Acórdão nº 3650/16.0T8VCT-G.G2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2024-04-04

Data de Julgamento04 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão3650/16.0T8VCT-G.G2
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação de Guimarães

1. Relatório

Por apenso ao Processo de Homologação do Acordo Extrajudicial de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais, AA deduziu Acção de Alteração das Responsabilidades Parentais contra BB, pedindo a alteração dos alimentos por si devidos aos menores, no valor de € 135,00 para cada um deles, para o valor mensal de € 80,00, e que no mês das férias de verão, em que os menores permanecem a seu cargo durante um período ininterrupto de 15 dias, o montante devido a título de alimentos, por cada um dos menores, fosse reduzido a metade.

Alegou para tanto que: requerente e requerido são pais dos menores CC e DD; por decisão proferida a 12/09/2013 no Processo de Homologação de Acordo Extrajudicial de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais n.º 1949/13.... foi homologado o acordo relativamente ao menor CC; e por decisão proferida 22/11/2016, no âmbito do Processo de Homologação de Acordo Extrajudicial de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais n.º 3650/16...., de que os presentes são apenso, foi homologado o acordo quanto ao menor DD, tendo o requerente ficado obrigado a pagar a quantia de € 135,00 mensais a título de alimentos; no apenso B do processo n.º 3650/16...., a 31/10/2016, foi actualizado o montante dos alimentos para o menor CC, tendo o requerente ficado obrigado a pagar a quantia de € 135,00 mensais.

Mais alegou que: em Abril de 2019 mudou-se para o ..., onde passou a residir, de favor, em casa dos pais da sua actual companheira, sem pagar renda ou outra prestação; em maio de 2022 comprou a fracção autónoma que identifica, sita em ..., ..., onde passou a residir em junho de 2022; para a aquisição da dita fracção recorreu ao crédito bancário, suportando mensalmente por conta desse empréstimo o montante de € 404,52, acrescido do montante de cerca de € 51,25 por mês a título de seguros (vida e imóvel); o requerente continua a exercer a sua actividade profissional em ..., para onde se desloca em automóvel próprio, despendendo por mês € 557,48; em dois sábados em cada mês, quando os menores se encontram consigo, o requerente tem de se deslocar a ... para aqueles participarem nos treinos e jogos de futebol, no que despende € 77,00; o requerente tem despesas de electricidade, água gás, televisão, internet e telemóvel, vestuário, alimentação e higiene, que indica, no total de € 346,00; aquando da regulação das responsabilidades dos menores ficou estabelecido que o requerente pagaria metade das despesas escolares e de saúde dos mesmos, mediante a apresentação de comprovativos por parte da progenitora; indica as quantias que pagou a título de despesas extra; o requerente aufere o salário base ilíquido de € 705,00, a que acresce subsídio de alimentação de €4,77; o requerente suporta despesas médicas e medicamentosas dos menores de € 70,00 em média; as despesas totais, incluindo os alimentos devidos aos menores, ascendem a € 1706,25.

A requerida citada, apresentou alegações, dizendo, em síntese, que: se, eventualmente, o Requerente viu a sua situação económica substancialmente diminuída, foi ele que se colocou nessa circunstância, já que continua a efetuar alterações à sua vida pessoal, sem ter qualquer preocupação com os seus filhos; o Requerente omitiu deliberadamente que adquiriu habitação com a atual companheira em ..., querendo fazer crer que liquida sozinho todas as despesas da casa de morada de família, o que é falso; e no último artigo das suas alegações afirma: o ”requerente litiga de má fé, o que expressamente se invoca para todos os efeitos legais.”

O Ministério Público promoveu “se julgue infundado o pedido de alteração, ordenando-se o arquivamento dos autos – art. 42.º n.º 4 RGPTC.”

Foi designada data para conferência de interessados, a qual se realizou, tendo sido proferida decisão com o seguinte teor:
“Determinamos o arquivamento dos autos (art. 42º, n.º 4 RGPTC).”

O requerente interpôs recurso da referida decisão.

Nesta RG foi proferida decisão sumária que julgou “procedente o recurso de apelação, nos termos expostos, revogando-se a decisão recorrida, devendo os autos prosseguir nos termos do art.º 42º n.º 5 do RGPTC.”

Devolvidos os autos ao tribunal a quo, foi designada data para inquirição de testemunhas, a qual teve lugar.

A 26/07/2023 foi proferida sentença com o seguinte decisório:
“Consideramos improcedente a pretensão de AA
Custas pelo progenitor. Notifique a fim de poder pronunciar-se sobre eventual litigância de má fé.”

O requerente pronunciou-se dizendo, em síntese, que: a notificação para se pronunciar sobre a eventual litigância de má fé, contra si arguida pela requerida em sede de alegações, foi realizada depois de ter sido proferida e notificada a sentença; essa sentença é omissa quanto ao pedido de condenação do requerente como litigante de má fé; após a prolação da sentença já não é lícito ao tribunal conhecer da alegada litigância de má fé, por estar esgotado o poder jurisdicional; quando a parte, na pendência da causa, assume uma conduta processual susceptível de ser subsumida ao disposto no art.º 542º, n.º 1 do CPC, é na sentença que põe termo ao processo que o juiz deve fazer essa apreciação, o que é corroborado pelo n.º 3 do art.º 543º do CPC; caso venha a ser proferida decisão que condene o requerente como litigante de má fé, tal decisão enfermará de nulidade por excesso de pronúncia; o requerente não age de má fé; o facto de não ter conseguido provar o que alegou, não é fundamento para condenar o requerente como litigante de má fé; o requerente não actuou com intenção ou consciência de deduzir uma pretensão absurda ou infundada, cuja falta de fundamento não ignorava ou não devia ignorar; nunca teve intenção de ocultar a compra da fracção autónoma em ... em conjunto com a sua companheira, nem a venda do apartamento em ...; vivendo em casal, as despesas são asseguradas por ambos, nunca tendo sido intenção do requerente alegar o contrário; não existe qualquer facto provado que evidencie a má fé do requerente; não se vislumbra como é que se poderá considerar a actuação do requerente como dolosa.

A 20/09/2023 foi proferida a seguinte decisão:
AA veio – contra BB – pedir a redução da mensalidade relativa a alimentos para os dois filhos.
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Trouxe como argumentação:
10.- Em Abril de 2019 mudou-se para o ..., onde passou a viver em casa dos pais daa actual companheira, sem pagar renda ou outra prestação.
11.- … manteve-se aí a residir até … Maio de 2022.
12.- 13.- E em Junho de 2022 passou para ..., após aí comprar um andar.
14.- Recorreu ao crédito … suportando mensalmente por conta desse empréstimo … €404,52 acrescido de €51,25 de seguros (doc 5 e 6 que indicam tais valores como os totais a pagar).
15.- … tem ainda as seguintes despesas mensais fixas, luz (€37) água (€20) gás (€34) tv, internet, telemóvel (€25).
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A matéria comprovada nos presentes:
6-8, 11, 18, 19- Por escritura de Maio de 2022 o A e companheira compraram andar em ... (...). (12) E aí passou a habitar no mês seguinte. (13) O A recorreu para tanto a crédito, correspondendo a prestação a €404,52 e o seguro correspondente, a €51,25 por mês. (14) O A tem despesas com electricidade, água, gás, tv, internet, telefone. (23) Ele e a companheira compraram andar em .... (c19) E com esta divide o pagamento do empréstimo e seguro correspondente e das despesas com os abastecimentos domésticos (água, electricidade, gás, tv …).
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A invocada gratuitidade quanto a casa (no ...) fornecida pelo pai da companheira é desmentida pelo próprio AA (e pela companheira também) no alegado em anterior processo de alteração (ap. E). Recorda-se o que articulou então (Outubro de 2019):
23º…deixou ...…passou a residir com companheira no ...…24º actualmente tem de comparticipar nas despesas mensais do seu agregado…37º suporta renda de € 350…
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Apesar do exposto por AA (ausência de verdadeiro dolo e de qualquer facto que evidencie má-fé) constata-se clara divergência entre o alegado e a realidade comprovada (as despesas com a casa e o empréstimo não lhe cabem na íntegra, antes são partilhados com a companheira) e entre alegações em alterações distintas (2022 e 2019) e entre casa de graça e comparticipação efectiva em gastos com habitação. A disparidade não pode deixar de se considerar consciente, tal como a finalidade de adequar a sua visão (distorcida) da realidade à finalidade proposta: redução das responsabilidades subsequente a debilitação da situação económica. A conduta adequa-se à previsão da al. a) do n.1 do artigo 542º CPC e exige condenação em multa, em montante humilde (art. 27º RCJ).
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Interpelado AA, veio manifestar-se pela extemporaneidade da apreciação da má-fé após a decisão relativa à pedida alteração das responsabilidades. É manifesto que a decisão tem de ser posterior à identificação dos factos e à possibilidade de as partes se pronunciarem. O esgotamento do poder jurisdicional refere-se apenas à matéria da causa, a alteração do regime de regulação, mantendo-se a decisão e fundamentos imutáveis com a apreciação posterior da conduta processual exageradamente inapropriada e censurável da parte.
A aceitar-se a leitura do A, a vigência da norma (art. 542º) ficaria dependente do consentimento do mesmo. Se o tribunal lhe garantisse o contraditório, o acesso ao direito e à defesa, resvalaria para a incapacidade/esgotamento para apreciação da constatada conduta nefasta na lide; se decidisse sobre a má-fé de imediato, sem facultar a hipótese de prévia pronúncia, cairia em vício de omissão do contraditório, no desrespeito da lei fundamental e na promoção da proibição da indefesa.
Tem-se como correcta a leitura do ac. R.C. de 16-03-2021 (F. Ramos) proc. 2504/20.0T8CBR, in dgsi.pt: … não podia de imediato proferir decisão condenatória quanto à litigância de má-fé, por carecer de garantir o...

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