Acórdão nº 3888/16.0T8VFR.P3 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-22

Ano2024
Número Acordão3888/16.0T8VFR.P3
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso de Apelação - 3ª Secção
ECLI:PT:TRP:2023:3888/16.0T8VFR.P3

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

1. Relatório
AA e mulher BB, residentes na Estrada ..., ..., ..., Brasil, CC e marido DD, residentes na Rua ..., ..., Rio de Janeiro, Brasil, EE e marido FF, residentes na Rua ..., ..., Rio de Janeiro, Brasil e GG e marido HH, residentes na Rua ..., ..., Rio de Janeiro, Brasil, instauraram acção de prestação de contas contra II, residente na Rua ..., ... ..., onde concluíram pedindo que o réu preste contas do mandato sem representação que lhe foi conferido pelos autores, desde 04.08.2014 até 23.05.2016 e, consequentemente, que seja condenado no pagamento do saldo que delas se vier a apurar.
Alegaram, em síntese, que JJ faleceu a 10 de Junho de 2014, no estado de viúvo de KK, sem descendentes e ascendentes vivos, tendo deixado testamento público, outorgado no dia 4 de março de 2004, lavrado a folhas ..., do Livro ......, do 1º Cartório Notarial de Santa Maria da Feira, no qual instituiu universais herdeiros de todos os seus bens, em comum e partes iguais, os aqui Requerentes.
Mais alegaram, que fazia parte do acervo de bens a partilhar por óbito de JJ o prédio urbano, constituído por casa térrea para habitação, sito no Lugar ..., ..., freguesia ..., inscrito na respectiva matriz sob o artigo ... e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o nº ....
Alegaram, ainda, que, por procuração notarial outorgada no 4º Tablionato de Notas do
Rio de Janeiro, Brasil, de fls. ... do Livro ... e datada de 4 de agosto de 2014, os herdeiros do falecido e respectivos cônjuges, constituíram o Requerido procurador, conferindo-lhe os poderes especiais para vender os bens da herança de JJ, podendo receber os valores, representá-los junto ao Banco 1..., bem como para efeitos de participação do Imposto de Selo, nomeando-o representante fiscal em Portugal.
Alegaram, por fim, que no exercício do mandato, o réu vendeu o prédio urbano inscrito atrás identificado, não prestando contas aos autores quanto à venda do bem imóvel, nem quanto ao montante depositado no Banco 1..., S.A.
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Citado, o réu contestou a obrigação de prestar contas.
Alegou, desde logo, que extrajudicialmente prestou contas à Drª LL, advogada mandatária dos autores, mediante o documento designado “relatório de contas”, comunicando-lhe o crédito que tinha sobre a herança representada pelos autores e sobre os mesmos.
Sem prescindir, prestou contas, neste articulado, alegando que o preço da venda do bem imóvel ascendeu a € 47.555,63, suportou despesas que totalizam € 18.449,02, tendo um saldo a seu favor no valor de € 37.200,00.
Acrescentou que, relativamente à conta no Banco 1..., S.A. não pode prestar contas, porquanto nunca administrou a referida conta em nome do falecido.
Formulou, ainda, pedido reconvencional onde concluiu pedindo que seja dada como provada a quantia de € 37.200,00 a título de compensação pelos cuidados prestados ao autor da herança, aqui representada pelos autores, a título de custo e tempo gasto na execução do mandato ou, assim não se entendendo, que o mesmo crédito seja reconhecido a título de enriquecimento sem causa, compensando-se no crédito do réu.
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Notificados, os autores contestaram as contas apresentadas, não aceitando nem o valor, nem a receita apresentada.
Vieram, ainda, pugnar pela inadmissibilidade da reconvenção.
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A reconvenção foi admitida por despacho de fls. 82 e seguintes.
Percorrida a tramitação subsequente, foi proferida sentença que julgou a existência da obrigação do requerido de prestar contas desde 04.08.2014 até 23.05.2016, determinando a sua notificação para as apresentar dentro de 20 dias, sob pena de lhe não ser permitido contestar as que os requerentes apresentem, levando em conta a factualidade provada em 11, 12 e 13.
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Não se conformando com a sentença proferida, os recorrentes/AA. vieram interpor recurso de apelação.
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Por acórdão deste Tribunal da Relação de 07 de novembro de 2019 foi acordado a devolução dos autos ao Tribunal recorrido para fundamentar a decisão da matéria de facto no que respeita aos pontos 3 e 13, de acordo com o que ficou exposto na fundamentação do acórdão.
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Por despacho de 02 de dezembro de 2019, o Tribunal a quo fundamentou a decisão da matéria de facto quanto aos pontos 3º e 13º da sentença.
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Por novo acórdão deste Tribunal da Relação datado de 05 de novembro de 2020 foi julgada a apelação parcialmente procedente, revogando-se o despacho de fls. 82 e seguintes e revogando-se, em parte, a sentença recorrida, nos seguintes termos:
A) Não se admite a reconvenção deduzida pelo réu, sem prejuízo de serem atendidas na prestação de contas as despesas efectuadas pelo réu e referidas nos pontos 9. e 10. da factualidade provada;
B) Julga-se a acção parcialmente procedente e, em consequência, julga-se a existência da obrigação do requerido de prestar contas desde 04.08.14 até 23.05.16, determinando a sua notificação para as apresentar dentro de 20 dias, sob pena de lhe não ser permitido contestar as que os requerentes apresentem, levando em conta a factualidade provada até ao ponto 10, inclusive.
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Por despacho de 21 de abril de 2021, em obediência ao decidido por este Tribunal da Relação, foi notificado o requerido para, no prazo de 20 dias, prestar contas desde 04/08/2014 até 23/05/2016 em forma de conta-corrente, especificando a proveniência das receitas e despesas, bem como o respectivo saldo, se o houver, sob pena de lhe não ser permitido contestar as que os requerentes apresentem, levando em conta a factualidade provada até ao ponto 10, inclusive.
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Foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente, e em consequência aprovou as contas prestadas pelo Réu, com o saldo líquido positivo no montante de € 35.514,77 a favor dos Autores, a ser pago pelo Réu, devendo ainda este repor à herança a quantia, não justificada, de € 37.500,00 - ponto 10º dos factos provados -, absolvendo o Réu do demais peticionado pelos Autores.
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Não se conformando com a sentença proferida, os recorrentes AA. vieram interpor o presente recurso de apelação, em cujas alegações concluem da seguinte forma:

“I. O presente recurso tem por objeto a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância com a ref.ª 127177139, e versa sobre matéria de facto e de direito, bem como, sobre a reapreciação da provada gravada em audiência de discussão e julgamento.

II. Em suma o Tribunal a quo julgou parcialmente provada a ação de prestação de contas aprovando as contas apresentadas pelo Réu com saldo positivo de 35.514,77€ a favor dos Autores a ser pago pelo Réu, bem como condenando o Réu a repor à herança o valor de 37.500,00€ cfr. Ponto 10 dos factos provados.

III. Considera o Recorrente desde logo que a pronúncia do Tribunal a quo que encerra o ponto 10) dos factos provados consubstancia uma ofensa do caso julgado, bem como um excesso de pronúncia, conhecendo de questão que não podia nestes autos conhecer.

IV. Isto porque, o processo de prestação de contas divide-se em duas fases, a primeira de apuramento da obrigação de prestar contas e em que medida, e uma segunda fase de indicação das receitas e despesas num encontro de contas entre deve e haver.

V. O Recorrente na primeira fase destes autos contestou a sua obrigação de prestar contas considerando já as haver prestado extrajudicialmente, e ainda, caso assim não se entendesse, apenas deveria prestar contas relativamente ao produto da venda do imóvel pertencente ao acervo da herança, e já não relativamente às contas bancárias.

VI. Os Autores consideravam por outro lado, que tendo em conta o imposto de selo onde constavam contas bancárias em nome do falecido tal obrigação deveria recair também sobre as mesmas.

VII. Foi produzida prova sobre tais factos nesta primeira fase, e foi proferida sentença pelo Tribunal a quo que decidiu julgar a existência de prestar contas por parte do Réu mas apenas relativamente ao produto da venda do imóvel, considerando os pontos 3), 4), 5), 6), 7), 8), 9) e 13) que aqui importam.

VIII. Não se conformando com tal decisão, os Autores recorreram para o doutro Tribunal da Relação do Porto invocando entre outros fundamentos que deveria ser acrescentado ao ponto 3 dos factos provados como fazendo parte do acervo hereditário as contas bancárias identificadas no imposto de selo do Serviço de Finanças, e o ponto 13) dos factos provados deveria ser dado como não provado.

IX. O Tribunal da Relação do Porto proferiu acórdão a 05.11.2020 transitado em julgado a 10/12/2020, considerando que não havia nos autos prova suficiente da existência de contas bancárias nos autos razão pela qual não havia nada a acrescentar ao ponto 3 dos factos provados mantendo-se a sua redação, considerando por outro lado, que não havia prova da suficiente também da sua inexistência razão pela qual o ponto 13 deveria ser dado como não provado.

X. Mais considerando que esta alteração não tinha relevância para a decisão do recurso já que “quanto ao conteúdo da obrigação de o réu prestar contas, ficou a mesma definida na presente fase declarativa do processo, com cumprimento integral da tramitação prevista no artigo 942º, na qual os autores tiveram intervenção, tendo tido a oportunidade de provar que, à data do óbito, o JJ possuía contas bancárias.” – SIC Acórdão.

XI. Contudo, com o início da segunda fase do processo de prestação de contas Autores e este Tribunal a quo que agora se recorre incorreram num equivoco e errada interpretação de direito, considerando que porque o Tribunal da Relação do Porto deu como não provado o ponto 13, poderiam os Autores nesta segunda fase voltar a requerer prova sobre a existência ou não de contas bancárias e solicitar prestação de contas sobre a mesma.

XII. Ora, entende o Recorrente, salvo devido respeito por entendimento contrário, é que o Tribunal da Relação do Porto considerou não haver prova
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