Acórdão nº 536/19.0BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 19-05-2022

Data de Julgamento19 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão536/19.0BELLE
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em Conferência, na Secção de Contencioso Administrativo, do Tribunal Central Administrativo Sul:

Relatório
Município de Loulé, nos presentes autos de ação administrativa urgente de intimação à emissão de alvará de autorização de utilização, do art 113° do DL n° 555/99, de 16.12, na redação dada pela Lei n° 60/2007, de e 4.9, que lhe foram movidos por G..., Lda, recorre da sentença proferida pelo TAF de Loulé em 31.1.2022, que julgou a ação procedente e, consequentemente, intimou a Câmara Municipal de Loulé, através do seu órgão competente, a emitir o alvará de utilização da moradia construída ao abrigo das licenças de construção n° 294/2009 e 265/2017, referente ao processo de obras n.° 498/07.
O recorrente conclui as alegações de recurso do modo seguinte:
A - A titulo prévio, quanto aos factos provados, entendemos que permitindo a factualidade assente e o teor dos documentos reproduzidos diversas interpretações, a questão não corresponde tanto à sua alteração e/ou ampliação, mas, distintamente, à interpretação e conclusões devidas, percute-se, delimitada pelo Acórdão do TCAS supra mencionado.
B- No âmbito da inspeção realizada, o Meritíssimo Juiz a quo, verificou direta e pessoalmente (cfr. Ata de Audiência final, de 17.01.2022 e Auto de Inspeção ao Local) que ”.... após a entrada no prédio, o acesso à garagem é no sentido ascendente, ou visto na perspetiva da saída da garagem, o sentido é sempre descendente, em linha reta ou na descida para a rua, tendo como referência a entrada do edifício, ou seja, quanto a nós, o Tribunal comprovou a realidade e veracidade do juízo contido no Ponto 5.1 da Informação transcrita no Ponto CC dos Factos provados, ou seja, a construção da rampa de acesso à garagem em desrespeito do projeto aprovado.
C - Fica, assim, provada a modelação artificial do terreno, pois, em rigor, no projeto aprovado para aceder à garagem tinha que se descer, e, agora, tem que se subir, o que foi verificado in loco pelo Meritíssimo Juiz a quo, aliás quaisquer duvidas que pudessem persistir, serão afastadas pela simples visualização das fotos que integram os PontosG (fotos de fls 9) e Q, onde é possível visualizar, tal como constatou a Fiscalização do Município de Loulé, a construção de 3 pisos acima da cota de soleira.
D - Sem conceder, ao invés do perfilhado na sentença recorrida, a situação dos autos não pode ser subsumida ao estabelecido no art. 88°A do RPDM, pois é patente que os critérios aí previstos não estão cumpridos, designadamente a área do terreno onde foi implantada a edificação e a qualidade de agricultor da A, aliás uma Sociedade Comercial.
E - Ao invés, confrontados os factos provados, mostra-se aplicável o regime no art. 88° B do RPDM, que, porém mostra-se violado, sendo inequívoco o desrespeito dos critérios e condições nele contemplados, desde logo, o não aumento dos pisos preexistentes e a integração paisagística nas formas e escala de relevo na paisagem natural.
F - Por último, importa considerar que, quando a A. requereu a emissão de licença de utilização, estando pendente de decisão final, os trabalhos de correção ou alteração já determinados ( cfr. Ponto I dos factos provados), não estavam reunidas as condições previstas no artigo 64° do RJUE, porquanto antes teria que ser objeto de pronúncia o peticionado pela A. em sede de audiência previa, daí que a A., por lapso ou estultícia, deu entrada do pedido de emissão de licença de utilização fazendo tábua rasa do despacho notificado nos termos do Ponto I) dos factos provados, estando, quanto a nós, obrigada, previamente a aguardar ou requerer a intimação judicial do Réu para proferir decisão final quando ao, por si, peticionado.
Termos em que ...requer-se a revogação da douta sentença recorrida e a sua substituição por outra que julgue a ação improcedente

A requerente/ recorrida contra-alegou o recurso, em cujas alegações formulou as seguintes conclusões:
1) Da factualidade dada como provada pelo Tribunal a quo, que aqui por questão de economia processual, se dá por reproduzida para todos os efeitos legais, constata-se que a mesma “descredibiliza” as alegações da recorrente, o que, por certo, levará à improcedência do seu recurso;
2) Pugna o Recorrente que deverá considerar-se provado que “A data da construção do edifício dos AA. o terreno foi artificialmente modelado”, que, no seu entender, resulta provado do constante no auto de inspeção ao local em que se verificou “que após a entrada no prédio, o acesso à garagem é no sentido ascendente, quer “pela simples visualização das fotos que integram os Pontos G (fotos de fls 9) e Q”;
3) Os indicados factos - modelação artificial do terreno -, em momento algum dos autos foram alegados pelo Recorrente, trata-se de uma afirmação da testemunha Arq.° Arménio da Conceição Lopes, produzida em sede de audiência de julgamento, tendo o Tribunal, face ao teor do testemunho, considerado que este se baseava numa suposição;
4) Pretende a alteração dos factos dados como não provados fundando-se, apenas, num documento, o auto de inspeção ao local onde vem dito que foi verificado que a entrada para o acesso ao prédio e à garagem é feito no sentido ascendente, com argumentos descontextualizados e isolados em relação à restante prova, esquecendo-se que a convicção do Julgador, no que a esses factos diz respeito, assentou na prova documental e prova testemunhal gravada, e quanto a este último meio probatório, não pediu a sua reapreciação;
5) Incumprindo o ónus de impugnação da decisão sobre a matéria de facto previsto no artigo 640°n° 2 al. a) do CPC a que estava obrigado;
6) Tal como vem sendo entendido pela Doutrina e pela Jurisprudência, resulta deste preceito o ónus de fundamentação da discordância quanto à decisão de facto proferida, fundamentando os pontos da divergência, o que implica a análise crítica da valoração da prova feita em primeira instância, abarcando a totalidade da prova produzida em primeira instância;
7) E tal omissão não pode ser suprida através de convite ao aperfeiçoamento, pois que, o recurso que tem por objeto a impugnação da matéria de facto, não comporta tal faculdade;
8) Consequentemente, tal implica a rejeição do recurso que incide sobre a matéria de facto;
9) A prova do facto - A data da construção do edifício dos AA. o terreno foi artificialmente modelado - também não resulta inelutável a partir dos documentos, fotografias que o Recorrente indica;
10) O facto que resultou provado - acesso à garagem no sentido ascendente - não tem a virtualidade de permitir a alteração da matéria de facto pretendida pelo Recorrente e inverter a decisão proferida, pelas razões expostas no corpo das presentes alegações, que aqui por questão de economia processual, se dão por reproduzidas para todos os efeitos legais;
11) Não se deixando aqui de salientar, a esse respeito, que o juízo contido no Ponto 5.1 da Informação transcrita no Ponto CC dos Factos provados, aludido pelo Recorrente é incorreto, pelas razões expostas pelo Arq.° N…, autor do projeto, constantes do Ponto DD dos factos assentes e demonstradas nas presentes alegações, que por economia processual se dão por reproduzidas;
12) Não podendo haver outra interpretação do teor do Ponto GG dos factos provados senão a de que, resultando da medição do poço da garagem a altura de 2,82 metros, tal só pode significar que foi feita a escavação para a cave da garagem, pelo menos, a essa medida de 2,82 metros (note-se, como ilustram as fotos tiradas aquando da inspeção ao local, a medição foi a partir da base do poço à qual ainda acresce a altura da escavação necessária à execução das fundações);
13) Que é corroborado por outras provas constantes no processo conforme se expõe nestas alegações e por questão de economia processual se dão por reproduzidas;
14) As invocações do Recorrente mostram-se predominantemente argumentativas e conclusivas, procurando transpor para a factualidade dada como provada, alguns segmentos meramente opinativos e redundantes do auto de inspeção realizado;
15) Acresce, dado que não foi impugnada a fundamentação jurídica da sentença, ou seja, a aplicação do Direito aos factos provados, comprometida está uma eventual apreciação da matéria de facto;
16) No caso sub judice, face à matéria de facto provada, é de considerar-se que a decisão é a conclusão lógica que decorre dos seus fundamentos, não ocorrendo entre a decisão e os respetivos fundamentos qualquer vício de raciocínio;
17) Sendo certo que ao Recorrente cabia alegar e provar os factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito arrogado pela ora Recorrida, o que não logrou;
18) Assiste ao Recorrente razão quando refere que houve erro de direito no que se refere às normas regulamentares aplicáveis à construção, porém, salvo o devido respeito, erra quanto ao seu enquadramento jurídico;
19) A obra foi licenciada por despacho do Presidente datado de 25.10.2007. (Cfr. PA junto aos autos, SITAF pág. 664, fls. 71), pelo que o diploma aplicável é RPDM de Loulé na versão da Resolução do Conselho de Ministros n.° 66/2004, de 26 de Maio e não a sua alteração - Aviso n.° 5374/2008 - atento o disposto neste último (Cfr. arts 2.°/2 e no art. 88.°, art.° e art.° 60.° do RJUE);
20) Nesse sentido, Fernanda Paula Oliveira, Maria José Castanheira Neves, Dulce Lopes e Fernanda Maçãs (in “Regime Jurídico da Urbanização e Edificação Comentado”, 2a. ed, págs. 241 e 242); Ac. TCAS de 02-03-2017, Proc. n.° 08426/12; Ac. STA de 29-10- 2020Proc. n.°0116/12.0BEMDL; Ac. STA de 27-01-2005Proc. n.°00510/05;
21) Mal se percebendo a posição ora tomada do Recorrente, quando é o próprio, como resulta da informação técnica, junta aos autos, datada 03.05.2018, que enquadra a operação urbanística na versão do RPDM referente à RCM n.° 66/2004 (pág. 963 do SITAF, fls. 242 a 243);
22) Afigura-se à Recorrida que o Recorrente pretende impugnar a douta decisão na...

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