Acórdão nº 5136/21.1T8CBR.C2 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2024-02-07

Data de Julgamento07 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão5136/21.1T8CBR.C2
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (COIMBRA (JUÍZO CENTRAL CRIMINAL DE COIMBRA – J3))


Acordam, em conferência, os juízes da secção criminal do Tribunal da Relação de Coimbra.

I.
No processo de cúmulo jurídico que, com o nº 5136/21...., corre termos pelo juízo central criminal de Coimbra foi decidido (transcrição):
“condenar o arguido AA na pena única de 4 anos e 10 meses de prisão efetiva englobando as penas aplicadas nos processos 121/16...., 1093/16...., 755/16...., 95/16.... e 1130/16....”.
*
Inconformado com o acórdão cumulatório veio o arguido recorrer para este Tribunal da Relação, apresentando as seguintes conclusões (transcrição):
1. Vem o ora recorrente, AA, condenado em cúmulo jurídico pela prática de diversos crimes de foro, essencialmente patrimonial, interpor o presente recurso pelo facto de (mais uma vez) não concordar com a decisão proferida pelo Tribunal a quo;
2. Considera-se ainda que o acórdão cumulatório, ao enfermar de vícios viola o direito a um recurso pleno, em termos de fundamentação de facto e de direito, dado que aquilo de que se recorre não se compagina com a realidade e entra em contradição com esta de forma intríseca, violando, assim, o n.º 1 do art.º 32.º da CRP;
3. Ora, atendendo à pena em que o arguido foi condenado em sede de cúmulo, nada obstava a que a mesma fosse substituida por uma (vulgo) pena suspensa;
4. Face à morosidade dos presentes autos, não é de descurar que o arguido cumpriu de forma integral, sem acesso a medidas de flexibilização da pena, designadamente saídas administrativas e liberdade condicional, a pena em que foi condenado no processo n.º 40/17...., transitado em julgado a 30 de Março de 2019, e que não é objecto do presente cúmulo - estamos perante uma condenação em pena de prisão efectiva de três anos, por tráfico de estupefacientes e detenção de arma proibida;
5. O Tribunal a quo consignou no acórdão cumulatório o que resulta de um relatório social totalmente desajustado da realidade hodierna, pelo facto de ter sido elaborado a 28 de Março de 2022, não tendo sequer requerido novo Relatório Social, o que se revela que estamos perante um vício subsumível ao disposto na al. a) do n.º 2 do art. 410.º do CPPenal, dado que inexistem elementos nos autos que permitam consignar como assente as conclusões do Tribunal, por serem inexactas - erro na matéria de facto dada como provada;
6. O Tribunal, neste momento, face aos dezasseis meses que medeiam entre a prolação do relatório social e o acórdão cumulatório, não sabe, nem tem como saber sem recurso a elementos que lhe são quotidiano, as circunstâncias que abonam em favor do recorrente;
7. Na fundamentação de direito do acórdão, para efeitos de aplicação da pena concretamente aplicável, resultante do disposto no art.º 78.º do CPenal, com aplicação das regras do art.º 77.º do CPenal, o Tribunal refere que a primeira condenação criminal relevante para o presente cúmulo seria a proferida nos autos que tramitaram no Juízo Local Criminal do Tribunal Judicial da Comarca de Coimbra, contudo, tal não corresponde à verdade, nem tampouco reflecte a solução legal;
8. Em nada é despiciendo referir que o processo n.º 121/16...., de facto é relevante para o cúmulo, pois, para além de a sua pena ter de ser incluída no cômputo do concurso superveniente, foi aquele processo que determinou a competência territorial do Tribunal a quo, dado que não foi a primeira, mas sim a última condenação do ora recorrente - veja-se o disposto no n.º 2 do art. 471.º do CPPenal;
9.A punctação efectuada pelo Tribunal a quo, quanto ao passado condenatório do arguido, omite as circunstâncias da punição e revogação das penas que se encontram ou não a concurso, pelo que o facto de estarmos perante técnicas de exposição decisórias bastante díspares entre si, cria alguma confusão e, se nos permitem, insegurança ora fica explanado que uma pena se encontra extinta pelo cumprimento, ora apenas se refere que se encontra extinta, ora nada se diz;
10. O arguido não consegue vislumbrar a razão pela qual o processo n.º 1720/15.... não está incluído no cúmulo e se tal terá consequências futuras;
11. Consequentemente, estamos (novamente) perante uma nulidade, desta feita a prevista na al. c) do n.º 1, do art. 379.º CPPenal, em virtude de o Tribunal não se ter pronunciado sobre matéria que era incontornável, para existir segurança jurídica, conforme anteriormente explanado;
12. Face ao supra exposto, revela-se incontornável a declaração da nulidade do acórdão recorrendo, tendo como consequência o disposto no n.º 1 do art.º 122.º do CPPenal, tornando inválida a decisão lida a 1 de julho de 2022, assinada e depositada a 5 de julho de 2022;
13. O Tribunal não se pode subtrair de proceder a uma avaliação pormenorizada dos factos dados como provados nos vários processos, precisamente para cumprir com o princípio nulla poena sine culpa;
14. Não podemos deixar de assumir que a culpa tem vária graduações e a análise da personalidade do agente, bem como o seu estádio de formação não são despiciendos, pelo que deviam ter ficado bem assentes no acórdão cumulatório;
15. Deveria ter sido dada ao recorrente a oportunidade de se (res)socializar, de ser educado para o direito, de forma condigna, sem recurso à reclusão, ou, se nos permitem a ousadia, com reclusão em estabelecimento apropriado, atenta a idade do mesmo aquando da prática dos factos, com recurso ao regime penal aplicável para jovens delinquentes, aprovado pelo Decreto-lei n.º 401/82, de 23 de Setembro - veja-se o art.º 1.º, n.º 1;
16. Em momento algum foi cogitada tal possibilidade não obstante o regime ser aplicável dado que AA ainda não tinha atingido os 21 anos de idade na maioria dos casos, pelo que, salvo melhor opinião, devia ter sido equacionada a atenuação especial da pena, nos termos dos arts.º 72.º e 73.º do Código Penal, por aplicação do art. 4.º do Regime Penal Aplicável a Jovens Delinquentes;
17. Não sendo possível aplicar o instituto da atenuação especial da pena em sede de concurso, e sendo a atenuação especial da pena consolidada na jurisprudência como um poder-dever do juiz quando estamos perante um jovem com idade compreendida entre os 16 e os 21 anos, a pena de concurso tem de, pelo menos, ter tal facto em consideração ao nível da culpa, pelo que a pena aplicada em sede de concurso superveniente é inequivocamente excessiva, violando o princípio da culpa, nos termos do n.º 2 do art. 40.º do CPenal e, consequentemente o princípio da legalidade nulla poena sine lege (stricta, caerta, praevia, scripta), nulla poena sine culpa, designadamente o disposto na al. c) do n.º 1 do art.º 165.º do CPPenal, por ausência de aplicação da lei penal conforme determinado pelo poder judicial, não podendo este imiscuir no poder legislativo;
18. A moldura penal de concurso estabelece-se entre os dois anos e dois meses de prisão e os oito anos e dez meses de prisão, ora, atendendo aos critérios dos arts. 70.º e 71.º do CPenal, face às circunstâncias de tempo e modo em que os crimes foram cometidos, bem como no que concerne ao seu comportamento depois da condenação - designadamente ter levado a cabo uma vida pautada pelo direito desde sete anos a esta parte; ter desempenhado actividades laborais de forma séria e contínua, quer em regime de reclusão, quer antes de ter sido detido; ter tomado conta da sua filha enquanto se encontrou em liberdade - vários pormenores foram omitidos do acórdão (logo não valorados) e que poderiam ter sido benéficos para o arguido;
19. Acresce ainda que o arguido foi julgado legalmente na sua ausência em quatro dos processos englobados no cúmulo, pelo que a censura (ou ausência dela) pelo seu comportamento não poderá, como refere o Tribunal a quo, estar reflectida naqueles processos.
20. Mesmo que o recorrente se tivesse remetido ao silêncio, uma vez que estivesse presente em julgamento, não podemos ignorar que tal ausência de palavra falada não o poderia prejudicar - veja-se o disposto na al. d) do n.º 1 do art.º 61.º e no n.º 1do art. 343.º do CPPenal (nemo tenetur se ipsum accusare);
21. Consideramos totalmente infundada a afirmação do Tribunal a quo o arguido não demonstrou juízo critico sobre o desvalor das condutas, nos processos englobados no cúmulo sobre a sua conduta, por inexistirem elementos nos autos que a permitam deixar impressa num acórdão condenatório, estando perante um erro notório na apreciação da prova, nos termos da al. c) do n.º 2 do art. 410.º do CPPenal;
22. O Tribunal obviou a reconhecer que os factos a praticados, em concurso, ocorreram sete anos e que, desde então, salvo o processo 40/..., o arguido tem levado a cabo uma vida de acordo com o direito, muito diferente do que é assente no acórdão recorrendo, onde é constantemente salientado o seu percurso criminal;
23. O lapso temporal decorrido, desde a prática dos factos e o dia de hoje, permite, para além do que se dispendeu supra, que estamos perante uma pena conjunta claramente excessiva, a qual, salvo melhor entendimento, nunca deveria ter sido fixada para além dos três anos e seis de prisão, atenta, inclusivamente, a idade do arguido aquando da sua prática - dos dezanove aos vinte e um anos, tendo hoje apenas vinte e sete anos;
24. A avaliação global dos factos resume-se ao um pequeno excerto e não contempla qualquer análise sobre a factualidade submetida a concurso;
25. Se no acórdão precedente salientámos que existia confusão entre figuras - dolo e culpa - aqui nem sequer uma frase expendida sobre o assunto e tal, salvo melhor opinião, é totalmente inadmissível e consubstancia omissão de pronúncia, logo, o acórdão só poderá ser declarado nulo, com base no disposto na al. c) do n.º 1 do art.º 379.º do CPPenal;
26. O acórdão não apreciou devidamente os factos cometidos, nem tampouco o tipo subjectivo e culpa do agente, pelo que se encontra insuficientemente justificada a aplicação da pena de prisão efectiva de quatro anos e dez me
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