Acórdão nº 4476/22.7T8STB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 02-03-2023

Data de Julgamento02 Março 2023
Ano2023
Número Acordão4476/22.7T8STB.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 4476/22.7T8STB.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal[1]

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Acordam, na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – RELATÓRIO
1. J..., SA, instaurou o presente procedimento cautelar comum contra a COMPANHIA DE SEGUROS ALLIANZ PORTUGAL, S.A., pedindo que:
a) a requerida seja condenada a fornecer-lhe camião de substituição até decisão final da ação principal;
b) em alternativa, seja condenada no pagamento de todas as faturas vincendas referentes ao aluguer do camião de substituição até decisão da ação principal.
Em fundamento da sua pretensão, a Requerente alegou, em síntese, que é dona e legítima proprietária do veículo pesado de mercadorias de marca “Volvo”, com a matrícula ..-CO-.., que
utiliza no âmbito da sua atividade comercial e industrial de exploração de pedreiras, fabrico e comercialização de massas betuminosas, execução de obras públicas e particulares, nomeadamente, para realizar transportes de inertes e massas, veículo que, no dia 8 de março de 2022, sofreu uma colisão frontal originada única e exclusivamente pelo facto de o veículo com a matrícula ..-GS-.., segurado pela requerida, ter inopinadamente invadido a faixa de rodagem contrária, na qual circulava o veículo da Requerente, e onde se verificou o embate.
Em consequência do embate, o condutor do veículo segurado da requerida morreu no local, e o veículo propriedade da requerente ficou severamente danificado e foi rebocado para a “Auto Sueco, Ld.ª” em Setúbal.
Participado o sinistro à requerida, a mesma procedeu a peritagem ao veículo da requerente, que durou mais de um mês, sendo que, no dia 20 de abril de 2022, a requerente recebeu e-mail da requerida, informando que a peritagem estava concluída, mas que ainda iria proceder à análise de “todos os elementos” para definir a sua posição sobre o sinistro, mais informando que a requerente poderia proceder, desde logo, à reparação por sua conta.
Ante esta posição, a requerente aguardou as conclusões da requerida, no sentido de assumir a responsabilidade, dado que o sinistro se deveu exclusivamente à conduta do condutor do GS.
Perante o silêncio da requerida, a requerente, no dia 12 de maio de 2022, mandou e-mail à requerida, alertando para o prejuízo diário causado pela paralisação do veículo e para a necessidade de resolução célere, isto porque, a sua falta determina quebra de faturação da requerente, e provoca-lhe dificuldades logísticas, pois toda a sua atividade se tramita com prazos contratualmente estipulados, tendo a requerida, no dia 18 de maio, via e-mail, respondido que “Face à morte do nosso condutor ainda não nos foi possível ultimar diligências. Assim, reforçamos informação já prestada na data acima de 13-04-2022 de que lamentamos informar que declinamos a responsabilidade no presente sinistro, sendo que nos disponibilizamos para analisar eventuais elementos de prova que possuam de suporte à v/versão, podendo vir a alterar esta posição caso nos seja feita prova inequívoca de suporte.”.
Tal posição por parte da requerida é inaceitável, porquanto estão reunidos todos os elementos probatórios relativos às circunstâncias em que ocorreu o sinistro, nomeadamente o facto de o embate ter ocorrido na faixa de rodagem onde circulava o veículo da requerente, e de onde resulta que o veículo segurado pela requerida se encontrava em contramão, motivo pelo qual será este o culpado do embate.
Atualmente o camião permanece na oficina para reparação. A requerente pediu orçamento da reparação, que monta a € 58.766,28.
O CO realizava cerca de 5 fretes diários, correspondentes a um valor de faturação diária de cerca de € 650,00. Por forma a pontualmente cumprir os compromissos comerciais assumidos perante os seus clientes, a requerente, em 20 de abril 2022, em face da inércia da requerida - ainda que invetivada - viu-se obrigada a contratar o aluguer de outro veículo com as mesmas características do CO, encontrando-se a pagar a quantia de € 590,00 por dia.
A responsabilidade da requerida pelos danos é pacífica, atendendo ao circunstancialismo em que ocorreu o acidente: o veículo segurado pela requerida entrou em contramão, embatendo no veículo da requerente, na faixa onde este circulava.
Volvidos mais de 3 meses sobre a data do sinistro, a requerida nada decide, nada diz e nada faz, assistindo impávida aos crescentes prejuízos diários sofridos pela requerente.
A atitude inerte da requerida é incompreensível e ilegal.
A requerente não pode continuar a suportar o valor do aluguer, quando tem o camião parado na oficina para reparação à espera que a requerida se defina.
Independentemente da composição definitiva do litígio, os prejuízos sofridos pela requerente carecem de tutela cautelar urgente, na estrita medida em que esta não tem capacidade para continuar a suportar ad eternum os prejuízos cujo ressarcimento cabe à requerida.
Juntou documentos e arrolou testemunhas.

2. Citada, a requerida deduziu oposição, invocando que não existe o direito da requerente, uma vez que ainda não foi apurada a responsabilidade na produção do acidente dos autos, encontrando-se em curso o inquérito n.º 151/22.0GASSB relativo a processo crime de homicídio por negligência, não tendo sido fornecido o auto de ocorrência completo, nem croqui do acidente, pelo que se desconhecem as circunstâncias concretas em que o mesmo ocorreu, daí que não seja possível aferir da responsabilidade da requerida, que só se verificará se a requerente provar que o condutor do veículo ligeiro foi o responsável pela produção do acidente dos autos, o que não poderá ocorrer nesta sede; acresce que, após a peritagem, atento o valor estimado da reparação dos danos, constatou a requerida uma situação de perda total do pesado, uma vez que se apurou que o valor estimado para a reparação dos danos sofridos pelo pesado, adicionado o valor do salvado, ultrapassa 120% do valor venal do veículo, sendo que em caso de perda total não há fundamento para ser facultado veículo de substituição, mais referindo que a requerente não especificou os seus prejuízos. Conclui pelo indeferimento do presente procedimento cautelar por não se encontrarem preenchidos os respetivos pressupostos.

3. Em 01.08.2022 foi proferido despacho, determinando que se oficiasse ao DIAP de Sesimbra, solicitando que informasse o estado do inquérito n.º 151/22.0GASSB, e fosse enviada a estes autos cópia do croquis do acidente e ainda do relatório elaborado pelo NICAV de Setúbal, tendo sido junto aos autos somente o croqui do acidente e prestada informação de que a investigação ainda não se encontrava concluída, aguardando-se o relatório da autópsia, para a sua conclusão.

4. Em 14.09.2022, foi proferido despacho determinando a notificação da requerente para que fosse clarificada nos autos a matéria de facto alegada quanto ao periculum in mora e concretizada a matéria factual relativa aos prejuízos, tendo a Requerente respondido, explicando mais circunstanciadamente a sua atividade e que, por não ter o camião disponível e para não sofrer as consequências decorrentes de incumprimentos dos prazos de entrega contratualizados com os seus clientes, foi obrigada a recorrer a uma empresa transportadora terceira para realizar os fretes, que teriam sido feitos pelo veículo acidentado, pagando a essa empresa, por conta das toneladas transportadas, tendo suportado em 10 dias do mês de abril a quantia de 4.021,52€ e no mês de maio, a quantia de 14.066,26€, daí o valor diário que indicou, porque 593,88€ correspondente à média do valor dos fretes. Juntou documentos.
Mais invocou que o crescimento do valor do prejuízo decorrente do sinistro é exponencial, sendo aquele valor, que suporta, acrescido do valor do parqueamento na oficina, há mais de 6 meses, de valor diário ainda desconhecido.
Finalmente, refere que tem sensibilizado a Requerida para todas estas questões, e nomeadamente para todos os factos relevantes para apuramento da respetiva responsabilidade, como ainda da necessidade de evitar danos futuros, não podendo a Requerente continuar a suportar este custo por muito mais tempo.

5. Foi novamente proferido despacho, solicitando o envio aos autos do relatório elaborado pelo NICAV de Setúbal, caso já se encontrasse concluído.

6. Recebida resposta negativa, foi proferida decisão, onde se consignou “cumpre apreciar liminarmente”, e terminou com o seguinte segmento dispositivo:
«julga-se não se mostrarem verificados os requisitos de que a lei faz depender a eventual procedência da providência intentada, pelo que se indefere liminarmente a presente providência».

7. Inconformada, a Requerente interpôs o presente recurso de apelação, que terminou
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