Acórdão nº 487/21.8T8VCT-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 07-12-2023
Data de Julgamento | 07 Dezembro 2023 |
Ano | 2023 |
Número Acordão | 487/21.8T8VCT-B.G1 |
Órgão | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães
I – Relatório:
AA veio propor processo de inventário para partilha da herança aberta por morte de seus pais, BB, falecida em .../.../2018, e CC, falecido em .../.../2019, identificando-se a si próprio e aos seus quatro irmãos como herdeiros de ambos: DD, DD, EE e FF.
Exerce funções de cabeça de casal o interessado DD.
O interessado DD veio reclamar da relação de bens apresentada – em 16/12/2021 – alegando que foi omitida a existência de dívida da herança a esse interessado, no valor de 19.924,48 euros, juntando prova documental, em língua francesa, e requerendo que se solicitassem informações ao Instituto da Segurança Social e que o interessado AA juntasse determinados documentos.
Tendo sido apresentada uma outra reclamação por parte da interessada FF, esta juntou prova documental relativa a essa reclamação, em articulado autónomo e decorridos cinco meses sobre a apresentação da reclamação, tendo a Mmª Juiz titular do processo proferido despacho a considerar extemporânea tal junção, nos termos do art.º 1105.º, n.º2, do C. P. Civil, não a admitindo e determinando o desentranhamento dos documentos.
Deste despacho foi interposto recurso de apelação – tramitado como apenso A dos autos principais.
Do Acórdão então proferido consta que:
“por via do disposto no art. 549º, nº 1 do C. P. Civil, à tramitação do inventário são aplicáveis as disposições da parte geral desse Código, bem como as regras do processo civil de declaração que se mostrem compatíveis com o processo de inventário judicial. Assim, é aplicável ao caso concreto, com as necessárias adaptações o disposto no nº 2 do art. 423º do mesmo Código.
O processo de inventário judicial não comporta uma fase de julgamento, pelo que o prazo previsto no mencionado art. 423º, nº 2 não pode ter como marco a audiência final. No entanto, nos casos em que, como no presente, em que o processo comporte uma fase instrutória (v. art. 1109º, nº 3 do C. P. Civil), com a designação de data para inquirição das testemunhas arroladas pelos interessados, a apresentação dos documentos deve ter como limite, não a apresentação do articulado respetivo, mas sim a data fixada para tal inquirição.
É certo que o novo regime do processo de inventário visa uma tramitação mais eficaz e mais célere dos processos, no entanto, o entendimento acima exposto em nada colide com o objetivo do novo modelo procedimental já que a observância do prazo previsto no art. 423º, nº 2, relativamente à data de inquirição de testemunhas, permitirá que a apresentação dos documentos ao abrigo desse preceito e as eventuais pronúncias sobre os mesmos, a apresentar pelos restantes interessados, ocorra antes da fase da partilha.
Deste modo, não obstante a indicação das provas dever ser feita com os requerimentos e respostas (v. art. 1105º, nº 2 do C. P. Civil), os documentos poderão ser apresentados até 20 dias antes da data em que se realize a inquirição de testemunhas, na fase instrutória do processo, caso o processo a comporte, mas a parte é condenada em multa, exceto se provar que os não pode oferecer com o articulado.
Deste modo, a junção dos documentos deve ser admitida, devendo apenas a Exmª Juiz verificar se é de aplicar ou não a multa prevista no mencionado art. 423º, nº2”.
Aquele despacho que recusou a junção de documentos por não terem sido apresentados com o articulado de reclamação foi, assim, revogado.
A esta reclamação à relação de bens apresentada pela interessada FF respondeu o interessado DD, em 26/05/2022, arrolando testemunhas, pedindo as suas declarações de parte e o depoimento de parte dos interessados FF, AA, EE e do cabeça de casal.
Em 14/06/2023 o interessado DD requereu a prestação de declarações de parte à matéria da sua reclamação à relação de bens, indicando os factos respetivos.
Indicou ainda a que factos da sua resposta à reclamação da interessa FF pretendia prestar declarações de parte.
Por despacho de 15/06/2023, a Mm.ª Juiz titular do processo indeferiu a pretensão formulada pelo interessado DD no sentido de prestar declarações à matéria da sua reclamação à relação de bens apresentada pelo cabeça de casal, considerando que tal não havia sido requerido no momento da apresentação da reclamação, entendendo que o requerimento formulado nesta fase era intempestivo, ao abrigo do disposto no art.º 1105.º, n.º 2, do C. P. Civil.
Perante este despacho, em 18/06/2023, o interessado DD formulou novo requerimento, invocando a jurisprudência do Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 30/03/2023, proferido no processo 215/21.8T8VVD-A.G1, concluindo assim que “não obstante o teor do despacho de 15.06.2023, por se entender ser tempestivo o pedido de prestação de declarações de parte do interessado DD, atento o agora supra explanado, requer-se a V. Exa. seja proferido novo despacho que admita as declarações de parte do interessado DD à matéria vertida nos artigos 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20 e 21 da sua reclamação”.
Sobre esta pretensão do interessado foi proferido despacho, em 19/06/2023, no decurso da diligência agendada para a produção de prova, nos seguintes termos:
“conforme o despacho proferido nos autos em 15-06-2023, as declarações de parte do interessado DD foram indeferidas nos termos e pelos fundamentos aí expostos, logo tal questão encontra-se decidida, esgotando-se o poder jurisdicional sob tal matéria, nada mais havendo a decidir.
Custas do incidente a cargo do interessado DD, por manifestamente infundado, que se fixam em 2 UC”.
Por último, no que interessa a estes autos de recurso, o interessado AA juntou em 16/06/2023 um conjunto de documentos em língua francesa, cuja junção havia sido requerida pelo interessado DD na sua reclamação à relação de bens.
No início da diligência de prova já referida, em 22/06/2023, sobre os documentos juntos em língua estrangeira, proferiu a Mmª Juiz titular o seguinte despacho:
“relativamente aos documentos juntos pelos interessados na língua francesa, determino que os respetivos apresentantes procedam à sua tradução, no prazo de 10 dias, sob pena de os mesmos não serem considerados”.
Posteriormente, não tendo o interessado AA procedido à tradução dos documentos que juntou a requerimento do interessado DD, determinou a Mmª Juiz a quo que a tradução fosse realizada pelo interessado que havia requerido a sua junção (despacho de 11/07/2023), acabando depois por, a pedido deste interessado DD, “suspender” os efeitos desse despacho até decisão deste recurso (e sem prejuízo de no parágrafo seguinte ter admitido o recurso com efeito meramente devolutivo – despacho de 21/09/2023).
Inconformado, o interessado DD veio colocar em crise os três despachos proferidos:
- aquele que não admitiu que prestasse declarações de parte à matéria que indicou da sua reclamação à relação de bens;
- aquele que indeferiu a reapreciação da questão e o condenou nas custas do incidente quando formulou pedido para que fosse reapreciada esta questão;
- aquele que determinou a tradução dos documentos que se encontravam em francês, que foram por si juntos e pelo interessado AA, mas cuja junção havia por si sido requerida.
Para tanto, formulou as seguintes conclusões:
“1. Vem o presente recurso:
a. do teor do despacho de 15.06.2023 que se pronunciou quanto ao requerimento apresentado interessado pelo DD (ref. página citius ...58), na parte em que indeferiu que o mesmo prestasse declarações de parte, por se considerar tal pedido intempestivo, ao abrigo do disposto no artigo 1105.º, n.º 2 do CPC;
b. do teor do despacho proferido em ata, no dia 19.06.2023 (ref. página citius ...41), na parte em que:
i. se pronunciou sobre o teor do requerimento do interessado DD de 18.06.2023 (ref. página citius ...59) e considerou que a questão da prestação de declarações de parte pelo mesmo já se encontrava decidida pelo despacho de 15.06.2023, estando esgotado o poder jurisdicional, nada mais havendo a decidir, bem como, condenou o referido interessado em custas do incidente, que se fixaram em 2 UC, por considerar-se o pedido manifestamente infundado;
ii. quanto aos documentos juntos pelo interessado AA na língua francesa, determinou que o apresentante procedesse à sua tradução, no prazo de 10 dias, sob pena de os mesmos não serem considerados.
2. Entende o recorrente que o Tribunal a quo não decidiu bem, tendo proferido decisões ilegais, cuja revogação e substituição por novas decisões se impõe.
A - Quanto ao teor dos despachos de 15.06.2023 e de 19.06.2023, que indeferiram as declarações de parte do recorrente, tendo o despacho de 19.06.2023 fixado custas a cargo do recorrente:
3. São os seguintes os despachos de que se recorre:
- Despacho de 15.06.2023 – referência ...27:
“(…) Na sua reclamação á relação de bens o interessado DD não requereu a prestação das suas declarações de parte a tal matéria, pelo que tal requerimento nesta fase é intempestivo ao abrigo do disposto no artigo 1105º, n.º 2, pelo que vai o mesmo indeferido.”
- Despacho de 19.06.2023, em ata – referência ...41:
“(…) Referência n.º ...59: conforme o despacho proferido nos autos em 15-06-2023, as declarações de parte do interessado DD foram indeferidas nos termos e pelos fundamentos aí expostos, logo tal questão encontra-se decidida, esgotando-se o poder jurisdicional sob tal matéria, nada mais havendo a decidir. Custas do incidente a cargo do interessado DD, por manifestamente infundado, que se fixam em 2 UC. Notifique.”
4. Considerando a data em que os presentes autos foram instaurados, 16.02.2021, aos mesmos é aplicável o regime da Lei 117/2019 de 13 de setembro.
5. Numa leitura literal do n.º 2 do artigo 1105.º do CPC, seriamos tentados a concluir, tal como fez o Tribunal a quo, que todas as provas teriam que ser requeridas nos articulados de oposição, impugnação e reclamação, e, nessa medida, estaria...
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