Acórdão nº 3963/18.6T8VIS-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 09-04-2024

Data de Julgamento09 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão3963/18.6T8VIS-A.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO CENTRAL CÍVEL DE VISEU)

Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra:



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I – Relatório

AA, advogado e com os demais sinais dos autos,

intentou a presente ação declarativa comum condenatória contra

1.ª - “A... Unipessoal, Lda.” e

2.º - BB,

estes também com os sinais dos autos,

pedindo que sejam estes condenados, solidariamente, no pagamento ao A. da quantia de € 56.791,95, com referência a honorários forenses, acrescida de juros moratórios, vencidos e vincendos, à taxa supletiva legal, até integral pagamento, bem como juros compulsórios, à taxa de 5%, nos termos do disposto no art.º 829.º-A, n.º 4, do CCiv..

Para tanto, alegou, em síntese, ter prestado serviços de advocacia aos RR., no âmbito de contrato respetivo, com obtenção do resultado pretendido através desses serviços, que ficaram enquadrados por “um acordo prévio de honorários cumulativos”, que os RR. não cumpriram, deixando por pagar o montante peticionado, apesar de instados para o efeito.

Os RR. contestaram conjuntamente, impugnando diversa factualidade alegada pelo A. e concluindo pela total improcedência da ação e decorrente absolvição do pedido.

Dispensada a realização de audiência prévia, saneado o processo e definidos o objeto do litígio e os temas da prova, foi designada data para audiência final.

Realizada esta ([1]), foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo relevante:

«I. Julgo a ação parcialmente procedente e, em consequência, condeno os Réus a pagar, solidariamente, ao Autor a quantia de cinco mil euros, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a citação e de juros compulsórios, à taxa de 5%, computados da data desta sentença, até integral pagamento. No demais, julgo a ação improcedente e, em consequência, absolvo os Réus do pedido.

(…).».

De tal sentença veio o A., inconformado – na parte em que não obteve ganho de causa –, interpor recurso, apresentando alegação/motivação e formulando as seguintes

Conclusões ([2]):

«Primeira: o autor celebrou com os réus um acordo de honorários em que se previam os serviços a prestar e os honorários a pagar, estes compostos por uma verba fixa e por uma cláusula de sucess fee, esta na percentagem de 6% sobre o ganho.

Segunda: os réus nada pagaram, tendo sido condenados apenas no pagamento da verba fixa de 5.000 mil euros e absolvidos quanto ao mais.

Terceira: Porém os factos que o Tribunal considera não provados deveriam igualmente considerar-se fixados por a prova dos mesmos resultar do que consta do processo principal complementado com o depoimento da testemunha CC.

Quarta: E em consequência, como impõe que se considere integralmente provada a matéria relativas aos ganhos com a consequente procedência total da ação.

Quinta: De qualquer modo os factos já considerados provados eram suficientes para fazer funcionar a cláusula sucess fee, e se assim não se entendesse, sempre os réus deveriam ser condenados a pagar o valor da cláusula de sucesso, em montante a liquidar em execução de sentença, isto nos termos do art.º 609 nº 2 do CPC.

Sexta: As objeções postas pelo Tribunal à cláusula de sucess fee estabelecida e sua comparação e classifica-la como “ganho de leão” ou “quota litis” não tem qualquer suporte legal e a comparação com o acórdão citado pelo Tribunal é totalmente desadequada.

Sétima: Pelo exposto deve o recurso ser julgado procedente revogando-se a sentença recorrida na parte objeto do presente recurso e julgando-se procedente a ação, nos termos que constam nas conclusões anteriores, por violação das normas supra identificadas e ainda o disposto no artigo 1158º do CC

Assim se fará Justiça».

Os RR. não apresentaram contra-alegação de recurso.


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O recurso foi admitido como de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo sido ordenada a remessa dos autos a este Tribunal ad quem, onde foi mantido o regime fixado.

Colhidos os vistos e nada obstando, na legal tramitação, ao conhecimento do mérito do recurso, cumpre apreciar e decidir.


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II – Âmbito recursivo

Perante o teor das conclusões formuladas pela parte recorrente – as quais definem o objeto e delimitam o âmbito do recurso ([3]), nos termos do disposto nos art.ºs 608.º, n.º 2, 609.º, 620.º, 635.º, n.ºs 2 a 4, 639.º, n.º 1, todos do NCPCiv. –, cabe saber:

a) Se deve proceder a impugnação da decisão de facto, quanto ao elenco dos factos dados como não provados, por se verificar a existência de erro de julgamento de facto;

b) Se ocorreu erro de julgamento quanto à decisão de direito, no concernente à fixação do montante do crédito objeto da condenação, a dever ser majorado.


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III – Fundamentação

A) Da impugnação da decisão relativa à matéria de facto

O A./Apelante veio apresentar impugnação recursória da decisão da matéria de facto, quanto aos três pontos [identificados por alíneas, de a) a c)] dos factos dados como não provados, pretendendo que sejam agora julgados como provados, com base, segundo refere, no «que consta do processo principal complementado com o depoimento da testemunha CC» (cfr. conclusão 3.ª).

Importa ter em conta, pois, os seguintes os pontos de facto dados como não provados:

«a) Que, para além da restituição das frações, na providência cautelar o Banco 1..., “…pedia o reembolso das despesas vencidas e não pagas e vincendas e devidas e correspondentes a juros de mora, uma indemnização de 20% do montante das rendas vincendas, correspondente a 55.608,68€: 20.548,24€ (prestações em dívida, juros de mora, despesas de incumprimento) + 35.060,44€ (20% do montante das rendas vincendas – 175.302,18€)”.

b) Que a “resolução do contrato representava para a ré e (…) para o réu, gerente e único sócio, os seguintes prejuízos/consequências (...):

• 385.187,83€ valor já pago, em prestações (…) que seria totalmente perdido com a resolução do contrato, correspondente a 130 prestações (533.337,00€: 180 x 130 = € 385.187.83)

• 533.337,00€ valor real das frações (…) preço este que as partes aceitaram e pelo qual o Banco comprou as frações sobre as quais incidiu o contrato de locação financeira; e

• 55.608,68€, correspondente à indemnização devida

c) Que “… feitas as negociações com o Banco 1..., foi possível manter na posse da ré as frações locadas, repristinando o contrato de locação financeira e baixando a prestação mensal, que era de 4.142,95€ para 1.800,00€, com o alargamento do prazo de pagamento…”.».

Sabido que teria o impugnante de observar suficientemente os ónus legais a seu cargo (cfr. art.º 640.º do NCPCiv.), designadamente quanto aos concretos meios de prova que impusessem decisão diversa [al.ª b) do n.º 1 daquele art.º 640.º e art.º 662.º, n.º 1, do mesmo Cód.], importa, ab initio, conjugar, em ponderação sujeita ao princípio da proporcionalidade, o acervo conclusivo com o corpo da antecedente motivação de recurso, de molde a procurar, desde logo, a concretização/identificação dos mencionados meios de prova “constantes do processo principal”, para depois se atentar, sendo o caso, no conteúdo/substância daquela identificada prova testemunhal.

Porém, é seguro que esta tarefa está claramente facilitada quanto ao primeiro dos pontos impugnados [al.ª a)], sujeito, pelo seu conteúdo, a prova documental – e não testemunhal –, posto importar saber o que era pedido no âmbito da providência cautelar interposta pelo “Banco 1...”, se apenas a “restituição das frações” ou também os ditos “reembolso das despesas” (“vencidas e não pagas e vincendas e devidas”), “juros de mora” e “indemnização”, para o que bastará confrontar a petição de tal providência cautelar apensa (matéria sujeita a prova documental adquirida para os autos).

Não, porém, sem que antes se sublinhe o sentido da convicção adotada a respeito pelo Tribunal recorrido, que exarou na sua justificação da convicção o seguinte:

«Em termos de prova documental, verificamos que a petição inicial da providência cautelar contraria frontalmente o alegado e elencado como não provado em a). Na providência cautelar, o pedido do Banco 1... foi apenas e só o de restituição das frações em consequência do incumprimento, pela R., da obrigação de pagamento das rendas, tal como se provou em 4). Como tal, não se poderia ter a factualidade elencada em a) como provada.».

E no ponto 4 dos factos provados – não sujeito a qualquer impugnação recursiva – apenas consta que:

«4) Nesta providência, o Banco 1... pediu que que se ordenasse à R. a entrega daquelas três frações devolutas e, caso se julgassem verificados os necessários pressupostos, que se antecipasse o juízo sobre a causa principal, considerando, em consequência, definitivamente resolvido o contrato de locação financeira.».

Vejamos, então, o que foi vertido na petição daquela providência cautelar, para que remete, afinal, o Apelante (no corpo alegatório apresentado), cujo teor, como ato processual, foi consultado nesta Relação no âmbito do processo eletrónico, através do sistema Citius.

Ora, dessa petição resulta apenas o pedido de que fosse ordenada a entrega judicial “à Requerente das frações identificadas no artigo 3.º deste requerimento” (as aludidas três frações autónomas, objeto de contrato de locação financeira imobiliária), bem como que “antecipe o juízo sobre a causa principal”. E não mais.

Por isso, estando plenamente provado o que consta do dito ponto 4 do elenco dos factos dados como provados – bem como o fundamento resolutivo a que alude o facto 5 ([4]) –, tem de persistir como não provado o mais que foi vertido na al.ª a) dos factos julgados não provados.

Prova esta por documento com força probatória plena, afastando, por isso, qualquer pretensão de valoração de prova testemunhal sobre o conteúdo de ato processual praticado em autos apensos.

Donde a manifesta improcedência da impugnação nesta parte, razão pela qual se queda inalterada a dita al.ª a) dos factos não provados.

Quanto já à também impugnada al.ª b), invoca, desde logo, o Apelante o “contrato de...

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