Acórdão nº 464/09.7TBVFX-C.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 24-02-2022

Data de Julgamento24 Fevereiro 2022
Ano2022
Número Acordão464/09.7TBVFX-C.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

I. RELATÓRIO
1. Em 27.01.2009 Banco Espírito Santo S.A. (atualmente Novo Banco, S.A.) instaurou ação de execução para pagamento de quantia certa contra António, Maria Helena e A.H.L. Imobiliária S.A..
O exequente apresentou como título executivo uma livrança no valor de € 1 721 162,32, subscrita pelos dois primeiros executados. O exequente nomeou à penhora dois imóveis, pertencentes à terceira executada, a qual foi demandada na execução nos termos do art.º 56.º n.º 2 do CPC de 1961 (art.º 54.º n.º 2 do CPC de 2013), pois havia constituído hipoteca sobre esses imóveis como garantia da referida dívida.
2. Em 29.4.2014 foram penhorados os referidos imóveis, a saber:
a) prédio rústico designado “S”, sito na freguesia de (…), concelho de Vila Franca de Xira, descrito na 2.ª CRP de VFX sob o n.º (…) e inscrito na matriz sob o artigo (…);
b) prédio misto descrito na 2.ª CRP de VFX sob o n.º (…) e inscrito na matriz, a parte rústica sob o artigo (…) e a parte urbana (moradia unifamiliar) sob o artigo (…).
3. Em 14.11.2016 a Sr.ª Agente de Execução (AE) decidiu vender os bens através de leilão eletrónico.
4. O leilão eletrónico teve início em 20.5.2017 e terminou em 28.6.2017.
5. Em 29.6.2017 foram abertas as propostas apresentadas, sendo a melhor proposta a do exequente, no valor de € 180 160,00, referente ao suprarreferido prédio misto, a qual foi aceite.
6. Em 29.6.2017 foi lavrado auto de encerramento do leilão quanto ao prédio rústico, tendo sido apresentada apenas uma proposta, pelo exequente, no valor de € 12 240,00, inferior ao valor mínimo fixado.
7. Em 29.6.2017 o prédio rústico foi inserido na plataforma de e-leilões por negociação particular, por 90 dias, com data de início em 29.6.2017 e fim das licitações em 27.9.2017.
8. Em 16.10.2017 foi proferido despacho de nomeação de administrador judicial provisório (AJP) em processo especial de revitalização requerido pela executada AHL – Imobiliária S.A.
9. O respetivo anúncio de nomeação do AJP, datado de 16.10.2017, foi junto aos autos de execução e foi notificado pelo tribunal à AE por ofício datado de 17.10.2017.
10. Em 23.10.2017 a AE emitiu título de transmissão, nos termos do n.º 2 do art.º 827.º do CPC, declarando que o prédio misto referido em 2. b) foi vendido - adjudicado ao exequente mediante leilão eletrónico, pela quantia de € 180 160,00, em 28.6.2017, tendo o exequente ficado dispensado do pagamento do preço nos termos do art.º 815.º n.º 1 e 541.º do CPC e isento do pagamento de IMT, atinente à referida adjudicação, nos termos do art.º 8.º n.º 1 do CIMT, tendo pago o respetivo imposto de selo.
11. Em 27.10.2017 a AE procedeu à venda, por escritura notarial, do prédio rústico referido em 2. a), pelo preço de € 45 000,00, a Jorge (…).
12. Os executados foram notificados da escritura referida em 11 por notificação datada de 30.10.2017.
13. Em 14.3.2018 o tribunal a quo proferiu sentença de verificação e graduação de créditos respeitante ao prédio misto suprarreferido em 2. b).
14. Em 12.4.2018 o tribunal a quo proferiu despacho em que declarou que por lapso não havia incluído na sentença de verificação e graduação de créditos o prédio rústico suprarreferido em 2. a) e que iria fazê-lo.
15. Em 23.4.2018 os executados apresentaram na execução o seguinte requerimento:
ANTÓNIO (…), MARIA HELENA (…) e AHL IMOBILIÁRIA, S.A., executados nos autos à margem identificados (os “Executados”), tendo sido notificados do douto despacho de 12 de abril de 2018, vêm aos autos requerer o seguinte:
1. O mandatário dos Executados foi notificado no dia 30 de outubro de 2017 da venda do prédio rústico, composto por terreno de cultura arvense, vinha, oliveiras e árvores de fruto, denominado “(S)”, situado em (…), freguesia de (…), concelho de Vila Franca de Xira, inscrito na matriz predial rústica sob o atual artigo (…) da secção (…) da União das Freguesias (…), que proveio do artigo (…), da secção (…), da freguesia de (…) (extinta), descrito na Segunda Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira sob o número (…), da freguesia de (…) (o “Prédio”) - penhorado nos autos -, efetuada no âmbito da presente execução.
2. Ora, a compra e venda do Prédio carece de eficácia, conforme de seguida se explica.
Da suspensão dos presentes autos por força do disposto no artigo 17.º - E, n.º 1 do CIRE e consequente ineficácia do contrato de compra e venda do Prédio
3. A Executada AHL IMOBILIÁRIA, S.A. foi objeto de um Plano Especial de Recuperação (“PER”), o qual foi aprovado pela maioria dos credores e homologado por douta sentença datada de 18.03.2018 (1 Esclarece-se que a douta sentença ainda não transitou em julgado, cfr. documento 1 – protesta juntar certidão).
4. A Executada apresentou-se a PER no dia 13 de outubro de 2017 e o PER foi liminarmente admitido e foi nomeado o Administrador Judicial Provisório (Sr. Dr. João Carvalho) por despacho do Tribunal datado de 16 de outubro de 2017, o que melhor se alcançará pela certidão que se protesta juntar.
Ora,
5. Nos termos do artigo 17.º - E, n.º 1 do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (“CIRE”):
1. “A decisão a que se refere o n.º 4 do artigo 17.º-C obsta à instauração de quaisquer ações para cobrança de dívidas contra a empresa e, durante todo o tempo em que perdurarem as negociações, suspende, quanto à empresa, as ações em curso com idêntica finalidade, extinguindo-se aquelas logo que seja aprovado e homologado plano de recuperação, salvo quando este preveja a sua continuação” (negrito e sublinhado nossos).
6. A decisão a que se refere o n.º 4 do artigo 17.º - C 2 consiste no despacho de nomeação do Administrador Judicial Provisório anteriormente invocado.
Acontece que,
7. A compra e venda do Prédio foi celebrada no dia 27 de outubro de 2017 (e não no dia 27 de setembro 2017, como por lapso refere o Credor Reclamante Novo Banco S.A. no requerimento por si apresentado no dia 3 de abril de 2018 no âmbito da reclamação de créditos processo 464/09.7TBVFX-B, apenso aos presentes autos de execução), conforme resulta da respetiva escritura pública de compra e venda junta aos autos pela Srª Agente de Execução.
8. Quer isto dizer que a compra e venda do Prédio – ato praticado, recorde-se, no âmbito do presente processo de execução – é celebrada numa altura em que o presente processo se encontrava já suspenso, já que 11 dias antes foi emitido no âmbito do PER despacho de nomeação do Administrador Judicial Provisório.
9. Facto para o qual o Sr. Dr. João Carvalho (Administrador Judicial Provisório nomeado no PER) tinha já advertido a Exma. Sra. Dra. (…), Agente de Execução nos presentes autos, por meio de e-mails enviados nos dias 6 de novembro de 2017 e 16 de novembro de 2017, respetivamente, cujas cópias se juntam como documento 2.
10. Desta forma, deverá considerar-se a celebração do contrato de compra e venda do Prédio como ineficaz, por violação do disposto no artigo 17.º - E, n.º 1 do CIRE e por, consequentemente, se tratar de um ato que vai contra o propósito do PER: a revitalização da sociedade, executada nos presentes autos.
11. A ineficácia absoluta do contrato de compra e venda do Prédio é definitiva, já que, conforme referido supra, o PER foi homologado por sentença judicial (cfr. documento 1 e certidão que se protesta juntar).
12. Apesar de a sentença não ter ainda transitado em julgado por força da interposição de recurso por credor que não viu o seu crédito reconhecido, a exponente e requerente está convicta que não existem fundamentos para que o Tribunal venha alterar a sua decisão de homologação do PER, para além de que, enquanto perdurar o PER, não podem ser praticados atos em processos executivos suspensos.
Nestes termos, e no mais de Direito que V. Ex. doutamente suprirá, deve ser declarada a ineficácia absoluta do contrato de compra e venda do Prédio”.
16. Em 23.11.2018 foi proferido o seguinte despacho:
Apesar da escritura de compra e venda ter sido formalizada em 27/10/2017, ou seja, já depois de proferido o despacho inicial no PER ao qual a sociedade executada se apresentou, a verdade é que o imóvel em causa foi vendido através de leilão eletrónico em 28/06/2017, ao exequente (o qual ficou por isso dispensado de depositar o preço). A data relevante não é a da escritura, mas a do encerramento do leilão, inexistindo, por isso, qualquer irregularidade, e indeferindo-se por conseguinte a pretensão da executada expressa no requerimento de 23/04/2018.
Notifique”.
17. Os executados apelaram daquele despacho, tendo apresentado alegações em que formularam as seguintes conclusões:
1. O Imóvel foi nomeado à penhora no âmbito do presente processo executivo, tendo sido requerida a sua adjudicação pelo Exequente Novo Banco após a promoção da sua venda por leilão eletrónico; contudo, o Imóvel não lhe foi adjudicado.
2. No dia 29 de junho de 2017, os Executados foram notificados pela AE do encerramento do leilão eletrónico e de que, a partir da data da notificação, o Imóvel tinha sido inserido na plataforma do e-leilões por negociação particular por noventa dias, com data de início em 29 de junho de 2017 e data de fim de licitações em 27 de setembro 2017.
3. A Executada AHL IMOBILIÁRIA apresentou-se a processo especial de revitalização (PER), tendo sido emitido no âmbito do PER, no dia 16 de outubro de 2017, despacho de nomeação do AJP.
4. Por notificação da AE datada de 30 de outubro de 2017, os Executados foram informados da celebração com Jorge (…), no dia 27 de outubro de 2017, de escritura pública de compra e venda do Imóvel.
5. Assim, a compra e venda do Imóvel carece de eficácia, já que o ato de transmissão da propriedade do Imóvel se dá em momento em que a execução já se encontrava suspensa, por força da conjugação do disposto nos artigos 17.º - C, n.º 4 e 17.º - E, n.º 1 do CIRE, de onde resulta que após a
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