Acórdão nº 516/23.0YLPRT.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 14-09-2023

Data de Julgamento14 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão516/23.0YLPRT.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes da 2ª secção (cível) do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. RELATÓRIO
LS e CS, requereram procedimento especial de despejo contra RV.
Foi proferida sentença que deferiu o pedido de desocupação de imóvel, pelo período de 5 meses, a qual foi comunicada ao Fundo de Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (cfr. artigo 15º-O, nº 3 do NRAU).
Inconformado, veio o INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL I.P. (IGFSS,IP) apelar da sentença, tendo extraído das alegações[1],[2] que apresentou as seguintes
CONCLUSÕES[3]:
1. Vem o presente recurso interposto da douta decisão de 08-05-2023 que concedeu o diferimento de desocupação do locado, por cinco meses, determinando, ainda, a comunicação ao FSS nos termos do estatuído no art.º 15.º-O – n.º3 do NRAU, daí, só se podendo concluir pela condenação do FSS no pagamento das rendas vencidas e não pagas durante o período do diferimento decretado.
2. O recurso tem por objeto apenas a parte da decisão de que deriva a condenação do FSS no pagamento das rendas referentes ao período de diferimento decretado.
3. Refere a douta decisão ora recorrida a dado momento que: “A procedência de tal diferimento, está, porém, dependente da verificação de algum dos seguintes fundamentos – cfr. artigo 15º-N, nº 2, als. a) e b): (a) que, tratando-se de resolução por não pagamento de rendas, a falta do mesmo se deve a carência de meios do arrendatário (o que se presume relativamente ao beneficiário de subsídio de desemprego, de valor igual à retribuição mínima mensal garantida ou de rendimento social de inserção); (b) que o arrendatário tem deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60%.
4. Sem indicar qual o fundamento do diferimento decretado, por referência aos fundamentos previstos no art.º 15.º - N, n.º 2 do NRAU, veio a decisão proferida a determinar o seguinte:“ Notifique. Comunique ao Fundo de Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (cfr. artigo 15º-O, nº 3 do NRAU).”
5. Ora, nos termos do art.º 15.º-O, n.º 3 do NRAU, a decisão de diferimento de desocupação do locado, bem como, a sua fundamentação só é comunicada ao FSS, no caso previsto no art.º 15.º - N. n.º 2 al. a) do NRAU, isto é, quando cabe ao dito Fundo pagar ao senhorio as rendas correspondentes ao período de diferimento.
6. Sucede que, é manifesto que não se verificam os pressupostos/requisitos cuja concretização cumulativa é condição necessária à intervenção do FSS.
7. Da conjugação do preceituado no art.º15.º - N, n.º1, n.º 2 al. a) e n.º 3 do NRAU, resulta que são pressupostos/ requisitos cumulativos de intervenção do FSS, os a seguir discriminados:
- que o contrato de arrendamento tenha por fim a habitação;
- que a resolução do contrato de arrendamento tenha por fundamento o não pagamento de rendas;
- que a falta do pagamento das rendas se deva a carência de meios do arrendatário, o que se presume relativamente ao beneficiário de subsídio de desemprego, de valor igual ou inferior à retribuição mínima mensal garantida, ou de rendimento de inserção social;
8. Nos termos do previsto no art.º 15.º - N, n.º3 do NRAU apenas cabe ao FSS pagar ao senhorio as rendas correspondentes ao período de diferimento, no caso de o diferimento em causa ter por fundamento o estatuído no n.º 2. al. a) do citado preceito legal.
9. Dos presentes autos e, nomeadamente, da notificação judicial avulsa da Ré e do requerimento de despejo resulta que o contrato de arrendamento em causa cessou por oposição à renovação pelo senhorio, não tendo sido resolvido por falta de pagamento de rendas.
10. Como decorre do art.º 15.º - N, n.º2 al. a) e n.º 3 do NRAU a intervenção do FSS está limitada a situações muito específicas, concretamente balizadas pela lei, e, consequentemente, tal intervenção está dependente da verificação necessária e cumulativa dos pressupostos/requisitos legais que a condicionam.
11. No caso dos autos, o contrato de arrendamento em causa caducou por oposição à renovação, pelo que, não se verifica, pelo menos, um dos pressupostos/requisitos legais, cuja concretização cumulativa é condição necessária à intervenção do FSS: que o contrato de arrendamento tenha sido resolvido, tendo por fundamento, a falta de pagamento de rendas.
Nestes termos e demais de direito, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão ora recorrida, na parte que determina a comunicação ao FSS, nos termos do art.º 15.º - O n.º 3 do NRAU e declarando-se que na situação em causa nos autos, não existe obrigação do FSS assegurar o pagamento das rendas referentes ao período de diferimento decretado.
Os autores e ré não contra-alegaram.
Colhidos os vistos[4], cumpre decidir.
OBJETO DO RECURSO[5],[6]
Emerge das conclusões de recurso apresentadas por INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL I.P. (IGFSS,IP), ora apelante, que o seu objeto está circunscrito à seguinte questão:
1.) Saber se não tendo o diferimento de desocupação do imóvel arrendado para habitação por fundamento a resolução do contrato de arrendamento por não pagamento de rendas, deve ser o Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social I.P., condenado a pagar as rendas vencidas e não pagas durante o período do diferimento.
2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. FACTOS
1.) LS e CS, requereram procedimento especial de despejo contra RV, alegando que não pretendendo a renovação do contrato de arrendamento com esta celebrado, vêm denuncia-lo unilateralmente, com efeitos a partir de 30 de Junho de 2022.
2.) Requereram a notificação judicial avulsa da Requerida, RV dando-lhe conhecimento de que consideravam denunciado o contrato de arrendamento celebrado em 01 de Julho de 2012, referente à fração autónoma destinada a habitação, designada pela letra “A”, correspondente 136 de 163 à subcave esquerda, do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, sito na Praceta …, n.º …, em Casal de S. Brás, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo … da freguesia da Falagueira-Venda nova, concelho da Amadora, descrito na Conservatória do Registo Predial da Amadora sob o nº …, a partir de 30 de Junho de 2022.
3.) A Requerida, RV, requereu o deferimento de desocupação do imóvel arrendado para habitação por um período máximo de 5 meses, por forma a permitir arranjar uma habitação.
4.) LS e CS, aceitaram o prazo de 5 meses para a desocupação do imóvel.
5.) A Requerida, RV, tem 57 anos, padece de patologia a nível neurológico, aufere um salário mensal de 700,00 €, foi despedida de um dos seus empregos, não dispõe de outra habitação, tendo, inclusive, solicitado uma habitação camarária.
5.) Foi proferida decisão que deferiu o pedido de desocupação de imóvel, pelo período de 5 meses, a qual foi comunicada ao Fundo de Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social (cfr. artigo 15º-O, nº 3 do NRAU).
2.2. O DIREITO
Importa conhecer o objeto do recurso, circunscrito pelas respetivas conclusões, salvas as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e as que sejam de conhecimento oficioso[7] (não havendo questões de conhecimento oficioso são as conclusões de recurso que delimitam o seu objeto).
1.) SABER SE NÃO TENDO O DIFERIMENTO DE DESOCUPAÇÃO DO IMÓVEL ARRENDADO PARA HABITAÇÃO POR FUNDAMENTO A RESOLUÇÃO DO CONTRATO DE ARRENDAMENTO POR NÃO PAGAMENTO DE RENDAS, DEVE SER O INSTITUTO DE GESTÃO FINANCEIRA DA SEGURANÇA SOCIAL I.P., CONDENADO A PAGAR AS RENDAS VENCIDAS E NÃO PAGAS DURANTE O PERÍODO DO DIFERIMENTO.
A apelante alegou que “que o contrato de arrendamento em causa cessou por oposição à renovação pelo senhorio, não tendo sido resolvido por falta de pagamento de rendas”.
Mais alegou que “como o contrato de arrendamento causa caducou por oposição à renovação, pelo que, não se verifica, pelo menos, um dos pressupostos/ requisitos legais, cuja concretização cumulativa é condição necessária à intervenção do FSS: que o contrato de arrendamento tenha sido resolvido, tendo por fundamento, a falta de pagamento de rendas”.
Assim, concluiu que “Nos termos do previsto no art.º 15.º - N, n.º 3 do NRAU apenas cabe ao FSS pagar ao senhorio as rendas correspondentes ao período de
diferimento, no caso de o diferimento em causa ter por fundamento o estatuído no n.º 2, al. a) do citado preceito legal”.
Vejamos a questão.
No caso de imóvel arrendado para habitação, dentro do prazo para a oposição ao procedimento especial de despejo, o arrendatário pode requerer ao juiz do tribunal judicial da situação do locado o diferimento da desocupação, por razões sociais imperiosas, devendo logo oferecer as provas disponíveis e indicar as testemunhas a apresentar, até ao limite de três – art. 15º-N/1, do NRAU.
O diferimento de desocupação do locado para habitação é decidido de acordo com o prudente arbítrio do tribunal, devendo o juiz ter em consideração as exigências da boa-fé, a circunstância de o arrendatário não dispor imediatamente de outra habitação, o número de pessoas que habitam com o arrendatário, a sua idade, o seu estado de saúde e, em geral, a situação económica e social das pessoas envolvidas, só podendo ser concedido desde que se verifique algum dos seguintes fundamentos: Que, tratando-se de resolução por não pagamento de rendas, a falta do mesmo se deve a carência de meios do arrendatário, o que se presume relativamente ao beneficiário de subsídio de desemprego, de valor igual ou inferior à retribuição mínima mensal garantida, ou de rendimento social de inserção; Que o arrendatário tem deficiência com grau comprovado de incapacidade igual ou superior a 60% – art. 15º-N/2/a/b, do NRAU.
No caso de diferimento decidido com base na alínea a) do número anterior, cabe ao Fundo de Socorro Social do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social pagar ao senhorio as rendas correspondentes ao período de diferimento, ficando aquele sub-rogado nos
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