Acórdão nº 4399/20.4T8ALM-A.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-11-22

Data de Julgamento22 Novembro 2022
Ano2022
Número Acordão4399/20.4T8ALM-A.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I- Relatório:
A, B e C, vieram, em 23.4.2021, deduzir embargos à execução para pagamento de quantia certa que, em 21.8.2020, contra si foi movida por D, e a que foi atribuído o valor de €64.146,25.
Alegam, no essencial, que não havia incumprimento quando foi instaurada a execução, estando então em vigor acordo, primeiro no âmbito de processo de insolvência, e depois no âmbito da reestruturação extrajudicial da dívida, celebrado entre os executados e a Caixa Geral de Depósitos, S.A., para reembolso do mútuo entre eles contratado, sendo que a cessionária do crédito, aqui exequente, não aceitou o referido acordo. Dizem, ainda, que não lhes foi devidamente comunicada a cessão do crédito, nem foram interpelados para pagar a totalidade da dívida que não é a indicada, e que os juros estão prescritos até 5 anos antes da apresentação do requerimento executivo. Pedem a extinção da execução.
Admitidos os embargos, contestou a exequente, impugnando a factualidade alegada e pedindo a improcedência da oposição, com o prosseguimento da execução.
Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador que conferiu a validade formal da instância, identificou o objeto do litígio e enunciou os temas da prova.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, em 11.4.2022, proferida sentença, nos seguintes termos: “(...) Julgo os embargos à execução procedentes por provados e, em consequência, declaro que:
- o valor do capital em dívida emergente do empréstimo em causa é de 36.790,80 euros;
- os juros de mora vencidos até ao dia 26 de Agosto de 2015 estão prescritos e os juros de mora em dívida são os vencidos entre 27 de Agosto de 2015 e Novembro de 2015;
- a mutuária CGD, S.A. e os mutuantes embargantes celebraram acordo (tácito) de pagamento daquele valor do capital em dívida e juros vencidos (entre 27 de Agosto de 2015 e Novembro de 2015), em prestações mensais de 190 euros, em Novembro de 2015, oponível à embargada;
- tal acordo foi, ilegitimamente, recusado pela embargada, está em curso e a obrigação exequenda é inexigível;
- a acção executiva é extinta.
Condeno a embargada no pagamento das custas da instância, por vencida - art.º 527.º, n.ºs. 1 e 2, do CPC.(…).”
Inconformada, recorreu a embargada/exequente, culminando as alegações por si apresentadas com as seguintes conclusões que se transcrevem:

1- O Tribunal a quo julgou procedentes os embargos com consequente absolvição dos executados da instância executiva;
2- Fundamenta a decisão por entender que os juros de mora vencidos até ao dia 26 de agosto de 2015 estão prescritos e os juros de mora em dívida são os vencidos entre 27 de agosto de 2015 e novembro de 2015;
3- Entendeu também que, a mutuária CGD, S.A. e os mutuantes embargantes celebraram acordo (tácito) de pagamento daquele valor do capital em dívida e juros vencidos, em prestações mensais de €190,00;
4- Acordo este que entendeu ter sido recusado pela ora Recorrente, estando ainda em curso, e, por isso, decidiu pela inexigibilidade da obrigação exequenda;
5- O Tribunal a quo julgou procedente, para todos os efeitos, a Oposição à Execução por Embargos de Executado com fundamento na inexistência da obrigação exequenda, concluindo assim pela extinção da ação executiva;
6- O Contrato de mútuo foi celebrado no dia 04 de agosto de 1998, entre a CGD, S.A., na qualidade de mutuante, e A e B, na qualidade de mutuários, e C, na qualidade de fiadora, pela qual a primeira emprestou aos segundos o montante de 13.600.000$00 (€67.838,51);
7- Tendo os mutuários deixado de pagar as prestações de reembolso convencionadas no contrato, em 04-10-2011;
8- Nos termos do disposto nos artigos 577.º e ss do C.C. a CGD, S.A. cedeu os seus créditos à ora Recorrente, tendo, por isso, nos termos do disposto do artigo 583.º do C.C. remetido aos executados uma carta com a informação de que tinha sido celebrado o contrato de cessão de créditos;
9- Ainda que, não tivessem sido notificados da cessão de créditos, foram judicialmente notificados da mesma por via da citação para a presente ação executiva;
10- Em virtude do incumprimento do contrato, as demais prestações se venceram na sua totalidade, de acordo com o artigo 781º do C.C, onde consta o seguinte: “Se a obrigação puder ser liquidada em duas ou mais prestações, a falta de realização de uma delas importa o vencimento de todas”;
11- A qualificação jurídica de tais prestações, enquadra-se no conceito de “quotas de amortização do capital” para capital e juros, sujeitos aos prazos de prescrição de 20 anos para o capital, conforme o disposto no artigo 309.º do C.C;
12- Os juros de mora vencidos até ao dia 26 de agosto de 2015, aquando da propositura da primeira ação executiva, não prescreveram;
13- No âmbito do processo de insolvência n.º 4118/11.6TBALM-B, que correu termos no 1.º Juízo Cível do Tribunal de Almada e depois no Tribunal do Barreiro, Instância Central, no Juiz 3 da 2.º Secção do Comércio, foi aprovado e homologado um plano de pagamentos;
14- No entanto, o referido acordo de pagamentos não foi cumprido;
15- Os pagamentos dos valores mensais de €150,00 e de € 90,00 terão ocorrido desde junho de 2015 a maio de 2020 a título voluntário, não tendo sido suficiente para liquidar a totalidade da dívida, mas nunca a título de acordo de pagamentos;
16- A Recorrente não concorda com o disposto na sentença do Tribunal a quo, quando é referido que “(...) ficaram provadas três realidades que nos levam a concluir ter havido um acordo tácito de pagamento em prestações (...)”;
17- Não houve nenhum acordo expresso de pagamento da dívida do mútuo em prestações mensais inicialmente de €150,00 e posteriormente de €190,00. Não podemos também entender que estamos perante uma declaração tácita da celebração do alegado acordo de pagamento;
18- Não existe acordo tácito na nossa ordem jurídica. O acordo homologado em 2012, não foi cumprido pelos executados, visto que aqueles pagamentos realizados mensalmente foram feitos a título voluntário, a qual a CGD, S.A. aceitou;
19- Estes valores pagos a título voluntários no valor inicialmente de €150,00 e depois no valor de €190,00, não são decorrentes de um acordo de pagamentos, visto que o único que existiu foi logo incumprido pelos executados, nem muito menos podemos dizer que estamos perante um acordo tácito, até porque tal figura jurídica não existe;
20- Nem podemos justificar a existência de acordo entre as partes pelo facto da ação executiva proposta em 2015 ter sido deserta;
21- Visto que, a deserção da execução foi decidida ou por falta de indicação de bens à penhora ou até por simples inércia por parte do Agente de Execução responsável pelo prosseguimento daquele processo;
22- Atente o exposto no artigo 281.º, n.º 1 do C.P.C., onde refere que “(...) considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses”;
23- Até porque se tivessem apresentado algum plano de pagamentos no decorrer dessa ação executiva, a execução tinha sido julgada extinta por inutilidade superveniente da lide nos termos do disposto no artigo 277.º, alínea e) do C.P.C;
24- Como sabemos, a 12 de maio de 2020 operou-se a cessão de créditos à ora Recorrente, tendo, por isso, sido cumprido o disposto no artigo 587.º do C.C., designadamente pela sua existência e exigibilidade de crédito ao tempo da cessão;
25- Sendo que a cessão de créditos apenas foi formalizada com o pressuposto de esses créditos cedidos estarem vencidos, senão nunca tinha sido possível proceder à própria cessão, visto que esta já pressupõe o incumprimento dos contratos e vencimento dos créditos cedidos, evidenciando assim a exigibilidade dos mesmos;
26- Na medida em que foi celebrado entre a CGD, S.A. e a ora Recorrente o contrato de cessão de créditos, esses mesmos créditos tinham que estar vencidos, pressupondo que houve realmente incumprimentos de contratos celebrados com a cedente, concluindo pela exigibilidade desses créditos.”
Pede a procedência do recurso e a revogação da sentença recorrida.
Não se mostram oferecidas contra-alegações.
O recurso foi admitido como apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo.
Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
*
II- Fundamentos de Facto:
A decisão da 1ª instância fixou como provada a seguinte factualidade:
1) No dia 04 de Agosto de 1998, a CGD, S.A., na qualidade de mutuante, A e B, na qualidade de mutuários, e C, na qualidade de fiadora, outorgaram escritura de “Compra, Venda, Empréstimo e Fiança”, pela qual a primeira emprestou aos segundos o montante de 13.600.000$00 (67.838,51 euros), os segundos confessaram-se devedores de tal quantia e a terceira declarou responsabilizar-se como fiadora e principal pagadora, cf. escritura e documento complementar juntos ao requerimento executivo, cujos teores se dão por reproduzidos.
2) A partir de 04 de Outubro de 2011, as prestações de reembolso do empréstimo deixaram de ser pagas.
3) Em 2011, foi proposto processo de insolvência dos embargantes A e B.
4) Em 2012, em incidente apenso ao processo de insolvência, foi homologado plano de pagamentos, integrando o crédito da CGD.S.A., que, após, veio a ser incumprido.
5) No dia 13 de Março de 2015, a CGD, S.A. instaurou acção executiva para pagamento da quantia de 49.451,07 euros contra A, B e C com fundamento em incumprimento do empréstimo referido em 1.
6) A acção executiva foi declarada deserta, por falta de impulso processual da exequente, por despacho de 05 de Abril de 2016, notificado às partes.
7) Entre Novembro de 2015 e Junho de 2020, os embargantes A e B pagaram, todos os meses, 190 euros à CGD, S.A., que os afectou ao pagamento do capital e juros do empréstimo referido em 1., emitindo documentos comprovativos dos pagamentos e extractos, designadamente os juntos à
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