Acórdão nº 515/14.3TBLRA-B.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-02-24

Ano2022
Número Acordão515/14.3TBLRA-B.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes que constituem o Tribunal da Relação de Lisboa.

1. RELATÓRIO.
No âmbito da ação declarativa de condenação, com processo comum, proposta por … S.A. contra ... PORTUGAL, LDA, pedindo, além do mais, a sua condenação a entregar-lhe a quantia de € 692.866,00, a título de indemnização de clientela, tendo sido proferida sentença, julgando a ação parcialmente procedente e condenando a R a entregar à A a quantia que se liquidar em incidente de liquidação relativamente ao pedido de indemnização de clientela, acrescida de juros desde o trânsito da decisão proferida no incidente de liquidação, a R interpôs recurso de apelação e requereu a fixação de efeito suspensivo ao recurso, oferecendo prestação de caução no valor de € 59.809,00 ou outro valor considerado adequado.
O tribunal a quo ordenou a notificação da A para se pronunciar e tendo esta respondido que a caução não deveria ser inferior ao valor pedido, de € 692.866,00, proferiu a seguinte decisão: “Considerando o valor peticionado pela A. quanto à indemnização de clientela (€ 692.866,00) o valor manifestamente baixo da caução proposta por referência àquele valor e a oposição da A quanto ao valor proposto, não admito a caução pelo valor de € 59.809,00 e, em consequência fixo ao recurso o efeito devolutivo”.
Inconformada com essa decisão a R dela interpôs recurso, recebido como apelação, pedindo que se declare a sua nulidade, ao abrigo do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas b) e d), do C.P. Civil, aplicável “ex vi” do artigo 613.º, n.º 3, do C.P. Civil, e que a mesma seja revogada e substituída por decisão que admita a caução oferecida ou noutro valor mais elevado, até ao montante máximo peticionado nos autos, de € 692.866,00, fixando-se, em consequência, efeito suspensivo ao recurso interposto da sentença, formulando para o efeito as seguintes conclusões:
A) O presente recurso vem interposto do Douto Despacho proferido em 02/12/2019, a fls. … dos autos, no qual o Tribunal a quo determinou a não admissão da caução pelo valor de EUR 59.809,00, fixando, em consequência, efeito devolutivo ao recurso interposto da Douta Sentença pela ... Portugal.
B) Aquando da interposição do recurso da Douta Sentença, em 07/12/2018, a ... Portugal requereu a atribuição ao mesmo de efeito suspensivo mediante a prestação de caução no valor de EUR 59.809,00. Ressalvou, no porém e expressamente, a possibilidade de prestar a referida caução por outro valor que o Tribunal a quo reputasse adequado com base, designadamente, no raciocínio vertido na Douta Sentença.
C) A ...H foi notificada das alegações de recurso da ora Recorrente, mas nada referiu a propósito da prestação de caução nas suas contra-alegações.
D) Posteriormente, foi proferido Douto Despacho em 09/02/2019, a fls. … dos autos, através do qual o Tribunal de 1ª instância convidou a ...H a pronunciar-se sobre o valor da caução proposta pela ... Portugal.
E) A ...H afirmou que o valor a fixar para efeito da prestação de caução não podia ser inferior ao valor peticionado (cfr. Requerimento da ...H, de 18/02/2019, com a Ref.ª Citius 31595108).
F) A ... Portugal respondeu a este Requerimento, pugnando pela sua inadmissibilidade legal, e interpôs recurso do Douto Despacho de 09/02/2019. Alegou, em síntese, que (i) não tendo a ...H exercido o contraditório no que à prestação de caução respeita no momento processual adequado – rectius, nas contra-alegações de recurso –, tal direito ficou precludido, não mais sendo possível pronunciar-se sobre a matéria, e (ii) o referido Despacho de 09/02/2019 padece de nulidade, pois dele não constam os fundamentos de facto e de Direito em que assenta (cfr. Requerimento de 25/02/2019, com a Ref.ª Citius 31673138 e Alegações de Recurso de 06/03/2019, com a Ref.ª Citius 31766466).
G) O referido recurso encontra-se presentemente pendente neste Venerando Tribunal, 8ª Secção, sob o nº 515/14.3TBLRA.L1, e a aguardar decisão.
H) Na sequência de Douto Despacho proferido pela 8ª Secção deste Venerando Tribunal (no processo nº 515/14.3TBLRA.L1), que ordenou a baixa dos autos ao Tribunal de 1ª instância, a fim de ser proferido despacho que fixe o efeito a atribuir ao recurso interposto da Douta Sentença pela ... Portugal, o Tribunal a quo, decidiu não admitir a caução pelo valor proposto pela ... Portugal e, em consequência, fixou efeito devolutivo ao recurso mencionado no ponto 2. supra.
I) O Tribunal a quo fundamentou a sua decisão nos seguintes termos: “Considerando o valor peticionado pela A. quanto à indemnização de clientela (€ 692.866,00) o valor manifestamente baixo da caução proposta por referência àquele valor e a oposição da A. quanto ao valor proposto, não admito a caução pelo valor de € 59.809,00, e, em consequência fixo ao recurso o efeito devolutivo”.
J) Salvo o devido respeito, que é muito, a ... Portugal não pode conformarse com o teor do Douto Despacho recorrido. Por um lado, (i) o Douto Despacho recorrido padece de nulidade, por falta de fundamentação e omissão de pronúncia (nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alíneas d) e b), do CPC) e, por outro, (ii) o valor da caução oferecida é idóneo e adequado. De qualquer modo, a ... Portugal disponibilizou-se ab initio – e reitera essa disponibilidade – para prestar caução por um valor diferente, que o Tribunal considerasse adequado, até ao limite de EUR 692.866,00 peticionado nos autos (sem que tal implique, contudo, o reconhecimento do direito invocado pela Recorrida no sentido de lhe ser atribuída indemnização de clientela).
K) Nos termos do disposto no artigo 608.º, n.º 2, do CPC, “[o] juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocuparse senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permiti ou impuser o conhecimento oficioso de outras”.
L) Por outro lado, estatui o art. 615º, nº 1, alíneas b) e d) do CPC que é nula a sentença quando (i) não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; e quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento (norma esta que é aplicável aos despachos “ex vi” do artigo 613º, nº 3, do CPC). M) In casu, o Tribunal a quo não apreciou, na totalidade, a questão relativa ao valor da caução a prestar, tal como concretamente configurada pela ... Portugal, nem especificou os fundamentos, de facto e de Direito, em que assentou a decisão recorrida.
N) Com efeito, nas alegações do recurso da Douta Sentença, a ... Portugal requereu a atribuição de efeito suspensivo ao mesmo, tendo para o efeito oferecido caução no montante de EUR 59.809,00 e explicitado os motivos pelos quais ofereceu este valor e o seu cálculo, e manifestado expressamente a sua disponibilidade para prestar caução por outro valor reputado adequado pelo Tribunal a quo (cfr. ponto 66. das alegações de recurso da ... Portugal e Conclusão X), facto que o Tribunal a quo deveria forçosamente de ter em conta aquando da prolação do Douto Despacho recorrido.
O)
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