Acórdão nº 361/22.0T8GDAM.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 09-03-2023

Data de Julgamento09 Março 2023
Ano2023
Número Acordão361/22.0T8GDAM.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso de Apelação
ECLI:PT:TRP:2023:361.22.0T8GDM.P1
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Sumário:
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Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:
AA, titular do cartão de cidadão n.º ... e contribuinte fiscal n.º ..., e mulher BB, titular do cartão de cidadão n.º ..., contribuinte fiscal n.º ..., residentes em Gondomar, instauraram acção declarativa com processo comum contra a A... Unipessoal, Lda., pessoa colectiva com identificação e contribuinte fiscal n.º ..., com sede em ..., Gondomar, pedindo a condenação da ré a (1) «reconhecer o abandono da obra e a consequente perda de interesse dos autores na manutenção do contrato com aquela», (2) «proceder à restituição das verbas recebidas por conta dos trabalhos adjudicados na empreitada e não realizados que se consubstanciam no montante de €7.250,00», (3) pagar «os prejuízos causados aos autores, mormente, nos valores pagos a terceiro para a realização dos trabalhos da responsabilidade da ré, que se computa no montante de €14.145,00», (4) pagar «a título de indemnização pelo incumprimento do contrato na quantia, nunca inferior a €2.500,00», (5) pagar «juros de mora desde a data da interpelação admonitória, até efectivo e integral pagamento».
Para fundamentar o seu pedido alegaram, em súmula, que celebraram com a ré um contrato de empreitada para execução das obras da especialidade de pedreiro para edificação de uma moradia, por conta de cujo preço e nos termos estabelecidos pagaram à ré €63.625,00, apesar do que a ré não executou parte dos trabalhos contratados (caixa de saneamento, escadaria frontal e coretes, entre outros) e em meados de Março de 2021 deixou de enviar trabalhadores para a obra e retirou desta ferramentas e utensílios, nomeadamente, betoneira, andaimes, martelos, pás, picaretas, etc., tendo sido interpelada pelos autores para retomar os trabalhos, sob pena de abandono da obra, mas não os retomou. Os autores tinham pago à ré €7.250,00 por trabalhos que esta não realizou e tiveram de contratar com terceiros a sua execução, no que despenderam o montante global de €14.145,00.
A ré foi citada e apresentou contestação, impugnando grande parte dos factos alegados, negando a versão da autora de ter havido abandono da obra, sustentando que apenas estavam por concluir uma parte do chão da garagem, a escadaria frontal, a rampa de acesso e uma corete, defendendo a improcedência da acção.
No despacho saneador conheceu-se parcialmente do mérito da causa, tendo-se julgado improcedentes «os pedidos de condenação da ré no pagamento das quantias de €4.920,00 (parte do terceiro pedido) e de €2.500,00 (quarto pedido)» deles se absolvendo a ré, determinando-se o prosseguimento da lide «para o conhecimento do primeiro pedido (eficácia da resolução), do segundo pedido (restituição de quantias pagas por trabalhos não realizados) de parte do terceiro pedido (no valor de €9.225,00) e do quinto pedido (juros de mora)».
Realizado julgamento, foi proferida sentença, tendo a acção sido julgada parcialmente procedente «declarando-se eficazmente extinto por resolução o contrato de empreitada celebrado entre a ré e os autores» e «condenando-se a ré a pagar aos autores a quantia de €4.175,00, acrescida de juros desde a citação».
Do assim decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:
I. A douta sentença de que ora se recorre não considerou a totalidade dos valores pagos pelos recorrentes a terceiros para as obras que deveriam ter sido realizadas e foram pagas à recorrida, bem como não considerou qualquer valor a título de indemnização pelo incumprimento contratual e danos.
II. A referida douta sentença apenas condenou a recorrida no pagamento da quantia de € 4.175,00 acrescidos de juros contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
III. Para tanto, a douta sentença fundamenta que estando provada a falta de apenas quatro trabalhos, o custo destes será de cerca de €6.150,00 (IVA incluído). Do preço dos trabalhos (excluído muros e anexos), isto é, €65.600,00 os autores pagaram €63.625,00. O mesmo é dizer que, estando apenas em falta os trabalhos referidos (no valor de €6.150,00), a quantia de €1.975 (65.600,00 – 63.625,00) não foi paga (antecipadamente). Já o valor restante €4.175,00 (6.150,00 – 1.975,00) foi pago, proporcionalmente, nos diversos pagamentos parcelares efectuados.
IV. Ainda que apenas no caso de se considerar que os recorrentes tiveram de pagar a terceiro mais do que teriam de pagar à recorrida, poder-se-á encontrar na diferença um dano indemnizável. No entanto, tal valor pago a terceiro foi usado para apurar o valor que seria devido à ré.
V. A conclusão vertida na douta sentença não teve em consideração o valor da obra no seu todo, mas apenas em parte da obra.
VI. É de senso comum que o valor por uma obra da envergadura da aqui em crise, é totalmente diferente do valor de apenas meros trabalhos a serem realizados - que em geral é sempre mais oneroso.
VII. Neste sentido, a douta sentença de que ora se recorre, não teve em consideração o valor que os recorrentes tiveram efectivamente de despender para terminar a referida obra (não só do que ficou por fazer e que foi confessado, mas toda a demais obra),
VIII. Os quais, foram muito superiores aos valores consignados aquando da elaboração do orçamento, bem como, na data em que os mesmos tiveram de ser (re)contratados (em face da crise em que vivemos face à pandemia e face a guerra na Ucrânia, com os inerentes aumentos dos materiais e custo de mão de obra).
IX. A douta sentença, não teve em consideração os documentos juntos aos autos, mormente as facturas dos trabalhos realizados por terceiros, com as quais poderia e deveria ter aferido a justa indemnização a atribuir aos recorrentes,
X. Bem como, não teve em consideração aos depoimentos prestados pelas testemunhas dos recorrentes, mormente, as declarações do Sr. CC, pessoa que teve de terminar o que foi deixado ao abandono pela recorrida.
XI. Já para não referir os custos que tiveram de suportar para a edificação de muros e anexos.
XII. A recorrida abandou a obra sem qualquer justificação.
XIII. Os recorrentes procederam ao pagamento dos trabalhos, incluindo trabalhos que não foram realizados pela recorrida.
XIV. A recorrida teve uma conduta reveladora de uma intenção firme e definitiva no sentido de não cumprir a obrigação contratual de concluir a respectiva obra, porquanto, verificou que o orçamento dado ficava aquém do que era expectável e que perdera dinheiro, conforme referiu o legal representante da recorrida.
XV. A paragem dos trabalhos e o subsequente abandono da obra por parte do empreiteiro ora recorrida, podem e devem, inequivocamente, ser interpretados como manifestação da sua intenção firme e definitiva de não cumprir a sua obrigação contratual de concluir a obra.
XVI. Por força da resolução do contrato de empreitada, ficou a recorrida automaticamente constituída na obrigação de indemnizar o dono da obra/recorrentes dos prejuízos que lhes causou, conforme decorre do disposto nos artigos 801º número 2 e 1223º do Código Civil.
XVII. Os recorrentes, por força do abandono da obra perpetrado pela recorrida, tiveram de contratar empresa terceira, para que concluísse as obras da responsabilidade daquela, tendo para o efeito, pago a quantia de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros) acrescidos de IVA, para a realização dos trabalhos de construção de escadaria, edificação de divisórias, edificação de coretes, chaminés, chão da garagem e floreira;
XVIII. Ainda, com o referido abandono de obra pela recorrida, tiveram ainda os recorrentes de contratar empresa terceira para a realização da rampa da garagem, o qual teve um custo de €4.000,00 (quatro mil euros) acrescidos de IVA, e não obstante saber a recorrida que a realização daquele trabalho era da sua responsabilidade e que se encontrava orçamentado e adjudicado.
XIX. Bem como, com o já referido abandono da obra, tiveram os recorrentes de contratar empresa terceira para proceder à edificação dos muros e dos anexos.
XX. Com as adjudicações referidas nos números XVIII e XIX, e conforme referido, tiveram os recorrentes prejuízos nos valores referidos, pois reitere-se, estavam estes valores incluídos na obra adjudicada.
XXI. O imóvel aqui em causa é para habitação própria e permanente dos recorrentes, sendo que para a edificação da mesma, tiveram, estes de recorrer a financiamento.
XXII. Em face do abandono da obra, viram-se os recorrentes na iminência de perder a última tranche do financiamento no valor de €30.000,00, o qual apenas não se verificou em face de os recorrentes terem conseguido novo empreiteiro para terminar a obra que havia sido adjudicada à recorrida.
XXIII. Sendo certo que a recorrida tinha conhecimento daquele “timing”.
XXIV. Em face do referido, deveria a sentença de que ora se recorre, ter condenado a recorrida no pagamento do montante de €7.250,00, (acrescidos de IVA) valor este pago pelos recorrentes a empresa terceira conforme factura junto aos autos, em face dos trabalhos e construção de escadaria, edificação de divisórias, edificação de coretes, chaminés, chão da garagem e floreira;
XXV. Deveria a recorrida ser condenada a pagar aos recorrentes a quantia de €4.000,00 (quatro mil euros) acrescidos de IVA, referente à construção da rampa da garagem, realizado por terceiro e que era da responsabilidade da recorrida.
XXVI. Pois que, se os pagamentos realizados para a obra eram de forma parcelar, os montantes recebidos pela recorrida, também se teriam por incluídos para a realização destas.
XXVII. Deveria a recorrida ser igualmente condenada a pagar aos recorrentes indemnização pelo incumprimento contratual por si perpetrado, cujo montante não deveria ser em quantia inferior a €2.500,00.
XXVIII. Pois a assim se não entender, para além de
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