Acórdão nº 3685/18.8T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-11-02

Ano2023
Número Acordão3685/18.8T8VCT.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

1 RELATÓRIO

AA e BB vieram propor contra EMP01..., Lda., EMP02..., Companhia de Seguros, S.A., Companhia de Seguros EMP03..., S.A. e Fundo de Garantia Automóvel a presente acção declarativa de condenação[1], peticionando que as RR. sejam condenadas a pagar, solidariamente, à primeira A., a quantia global líquida de € 48.876,09, e a quantia ilíquida correspondentes à incapacidade permanente e esforços acrescidos e ao valor dos tratamentos, internamentos, acompanhamento médico e medicamentoso, que, no futuro, sejam necessários em consequência das lesões sofridas, a liquidar posteriormente, e juros legais desde a citação, e à segunda A., a quantia líquida de € 5.752,51, acrescida de juros legais desde a citação.
A primeira A. alega, para o efeito e em síntese, que no dia .../... de 2016, pelas 09.15 horas, na estrada municipal, sita no lugar ... (...), quando conduzia o veículo de matrícula ..-..-ZR deparou-se com a máquina retroescavadora de marca ..., sem matrícula, com o nº de quadro ...70, manobrada por CC, atravessada na via, pelo que tentou desviar o veículo que conduzia o mais para a direita possível, atento o seu sentido de marcha, a fim de evitar o embate, não o tendo conseguido. Em consequência do embate, a primeira A., alega, sofreu lesões físicas, foi submetida a cirurgias, esteve internada em hospital, realizou fisioterapia, mas ficou com sequelas e limitações neurológicas e funcionais na mão e cotovelo, sentiu e sente dores, ficou incapaz de conduzir e de usar o braço esquerdo e a mão para tarefas repetitivas e de algum esforço. Ficou ainda, alega, com uma limitação permanente na extensão e flexão do cotovelo, atrofia da mão e lesão grave dos nervos cubital e radial esquerdos, tendo ainda de ser submetida a novos tratamentos e cirurgias. Pagou consultas, tratamentos e cirurgias.
A segunda A. alega, para o efeito e em síntese, que é proprietária do veículo de matrícula ..-..-ZR, que o mesmo teve de ser reparado em consequência do embate supra descrito, tendo despendido a quantia de € 3.552,51. Alega, ainda, que o referido veículo esteve imobilizado durante 220 dias, pelo que teve um prejuízo de € 2.200,00.

Regularmente citadas, contestaram as RR.
A R. EMP02... defendeu-se por excepção, alegando a inexistência de contrato de seguro celebrado e incidente sobre a máquina interveniente no evento, e por impugnação.
O R. FGA invocou a ilegitimidade (processual e substantiva) para se encontrar em juízo e por impugnação.
A R. EMP01..., Lda. invocou a sua ilegitimidade e defendeu-se por impugnação.
A R. EMP04..., S.A. defendeu-se por excepção invocando a sua ilegitimidade para ser considerada parte no presente pleito e por impugnação.

Em sede de resposta, vieram as AA. requerer a intervenção principal de CC, como associado do R. FGA, o que foi admitido por despacho de 11-03-2019.

O Chamado foi citado editalmente e apresentou contestação onde invocou a sua ilegitimidade e se defendeu por impugnação.

Em sede de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, no qual se julgou procedente, por verificada, a excepção de ilegitimidade passiva da R. EMP02..., absolvendo-se esta da instância, sanada, pela intervenção do Chamado CC, a excepção de ilegitimidade passiva do R. FGA, e improcedentes, por não verificadas, as excepções de ilegitimidade pelas restantes RR. e pelo Chamado. Definiu-se o objecto do processo e procedeu-se à selecção dos Temas de Prova.

Foi realizado o exame médico-legal na pessoa da A. e junto aos autos o correspondente relatório pericial.

A primeira A., notificada que foi do relatório médico-legal, apresentou articulado superveniente, alegando factos que sustentou no dito relatório e requereu a ampliação do pedido, cifrando-se este, agora, num montante global líquido de € 117.914,21, e a condenação das RR. a pagar, solidariamente, ou a ministrar directamente à A. todo o tipo de tratamentos, internamentos, acompanhamento médico e medicamentoso, relacionados com as sequelas da primeira A. e cuja liquidação requereu que se remetesse para execução de sentença.
Dado o contraditório, foi o articulado superveniente admitido, ao abrigo do disposto no art. 588º do CPC, os factos alegados incluídos nos temas de prova, bem como a ampliação do pedido, ao abrigo do disposto no art. 265º/2, segunda parte, do mesmo diploma legal.

Procedeu-se a julgamento, que se prolongou por 4 sessões, com observância de todas as formalidades legais.

No final, foi proferida a seguinte decisão:
Em face do exposto, julgo a acção proposta por AA contra EMP01..., Lda., Fundo de Garantia Automóvel e CC, parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente condeno os Réus a pagarem à Autora, solidariamente, a quantia global líquida de € 106.949,48, acrescida de juros contados desde data da citação sobre a quantia de € 66.949,48, e desde a data da prolação da presente decisão sobre a quantia de € 40.000,00, à taxa legal de 4%, até integral e efectivo pagamento, e, ainda, a quantia cuja fixação se remete para decisão ulterior, nos termos do disposto no artigo 564º, nº 2, do Código Civil, e que corresponder às despesas que a Autora comprovar ter despendido com tratamentos médicos (ortopédicos e fisiátricos) em face da evolução para artrose da lesão sofrida no cotovelo esquerdo.
Absolvo a Ré EMP05..., S.A. dos pedidos contra si deduzidos.
Em face do exposto, julgo a acção proposta por BB contra EMP01..., Lda., Fundo de Garantia Automóvel e CC, parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, consequentemente condeno os Réus a pagarem à Autora, solidariamente, a quantia global líquida de € 3.360,00, acrescida de juros contados desde data da citação, à taxa legal de 4%, até integral e efectivo pagamento.
Absolvo a Ré EMP05..., S.A. dos pedidos contra si deduzidos.
Custas na proporção do decaimento, sem prejuízo do decidido administrativamente quanto ao apoio judiciário.
Registe e notifique.
*

Inconformado com essa sentença, apresentou a R. EMP01..., Lda. recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões:

1. A sentença enferma de nulidade por violar o princípio do contraditório previsto no n.º 3 do artigo 3.º do CPC e com assento constitucional no n.º 4 do artigo 20.º da CRP;
2. Igualmente, padece a sentença de nulidade, por inobservar o princípio do dispositivo e da autorresponsabilidade das partes, previsto no artigo 5.º do CPC, assim como o princípio da igualdade de armas e do processo equitativo, conquanto o Tribunal a quo faz-se substituir às Recorridas, desonerando-as da alegação e da prova;
3. A sentença viola o princípio da proporcionalidade, consagrado no artigo 18.º da CRP;
4. A decisão recorrida não cumpre o princípio da legalidade constitucionalmente plasmado, na medida em que, com o devido respeito, viola as regras relativas ao ónus da prova (vide artigos 342.º e ss. CC) e à força probatória dos documentos (vide artigos 369.ºe ss. CC);
5. Idem, padece a sentença de falta de fundamentação, de modo que, com o devido respeito, faz padecer a sentença de nulidade, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC;
6. A decisão recorrida, com o devido respeito, padece de nulidade por manifesta contradição entre a fundamentação e entre a fundamentação e a decisão, nos termos do disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC;
7. Ainda, padece a sentença de nulidade por excesso de pronúncia, nos termos da alínea e) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC;
8. O Tribunal a quo, s.m.o., errou na apreciação da prova. Desta feita, deverão os identificados pontos de facto incorretamente julgados serem substituídos pela decisão que a Recorrente acima propõe, absolvendo-se a mesma, em conformidade.
Assim se fazendo JUSTIÇA!
*

Igualmente inconformado com essa sentença, apresentou o R. FGA recurso de apelação contra a mesma, cujas alegações finalizou com a apresentação das seguintes conclusões:

i. O acidente em crise nos presentes autos não se trata de um acidente de viação, resultante da capacidade de circulação terrestre própria dos veículos com motor, mas de um acidente resultante do modo de laboração próprio de uma máquina industrial, do risco inerente ao seu específico funcionamento e utilização como instrumento de trabalho;
ii. A máquina retroescavadora encontrava-se em laboração quando ocorreu o acidente, sendo que os danos provocados pela mesma não decorrem de qualquer movimento de circulação do mesmo enquanto veículo, antes decorrendo do desempenho da sua atividade própria e específica de máquina industrial;
iii. O FGA não pode ser responsabilizado pelo ressarcimento dos danos emergentes do acidente dos autos (ainda que como garante);
iv. O acidente dos autos e os danos deles decorrentes inserem-se no âmbito do risco do veículo/máquina enquanto engenho mecânico no exercício industrial a que está adstrito;
v. Não estando o seu proprietário obrigado a celebrar qualquer contrato de seguro de responsabilidade civil automóvel que titule a utilização dessa máquina e, em consequência, não se
encontrando o aqui recorrente legalmente obrigado a garantir a responsabilidade civil emergente da utilização dessa máquina;
vi. Tendo em consideração que entre a Ré EMP01... e a ré EMP05..., S.A. foi celebrado o contrato de seguro do ramo Responsabilidade Civil/Construção, titulado pela apólice ...53 – conforme o facto provado eee) – qualquer eventual responsabilidade de reparação dos danos emergentes do acidente em crise teria necessariamente de recair sobre a ré Seguradora;
Sem conceder,
vii. Devem ser considerados não provados os factos descritos na sentença como matéria de facto provada sob as alíneas h), i) - salvo a menção à data, o local não era policiado - e n);
viii. Ademais, tal decorre da inexistência de prova nesse sentido que resulte do depoimento de DD, na...

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