Acórdão nº 428/19.2T8CMN.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2022-10-27

Ano2022
Número Acordão428/19.2T8CMN.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

X – FUROS PARA CAPTAÇÃO DE ÁGUA, S.A., intentou ação especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergente de contratos nos termos do Decreto-Lei nº 269/98, de 01/09 contra N. R. E M. R., peticionando, a final, a condenação dos Requeridos no pagamento da quantia total de €8.930,90, acrescida de juros de mora a contar da data da instauração da ação até efetivo e integral pagamento.
Alega, para tanto e em síntese, que no exercício da sua atividade de prestação de serviços de pesquisa de águas subterrâneas e sua captação, contratou com N. R. a execução de um furo de captação de água, tendo sido devidamente explicadas as condições do contrato. O início dos trabalhos ocorreu no dia 29 de julho, data previamente acordada com o primeiro Réu e ficaram concluídos a 31 de julho desse mesmo mês, tendo o Réu assinado o auto de receção e conformidade dos trabalhos.
O valor total dos trabalhos executados ascende ao montante de € 7.496,85 (c/ IVA incluído).
No dia 06/08/2019 foi emitida a fatura e remetida para o primeiro Réu, que não procedeu ao seu pagamento.
Para além do valor em dívida, é devida a quantia de €1.349,43, a título de cláusula penal pelo incumprimento superior a 60 dias, em conformidade com a cláusula 10ª do contrato outorgado.
Mais, alega que os Réus ficaram beneficiados com a realização da empreitada, com um furo que lhes permite a captação de água subterrânea e que valorizou o terreno, o que somente conseguiram à custa dos equipamentos, materiais e mão-de-obra fornecidos pela Autora, que ficou empobrecida no valor correspondente ao valor peticionado.

Regularmente citados, vieram os Réus contestar invocando a exceção de ilegitimidade do primeiro Réu, alegando, em suma, que o Réu não entabulou quaisquer negociações ou outorgou qualquer contrato com a Autora.
Mais, alegam que as negociações foram entabuladas com o segundo Réu, a quem foi garantido pelo responsável da Autora, depois de se deslocar ao prédio onde seria para executar o furo que naquele terreno havia água em qualquer sítio, bastando uma profundidade máxima de 60 metros para atingir o veio ou lençol freático, e que lhe indicou o preço por metro linear entre €22,50 e €30,00/m, dependendo do diâmetro do tubo.
Que em julho de 2019, depois de ter contactado o responsável da Autora que lhe assegurou que os preços indicados se mantinham, o segundo Réu aceitou executar a obra e que uns dias depois e sem aviso prévio, a Autora deslocou para o local da obra maquinaria e trabalhadores, sendo que no local só se encontrava o primeiro Réu a quem foi pedido que assinasse uma folha em branco e que alegadamente era para aceder ao terreno e solicitar a licença para abertura do furo, documento que aquele assinou.
Alegam ainda que cerca de uma semana depois da abertura do furo, o segundo Réu foi contactado para proceder ao pagamento do valor de €5.460,00, que recusou pagar por não estar de acordo com o preço ajustado e que nesse seguimento, o segundo Réu foi verificar e testar o furo, tendo constatado que não tinha água suficiente, porque só tirava 200 litros de água/hora, e tinha uma profundidade de 90 metros quando a Autora reclama uma profundidade de 110 metros.
Mais, constatou que o veio da água se encontrava a 3 metros do local onde foi executado o furo e que para garantir o caudal de água necessário a uma profundidade não superior a 70 metros, o preço do furo era de € 2.230,00 (s/IVA).
Mais, alegam que o segundo Réu não assinou qualquer documento.
Sustentam os Réus que a Autora litiga com má-fé, alegando factos contrários à verdade e deduzindo pretensão cuja falta de fundamento não ignora.
A Autora respondeu pugnando pela legitimidade de ambos os Réus.
No mais impugna os factos alegados, alegando em suma que os preços foram transmitidos ao primeiro Réu e constam expressamente mencionados no contrato por ele assinado e cujo conteúdo lhe foi lido e explicado antes da assinatura.
Mais, impugna e reputa de falso que tivesse garantido a existência de água à profundidade máxima de 60 metros, não existindo qualquer método fidedigno e científico que permita saber a que profundidade existe água, sendo que o local onde foi executado o furo foi escolhido pelo primeiro Réu.
Finalmente, alega que a obrigação assumida pela Autora é de meios e não de resultados, pelo que o perfeito cumprimento do contrato não está dependente da existência de água e do seu caudal.
Invoca, ainda, a caducidade do direito dos Réus relativo às desconformidades entre o alegado como tendo sido contratado e o executado, sendo que a obra foi aceite sem qualquer reserva.

Veio a efetivar-se a audiência de discussão e julgamento com a prolação de sentença nos seguintes termos, no que concerne à parte dispositiva:

“Pelo exposto, decide-se julgar a presente ação parcialmente procedente, e, em consequência:
- Condena-se o Réu N. R., a pagar à Autora a quantia de € 8.843,28 (oito mil oitocentos e quarenta e três euros e vinte e oito cêntimos).
- Absolve-se o Réu M. R. do pedido.
Custas da ação pela Autora e pelo Réu N. R., na proporção do decaimento (art.º 527º, nº 1 e 2 do CPC).
Registe e notifique”.

Inconformado, apelou da sentença o Réu N. R., concluindo as suas alegações da seguinte forma:

“1- Vem o presente recurso da douta sentença prolatada, com data de 24 de maio de 2022, que julgou a ação parcialmente procedente, condenando o recorrente a pagar à Autora a quantia de 8.843,28 €uros.
2- Salvo o sempre devido respeito, não traduz tal decisão um correto e assertório enquadramento dos factos, nem uma correta valoração da prova documental e da testemunhal produzida, tão pouco um criterioso e assertivo concatenar de tal prova com as regras da experiência e da lógica e as máximas da normalidade, e nem um acertado enquadramento técnico-jurídico das questões submetidas à apreciação jurisdicional.
3- A decisão em pronúncia procede, no entendimento do recorrente, de erro de julgamento da matéria de facto, e de desacertada aplicação da lei e do direito, encontrando-se a decisão em parcial contradição com a fundamentação de facto.
4- Por meio deste recurso procede-se, também, à impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, concretamente no que tange à resposta (de provado) dada à matéria que consta das alíneas l) e m) dos “Factos provados”, à resposta (de não provada) dada à factualidade inserta nas alíneas a), f) e g) dos “Factos não provados”, e à não consideração, como provado, de que a água do furo feito pela Autora se mostra insuficiente para as necessidades e os fins que determinaram a contratação da sua execução por parte do segundo Réu.
5- Em ordem a decidir a matéria de facto e a sorte da ação o Tribunal de Primeira Instância julgou pelo seguro, agarrando-se, e ancorando-se, nos documentos, enquanto, prima facie, conferidores de uma maior segurança na prova e em ordem à decisão, o que, no concreto caso em análise, e face ao circunstanciado conspecto da assinatura do contrato, não deveria ter sido o caminho seguido.
6- Quanto à (em sede da contestação suscitada) questão da ilegitimidade do primeiro Ré, ora Apelante, pede-se, desde logo, a melhor atenção para a matéria de facto alegada pela Autora e dada como não provada sob as alíneas b) e c) dos “Factos não provados”, donde resulta que a Autora não provou que 4 ou 5 dias antes do início dos trabalhos o seu representante se tenha deslocado ao terreno e que ali tenha acordado, com o dito primeiro Réu, as condições do contrato.
7- Deve atentar-se, em segunda linha, na matéria fáctica dada como assente nas alíneas b), c), d), f), g), p), q), r), e t), dos “Factos Provados”.
Efetivamente,
8- Resulta dos aludidos factos provados que, com a única exceção da assinatura dos documentos, todas as negociações tendentes à celebração do contrato de empreitada com a Autora, incluindo a iniciativa dos contactos para o efeito, o ajuste do preço, a solicitação da execução do furo, a apresentação dos valores a pagar no final dos trabalhos, a manifestação do desacordo com tais valores, a não entrega do relatório referente ao furo, e as diligências tendentes a apurar o caudal da água e o consequente cumprimento ou incumprimento do contrato se centram, invariavelmente, na pessoa do segundo Réu. Aliás,
9- A fls. 9, último parágrafo, da douta sentença em recurso a M.ma Juíza do Tribunal “a quo” não deixou de sublinhar, ancorando-se nas declarações da testemunha L. A., funcionário da Autora, que “… as condições do contrato foram previamente negociadas com o Réu M. R..”
10- O segundo Réu é, de resto, conforme alegado pela Autora, o proprietário do terreno onde o furo foi feito.
11- Ora, entenda-se que o primeiro Réu/Apelante tenha assinado o contrato em branco, ou parcialmente por preencher, ou entenda-se que o fez já preenchido, no todo ou em parte, certo é que o fez (a solicitação do colaborador da Autora, e porque no local se encontrava somente ele) quando não era ele o dono da obra, o interessado, ou a parte contratante. Diga-se que,
12- Não poderia o dito contrato encontrar-se já preenchido, no momento em que ao primeiro Réu foi apresentado para assinatura, atendendo a que parte do que nele consta como clausulado, escrito à mão (veja-se, por exemplo, o clausulado em “3.º”, no que concerne aos “diâmetros da perfuração”, o diâmetro da “coluna definitiva nas zonas de terreno alterado”, e o diâmetro da “coluna definitiva nas zonas de admissão da água”) apenas seria decidido, ou determinado, após a abertura do furo. De resto,
13- Não poderia o primeiro Réu, em consciência, ter assinado um contrato, de que fosse efetiva parte (a não ser confiando em que o que aí constava exarado correspondia fielmente ao que havia sido ajustado entre o seu pai e a Autora), quando certo é que o mesmo contém clausulado que se mostra perfeitamente abusivo (conforme melhor explanado foi...

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