Acórdão nº 393/22.9T8FAR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-10-26

Ano2023
Número Acordão393/22.9T8FAR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 393/22.9T8FAR.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
AA (Autora) intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “Om Wash, unipessoal, Lda.”, (Ré), solicitando, a final, que a ação seja julgada procedente por provada e, em consequência, seja a Ré condenada no pagamento:
à Autora da quantia de €3.870,15, a título de trabalho suplementar;
à Autora da quantia de €3.000,00, a título de danos não patrimoniais, em face da discriminação de que foi vítima; e
das custas do processo e demais encargos legais.
Alegou, em síntese, que a Autora celebrou contrato de trabalho com a Ré em 18-06-2019, com início nessa data, para desempenhar as funções inerentes à categoria de calandrador, sendo que, apesar de constar no contrato de trabalho que a Autora se encontra sujeita a banco de horas, tal não corresponde à verdade, visto que a Autora tem, desde o início do contrato, um horário certo e determinado para entrar e sair, das 08h00 às 18h00, com uma hora de almoço, ainda que a sua jornada de trabalho fosse de 08h00, pelo que todo o trabalho realizado, para além do horário praticado pela Autora, é trabalho suplementar.
Alegou ainda que, para além das horas diárias que trabalhou para além do seu horário de trabalho, trabalhou ainda 24 dias de folgas, pelo que a título de trabalho suplementar lhe deve ser paga a quantia de €3.870,15.
Por fim, alegou que a gerente da Ré exerce pressão para que a Autora trabalhe sem o seu véu, sendo tal pressão ilegal e inconstitucional, gerando na Autora um grande desconforto, uma grande vergonha, nervosismo e ansiedade, sentindo-se discriminada pela Ré, pelo que solicita, a título de danos não patrimoniais, a quantia de €3.000,00.
Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver o litígio por acordo.
A Ré “Om Wash, unipessoal, Lda.” apresentou contestação, requerendo, a final, que a ação seja julgada totalmente improcedente por não provada, sendo a Ré absolvida dos pedidos.
Alegou, em síntese, que, com exceção dos factos vertidos em 1 e 3 da petição inicial, impugna todos os demais factos, visto que o banco de horas que consta do contrato de trabalho celebrado entre as partes, e que se mostra previsto na lei e na CCT aplicada ao sector, foi efetivamente implementado, tendo o crédito de horas disponível a favor da Autora ou da Ré sido utilizado no decurso do contrato.
Mais alegou que o livro de registo de tempos de trabalho está e sempre esteve disponível no escritório da Ré, nunca tendo sido recusado a qualquer trabalhador a sua exibição, sendo que, desde o início da relação laboral, o horário de trabalho é fixado pela Ré e atempadamente comunicado aos trabalhadores através de afixação do mesmo em local próprio da empresa.
Alegou ainda que o recurso a banco de horas resulta da circunstância de a atividade da Ré ser sazonal, encontrando-se diretamente ligada ao turismo, o qual aumenta nos períodos designados de época alta, pelo que períodos houve em que a Autora trabalhou muito menos do que as 40 horas semanais, sendo que sobre esses factos a Autora nada referiu.
Por fim, referiu que nunca a Ré exerceu qualquer discriminação sobre a Autora, sendo que, em face das regras de segurança e saúde no trabalho instituídas na Ré, está interdito o uso de lenços, bem como de qualquer tipo de adornos, vestuário largo e gravatas, no exercício da atividade laboral, por razões de segurança, já que com o tipo de máquinas utilizadas existe o risco dos objetos e roupas mencionadas ficarem presos e, desse modo, poder ocorrer um acidente de trabalho.
Por despacho proferido em 02-05-2022, foi a Autora convidada a aperfeiçoar a sua petição inicial.
A Autora apresentou o respetivo aperfeiçoamento, o qual foi impugnado pela Ré.
Realizada a audiência prévia, não foi possível, uma vez mais, obter o acordo entre as partes, tendo a Autora concretizado alguns elementos que ainda não se mostravam suficientemente concretizados no requerimento de aperfeiçoamento que juntou aos autos.
Proferido despacho saneador, foi fixado o valor da ação em €6.870,15, foi enunciado o objeto do litígio e foram identificados os temas da prova.
Após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença em 14-04-2023, com a seguinte decisão:
Em face do exposto julgo improcedente a ação e, em consequência, absolvo a R. dos pedidos.
Custas pela A. sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia ( cfr. art. 527º do CPC
ex vi art. 1º nº 2 al. a) do CPT).
Notifique e registe.
Não se conformando com a sentença, veio a Autora AA interpor recurso de apelação, terminando com as seguintes conclusões:
1 - A A. veio intentar ação comum, emergente de contrato de trabalho pedindo que lhe fossem pagas as horas extraordinárias por si trabalhadas em prol da R.
2 - A R. alegou, que tinha o registo de horas de entrada e saída dos seus trabalhadores em registo manual efetuado por outra trabalhadora da R. na sede da empresa; o mapa de horário de trabalho continha todos os elementos, encontrava-se nos serviços administrativos da R.
3 - Foi proferida sentença com a decisão seguinte: “Em face do exposto julgo improcedente a ação e, em consequência, absolvo a R. dos pedidos (…)”.
4 - A R. produziu registos dos tempos de trabalho que nem sequer estão assinados pelos trabalhadores na sede da empresa, sendo apenas um manuscrito realizado por uma outra funcionária da empresa.
5 - O que é inadmissível, não podendo estes registos efetuados por uma 3ª pessoa serem considerados como provas, pois, com todo o respeito, erroneamente foi considerada como tal, pelo Tribunal a quo.
6 - Assim, a decisão padece de uma errada qualificação jurídica dos factos e do direito.
7 - Cada funcionário deve ter a sua própria folha de presença, também chamada de folha de ponto, para registos individuais.
8 - Esse documento, por sua vez, deve conter informações relevantes como o nome completo do trabalhador, o seu NIF, sua função na empresa, a equipa correspondente e o mês em questão.
9 - Sendo todos estes requisitos completamente negligenciados pela R.
10 - Ora não tendo a R. provado com documentos reais, ou seja, dos quais constem o procedimento de picagem por parte da A. que confrontassem o alegado na P.I. da A., estes mesmos factos consideram-se confessados.
11 - Não foram na verdade contestados.
12 - Pois não foram juntos aos autos Registos de Tempos de Trabalho com o devido procedimento de picagem por parte da A., ou seja, aqueles manuscritos da autoria da R. são inaptos a provar o quer que seja.
13 - E deste modo, consideram-se confessados os factos elencados na P.I. pela A., pois aquelas folhas não têm qualquer valor jurídico para contestar a matéria de facto elencada pela A.
14 - Deve, portanto, assim, a R. ser condenada ao pedido da A. na sua P.I., assim como proceder ao pagamento de indeminização à A.
Assim, Venerados Juízes Desembargadores, a decisão do Tribunal a quo encontra enferma de nulidade pois baseou a sua convicção e respetiva decisão em prova não admissível, pois baseou-se em manuscritos da autoria e forjados pela R. para a sua própria defesa, como elementos de prova, o que não poderia ter acontecido.
Trata-se de provas não válidas, que não provam que a A. picou o ponto como de seu direito e legitimidade, e desta, tratando-se de prova inválida, os factos elencados na P.I. pela A. consideram-se integralmente provados, por confessados pela R., devendo assim ser a R. condenada a pagar os valores das horas extra prestados e reclamados pela A. e a respetiva indeminização cível.
A Ré “Om Wash, unipessoal, Lda.” apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida a sentença recorrida.
O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, tendo subido os presentes autos a este tribunal, onde foi dado cumprimento ao preceituado no n.º 3 do art. 87.º do Código de Processo do Trabalho, pugnando a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta no seu
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