Acórdão nº 416/17.3T8FAR-E.E2 de Tribunal da Relação de Évora, 2022-02-24

Ano2022
Número Acordão416/17.3T8FAR-E.E2
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Processo n.º 416/17.3T8FAR-E.E2
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Família e Menores de Faro – J1
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Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente oposição à execução deduzida por (…) contra (…), uma vez proferida sentença, o executado veio interpor recurso daquela decisão.
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O oponente invocou a ilegitimidade do exequente e a cessação da obrigação de alimentos por força da maioridade e por irrazoabilidade.
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Em defesa da sua tese, o oponente afirma que, após atingir a maioridade (28/03/2012), o exequente passou a viver com o oponente, que suportou as despesas do filho e que este não mantém com o pai e com a família paterna qualquer relação.
Conclui peticionando a cessação da pensão de alimentos, por não ser razoável exigir o pagamento e, caso assim não se entenda, que opere a compensação de créditos e se declare a inexigibilidade das prestações referente a Junho de 2016 a Outubro de 2016, bem como as prestações referentes ao período posterior à data de conclusão da licenciatura do exequente.
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O exequente veio apresentar contestação, alegando, em síntese que no período abrangido pela execução (Outubro de 2015 a 28/03/2019) a sua residência habitual foi sempre com a mãe, onde se centrava toda a sua vida e que apenas residiu com o seu pai no mês de agosto de 2016 e que nunca interrompeu os estudos. Conclui pela improcedência da oposição e, consequentemente, pelo prosseguimento da execução.
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Após o Tribunal da Relação de Évora ter julgado parcialmente procedente o primeiro recurso interposto, os autos prosseguiram para apreciação das demais questões suscitadas e não apreciadas.
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Foi elaborado despacho saneador, com fixação do objecto do litígio e temas da prova.
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Realizada a audiência final, o Tribunal «a quo» julgou improcedente a oposição deduzida pelo embargante (…), absolvendo do pedido o embargado (…) e ordenando o prosseguimento da execução.
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Inconformado com tal decisão, o recorrente apresentou recurso de apelação e as alegações continham as seguintes conclusões:
«a) A manutenção da obrigação dos pais prestarem alimentos aos filhos depois destes atingirem a maioridade decorre do art. 1880.º do Cód. Civil, o qual, assenta num juízo de prognose casuístico, decorrente da premissa de que o menor não completou a sua formação profissional, mantendo-se a obrigação pelo tempo normalmente requerido para que aquela se complete, o que, por via do silogismo inerente à questão, nos leva a concluir que aquela formação dever-se-á completar no mais curto espaço de tempo possível.
b) A alteração ao art. 1905º do Código Civil com a introdução de um n.º 2 pela Lei n.º 137/2015, de 7 de Setembro, veio fixar o caracter residual do conceito de irrazoabilidade, no que à obrigação de prestar alimentos ao filho maior de idade diz respeito, introduzindo duas situações jurídicas tipificadas: o processo de educação ou formação profissional estar concluído antes do filho atingir os 25 anos de idade ou o referido processo ter sido livremente interrompido.
c) As duas situações tipificadas no art. 1905º n.º 2 do Cód. Civil não deixam de integrar o conceito de irrazoabilidade lato sensu.
d) Uma vez concluída a escolaridade obrigatória (12º ano de escolaridade), só excepcionalmente se pode (deve) considerar que o processo de educação não está concluído se à data em que atingir a maioridade o filho estiver a frequentar, designadamente, o ensino superior, e até à conclusão do ciclo de estudos em que se encontrar, ou, no limite, com a conclusão do ciclo de estudos iniciado acto contínuo à conclusão da escolaridade obrigatória, na medida em que este constitua a formação base necessária ao acesso à profissão a que o mesmo se destina.
e) O início de um novo ciclo de estudos, após a conclusão do anterior, salvo a excepção referida em d), não é uma possibilidade enquadrável no espírito da lei, na medida em que, a mens legis, aponta no sentido da conclusão de um processo em curso e não num sucessivo reiniciar de processos.
f) O processo educativo ou de formação profissional do filho sob a égide dos pais, consubstanciado na obrigação legal destes lhe prestarem alimentos para além da menoridade, termina com a conclusão do ciclo de estudos em que o menor se encontrar quando este atingiu a maioridade, ou com a conclusão do ciclo de estudos iniciado acto contínuo à conclusão da escolaridade obrigatória, na medida em que este constitua a formação base necessária ao acesso à profissão a que o mesmo se destina.
g) O conceito de “interrupção voluntária” referido no art. 1905.º, n.º 2, do Cód. Civil, traduz-se num status quo individual, que leva a que o filho por si só e pelas suas circunstâncias intrínsecas, provido de livre arbítrio, interrompa o seu processo educativo ou profissional.
h) A voluntariedade da interrupção do processo educativo ou profissional consubstancia-se em causas internas, ou seja, resulta de um acto de vontade cuja formação se funda na motivação intrínseca do filho e não em qualquer outra causa, que por apresentar uma origem externa em nada releva para a formação da vontade que caracteriza a “interrupção voluntária” no âmbito do art. 1905.º, n.º 2, do Cód. Civil, designadamente, a escassez de recursos financeiros.
i) O exequente não concluiu o curso que frequentava na FDL, tendo desistido do mesmo antes do fim do ano lectivo, por falta de interesse face ao referido curso.
j) O desinteresse por uma determinada área de estudo ou de conhecimento, apenas poderá ser imputada como causa intrínseca do próprio agente, já que, esse desinteresse resulta ou funda-se em motivações próprias do mesmo que concorrem para a formação da vontade que conduz à desistência.
k) A causa da desistência do curso de Direito por parte do exequente deveu-se à sua própria e livre vontade, fundada num sentimento de desinteresse face ao referido curso e não a qualquer outra causa externa, designadamente à falta de meios financeiros.
l) A razão por que o douto Tribunal a quo não conclui do mesmo modo que o aqui alegante, resulta da perspectiva com que aborda a questão, ou seja, o Tribunal a quo aborda a questão sob uma perspectiva de 2021 e não sob a perspectiva de 2012 - 2013, como deveria ter sucedido.
m) Da matéria dada como provada resulta que o exequente desistiu do curso de Direito, interrompendo livremente o seu processo de educação, não obstante mais tarde tê-lo reatado, ingressando num curso diferente, porém, isso não pode configurar uma continuidade ininterrupta do seu processo de educação, pois só aparentemente assim é, em resultado de se observarem os factos sob a perspectiva de quem os vê em 2021, ou seja, depois de se ter conhecimento daquilo que ocorreu após a referida interrupção do processo de educação, fundado na desistência do curso de Direito.
n) O reatamento do processo de educação não sana a sua prévia e livre interrupção.
o) Ao interpretar os factos ocorridos no ano lectivo de 2012 - 2013 e 2013 - 2014 sob a perspectiva de quem os vê em 2021, sem fazer o necessário esforço mental de os interpretar sob a perspectiva das datas em que os mesmos ocorreram, o douto Tribunal a quo, com o devido respeito e sem prejuízo de melhor opinião, incorreu em erro de raciocínio.
p) O erro de raciocínio em que o Tribunal a quo incorreu, contamina o julgamento da presente contenda, dando origem a um errado julgamento da mesma, ou seja, traduz-se em erro de julgamento.
q) O exequente concluiu a licenciatura em Património Cultural e Arqueologia em 31 de Maio de 2017.
r) O que está em causa no âmbito do art. 1905º n.º 2 do Cód. Civil é garantir que o processo de educação em curso se conclua, entendendo-se por tal a conclusão do ciclo de estudos em curso à data em que o menor atinja a maioridade, ou, no limite, conclua o ciclo de estudos que lhe permita aceder à profissão de que aquele constitua a formação base, desde que iniciado imediatamente a seguir à conclusão da escolaridade obrigatória, e não o reinício repetido de novos ciclos de estudos.
s) O processo de educação do exequente, para efeitos do disposto no art. 1905º n.º 2 do Cód. Civil, ficou concluído no dia 31 de Maio de 2017.
t) O exequente não tem qualquer legitimidade para reclamar do executado o pagamento das prestações referentes à pensão de alimentos fixada na sua menoridade de 1 de Junho de 2017 a Março de 2019, por estas não serem devidas.
u) Passados muitos anos sobre a data em que o menor atingiu a maioridade, completou os 25 anos de idade e concluiu o seu processo de educação, sendo que esta última situação por si só obstaria em qualquer caso à manutenção da obrigação de alimentos, não é razoável, nesta data, a manutenção da obrigação de alimentos, sob a forma do pagamento da pensão de alimentos fixada na menoridade, por parte do executado ao exequente, uma vez que, o decurso do tempo tornou impossível o desiderato que a lei visava alcançar.
v) Não é razoável que muitos anos depois, e sem qualquer possibilidade repristinatória de uma determinada situação que pudesse ter sido prejudicada, o que nem sequer foi o caso, se possa exigir o cumprimento de uma obrigação que só tem enquadramento legal enquanto medida garantística da previsão ínsita na norma.
w) Hoje, o cumprimento de tal obrigação por parte do executado traduzir-se-ia num locupletamento indevido do exequente, pelo que, existiu erro de julgamento do douto Tribunal a quo.
x) Não devendo os pais serem considerados meros “f‌inanciadores" dos f‌ilhos, e consequentemente não se sufragando a tese de que o “pai que só serve para pagar”, entende o executado estar preenchida e provada a irrazoabilidade da obrigação de pagamento das prestações referentes à pensão de alimentos f‌ixada na menoridade do exequente prevista no art. 1905º n.º 2 do Cód. Civil.
y) Deveria assim, o douto Tribunal a quo ter julgado no sentido
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