Acórdão nº 3594/18.0T8ALM-B.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-03-10

Ano2022
Número Acordão3594/18.0T8ALM-B.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados

I - RELATÓRIO
CLUBE DESPORTIVO DA COVA DA PIEDADE - FUTEBOL SAD interpôs o presente recurso de apelação da sentença que julgou improcedente o incidente de oposição à penhora que deduziu, por apenso à ação executiva para pagamento de quantia certa que, sob a forma ordinária, contra o mesmo foi intentada pelo CLUBE DESPORTIVO COVA DA PIEDADE.
No requerimento executivo, apresentado em 15-05-2018, a Exequente, que se identificou como pessoa coletiva de direito privado e de utilidade pública (cf. Estatutos que juntou mediante requerimento apresentado a 22-01-2019 nos autos principais), veio pedir o pagamento da quantia exequenda no valor de 125.684,38 €, dando à execução o contrato de sociedade da Executada, com os respetivos Estatutos, e complementarmente o relatório do ROC anexo ao contrato e uma carta de interpelação dirigida à Executada na data da sua constituição (cf. também o requerimento de junção documental de 03-07-2018).
Após terem sido realizadas algumas diligências no sentido de confirmar se a Exequente beneficiava de isenção de custas, foi proferido, em 07-03-2019, despacho liminar, que ordenou a citação da Executada.
No seguimento da consulta da certidão do registo comercial da Executada (na qual consta como morada da respetiva sede o Largo 5 de Outubro, 53, freguesia de Almada, Cova da Piedade, Pragal e Cacilhas, concelho de Almada, distrito de Setúbal, Código Postal 2805-119 Almada) foi pela Agente de Execução, em 21-03-2019, enviada carta registada com a/r para citação, a qual veio devolvida, por não ter sido reclamada (cf. nota de citação de 21-03-2019 e junção documental de 24-04-2019).
Em 23-04-2019, foi enviada pela Sr.ª Agente de Execução nova carta registada para citação, nos termos conjugados dos artigos 246.º, n.º 4, e 229.º, n.º 5, ambos do CPC, a qual foi, no dia 03-05-2019, depositada no recetáculo postal existente na morada Largo 5 de Outubro, n.º 53, 2805-119, Cova da Piedade Almada (cf. junção de 30-05-2019).
Em 23-05-2019, a Executada deduziu oposição à execução mediante embargos (apenso A), requerendo que fossem “julgadas procedentes as exceções invocadas de inexistência de título executivo; inexequibilidade; inexigibilidade e iliquidez da obrigação”, bem como que fosse “atribuído efeito suspensivo aos presentes embargos, nos termos da alínea c) do n.º 1 do artigo 733º do CPC”.
Em 29-05-2019 foi, no processo principal, pela Sr.ª Agente de Execução efetuado “pedido de penhora eletrónica de saldos bancários”, o que reiterou em 30-05-2019, já com identificação expressa da entidade bancária (Millennium BCP), vindo a efetuar em 11-06-2019 comunicação a essa mesma entidade, com indicação do montante a penhorar de 54.092,73 €.
Em 03-06-2019, a Executada apresentou, no processo principal, requerimento de arguição de nulidade processual, em que invocou a ilegalidade da penhora de depósito bancário no valor de 54.092,73 €, alegando, em síntese, ter sido desconsiderado pela Sr.ª Agente de Execução, que, no dia 23-05-2019, a Executada havia apresentado oposição à execução com fundamento na manifesta falta de título executivo e pedido de suspensão da execução sem prestação de caução, nos termos do art. 733.º, n.º 1, al. c), do CPC; invocando o disposto no art. 195.º do CPC, requereu que fosse “declarada procedente a nulidade invocada, com a consequente nulidade de todo o processado posterior, ordenando-se a notificação da Sra. Agente de Execução para que proceda ao imediato levantamento da mesma, dando, assim, sem efeito a penhora de saldos bancários por manifestamente ilegal, devendo ainda o douto tribunal pronunciar-se quanto à atuação culposa da Sra. Agente de Execução”.
Em 14-06-2019, a Sr.ª Agente de Execução veio dar conta dos atos praticados com vista à citação da Executada, mais informando não ter sido notificada até essa data da “entrada de embargos de executado” e, ainda que o tivesse sido, “a execução só poderia ser suspensa por prestação de caução ou por ordem do Meritissimo Juiz de Direito (Art733 CPC)”, acrescentando não poder ser atendido o requerimento da Executada por falta de base legal, sem prejuízo do entendimento do Tribunal.
A Sr.ª Agente de Execução elaborou ainda, em 19-06-2019, auto de penhora com indicação do n.º da conta bancária e do respetivo saldo (no valor de 54.092,73 €), tendo, nessa mesma data, notificado à Executada a realização da penhora deste saldo.
Em 21-06-2019, no apenso A, foi proferido despacho que admitiu liminarmente os embargos e mandou cumprir o disposto no art. 732.º, n.º 2, do CPC, do que foi, na mesma data, dado conhecimento, nos autos principais, à Sr.ª Agente de Execução.
Neste apenso, foi apresentada Contestação em 16-07-2019 e, após prolação de despachos determinando a notificação das partes para se pronunciarem sobre a possibilidade de conciliação e de conhecimento do mérito da causa sem a realização de audiência prévia, veio a ser proferido, em 26-05-2020, saneador-sentença que julgou os embargos improcedentes, decisão da qual foi interposto recurso de apelação. A Relação de Lisboa, por acórdão de 19-01-2021, julgou improcedente essa apelação e confirmou a sentença da 1.ª instância, tendo esse acórdão sido confirmado no recurso de revista excecional interposto pela Executada (cf. acórdão do STJ de 03-02-2022, transitado em julgado em 17-02-2022, conforme certidão elaborada a 23-02-2022).
Em 24-06-2019, veio a Sr.ª Agente de Execução informar ter sido notificada da “entrada de embargos e admissão dos mesmos”, mas não ter sido “notificada para ser feita qq suspensão ou cancelamento de penhora efectuada”, acrescentando que “(N)a ausência de qq indicação por parte do Meritissimo Juiz de Direito nesse sentido, deve a execução seguir os seus termos. Pelo exposto segue a execução até indicação contrária do Douto Tribunal”.
Em 26-06-2019, a Executada pronunciou-se a este respeito, requerendo que fosse “que julgado totalmente improcedente o requerimento apresentado pela Sra. AE, em consequência, ser determinado o imediato levantamento da penhora de depósito bancário que a Sra. AE promoveu ilegalmente”.
Em 27-06-2019, a Sr.ª Agente de Execução veio reiterar que a penhora “não padece de qq vício ou ilegalidade”, porquanto “a entrada de embargos apenas suspende a execução com prestação de caução ou por ordem do Juiz”.
Em 28-06-2019, a Exequente pronunciou-se a este respeito, pugnando pela legalidade da penhora. Em 03-07-2019, a Executada apresentou novo requerimento, idêntico aos anteriores, insistindo pelo levantamento da penhora.
Em 09-07-2019, o Tribunal recorrido proferiu despacho determinando a notificação da Sr.ª Agente de Execução para se pronunciar, o que esta fez, em 10-07-2019, voltando a reiterar os argumentos constantes das informações anteriormente prestadas.
Em 15-07-2019, o Tribunal determinou a notificação das partes para se pronunciarem, o que a Exequente veio fazer mediante requerimento apresentado em 23-07-2019, pugnando pelo prosseguimento da execução, mantendo-se a penhora efetuada.
Em 30-07-2019, a Executada veio pronunciar-se sobre este último requerimento, requerendo que fosse “julgado totalmente improcedente o requerimento apresentado pela exequente”.
Em 01-07-2019, a Executada deduziu incidente de oposição à penhora (apenso B), mediante requerimento com o seguinte teor:
“OPOSIÇÃO À PENHORA, que deduz:
CLUBE DESPORTIVO DA COVA DA PIEDADE - FUTEBOL SAD, executada, nos autos em epígrafe e neles melhor identificada, em que é exequente CLUBE DESPORTIVO DA COVA DA PIEDADE — INSTITUIÇÃO DE UTILIDADE PÚBLICA DESPORTIVA nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 784º e ss. do C.P.C.
FUNDAMENTOS:
— Das alíneas a) e c) do n.º 1 do art.º 784.º do C.P.C.
1º Foi a executada notificada do auto de penhora datado de 19.06.2019 da penhora de depósito bancário no valor de € 54.092,73(cinquenta e quatro mil e noventa e dois euros e setenta e três cêntimos) da qual a executada é titular no Banco Millenium BCP.
2º Ora, como se torna evidente a penhora de saldos bancários promovida pela Sra. Agente de Execução é inadmissível e manifestamente ilegal e está a causar graves prejuízos à executada.
3º A Exma. Sra. Agente de Execução decidiu promover uma penhora de saldos bancários, desconsiderando que no dia 23.05.2019 a executada já havia deduzido oposição à execução na qual foi expressamente alegada a manifesta falta de título executivo.
4º Resulta mais do que evidente que a Sra. Agente de Execução não podia ter promovido tal diligência, como fez, uma vez que estamos perante uma execução ordinária, com lugar a citação prévia do executado, nos termos do art.º 726.º do CPC.
5º Tendo a executada vindo oportunamente deduzir oposição à execução no dia 23.05.2019 e na qual foi expressamente alegada a manifesta falta de título executivo!
6º A penhora de saldo bancário que a Exma. Sra. Agente de Execução promoveu sobre a executada é manifestamente ilegal.
7º Estamos perante a inadmissibilidade de uma penhora do bem apreendido e sobre um bem que não responde pela divida exequenda (alíneas a) e c) do n.º 1 do art.º 784.º do C.P.C.).
8º Não se coibiu a Exma. Sra. Agente de Execução de promover uma diligência de penhora, sabendo ou não podendo ignorar, que estamos perante uma execução ordinária (art.º 726.º do CPC) e, por conseguinte, tem lugar a citação prévia da executada e ainda bem sabendo que a executada veio oportunamente deduzir a oposição à execução na qual foi expressamente alegada a manifesta falta de título executivo.
9º Não se coibiu a Exma. Sra. Agente de Execução de promover uma diligência de penhora, bem sabendo ou não podendo ignorar que a Executada impugnou a exigibilidade e a liquidação da obrigação exequenda, por entender que, em primeiro lugar, estamos perante uma manifesta falta de título executivo,
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