Acórdão nº 3843/22.0T8FAR-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 28-09-2023

Data de Julgamento28 Setembro 2023
Ano2023
Número Acordão3843/22.0T8FAR-A.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 3843/22.0T8FAR-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro[1]
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Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – RELATÓRIO
1. AA, autora nos autos acima identificados, notificada do despacho proferido em 21.04.2023, que indeferiu o requerimento que havia formulado na petição inicial, «sob a epígrafe “Prova Pericial”» para que, «ao abrigo do disposto no art. 467.º e seguintes do CPC, fosse elaborado um relatório técnico-científico de reconstituição do acidente de viação em apreço nos presentes autos», e não se conformando com o mesmo, apresentou o presente recurso de apelação, pedindo que o despacho recorrido seja revogado e admitido o meio de prova requerido, finalizando a sua minuta recursiva com as seguintes conclusões:
«1. O presente recurso de apelação é interposto contra o douto despacho judicial proferido a 21.4.2023 que indeferiu a produção de um meio de prova oportunamente requerido pela Autora;
2. É legalmente admissível o recurso autónomo dos despachos de admissão ou de rejeição de algum meio de prova – vide art. 644.º, n.º 2, alínea d) do CPC;
3. As partes podem oferecer ou requerer quaisquer provas (licitas) que entendam necessárias para provar os factos que alegam em sustentação dos direitos afirmados, ou para contraprova dos factos aduzidos pela contraparte que ponham em crise tais direitos;
4. Enquadrando-se o objeto da Requerida perícia no âmbito da matéria em discussão na causa, quanto à factualidade ainda não assente e relevante para o exame e decisão da causa, esse meiode prova só poderá ser indeferido, se for impertinente ou dilatório;
5. O direito à prova constitucionalmente reconhecido (art. 20.º da CRP) faculta às partes a possibilidade de utilizarem em seu benefício os meios de prova que considerarem mais adequados tanto para a prova dos factos principais da causa, como, também, para a prova dos factos instrumentais ou mesmo acessórios.
6. O que releva, fundamentalmente, para a admissão da prova pericial requerida é que a mesma se reporte ao núcleo fundamental da questão que se pretende ver esclarecida;
7. A Recorrente cumpriu no seu requerimento com todos os formalismos legais previstos nos artigos 467.º e seguintes do CPC;
8. A decisão recorrida recusou, sem fundamento pertinente, a realização de uma diligência de prova importante para a apreciação de factualidade constante do primeiro tema de prova fixado pelo tribunal recorrido;
9. O despacho recorrido é ilegal e infundamentado, tendo influência direta nas condições de decisão da causa, uma vez que recusou indevidamente a realização de uma diligência de prova legalmente requerida pela Autora, violando assim diretamente os artigos 20.º da CRP e 467.º e seguintes do CPC, 341.º e 388.º do Código Civil».

2. Pela Ré GENERALI SEGUROS, S.A., foram apresentadas contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos:
«a) Veio a Recorrente, em sede de petição inicial, alicerçada nos artigos 467.º e seguintes do CPC, requerer a elaboração de relatório técnico-científico de reconstituição do acidente de viação sub judice, evidenciando que esse exame pericial se destina a fazer prova da matéria de facto respeitante à dinâmica do acidente.
b) Contudo, em sede de despacho saneador, o Tribunal a quo indeferiu o meio de prova requerido, fundamentando que a prova da dinâmica do acidente não comporta factos para os quais se exijam conhecimentos especiais que o Tribunal não possui, indo, assim, ao encontro do consignado no artigo 388.º do CC.
c) Sucede que, o meio de prova requerido pela Recorrente, isto é, elaboração de relatório de reconstituição de acidente de viação, não pode ser classificado como prova pericial, conforme tem vindo a ser pugnado pelos Tribunais Superiores, razão pela qual não pode ser admitido, e ordenado, o meio de prova requerido pela Recorrente.
d) Efectivamente, a percepção da dinâmica do acidente, portanto, das causas que estiveram na sua origem, não pressupõe conhecimentos especializados que estejam além da percepção do Tribunal a quo, sendo certo que também não afasta a possibilidade de se socorrer de parecer técnico.
e) Ou seja, dispõem as partes, e o Tribunal a quo, de outros meios de prova para percepção da dinâmica do acidente, de entre os quais a prova testemunhal, não lhes sendo lícito socorrer-se de um meio de prova não admissível.
f) Termos em que, a Recorrida pugna pela manutenção do despacho saneador, sobretudo pelo indeferimento do meio de prova requerido pela Recorrente».

3. Observados os vistos, cumpre decidir.
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II.1. – Objeto do recurso
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objeto do recurso se limita pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo daquelas questões cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, a única questão a apreciar no presente recurso é a de saber se deve ou não ser revogado o despacho recorrido, substituindo-se por outro que admita o requerido meio de prova.
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II.2. – Incidências processuais relevantes
A tramitação processual relevante para a decisão do presente recurso será indicada na oportunidade, para evitar repetição inútil.
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II.3. – O mérito do recurso
Pretende a Recorrente por via do presente recurso que os meios de prova por si requeridos e parcialmente rejeitados pelo despacho recorrido, devem ser admitidos nos termos em que os requereu, devendo concretamente ser admitida a prova pericial requerida.
Sustentando a sua pretensão recursiva, a Apelante sintetizou a tramitação antecedente ao despacho recorrido, nos seguintes termos, que reproduzimos, pois contêm o essencial do requerimento e fundamentos que oportunamente aduziu:
«Com a oferecimento dos seus meios de prova (in casu com a apresentação da petição inicial), a Autora, ora Recorrente, requereu sob a epígrafe “Prova Pericial” que, ao abrigo do disposto no art. 467.º e seguintes do CPC, fosse elaborado um relatório técnico-científico de reconstituição do acidente de viação em apreço nos presentes autos.
Para fundamentar esse seu pedido, a Autora teve o cuidado de esclarecer que esse exame pericial se destinava “…a efetuar a prova da matéria de facto respeitante à dinâmica do acidente de viação em crise nos presentes autos.”, acrescentando que a realização de tal exame pericial iria permitir “…ao tribunal apurar quais as causas que determinaram o acidente de viação em apreço nos presentes autos, designadamente:
“i. pela avaliação técnica a realizar ao veículo interveniente;
ii. pela análise às características físicas da faixa de rodagem, sua localização, visibilidade e sinalização;
iii. pelo estudo do comportamento da condutora interveniente (tempos de reação, travagem, manobras, distâncias, etc.) e da aqui Autora, enquanto peã;
iv. pelo cálculo da velocidade aproximada a que circulava o veículo ligeiro de matrícula …QS;
v. pela estimativa da velocidade e reação que teria sido adequada para evitar o acidente;
vi. pela relação entre os danos materiais sofridos pelo veículo atropelante, partes amolgadas, zonas de deformação e velocidade de impacto.”
Acresce que, a Autora, nessa peça processual, esclarecia que a produção desse meio de prova também poderia “…ser útil para as partes poderem contraditar a prova testemunhal que irá ser produzida em sede de audiência de discussão e julgamento.”
Para tanto, a aqui
...

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