Acórdão nº 444/17.9T8ALB.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão444/17.9T8ALB.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação nº 444/17.9T8ALB.P1
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro
Juízo de Competência Genérica de Albergaria-a-Velha
Relator: Carlos Portela
Adjuntos: António Paulo Vasconcelos
Filipe Caroço

Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório
AA e BB, residentes na Rua ..., ..., ... Albergaria-a-Velha, intentaram a presente acção declarativa com processo comum contra CC e DD, residentes na ... ..., peticionando, em súmula, se proceda à demarcação entre o prédio rústico de que são proprietários (inscrito na respectiva matriz sob o art.º ...) e o prédio rústico pertencente aos RR. (inscrito na matriz sob o art.º ...), com aquele confinante, sendo o dos Autores com a área de 1984 m2 e o dos Réus com a área de 9416 m2.
Regularmente citados, os Réus deduziram contestação, na qual, em síntese, reconhecendo que os prédios em questão são confinantes, impugnaram a generalidade da factualidade alegada pelos Autores, designadamente no que concerne à área do seu prédio, que dizem ser de 11.589 m2, pelo que a delimitação entre os prédios das partes será diversa da alegada pelos Autores.
Pugnaram, assim, pela improcedência da acção.
Foi realizada a audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho onde se saneou o processo, se definiu o objecto do litígio, se dispensou a fixação dos temas de prova e se apreciaram os meios de prova apresentados pelas partes.
Foi determinada a realização de perícia sobre a matéria em apreço nos autos, a qual foi levada a cabo pelo perito nomeado, cujo relatório e subsequentes esclarecimentos constam dos autos sob as referências ..., ..., ..., ... e ....
Realizou-se a audiência de julgamento com observância de todas as formalidades legais, no culminar da qual foi proferida sentença onde se decidiu do seguinte modo:
Julgou-se a presente acção parcialmente procedente, por provada em parte, e, em consequência, decidiu-se:
a) Declarar que os AA. AA e BB são legítimos proprietários do prédio rústico sito em ..., Albergaria-a- Velha, inscrito na matriz predial sob o art.º ... e descrito na CRP de Albergaria-a-Velha sob o nº ...;
b) Declarar que aquele prédio confina pelo lado nascente com o prédio rústico sito em ..., Albergaria-a-Velha, inscrito na matriz sob o art.º ..., pertencente aos RR. CC e DD;
c) Determinar que a demarcação entre esses prédios se faça através dos marcos indicados no desenho topográfico sob a ref.ª ... com os dizeres “Marco a colocar aceite por A. e Réu” e “Marco a colocar aceite pelo A.”, inserindo- se no prédio dos AA. a parcela de 567,86 m2 ali mencionada;
d) Condenar A. e RR. a respeitar tal delimitação;
e) Condenar A. e RR. nas custas do processo, na proporção de 1/3 e 2/3, respectivamente (art.º 527º, 1 e 2, CPC).
*
Inconformados com a decisão proferida dela vieram interpor recurso os Autores e os Réus, apresentando cada um deles as suas respectivas alegações.
Não foram apresentadas contra alegações.
Foi proferido despacho onde se consideraram os recursos tempestivos e legais e se admitiram os mesmos como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Recebido o processo nesta Relação, foi emitido despacho que teve os recursos como próprios, tempestivamente interpostos e admitidos com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II. Enquadramento de facto e de direito:
Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais da Lei nº41/2013 de 26 de Junho.
É consabido que o objecto do presente recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pelos apelantes nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).
E é o seguinte o teor dessas mesmas conclusões:
No recurso dos Réus:
1. Os depoimentos das testemunhas EE (as declarações encontram-se gravadas, através do sistema digital conforme ata da audiência de Julgamento de 16/09/2021, com início às 11:17:10 a 11:34:06), FF (as declarações encontram-se gravadas, através do sistema digital conforme ata da audiência de Julgamento de 16/09/2021, com início às 11:35:07 a 11:48:34), GG (as declarações encontram-se gravadas, através do sistema digital conforme ata da audiência de Julgamento de 16/09/2021, com início às 15:04:13 a 15:12:39) e HH (as declarações encontram-se gravadas, através do sistema digital conforme ata da audiência de Julgamento de 16/09/2021, com início às 15:15:02 a 15:46:22), cuja credibilidade (de nenhuma destas testemunhas) não foi posta em causa pelo Tribunal “a quo”, demonstram que as alíneas b) e c) dos factos não provados encontram-se mal julgadas.
2. A testemunha EE, arrolada pelos Autores e primo dos mesmos, referiu, no seu depoimento que o Réu CC catrapilou o terreno em discussão nos autos, colocou galinhaço (estrume), cortou árvores por mais que uma vez e anda na posse do terreno em causa há mais de vinte anos. Recorda-se que há mais de 20 anos o Réu tomou parte do terreno que era da Tia II (posteriormente passou para os Autores) e a partir de então anda na posse do mesmo (ver minutos 10:26 a 10:48; 12:53 a 13:35; 14:21 a 15:38; 15:55 a 16:46).
3. A testemunha FF, arrolada pelos Autores e filho dos mesmos, esclareceu que o terreno que os pais (aqui Autores) compraram a uma prima do Autor, que está no Brasil, andava na posse do Réu CC, o qual a catrapilou e cortou árvores (minutos 09:47 a 10:48; minutos 11:55 aos minutos 12:33).
4. A testemunha GG, a qual é genro dos Réus, esclareceu que conhece o prédio dos sogros há mais de vinte anos, que ali plantou eucaliptos e regou os mesmos e nunca foi chamado à atenção por quem quer que seja. Acrescenta que o terreno dos Réus terá à volta de um hectare (minutos 01:06 a 04:39).
5. A testemunha HH, filhos dos Réus e com conhecimento directo do local dos factos, explicou que conhece o terreno dos pais por “...”, o qual foi adquirido por aqueles, por compra e venda, há mais de 25 anos, tendo cerca de 1 hectare de área. Explicou que, após a compra, os seus pais cortaram os pinheiros e eucaliptos grossos que ali existiam, lavraram através do Sr. JJ e depois plantaram eucaliptos, não tendo dúvidas de que havia marcos a separar o prédio dos Autores do dos Réus e estes plantaram os eucaliptos antes cerca de 1 metro de distância dos marcos, como é habitual (minutos 00:58 a 20:23).
6. A testemunha explicou ainda que, desde a compra, os Réus limpavam os matos, estrumavam, punham galinhaço e tratavam do terreno, confirmando os cortes de madeira nesse prédio (o primeiro há cerca de 25 anos, aquando da compra do terreno, e o segundo passados 12 anos da primeira plantação feita pelos Réus) [minutos 00:58 a 20:23].
7. Esta testemunha explica a diferença entre as madeiras do terreno dos AA e a dos RR (aquela era mais fraca e fina, menos tratada do que a madeira do terreno destes) [minutos 00:58 a 20:23].
8. A testemunha HH confirma que a empresa de compra e venda de madeira dos Réus comprou, por duas vezes, madeira aos Autores – a primeira há cerca de 8/10 anos atrás e a última em 2019/2020 (minutos 00:58 a 20:23).
9. Decorre ainda do depoimento da mesma que há alguns anos atrás as partes (Autores e Réus e mandatários) foram ao local mediram à fita o prédio dos Réus e colocaram um pau/estaca à beira do caminho (foto nº. 1 junta ao auto de inspecção ao local de 26 de Maio de 2021), o qual alinha com os marcos em pedra que estão mais acima (e aliás foram reconhecidos/confirmados por ambas as partes e constam no levantamento topográfico com a referência ..., de 29/11/2019). Este pau/estaca delimita à beira do caminho o prédio dos AA. e dos RR. E colocaram uma outra estaca no L (minutos 22:30 aos minutos 23:08 e 23:40 aos minutos 29:47).
10. Em face de toda a prova testemunhal produzida e do facto 8 dado como provado, deve esta douta Relação (face aos poderes que goza de reapreciação da matéria de facto), nos termos da al. c), do n.º 1, do art.º 640.º do CPC, alterar a decisão de facto, passando a dar como provado o seguinte:
- A área efectiva e real do prédio indicado em 4) é de pelo menos 1 hectare (isto é, 10.000m2).
- Desde há 10, 15, 20 e mais anos, os Réus sempre tiveram por certa tal área (10.000m2) como o limite do seu prédio, que sempre respeitaram, dele fruindo nessa extensão sem que os AA. ou quem quer que fosse se opussem.
11. O Tribunal “a quo” erra ao centrar a sua atenção nas áreas previstas nas certidões prediais e matriciais referentes ao art.º ... e ao art.º ..., esquecendo-se que no caso em apreço a linha divisória tem de ser fixada mediante os actos de posse dos RR, alegados e provados (quer com a prova indicada pelos Autores, quer com a prova indicada pelos Réus).
12. O Tribunal teve a oportunidade de confirmar no local que até ao pau/estaca existente à beira do caminho (foto nº1 junta ao auto de inspecção ao local de 26 de Maio de 2021), o qual alinha com os marcos em pedra que estão mais acima (reconhecidos/confirmados por ambas as partes e constam no levantamento topográfico com a referência ..., de 29/11/2019), a vegetação é diferente daquela que se encontra no prédio dos AA (facto 8 dado como provado) (a partir desse dito pau), tendo as testemunhas, de AA e RR, relatado os actos de posse destes até esse pau.
13. O tribunal não só não atendeu à factualidade que observou no local (e que decorre das fotografias juntas ao auto de inspecção de 26/05/2021), como não levou em consideração o facto desse pau se encontrar no alinhamento dos marcos em pedra que estão mais acima, e ainda à prova testemunhal produzida.
14. O raciocínio do Tribunal “a quo”, segundo o qual «se a parcela em litígio for incluída no prédio dos RR., este passará a totalizar a área de 10.342 m2, ou seja, perto de 2.000 m2 a mais do que se mostra inserto no seu título», não tem qualquer relevância para a boa decisão da causa, já
...

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