Sentença ou Acórdão nº 0000 de Tribunal da Relação, 01 de Janeiro de 2023 (caso Acórdão nº 5468/19.9T8VNF.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-03-16)

Data da Resolução01 de Janeiro de 2023

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães:

I. RELATÓRIO [[1]]

Por sentença de 21-01-2019, do Tribunal Cível ..., proferida no Procedimento Cautelar de Restituição Provisória de Posse nº 622/19.... (antes, 5312/18....), requerido por S... Investimentos Imobiliários, Ldª, e S... Engenharia, SA, contra A..., SA, e AA, estes foram “condenados” a: i) restituir àquelas parte de certos prédios; ii) não impedir ou dificultar o acesso, circulação e fruição da mesma; iii) retirar de lá uns contentores e outros bens ou equipamentos lá colocados e que tal impediam; iv) entregar as chaves do portão; v) absterem-se de utilizar o logradouro; e vi) pagar-lhes a quantia de 500,00€ por cada dia de atraso no cumprimento ou de violação daquelas obrigações (fls. 163 a 175 do dito processo – cfr. certidão).

Em 11-03-2019, com base em alegado incumprimento dessas obrigações e no trânsito em julgado daquela sentença, foi instaurado e corre termos no Juízo de Execução de ... processo executivo nº ...9..., peticionando o pagamento da quantia correspondente à referida sanção, ou seja, além da quantia exequenda liquidada no requerimento inicial em 69.500,00€, “acrescida de prestações diárias à razão de €500,00 por dia, desde a data em que a sentença transitou em julgado até efectivo e integral cumprimento de tudo a quanto foram condenados”.

Posteriormente, no Tribunal de Comércio de ..., por sentença de 28-01-2020, transitada em julgado, foi declarada em estado de insolvência “A..., SA”.

Aberto o concurso de credores, a S... Engenharia, SA, deduziu reclamação de créditos, alegando persistir o aludido incumprimento das obrigações decretadas na Providência Cautelar e peticionando o reconhecimento e graduação do crédito correspondente a 406 dias (contados desde a data daquela sentença condenatória até à da apresentação da reclamação) x 500,00€ = 203.000,00€.

O Administrador de Insolvência apresentou (em 04-08-2020) a relação dos créditos reclamados a que se refere o artº 129º, do CIRE, e, na dos não reconhecidos, incluiu o da S... Engenharia, SA (nº 632), nela justificando: “Não foi reconhecido o montante referente à sanção pecuniária compulsória (203.000,00€) e respectivos juros de mora (15.806,19€), porquanto, conforme resulta do relatório de 04-02-2020, efetuado em sede de execução de sentença (processo nº 1781/19....), concluiu-se pelo cumprimento por parte da insolvência da sentença proferida no âmbito do processo nº 5312/18....).”

Em face disso, a S... Engenharia, SA, em 20-08-2020, deduziu impugnação à Lista, sustentando que se mantém o incumprimento da sanção pecuniária compulsória cujo montante peticionou na Execução e acrescentando que, nesse processo, a insolvente A..., SA, deduziu embargos de executado, que aquela contestou e no âmbito de cuja instrução foi determinada a realização de uma perícia para apurar o cumprimento ou não das obrigações cominadas no Procedimento Cautelar. Tais esclarecimentos ainda não foram prestados e, por isso, não foi realizada a audiência de discussão e julgamento. Não é certo que do relatório pericial se possa retirar a conclusão de que a insolvente cumpriu a providência cautelar. Em sua perspectiva, tal incumprimento subsiste e a devedora até levou a cabo no local actos contrários ao que lhe estava determinado. Por isso, é devido o pagamento do montante reclamado, àquele título e por tal incumprimento.

No processo de reclamação de créditos, designou-se, sem êxito, tentativa de conciliação e, depois, em 07-03-2022, proferiu-se saneador – referência Citius ...70, neste constando:

“A impugnante S... Engenharia veio impugnar o seu crédito [[2]], com fundamento, entre outros, na aplicação de sanção pecuniária compulsória à massa insolvente e respectivos juros de mora, no montante total de €218.806,19€.
Contudo, este crédito é um crédito da massa insolvente, pois que foi constituído após a declaração de insolvência. [[3]]
Pelo exposto, não pode ser reclamado no apenso de verificação e graduação de créditos da insolvência.
Termos em que tem de improceder a impugnação apresentada quanto ao mesmo”. [[4]]

No mesmo processo, foi proferida sentença em 13-09-2022, referência Citius ...91, nela constando, na parte do relatório:

“A impugnante pediu ainda que se reconheça o seu crédito no montante de €218.806,19€ correspondente aos montantes devidos a título de sanção pecuniária compulsória e respectivos juros de mora, contabilizados até à data da declaração de insolvência, graduado como crédito comum, e juros vencidos e vincendos desde a data da declaração de insolvência até efetivo e integral pagamento, reconhecido como crédito surbordinado.” [[5]]

E mais adiante, em sede de apreciação, a seguir à repetição daquele texto, acrescentou-se:

“Mas quanto a estes últimos, já decidimos no despacho saneador não serem de incluir na lista por se tratar de dívida da massa insolvente”. [[6]]

Após decisão das impugnações, foi feita graduação, tendo sido determinado que, sempre em primeiro lugar, pelo produto dos bens liquidados, será dado pagamento às dívidas da massa insolvente [[7]] que “saem precípuas”, nos termos dos nºs 1 e 2, do artº 172º, do CPC.

Entretanto, por requerimento apresentado em 12-07-2022, com a referência Citius ...56, a credora reclamante S... Engenharia, SA, pediu que fosse ordenada a apensação a este (insolvência) do já referido processo executivo nº ...9... pendente no Juízo de Execução de ... (em que é exequente).

Alegou, para tal fundamentar, que o Tribunal de Comércio, no saneador e na sentença proferidos no processo de reclamação, já decidiu que o crédito exequendo não é susceptível de reclamação e que é crédito da Massa Insolvente “pois foi constituído após a declaração de insolvência” mas que o crédito relativo ao incumprimento ocorrido no período que antecedeu a sentença declaratória da insolvência [[8]] “nunca poderia ser qualificado como dívida da massa insolvente”, sendo “dívida sobre a insolvente” por à data do início desse facto (incumprimento) não existir ainda situação de insolvência. No caso, o “fundamento” a que alude o artº 47º, nº 1, do CIRE, cuja anterioridade aí consta como critério definidor do que são dívidas da insolvência, não é a sentença proferida no Procedimento Cautelar que condenou na sanção pecuniária compulsória mas “tão só o concreto incumprimento que atribui, ao credor da prestação, o direito de exigir do devedor o pagamento” dela. É a data deste incumprimento que estabelece a destrinça entre “créditos da insolvência” e “créditos da massa”. Por isso é de “qualificar como crédito sobre a insolvência o incumprimento verificado até à data da declaração de insolvência e como crédito sobre a massa insolvente, o crédito originado pelo incumprimento ocorrido após esse momento” [[9]]. Assim, correspondendo a uma dívida da Massa o crédito originado pelo incumprimento verificado entre a data de declaração de insolvência – 28-01-2020 – e a presente data – 12-07-2022 – e tendo “o crédito em apreço” [[10]] sido pedido na dita execução 1781/19...., por apelo ao nº 2, do artº 89º, do CIRE, norma que considera imperativa, segundo a qual as acções, incluindo as executivas, relativas a dívidas da Massa correm por apenso ao processo de insolvência, é obrigação do Tribunal ordenar a pretendida apensação.

Por despacho de 01-08-2022, reportado ao requerimento de fls. 5950 (o de 12-07-2022), determinou-se: “Oficie ao processo nº 1781/19.... do J... do Juízo de Execução de ... solicitando informe se existe algum bem penhorado nos autos”.

Imediatamente após tal despacho, a S... Engenharia, SA, atravessou nos autos novo requerimento, percutindo que factor determinante da apensação requerida é tão só a natureza da dívida peticionada no processo exequendo, pelo que não se compreende que, tendo o Tribunal qualificado o crédito em causa como crédito sobre a massa e, por isso, nem o tendo admitido no âmbito da reclamação, agora mande pedir informação sobre se no processo executivo existe algum bem penhorado à ordem desses autos, existência ou inexistência que são completamente indiferentes, pois que não se está perante crédito sobre a insolvente. Daí que tenha insistido por que se determine a apensação.

Por despacho de 08-11-2022, referencia Citius ...29, foi decidido:

“Requerimento de 12-7-2022, a fls. 5950 e ss e informação de fls. 6068: Apenas foram penhoradas três quotas pertencentes a outro executado, também ele declarado insolvente, e não foram penhorados quaisquer bens da insolvente, pelo que, nos termos do disposto no artigo 88º, nº 2 a contrario do CIRE, indefiro a requerida apensação, que nenhuma vantagem traz para os autos.”

Em 29-11-2022, a credora reclamante “S... Engenharia, SA”, dizendo-se inconformada, apelou a que esta Relação revogue tal decisão e a substitua por outra que ordene a apensação ao processo de insolvência do executivo nº 1781/19...., tendo assim concluído as suas alegações:

“I- Através da prolação do despacho com a referência nº. ...29, datado de 2022.11.08, o Tribunal a quo indeferiu o pedido de apensação formulado nos autos pela Recorrente;
II- Para tanto, considerou o Tribunal a quo que o crédito peticionado no âmbito do Procº. nº. 1781/19...., consubstancia um crédito sobre a insolvente e não um crédito sobre a massa insolvente;
III- Antes de mais se refira que o despacho recorrido ao considerar estarmos perante um crédito sobre a insolvente e não sobre a massa insolvente contraria, quer a despacho saneador que não admitiu a reclamação do aludido crédito no âmbito do apenso de reclamação de créditos, quer a sentença proferida no âmbito de tal apenso, pois que em ambas as decisões o Tribunal a quo expressamente se qualificou o crédito em questão como um crédito sobre a massa insolvente;
IV- Com efeito e conforme resulta do requerimento de apensação junto aos autos pela...

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