Acórdão nº 4577/23.4T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 23-11-2023
Data de Julgamento | 23 Novembro 2023 |
Ano | 2023 |
Número Acordão | 4577/23.4T8VNF-A.G1 |
Órgão | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores da 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães no seguinte:
I- RELATÓRIO
AA, residente na Rua ..., ..., Guimarães, BB, residente na Rua ..., ..., ..., ..., e CC, residente na Rua ..., ..., por si e em representação do Conselho Fiscal de EMP01... – Cooperativa de Ensino, CRL, dos quais são Presidente e Vogais, respetivamente, instauraram a presente providência cautelar especificada de suspensão de deliberações sociais, contra EMP01..., CRL, com sede na Rua ..., ..., ..., pedindo que se:
a- declarasse a nulidade das deliberações que elegeram o Conselho de Administração, o Conselho Fiscal e a Mesa da Assembleia Geral da Requerida ou, pelo menos, a sua anulabilidade;
b- ordenasse a suspensão da execução das deliberações que elegeram o Conselho de Administração, o Conselho Fiscal e a Mesa da Assembleia Geral da Requerida;
c- ordenasse que a Requerida se abstivesse de proceder ao registo dos novos órgãos sociais ilegalmente eleitos junto do Registo Nacional de Pessoas Coletivas;
d- ordenasse que os novos órgãos socais ilegalmente eleitos têm as suas funções suspensas; e
e- decretasse a inversão do contencioso.
Para tanto alegaram, em síntese, que a Requerida é uma cooperativa de ensino, sem fim lucrativo, com um capital social de 2.500,00 euros, classificando-se, quanto ao objeto, como cooperativa polivalente e, quanto aos seus membros, como cooperativa de prestação de serviços, em que a manutenção da qualidade de cooperante se encontra obrigatoriamente dependente de contribuição para aquela de capital e trabalho.
Em 05/07/2023 decorreu a sessão extraordinária da Assembleia Geral da Requerida, cuja ordem de trabalhos foi a eleição para os órgãos sociais e Mesa da Assembleia Geral.
Na aludida Assembleia Geral concorrerem cinco listas às eleições dos órgãos sociais da Requerida e como resultado da votação obtiveram vencimentos a lista B para o Conselho de Administração, a lista A para o Conselho Fiscal e a lista D para a Mesa da Assembleia Geral.
Ocorre que, entre 2016 e 2023, trinta e um membros da Requerida cessaram os seus contratos de trabalho cooperativo e, em consequência, deixaram de lhe prestar qualquer serviço ou funções, pelo que perderam a sua qualidade de cooperantes.
Não obstante, esses ex-membros continuaram a figurar na lista de membros da cooperativa Requerida e parte dos mesmos (que identificam) estiveram presentes na Assembleia Geral que teve lugar em 05/07/2023, onde foram admitidos a participarem nessa assembleia e de nela votarem, apesar do 1º Requerente, na qualidade de Presidente do Conselho Fiscal, ter apresentado requerimento, também subscrito pela cooperante DD, requerendo que aqueles fossem excluídos da participação na assembleia e de exercerem o direito de voto.
Acresce que os elementos que identificam, apesar de já não deterem a qualidade de cooperantes da Requerida, concorreram nas listas (que igualmente identificam) e foram autorizados pelo Presidente do Conselho Fiscal e pelo Presidente da Assembleia Geral a permanecerem nas listas a sufrágio e a votarem, isto apesar do 1º Requerente ter apresentado requerimento, também subscrito pela cooperante DD, na dita Assembleia Geral, requerendo que aqueles ex-membros fossem excluídos das listas submetidas a sufrágio.
Em 06/07/2023, o 1º Requerente, na qualidade de Presidente do Conselho Fiscal, apresentou requerimento impugnando o resultado das eleições e, no dia 10/07/2023, os vogais do Conselho Fiscal, aqui Requerentes, usando da prerrogativa do art. 59º, n.º 6, do CSC, fizeram consignar perante notário que não votaram naquela Assembleia Geral no sentido que obteve vencimento.
Perante o supra exposto, as deliberações da Assembleia Geral de 05/07/2023, que elegeu o Conselho de Administração, o Conselho Fiscal e a Mesa da Assembleia Geral da Requerida estão feridas de nulidade ou, pelo menos, de anulabilidade.
Mais alegaram que a execução das mencionadas deliberações é suscetível de causar dano apreciável à Requerida, porquanto, tomando posse os órgãos sociais ilegalmente eleitos e sendo efetuado o respetivo registo, esses órgãos apresentar-se-ão perante terceiros como representantes legítimos da Requerida, podendo-a vincular, nomeadamente, em negócios, contratos, financiamentos, movimentação de contas e celebrando novos contratos e negociando a alteração de outros já celebrados e de financiamentos já existentes, gerando obrigações para aquela, o que, por si só, é suscetível de lhe causar dano de natureza patrimonial, laboral e reputacional, que podem pôr em causa a viabilidade económica e financeira desta, além de que a execução dessas deliberações contribuirá para a insegurança de todos os cooperadores no que diz respeito à legalidade dos procedimentos internos.
Ao invés, do decretamento da suspensão daquelas deliberações não decorrerá qualquer prejuízo para a Requerida, que continuará a funcionar normalmente, desenvolvendo regularmente a sua atividade até à realização de novo ato eletivo dos seus órgãos sociais.
Por despacho de 12/07/2023 deferiu-se a citação urgente da Requerida.
Por requerimento entrado em juízo em 24/07/2021, EE e FF, intitulando-se membros/cooperadores da Requerida EMP01..., CRL, requereram que fosse nomeada à última um representante especial, em substituição do seu Conselho de Administração, para os fins impostos pela presente providência cautelar, nomeadamente, para ser deduzida oposição.
Como fundamento desta pretensão alegaram, em suma, terem sido candidatos das listas declaradas vencedoras na Assembleia Geral de 05/07/2023, o primeiro enquanto Presidente do Conselho de Administração, e o segundo como Presidente do Conselho Fiscal.
Os requerentes tomaram conhecimento, através do Presidente da Assembleia Geral ainda em exercício, Dr. GG, da pendência da presente providência cautelar e que, em consequência, os titulares dos órgãos sociais eleitos na referida Assembleia Geral de 05/07/2023, já não podiam ser investidos nos respetivos cargos, na sequência do que, o Presidente da Mesa da Assembleia Geral ainda em exercício questionou o Conselho de Administração sobre a posição deste perante o presente procedimento cautelar e se iria ser deduzida oposição, obtendo por resposta que: “a ponderação da estratégia a adotar relativamente à providência incumbe ao Conselho de Administração” e que tal “ponderação será efetuada tendo em vista a defesa dos interesses da EMP01...”.
Acontece que o Conselho de Administração ainda em exercício está em claro conflito de interesses com os reais interesses da cooperativa, isto porque o atual Conselho de Administração e o Conselho Fiscal, de que fazem parte os Requerentes do presente procedimento cautelar, representam apenas os seus próprios interesses e os de um pequeno grupo que, ao longo de décadas, têm dominado e gerido a cooperativa Requerida ao sabor de interesses particulares e ao arrepio dos interesses desta e das normas e princípios cooperativos.
Há já muitos anos que a cooperativa Requerida vem sendo gerida como se de uma sociedade comercial se tratasse, participando em sociedades comerciais, cujo escopo é o lucro, que nada aproveitam à própria cooperativa Requerida, mas apenas ao pequeno núcleo de membros que a dominam.
Chegou ao ponto de a cooperativa Requerida participar, com elevada percentagem de capital, na sociedade comercial Colégio ..., que é concorrente com a sua própria atividade.
Criou a sociedade anónima EMP02..., para a qual foram transferidos todos os meios de transportes da cooperativa Requerida, destinados a transportar alunos, e que agora também se dedica a fazer transportes para fora.
Um simples olhar pelos titulares dos órgãos sociais da cooperativa Requerida ao longo dos anos, incluindo a Direção Pedagógica, demonstra que um pequeno número de cooperadores, diretamente ou por intermédio de pessoas escolhidas por aqueles, têm dominado a cooperativa Requerida.
A Mesa da Assembleia Geral em exercício é a única exceção ao referido domínio de décadas e foi sempre um obstáculo para aqueles.
O Conselho de Administração e o Conselho Fiscal saído das eleições de 05/07/2023 são compostos por membros não afetos ao dito pequeno grupo que tem dominado a cooperativa Requerida.
Os titulares da lista que veio a ser eleita para o Conselho de Administração, antes do ato eleitoral, deram a conhecer que, caso fossem eleitos, iriam promover uma auditoria à gestão anterior, já que têm fundadas razões para entender que essa gestão tem sido feita em prejuízo da cooperativa Requerida, em violação do Código Cooperativo e dos princípios cooperativos, e que dessa auditoria seriam retiradas todas as consequências, incluindo, responsabilidades.
Os requerentes receiam que não seja deduzida oposição à presente providência cautelar ou que não seja deduzida uma verdadeira oposição.
O conflito de interesses decorre ainda do facto de um membro efetivo do Conselho de Administração atual, HH, e dois suplentes, II e JJ, terem concorrido às eleições, em lista que foi vencida.
Mais alegaram que os fundamentos invocados pelos Requerentes da presente providência cautelar carecem de fundamento, pelas razões que enunciam e, bem assim, que os Requerentes atuam em abuso de direito, uma vez que basta analisar as atas das Assembleias Gerais da cooperativa Requerida relativas aos últimos seis anos e as respetivas listas de presenças, para se constar que os membros sem prestação de trabalho continuaram a participar nessas Assembleias Gerais e a votar nas questões que foram submetidas a votação nessas assembleias, incluindo os elementos que os Requerentes identificam na petição inicial e que alegam já não deterem a qualidade de cooperantes da Requerida, sem que tal merecesse qualquer reparo de quem quer que fosse, incluindo dos Requerentes da presente providência cautelar.
Sugerem que seja nomeado como representante especial...
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