Acórdão nº 4236/20.0T8CBR.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 13-12-2023

Data de Julgamento13 Dezembro 2023
Ano2023
Número Acordão4236/20.0T8CBR.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO LOCAL CÍVEL DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

I – RELATÓRIO.

A..., LDA., com sede na Rua ..., ..., ... ..., NIPC ...88, instaurou no Juízo Local Cível de Coimbra acção comum contra

B..., CRL, com sede na Av.ª ..., ..., ... ..., NIPC ...29,

pedindo, com base na factualidade, melhor descrita na petição inicial, que a ré seja condenada a:

I. Pagar à autora uma indemnização em montante nunca inferior a 8.488,28 € (oito mil quatrocentos e oitenta e oito euros e vinte e oito cêntimos), a título de lucros que aquela deixou de poder auferir;

II. Pagar à autora uma indemnização em montante nunca inferior a 6.878,44 € (seis mil oitocentos e setenta e oito euros e quarenta e quatro cêntimos), a título de custos de produção extraordinários;

III. Pagar à autora uma indemnização em montante nunca inferior a 2.546,46 € (dois mil quinhentos e quarenta e seis euros e quarenta e seis cêntimos), a título de custos financeiros que a autora sofreu por não poder dispor do produto das vendas da sua produção;

IV. Adoptar medidas adequadas à captação de poeiras de milho no seu armazém.

A ré contestou, impugnando parte do acervo factual alegado na petição inicial e concluindo no sentido da improcedência da acção.


***

Identificado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, realizou-se audiência final, com observância do formalismo legalmente prescrito.

***

Em 24/4/2023, foi proferida sentença, que condenou a ré nos precisos termos peticionados pela autora.

***

Não se conformando com a decisão proferida, a ré interpôs o presente recurso, no qual formula as seguintes conclusões:

“A sentença recorrida violou:

1.º- os artigos 355.º, 356.º e 358.º do Código Civil, não atendendo á confissão judicial espontânea proferida pela Autora,

- o artigo 413.º do Código do Processo Civil, por não considerar a confissão proferida pela Autora como meio de prova atendível,

- o artigo 410.º do Código do Processo Civil, pois que a instrução do processo tem por objeto os factos relevantes para o exame e decisão da causa que devem considerar-se controvertidos ou necessitados de prova. tendo a Ré aceite a confissão da Autora, para não mais ser retirada, de que “ Esta situação é inédita. Nunca nos anos anteriores forma arrastados para o nosso viveiro as poeiras que estão coladas à folhas, por um aldo, e não tendo a Ré, por outro, impugnado os documentos que a Autora juntou à petição inicial, as declarações neles contidas, reproduzidas na contestação, importam confissão dos fatos invocados, confissão que, repita-se a Ré aceitou para não mais ser retirada, nos termos e para os efeitos do 358.º do Código Civil, e que, nas circunstâncias descritas, tem força probatória plena contra o confitente, a Autora.

Do supra exposto, decorre que a Ré aceitou a confissão judicial da Autora que descreve a causa de pedir como “ por via do vento se abateram sobre os terrenos explorados pela A., situados a norte do seu armazém.”, tendo o legal representante da Autora, AA afirmado ao perito BB a quem incumbiu a realização do doc. 6 junto á petição inicial, denominado “Nota técnica de avaliação de material vegetal nos viveiros C..., lda, em ...”, o teor das declarações prestadas na (sic) “ Introdução A presente Nota Técnica surge no seguimento do contacto efetuado pelo Eng.º AA, (…), -sic pág 4 do aludido parecer- “(…) Também foi indicado que, ao contrário do que é habitual, o vento soprava de sul e arrastou esse nuvem de poeiras para norte o que levou a que uma parte dessas poeiras se tivesse depositado sobre as plantas situadas nos talhões contíguos à unidade de transformação.”, para além de ter declarado na troca de correspondência eletrónica “Conforme alertamos e já devem ter tido oportunidade de verificar, as árvores em vaso que estão no canteiro entre a Hortobeira e a Vargem Grande foram atingidas pelo pó que a limpeza de milho armazenado no v/ armazém produziu e que para ali foi encaminhado pelo vento.”(negritos e sublinhados nossos).

Ora as declarações prestadas pela Autora são o reconhecimento da realidade dos fatos descritos na causa de pedir indicada na petição inicial, e as declarações contidas nos documentos juntos à petição inicial e que a Autora deu, um por um, integralmente por produzidos, constituem a causa de pedir, causa de pedir que se traduz na confissão judicial espontânea dos fatos invocados pela Autora.

E, a confissão judicial escrita tem força probatória plena contra o confitente.

Com os fundamentos e meios probatórios supra indicados, a matéria de facto dada como provada pela sentença recorrida deve ser alterada, e ao contrário da decisão proferida, deve ser considerado como provado:

“ que, no final de Janeiro de 2020 existiram ventos incomuns e invulgares, imprevisíveis em termos de intensidade e de direção, que geram uma situação inédita e por via da qual as poeiras se abateram sobre os terrenos explorados pela autora, situados a norte do armazém da ré;”;”

2.º- o nº 1 do artigo 342.º do Código Civil, pois caberia à Autora fazer prova daquela omissão e/ou incumprimento, prova que a Autora não logrou fazer, sendo que, para preenchimento de tal conceito não basta a afirmação de que A Ré não tinha instalado no seu armazém qualquer sistema para captação das poeiras levantadas pelas operações de secagem. De acordo com o tema de prova caberia à Autora provar que a Ré incumpriu com obrigações referentes a regras técnicas; E,

Ao ter omitido a utilização para efeitos de licenciamento do referido armazém, a sentença recorrida violou:

- o artigo 413.º do CPC que se refere às provas atendíveis, no sentido em que todas as provas produzidas nos autos devem ser atendidas como suporte de fatos provados ou não provados;

- o artigo 427.º do CPC, na medida em que os referidos documentos foram notificados á parte contrária, a qual não deduziu oposição nem á junção nem ao teor dos mesmos;

- o nº 1 do artigo 369.º do Código Civil, nos termos do qual, o documento é autêntico quando a autoridade que o exara é competente, como sucede comos dois referidos documentos.

Assim, a matéria de fato deve ser ALTERADA, nos seguintes termos:

“ A Ré não omitiu nem incumpriu a observância de regras técnicas.”

“ O imóvel está descrita na certidão de teor como armazém e atividade industrial, e encontra- se licenciado pelo Alvará de Autorização de Utilização número ...04 emitido pela Câmara Municipal ... a 16 de abril de 2004, do qual resulta a autorização camarária para utilização do armazém como edifício de apoio agrícola.”

Conclusões que decorrem da formulação do tema de prova (sic) “Circunstancialismo relativo ao depósito das poeiras nas plantas da autora, designadamente a sua causa – por omissão ou falta de cumprimento por parte da ré de regras técnicas ou por mera acção do vento (ventos incomuns, invulgares, imprevisíveis em termos de intensidade e de direcção).”

A sentença recorrida ao contrário do decidido, deveria ter dado como não provado:

“ Circunstacionalismo relativo ao depósito de poeiras nas planetas da autora, designadamente a sua omissão ou falta de cumprimento por parte da ré de regras técnicas ou (…) ” .

Com efeito, “OU” implica alternativa ou opcionalidade, isto é que a causa do depósito de poeiras, resulta, das duas uma:

- por omissão ou falta de cumprimento por parte da ré de regras técnicas;

- ou por mera acção do vento (ventos incomuns, invulgares, imprevisíveis em termos de intensidade e de direcção).”

Sendo que a resposta afirmativa a um, comporta a negativa a outra.

Resulta da petição inicial, que a Autora não invoca que no processo de transformação a Ré tenha incumprido qualquer regra técnica para realização das operações de secagem de milho no armazém contíguo aos terrenos por si explorados. Apenas invoca que a ré não tem instalado no seu armazém sistema para captação de poeiras. Ora, uma coisa é o cumprimento de regras técnicas, outra, diferente é saber se o sistema de captação de poeiras constitui uma regra técnica.

Quanto à existência e/ou incumprimento de regras técnicas a sentença é completamente OMISSA, pois nada refere quanto á obrigatoriedade legal de a Ré ter um sistema de captação de poeiras, ou de ter omitido ou incumprido regras técnicas.

Aliás, resulta do alegado nos artigos 20.º, 21.º e 22.º da contestação e dos documentos juntos aos autos pela Ré através de requerimento com a referência 37313359, não impugnados pela Autora, que o armazém a que a Autora alude no artigo 5.º da sua petição inicial serve de apoio á atividade agrícola e cooperativa da Ré desde 2017, mas está licenciado para o efeito desde 2004. Neste sentido foi dado como provado que (sic): “(…) Numa área contígua à dos terenos explorados pela autora, no âmbito do mencionado protocolo, a ré tem um armazém, que utiliza, designadamente, para recepção, armazenamento e secagem de milho dos produtores daquela área geográfica, no âmbito da sua actividade, desde 2017. (…)” .

Não obstante a junção aos autos de certidão predial comprovativa do destino do referido armazém “ armazém e atividade industrial”, e do respetivo Alvará de Autorização de Utilização número ...04 emitido pela Câmara Municipal ... a 16 de abril de 2004, do qual resulta a respetiva autorização para utilização como sendo edifício de apoio agrícola, certo é que a sentença proferida não alude ao destino e licenciamento do armazém, isto é, não considera que a atividade desenvolvida pela Ré naquele armazém corresponde à utilização que lhe foi atribuída pela autoridade competente: a Câmara Municipal .... Ao ter omitido, na sentença proferida e em resposta ao tema de prova supra enunciado que a Ré não incumpriu, por omissão ou falta de cumprimento regras técnicas no exercício da atividade levada a cabo no seu armazém, a sentença recorrida violou o princípio do ónus da repartição da prova contido no nº 1 do artigo 342.º do Código Civil, pois caberia à Autora fazer prova daquela omissão e/ou...

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