Acórdão nº 543/23.8T8BJA.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25-05-2023

Data de Julgamento25 Maio 2023
Ano2023
Número Acordão543/23.8T8BJA.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Apelação 543/23.8T8BJA.E1
2ª Secção

Acordam no Tribunal da Relação de Évora:


I

AA, residente na R ... ..., ... ...., veio apresentar-se à insolvência.

Alega a Requerente que é solteira, que tem três filhos, menores, possui o 12º ano de escolaridade, desempenha funções de técnica de análises clínicas. Aufere em média € 914,74 por mês. Não tem mais bens, que não sejam os de uso estritamente pessoal, como roupa, sapatos e bens de higiene pessoal.

Inicialmente, ao socorrer-se do crédito, fê-lo para conseguir fazer face a algumas despesas e quebras de rendimentos. Contudo, a crise manteve-se e a Requerente não teve condições para cumprir com todas as suas obrigações bancárias. Tentou fazer acordos. Chegou ao ponto de completa rutura financeira, em que não consegue mais, apesar de tudo ter feito para o evitar, cumprir pontualmente as suas obrigações.

Nos últimos meses, apesar de já apresentar incumprimentos generalizados das suas obrigações, a Requerente ainda tentou junto de familiares e amigos o apoio necessário para poder cumprir para com as entidades credoras, o que, agora constata não ser possível. Tendo já, diversas prestações vencidas e não pagas.

Neste momento, os credores da Requerente são os seguintes:

1) Bankinter Consumer Finance, E.F.C., SA- Sucursal em Portugal, com sede na Praça Marquês de Pombal, nº13, 4º andar, 1250-162 Lisboa, onde detém um crédito cuja dívida ascende a 963,79€ (líquido), decorrente de um cartão de crédito, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento a 12-03-2023.

2) BNP Paribas Personal Finance, S.A. – Sucursal em Portugal, com sede na Rua Galileu Galilei, n.º 2, 8º piso, Torre Ocidente, Centro Colombo, 1500-392 Lisboa, onde detém um crédito cuja dívida ascende a 325,69 €, decorrente de um crédito pessoal, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento em 06-03-2023.

3) Caixa de Crédito Agrícola Mútuo do Alentejo Sul, CRL, com sede no Largo Eng. Duarte Pacheco, nº12, 7800-019 Beja, onde detém:

a) um crédito cuja dívida ascende a 1.471,17€, decorrente de um cartão de crédito, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento em 27-02-2023.

b) Um crédito cuja dívida ascende a 468,30€, decorrente de um crédito renovável, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento em 27-02-2023.

4) Montepio Crédito- Instituição Financeira de Crédito, S.A., com sede na Rua Júlio Dinis, nº158-160, 2º andar, 4050-318 Porto, onde detém um crédito, cuja dívida ascende a 3.671,79€, decorrente de um crédito pessoal, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49º, com data de vencimento de 01-04-2023.

5) Oney Bank- Sucursal em Portugal, com sede na Av. José Gomes Ferreira, nº9, SL1, 1495- 139 Algés, onde detém um crédito, cuja dívida ascende a 154,10€, decorrente de um cartão de crédito, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos 49º, com data de vencimento de 22-03-2023.

6) Unicre- Instituição Financeira de Crédito, S.A, com sede na Rua General Firmino Miguel, nº 6-B, piso – 1, 1600-300 Lisboa, onde detém um crédito, cuja dívida ascende a 2.431,81€, decorrente de um crédito pessoal, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento em 18-03-2023.

7) UNIVERSO, IME, S.A, com sede no Lugar do Espido, Via Norte, 4470-177 Maia, onde detém um crédito, cuja dívida ascende a 466,75€, decorrente de um cartão de crédito, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento em 12-03-2022.

8) Wizink Bank, S.A.U. – Sucursal em Portugal, com sede na Avenida Colégio Militar, n.º 37 – F, 6.º piso, D, 1500-180 Lisboa, onde detém um crédito:

a) cuja dívida ascende a 2.097,92€, decorrente de um crédito pessoal, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento em 24-02-2023.

b) Cuja dívida ascende a 4.125,87€, decorrente de um crédito pessoal, não havendo garantias prestadas, ou existência de relações especiais, nos termos do artigo 49.º, com data de vencimento em 24-02-2023.

A Requerente reside com o companheiro e os seus filhos em casa arrendada, pagando mensalmente o valor de 500,00€. Gasta mensalmente cerca de 281,85 € em água, luz, gás e telecomunicações. Apesar das despesas não constarem todas no nome da requerente, são todas suportadas pela mesma.

Acresce ainda gastos frequentes com saúde ocular de dois dos seus filhos.

As dificuldades económicas, que se arrastam, foram sendo superadas com as ajudas de terceiros, nomeadamente os familiares com quem reside.

A requerente tentou renegociar os seus créditos, no sentido de alcançar uma prestação que efetivamente pudesse cumprir, sem que tenha tido sucesso.

Indicou o valor das suas despesas correntes mensais como sendo aproximadamente de € 1181,85.

Requereu, por fim, a exoneração do passivo restante.

Acrescentando que, após ter tido conhecimento de que todas as dívidas pelas quais é responsável por força citações para os processos de execução, envidou todos os esforços, dentro da sua situação de incapacidade, no sentido de tentar arranjar meios que lhe permitissem pagar o seu passivo.

Sendo que apenas muito recentemente se frustraram todas as diligências desde então encetadas pela Requerente na tentativa de arranjar meios de satisfação de todas as dívidas.

Com a petição juntou os seguintes documentos:

a) Relação por ordem alfabética de todos os credores, com indicação dos respetivos domicílios, dos montantes dos seus créditos, datas de vencimento, natureza e garantias de que beneficiem, e da eventual existência de relações especiais;

b) Declaração escrita pelo seu próprio punho a explicitar a sua situação financeira;

c) Pedido de exoneração do passivo restante;

d) Declaração de funções exercidas nos últimos três anos;

e) Comprovativo de pedido de apoio judiciário;

f) Declaração de inexistência de bens em seu nome;

g) Procuração forense;

h) Declaração de veracidade das informações prestadas.

De imediato foi proferida a seguinte sentença:

«Prescreve o art. 3º n.º 1 do CIRE aprovado pelo Decreto Lei nº 53/04 de 18 de Março (código a que pertencem todas as disposições infra citadas sem qualquer outra indicação), que “1 - É considerado em situação de insolvência o devedor que se encontre impossibilitado de cumprir as suas obrigações vencidas. 2 - As pessoas coletivas e os patrimónios autónomos por cujas dívidas nenhuma pessoa singular responda pessoal e ilimitadamente, por forma direta ou indireta, são também considerados insolventes quando o seu passivo seja manifestamente superior ao ativo, avaliados segundo as normas contabilísticas aplicáveis. 3 - Cessa o disposto no número anterior quando o ativo seja superior ao passivo, avaliados em conformidade com as seguintes regras: a) Consideram-se no ativo e no passivo os elementos identificáveis, mesmo que não constantes do balanço, pelo seu justo valor; b) Quando o devedor seja titular de uma empresa, a valorização baseia-se numa perspetiva de continuidade ou de liquidação, consoante o que se afigure mais provável, mas em qualquer caso com exclusão da rubrica de trespasse; c) Não se incluem no passivo dívidas que apenas hajam de ser pagas à custa de fundos distribuíveis ou do ativo restante depois de satisfeitos ou acautelados os direitos dos demais credores do devedor. 4 - Equipara-se à situação de insolvência atual a que seja meramente iminente, no caso de apresentação pelo devedor à insolvência.»

A insolvência corresponde à impossibilidade de cumprimento pontual das obrigações e não à mera insuficiência patrimonial, correspondente a uma situação líquida negativa. A situação liquida negativa não implica a insolvência do devedor se o recurso ao crédito lhe permitir cumprir as suas obrigações.

Nos termos do art. 20º do CIRE são elencados factos que constituem meros índices da situação de insolvência tal como definida no mencionado art. 3º do CIRE, a saber:

a) Suspensão generalizada do pagamento das obrigações vencidas;

b) Falta de cumprimento de uma ou mais obrigações que, pelo seu montante ou pelas circunstâncias do incumprimento, revele a impossibilidade de o devedor satisfazer pontualmente a generalidade das suas obrigações;

c) Fuga do titular da empresa ou dos administradores do devedor ou abandono do local em que a empresa tem a sede ou exerce a sua principal atividade, relacionados com a falta de solvabilidade do devedor e sem designação de substituto idóneo;

d) Dissipação, abandono, liquidação apressada ou ruinosa de bens e constituição fictícia de créditos;

e) Insuficiência de bens penhoráveis para pagamento do crédito do exequente verificada em processo executivo movido contra o devedor;

f) Incumprimento de obrigações previstas em plano de insolvência ou em plano de pagamentos, nas condições previstas na alínea a) do n.º 1 e no n.º 2 do artigo 218.º;

g) Incumprimento generalizado, nos últimos seis meses, de dívidas de...

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