Acórdão nº 3758/21.0T8VNF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2022-07-13

Ano2022
Número Acordão3758/21.0T8VNF-A.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES

I. Relatório

Nos autos de Processo de Promoção e Protecção instaurado pelo Ministério Público, relativo ao menor M. F., nascido em ..-09-2018, filho de H. M. e de I. C., residente com a familia de acolhimento, S. R. e R. A., na Rua …, n.º …, Guimarães, veio requerer-se a abertura de instrução nos termos do art. 107.º, da LPCJP, com a audição dos progenitores, da coordenadora do caso, realização de relatório, com vista a aplicação de medida de protecção do menor que se venha a julgar mais adequada.
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Para o efeito de se proceder à audição dos progenitores, das anteriores Gestoras de Caso, Drª.s E. R. e C. G., e actuais Gestoras de Caso, como requerido pelo M.º P.º, foi designado o dia 16.2.22 para esse efeito.
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Tal como consta da respectiva acta - acta de acordo de promoção e protecção - o Mmº Juiz procedeu à audição de todos os presentes, constando da referida acta que estiveram presentes os progenitores, H. M., I. C., as coordenadoras do caso, Dra. P. A. e Dra. S. M., a técnica da CPCJ, Drª. E. R., e a família de acolhimento, S. O. e R. A..
Após, considerando o adiantado da hora, foi a diligência interrompida e designado o dia 16-03-2022 para continuação.
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Antes da data designada para continuação da diligância, a família de acolhimento veio juntar aos autos um requerimento, nos termos e para os efeitos do disposto no n.º 1 do artigo 104.º e no n.º 1 e n.º 3 do artigo 107º da Lei n.º 147/99, de 01 de Setembro (LPCJP), pedindo que fosse concedido prazo para junção aos autos de relatório pedopsiquiátrico, face ao facto do menor estar a ser seguido em consultas de neurocirurgia pediátrica e pedopsiquiatria desde Dezembro de 2018 e ter tido uma evolução favorável do seu estado de saúde e do seu desenvolvimento cognitivo decorrente após a sua inserção na família de acolhimento que entendem relevar para que sejam os mesmos ouvidos em audiência de julgamento e juntem os meios de prova que entendam por convenientes, por forma a permitir ao tribunal decidir convenientemente o futuro do H. M..
Nessa sequência, requereu-se a tomada de declarações dos requerentes na sessão de audiência de julgamento, designada para 16/03/2022, bem como a audição das testemunhas que indicam (educadora de Infância do menor na Creche Jardim de Infância …, em Guimarães e a médica de neurocirurgia pediátrica.
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No dia designado, aberta a presente audiência, pelo magistrado do Ministério Público foi pedida a palavra, a qual lhe foi concedida e no uso da mesma disse:

“O Ministério Público pronuncia-se sobre o requerimento feito por S. R. e R. A. no sentido de o mesmo ser indeferido na sua totalidade porquanto:
1- Não são partes neste processo;
2- Não são guardadores de facto no invocado artº 5º da Lei LPCJP, mas são guardadores de direito;
3 - Porque têm um estatuto específico de família de acolhimento nos termos do artº 47º da lei de promoção e proteção;
4 - Nos termos do DL n.º 11/2008 de 17 de janeiro que regulamenta a execução do acolhimento familiar daí que mesmo a citação de um acórdão de 2002 não retira esse estatuto;
5 - Será de indeferir também o requerimento pela família de acolhimento, uma vez que segundo o artº 3º de tal regulamento esta medida tem por base a previsibilidade do regresso da criança à família natural, quando esta tenha condições, ou é mesmo no pressuposto da execução e preparação da criança para autonomia de vida;
6 – Tanto não é cuidadora de facto esta família, porquanto como toda a família de acolhimento é selecionada pelas instituições de enquadramento o que foi o caso, resulta do regulamento referido, designadamente dos seus direitos e obrigações descritos nos artºs 20º e 21º, que as mesmas não têm autonomia como parte, devendo prestar as suas informações à instituição de enquadramento (serviços da Segurança Social), entendemos nós também que por esse facto nem sequer têm legitimidade para recorrer;
7 – A família de acolhimento, segundo ao artº 38º, têm um contrato de prestação de serviços daí que este contrato até está sujeito a cessação por violação das obrigações contratuais assumidas ou perda de requisitos e condições, conforme o artº 41º do regulamento;
8 – Para além do mais a fase dos invocados artºs 104º e 107º da LPCJP está ultrapassada, o relatório é do artº 108º que foi apresentado;
9 – Estamos na fase do artº 11º- B e artº 112 da lei de promoção e proteção;
10- Reunião com pais e Ministério Público para eventual negociação de medida como foi requerido no requerimento inicial;
11 – Por último e em face do estipulado no artº 88º da LPCJP atento o carácter reservado do processo, mais se requerer que quem não é parte não têm de estar presente nesta reunião.”.
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Após pronúncia por parte da mandatária da família de acolhimento, pelo tribunal a quo foi proferido o seguinte:

DESPACHO

Em face dos requerimentos apresentados pela representante da família de acolhimento e da resposta apresentada pelo Ministério Público, oferece-nos dizer o seguinte:
a) Conforme resulta dos autos, foi promovido pelo Ministério Público a convocação de uma conferência para audição dos progenitores, das anteriores gestoras de caso, bem como das atuais gestoras de caso; na sequência de tal promoção, foi proferido despacho, o qual acedeu à promoção subscrita e designou diligência para audição das referidas pessoas indicadas pelo Ministério Público; a conferência iniciou-se no pretérito dia 16 de Fevereiro do corrente ano e da leitura da acta verifica-se que para além das pessoas sugeridas pelo Ministério Público para intervir na diligência promovida estiveram também presentes a família de acolhimento, representadas pela Drª A. R.. Decorre, pois, do agendamento da diligência que a família de acolhimento não foi convocada para esta diligência. Todavia, e uma vez que este processo tem como escopo principal acautelar os interesses do H. M., sendo que o mesmo tem estado ao cuidado da família de acolhimento desde os 3 meses de idade, haverá todo o interesse no sentido de chegar a uma solução consensual que os mesmos permaneçam nesta diligência, com vista a aquilatar-nos do atual estado físico, psíquico e emocional da criança, sendo que esta família poderá ser, naturalmente, quem nos poderá trazer melhores elementos sobre tais desideratos.
b) No que concerne às diligências requeridas pela família de acolhimento, e atento o momento processual em que nos encontramos (audição de todos os intervenientes com vista à chegada de uma solução consensual), diremos que a mesma é intempestiva, surge fora dos prazos indicados pela LPCJP, pelo que se indefere na sua totalidade.
Notifique.
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De seguida, o Ministério Público veio arguir a nulidade de omissão de pronúncia da decisão proferida nos termos do artº 615º, n.º 1, al. d), do C.P.C., face à questão suscitada de legitimidade dos requerentes S. R. e R. A. serem partes, requerendo que se exercitasse o carácter reservado do processo.
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De novo ouvidas as mandatárias presentes, pelo tribunal a quo foi proferido o seguinte:

DESPACHO

Em face do alegada nulidade invocada pelo Ministério Público, julgamos que a mesma não ocorre, porquanto no nosso despacho entendendo que a legitimidade da família de acolhimento para estar presente, para a qual não foi convocada, advém da circunstância de estar a cuidar desta criança desde os seus 3 meses de idade (repetimos), e ser esta família, provavelmente, as pessoas mais indicadas para nos fornecerem os elementos mais atuais sobre o estado físico, psíquico e emocional (repetimos) da criança.
Deste modo, e salvo melhor opinião, reiteramos que não existe a apontada nulidade. Notifique.
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Arguida a nulidade por falta de total fundamentação de direito, foi proferido o seguinte
DESPACHO

Em complemento dos anteriores dois despachos por nós proferidos, e na sequência do requerimento apresentado pelo Ministério Público, diremos que a legitimidade da família de acolhimento para intervir nesta diligência resulta da leitura que fazemos dos artºs 107º, n.º 3 e 112º da LPCJP.
Notifique.
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Após, em face do desacordo entre as partes quanto à aplicação de uma medida de promoção e proteção ou tutelar cível adequada ao interesse da criança, nos termos do n.º 1, do artº 114º, da LPCJP, o tribunal a quo determinou a notificação das partes para, em 10 dias, alegarem, por escrito, querendo, e apresentarem prova, e a solicitação à Ordem de Advogados a indicação de um defensor oficioso com vista a ser nomeado à criança.
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II- Objecto do recurso

Não se conformando com o decidido, o Magistrado do Ministério Público veio apresentar recurso, concluindo nos seguintes termos

1.º - Para efeitos da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (doravante LPCJP), a "família de acolhimento" não se considera "guarda de facto" da previsão do seu art.º 5.º, nem se considera como "quem tenha guarda de facto".
2.º - Para efeitos da LPCJP "família de acolhimento" são "famílias que não tenham qualquer relação de parentesco com a criança...e não...

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