Acórdão nº 419/21.3YHLSB.L1-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 20-02-2023

Data de Julgamento20 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão419/21.3YHLSB.L1-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam em conferência, na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão, do Tribunal da Relação de Lisboa

Reclamação para a conferência
1. Por decisão sumária proferida em 19.1.2023, com a referência citius 18893966, a relatora apreciou o mérito do presente recurso tendo decidido revogar a sentença recorrida e substitui-la por outra que julgou improcedente o pedido de declaração de caducidade do registo da marca nacional n.º 384650.
2. Tal como nela indicado, essa decisão foi proferida ao abrigo do disposto nos artigos 652.º n.º 1 – c) e 656.º do Código de Processo Civil (CPC), por ter a relatora julgado que a questão a decidir, sobre os requisitos do uso sério da marca, é simples, designadamente por já ter sido apreciada de modo uniforme e reiterado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) mencionada nessa decisão e, por acórdão deste Tribunal, no Processo 148/20.5YHLSB.L2.
3. Da decisão sumária referida no parágrafo 1 veio a apelante reclamar para conferência, por requerimento de 19.1.2023 (referência citius 615626) defendendo, em síntese que:
§ A jurisprudência indicada na decisão da relatora para fundamentar o recurso ao mecanismo excepcional da decisão sumária não deve ser tomada por representativa do conceito de apreciação de modo uniforme e reiterado;
§ A pluralidade e complexidade das questões a decidir não se enquadra na previsão do disposto no artigo 656.º do Código de Processo Civil (CPC);
§ Existe erro de julgamento na medida em que, o uso do mero elemento verbal, ainda que com o vocaìbulo Next estilizado, como no sinal misto em crise, não pode ser considerado uso do sinal inalterado;
§ As modificações apuradas não estão cobertas pelas excepções previstas no artigo 255.º n.º 2 do Código da Propriedade Industrial (CPI).
4. A apelada/reclamante, conclui formulando o seguinte pedido:
“A Apelada, ora Reclamante, entende, pede e espera que o seu Recurso seja objecto de normal Decisão Colectiva, mediante Acórdão, que pondere os fundamentos e a bondade do Recurso, decidindo-se o seu não provimento e consequente confirmação da Sentença proferida pelo Tribunal da Propriedade Intelectual (...)”.
5. Notificada para se pronunciar sobre a reclamação, a apelante nada veio dizer.
6. À luz do disposto no artigo 652.º n.º 3 do CPC, a presente reclamação para conferência é admissível, ficando, por isso, prejudicada a apreciação da alegada inobservância dos requisitos previstos no artigo 656.º do CPC, uma vez que, corridos os vistos, cabe agora à conferência apreciar o mérito do recurso.

Sentença recorrida
7. A apelada, requereu a declaração de caducidade do registo da marca nacional n.º 384650, aqui em crise, de que é cotitular a apelante, ao abrigo do disposto no artigo 269.º do Código da Propriedade Industrial (CPI), tendo esse pedido de declaração caducidade sido indeferido por despacho de Instituto Nacional da Propriedade Industrial (doravante também INPI), de 16.9.2021 (cf. documento junto à impugnação judicial de 22.11.2021/referência citius 94066, como Despacho [Doc.5]).
8. Do despacho do INPI mencionado no parágrafo anterior, a apelada interpôs recurso de impugnação judicial junto do Tribunal da Propriedade Intelectual (doravante também Tribunal a quo ou Tribunal de primeira instância), nos termos previstos no artigo 38.º - b) do CPI, pedindo a sua revogação e a consequente declaração de caducidade da marca nacional n.º 384650.
9. Citadas as cotitulares do registo da marca nacional n.º 384650 – Sumo Publicidade Lda. e Next Models Lisbon – Agência de Modelos Lda. – ao abrigo do disposto no artigo 43.º do CPI, as mesmas responderam, pugnando pela improcedência do recurso de impugnação judicial e pela manutenção do despacho do INPI que indeferiu o pedido de declaração de caducidade da marca.
10. O Tribunal da Propriedade Intelectual, por sentença de 4.4.2022 (referência citius 479986), julgou procedente o recurso de impugnação judicial e, tendo revogado a decisão do INPI, declarou a caducidade da marca nacional n.º 384650.

Alegações da apelante
11. Da sentença referida no parágrafo anterior veio a apelante interpor o presente recurso para o Tribunal da Relação, pedindo a sua revogação e substituição por acórdão que mantenha a decisão do INPI, de 16.09.2021, publicada no Boletim da Propriedade Industrial de 21.09.2021, que indeferiu o pedido de declaração de caducidade do registo da marca nacional n.º 384650.
12. A apelante invocou, em síntese, que:
§ O Tribunal a quo fez uma interpretação incorrecta dos artigos 255.º n.ºs 1 e 2 e 267.º n.º 1 do CPI;
§ O Tribunal recorrido julgou erroneamente que a apelante não demonstrou o uso da marca, nos cinco anos consecutivos anteriores à apresentação do pedido de declaração de caducidade – ou seja, entre 10.3.2015 e 10.3.2020 – por considerar que os sinais usados diferem significativamente do sinal registado; no entanto, a recorrente fez prova do uso do sinal, nomeadamente do elemento “Next”;
§ Tratando-se de uma marca mista, destinada a assinalar serviços de publicidade, gestão de negócios e administração comercial, na classe 35 da Classificação de Nice, resulta da prova produzida, globalmente considerada, o seu uso efectivo, atenta a actividade comercial da apelante por mais de quinze anos;
§ O Tribunal a quo devia ter levado em conta que as modificações efectuadas na marca nacional mista “Next”, com o n.º 384650, de que é cotitular a apelante, não afectaram substancialmente a sua capacidade distintiva, nem alteraram a “commercial impression” da marca no consumidor;
§ Cabia à apelada, nos termos do artigo 342.º n.º 1 do Código Civil (CC), o ónus de provar que o consumidor, perante as modificações efectuadas na marca, pensaria que não se tratava da mesma marca, prova essa que a apelada não fez.

Contra-alegações da apelada
13. A apelada contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso, defendendo, em síntese que:
§ A apelada é titular de duas marcas da União Europeia, a marca mista “Next” com o n.º 1235423 e a marca nominativa “Next Management” com o n.º 1252436, cujo registo é prioritário em relação ao registo da marca nacional aqui em crise;
§ A apelante e a outra co-titular da marca nacional mista “Next”, com o n.º 384650, não fizeram prova do uso sério dessa marca nos últimos cinco anos que antecederem o pedido de declaração de caducidade e tanto assim é que a outra cotitular chegou a pedir a caducidade da marca em crise antes de adquirir a cotitularidade da mesma;
§ A marca usada pela apelante apresenta várias versões com alterações gráficas e visuais substanciais, aos seus elementos distintivos.

Delimitação do âmbito do recurso
14. Tem relevância para a decisão do mérito do recurso a seguinte questão:
A. Requisitos do uso sério da marca: uso comercial e uso típico.

Factos provados
15. Nota preliminar:
§ Para facilitar a leitura e remissões será a seguir mantida, entre parêntesis, a numeração dos factos constante da sentença recorrida;
§ Uma vez que a recorrente em segunda instância foi recorrida em primeira instância, o Tribunal indicará entre chavetas se se trata da apelante ou da apelada no presente recurso, sempre que isso se mostre necessário para melhor identificar as partes.
16. (1) A recorrente [aqui apelada] é titular dos seguintes registo[s] de marca, cfr. docs. 1 e 2 da petição de recurso juntos a fls. 13-14v dos autos que se dão por reproduzidos:
§ marca da União Europeia (UE) nº 1235423 NEXT, solicitado em 9.07.1999 e concedido em 9.05.2003 para assinalar ‘Serviços de agência de modelos’ na classe 35 da Classificação de Nice;
§ marca da UE nº 1252436 NEXT MANAGEMENT, solicitado em 15.09.1999 e concedido em 5.05.2003 para assinalar ‘Publicidade; trabalhos de escritório; todos os serviços atrás referidos relacionados com serviços de agências de modelos; gestão e administração empresariais para prestadores de serviços em regime de freelance, especificamente modelos’ na classe 35 da Classificação de Nice.
17. (2) A recorrida Next Models Lisbon – Agência de Modelos, Lda. é titular do registo de marca nacional nº 384650

solicitado em 21.09.2004 pela recorrida Sumo Publicidade, Lda. [aqui apelante] e concedido em 29.11.2005 para assinalar ‘Publicidade; trabalhos de escritório; todos os serviços atrás referidos relacionados com serviços de agências de modelos; gestão e administração empresariais para prestadores de serviços em regime de freelance, especificamente modelos’ na classe 35 da Classificação de Nice, cfr. doc. 3 da petição de recurso junto a fls. 15-19v dos autos, que se dá por reproduzido.
18. (3) Em 14.11.2019, a recorrida Next Models Lisbon – Agência de Modelos, Lda. requereu junto do INPI a caducidade por falta de uso sério do aludido registo de marca nº 384650

cfr. doc. constante do processo administrativo junto a fls. 79-86 dos autos, que se dá por reproduzido.
19. (4) Em 4.03.2020, a recorrida Next Models Lisbon – Agência de Modelos, Lda. adquiriu a co-titularidade do aludido registo de marca nº 384650

cfr. doc. constante do processo administrativo junto a fls. 103-108 dos autos, que se dá por reproduzido.
20. (5) Em 10.03.2020, a recorrente [aqui apelada] requereu junto do INPI a declaração de caducidade da mencionada marca nacional nº 384650

das recorridas (ponto 2 do presente enunciado de factos), alegando falta de uso sério da mesma nos últimos cinco anos, cfr. doc. constante do processo administrativo junto a fls. 109-113 dos autos, que se dá por reproduzido.
21. (6) Em 16.06.2020, a recorrida Sumo Publicidade, Lda. respondeu ao aludido pedido de declaração de caducidade do registo de marca nº 384650 invocando ter sido feito uso sério da dita marca no período em causa, nos termos constantes de fls. 128-159 dos autos, que se dão por reproduzidos.
22. (7) Em 20.07.2020, a recorrida Next Models Lisbon – Agência de Modelos, Lda. desistiu do
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