Acórdão nº 51/17.6 BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-06-01

Data de Julgamento01 Junho 2023
Ano2023
Número Acordão51/17.6 BCLSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACÓRDÃO
I - Relatório
A Sociedade G....., SGPS, S.A., solicitou junto do CAAD, a constituição de tribunal arbitral e procedeu a um pedido de pronúncia arbitral com vista à anulação do acto de liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) com o n.º ……………..325, referente ao exercício de 2011, no valor de €188.910,76, bem como a restituição do imposto pago indevidamente, acrescido dos respectivos juros indemnizatórios à taxa legal. O Tribunal Arbitral, por decisão colectiva de 14 de Março de 2017, proferida no âmbito do Processo nº ……./2016-T, julgou improcedente o pedido formulado, mantendo na ordem jurídica a liquidação sindicada.
Inconformada, a sociedade G....., SGPS, S.A., veio deduzir impugnação contra a referida decisão arbitral, tendo nas alegações apresentadas e constantes a fls. 1 e ss. (numeração em formato digital – sitaf), formulado as seguintes conclusões:
(A) No presente processo vem impugnada a decisão arbitral proferida pelo Tribunal Arbitral no processo n.º237/2016-T;
(B) Em causa no sobredito processo estava a apreciação da legalidade de uma liquidação adicional de IRC, emitida pela AT à impugnante, com fundamento no facto de o recebimento por esta de 183.384 ações do S........, realizado no contexto de um aumento de capital por incorporação de reservas em 2011 e no quadro de um "programa de retribuição accionista, denominado «S........ Dividendo Elección»", consubstancia o recebimento de um dividendo tributável, nos termos do art.º20º, nºl, al. c) do Código do IRC (cf. liquidação contestada e Relatório Final de Inspeção que constam da certidão junta como doc. n.ºl);
(C) Por essa razão, a referida liquidação tem como base de incidência o valor de mercado daquelas ações no momento em que foram recebidas, no valor €1.676.863,30 (cf. liquidação contestada e Relatório Final de Inspeção que constam da certidão junta como doc. n.º1);
(D) A Impugnante, discordando deste entendimento, pugnou pela ilegalidade daquela liquidação, alegando que o recebimento daquelas ações não consubstancia um dividendo nem qualquer outro rendimento, já que precisamente não importa qualquer variação positiva do ativo líquido da Impugnante, pelo que acrescer tal valor ao resultado contabilístico (onde não foi naturalmente registado qualquer ganho) e tributar com fundamento no artº20º, nº1, al. c) do Código do IRC - como fez a AT - é ilegal e não pode manter-se (cf. pedido arbitral e alegações da Impugnante que que constam da certidão junta como doc. n.º1);
(E) Mais sustentou a Impugnante que apenas a transmissão onerosa das ações recebidas, se e na medida em que tal transmissão se apurasse um ganho, permitiria apurar uma mais-valia tributável, nos termos do art.º20º, nº1, al. h) do Código do IRC (e a ser efetivamente tributada no quadro da demais legislação aplicável) (cf. pedido arbitral e alegações da Impugnante que que constam da certidão junta como doc. nº i);
(F) Ademais, alegou que outra interpretação do disposto no art.20º que não a que perfilhava seria violadora dos princípios da legalidade, previsto nos art.ºs 103º, nº2 e 165º, nº1, al. i) da CRP e do art.º8º da LGT e dos princípios constitucionais da capacidade contributiva e da tributação pelo lucro real, previstos no artº103º, nº1da CRP e, em última instância, do princípio da igualdade, previsto no artº13º da CRP (cf. pedido arbitral e alegações da Impugnante que que constam da certidão junta como doc. nº1);
(G) A AT, nos autos arbitrais, manteve a sua posição, sustentando que tal atribuição constituía um dividendo e era por isso tributável em IRC (cf. pedido resposta e alegações da AT que que constam da certidão junta como doc. nº1);
(H) Na decisão impugnada, o Tribunal a quo decidiu no sentido da improcedência do pedido e, consequentemente, pela manutenção na ordem jurídica da liquidação contestada (cf. decisão impugnada que consta da certidão junta como doc. nº1);
(I) Para tanto, deu como provada a realização de um aumento de capital por incorporação de reservas;
(J) E considerou que dessa operação resulta a incorporação (em alternativa à distribuição) de lucros acumulados no capital social do S........;
(K) No entanto, conclui contraditoriamente pela manutenção na ordem jurídica de uma liquidação que tributa as ações recebidas pela Impugnante em resultado desse aumento de capital como um dividendo;
(L) Por outro lado, o Tribunal a quo deu como provado que o ato contestado tinha por fundamentação o recebimento de um dividendo;
(M) Contudo, considerando que o Código do IRC consagra um "conceito amplo de proveitos ou ganhos" e com total independência do conceito de dividendo em que se baseou a AT para emitir o ato, conclui que a Impugnante teve um "incremento patrimonial da sua esfera jurídica" que deve ser tributado - o que não consubstancia a fundamentação da liquidação contestada pela Impugnante;
(N) De seguida, considera que esse incremento patrimonial (que repita-se não existiu) resulta da aquisição e subsequente transmissão das ações do S........, o que precisamente levaria à conclusão de que estaríamos nesse caso em presença de uma mais-valia (conceito reservado aos rendimentos gerados aquando da alienação de ativos como são as ações aqui em causa),
(O) Mas depois decide pela legalidade da liquidação contestada que tem apenas por base o recebimento dessas ações e que pretende tributar esse recebimento (e apenas esse recebimento) como um dividendo;
(P) E por último, cita a decisão os comentários previstos na Convenção Modelo da OCDE, onde nesta se escreve que constituem dividendos os que sejam atribuídos como tais, ou outros benefícios que em sua substituição sejam abonados;
(Q) Porém, tal pressupõe, sempre e em qualquer caso, que haja distribuição, ou seja, que os lucros acumulados (ou reservas livres) sejam distribuídos (o que não aconteceu no caso da Impugnante e, portanto, não é pressuposto da liquidação contestada) pelo que essa alegação é contraditória com a decisão de considerar legal essa liquidação;
(R) Sendo que, e além disso, tais comentários se referem a Tratados celebrados para repartir a competência tributária entre Estados e nada acrescentam à boa interpretação e aplicação dos preceitos da legislação portuguesa em que se apoia a liquidação contestada;
(S) O que conduz à conclusão de que a decisão impugnada encerra uma "oposição dos fundamentos com a decisão", prevista nos termos do art.º28º, nº2, al. b) do RJAT, como fundamento de impugnação da decisão arbitral, devendo, por isso, ser declarada nula com esse fundamento;
(T) Por outro lado, e ainda que assim não fosse, em qualquer caso, considerando o Tribunal a quo que a improcedência do pedido da Impugnante resulta, não da procedência da fundamentação que a AT deu ao ato que praticou e que alegou até à exaustão nos autos arbitrais, de que o recebimento das ações do S........ configurava a obtenção de um dividendo, mas antes de um conceito amplo de proveitos ou ganhos tributáveis que compreende nomeadamente o recebimento e posterior alienação daquelas ações, que nunca foi alegado pelas partes, nem era de conhecimento oficioso, é forçoso concluir que o Tribunal a quo excedeu os seus poderes de apreciação;
(U) Acresce que ao recorrer a esta nova fundamentação, e ao mesmo tempo desconsiderando a fundamentação que foi dada pela AT ao ato contestado, o Tribunal a quo não só excede os seus poderes de apreciação, como se substitui à AT no seu dever de fundamentação, o que constituiu uma violação desse dever constitucionalmente consagrado, no art.º268º, nº3 da CRP e do princípio da separação de poderes, previsto nos art.ºs 2º e 111º da CRP;
(V) Pelo que se verifica uma "pronúncia indevida" por parte do Tribunal a quo, prevista nos termos do artº28º, nº2, al. c) parte inicial do RJAT, como fundamento de impugnação da decisão arbitral, devendo, por isso, a decisão impugnada ser declarada nula com esse fundamento;
(W) Cumulativamente, ao avançar com essa nova fundamentação para a liquidação contestada apenas na decisão impugnada, o Tribunal a quo não deu às partes, e em especial à Impugnante, a possibilidade de se pronunciar sobre essa questão de direito que, porque é a única que fundamenta a improcedência do seu pedido, é evidentemente essência para a boa decisão da causa;
(X) Pelo que, nessa medida, a decisão impugnada viola ainda o princípio do contraditório, o que constitui fundamento para a sua impugnação, nos termos do artº28º, nº2, al. d) do RJAT devendo, por isso, ser declarada nula com esse fundamento;
(Y) Por último, e também cumulativamente, ao não realizar qualquer apreciação relativa à verdadeira e própria fundamentação da liquidação contestada feita pela AT no momento da sua emissão e mantida em sede arbitral, ou seja, que o recebimento das ações do S........, no contexto de um aumento de capital por incorporação de reservas, constitui um dividendo, nos termos e para os efeitos do art.º20º, nº1, al. c) do Código do IRC, o Tribunal a quo deixou por apreciar a única questão que foi efetivamente submetida pelas partes à sua apreciação e que não podia ter deixado de julgar;
(Z) Assim como não podia ter deixado de conhecer (como fez) os vícios de inconstitucionalidade que a Impugnante assacou à interpretação feita pela AT do disposto no art.º 20.º, nº1, al. c) do Código do IRC Tribunal a quo e que consagra o conceito de dividendo no qual a AT fundamenta a liquidação contestada;
(AA) Pelo que o silêncio do Tribunal a quo quanto a essas duas questões configura uma "omissão de pronúncia" prevista nos termos do art.º28º, nº2, al. c) parte final do RJAT, como fundamento de impugnação da decisão arbitral, devendo, por isso, a decisão impugnada ser declarada nula com esse fundamento.

Termina, pedindo que deve a presente impugnação da decisão arbitral proferida no processo n.º 237/2016-T ser julgada integralmente procedente e,...

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