Acórdão nº 347/23.8T8PRD.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-01-22

Ano2024
Número Acordão347/23.8T8PRD.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo número 347/23.8T8PRD.P1, Juízo Central Cível de Penafiel, Juiz 2.


Relatora: Ana Olívia Loureiro
Primeira adjunta: Eugénia Cunha
Segundo adjunto: José Eusébio Almeida





Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I – Relatório:
1. AA e BB propuseram, em 13-02-2023, ação declarativa a seguir a forma de processo comum contra CC e DD pedindo o reconhecimento de propriedade de imóvel, que identificam, a favor da Autora mulher e a declaração de que do mesmo faz parte uma parcela de terreno adquirido em negócio de permuta celebrado com os anteriores proprietários do imóvel dos Réus, bem como que aquele imóvel dista, a sul, cerca de um metro de uma construção existente em prédio dos Réus. Descrevem a linha delimitadora dos dois imóveis que dizem ser contíguos e pedem a sua demarcação e a autorização para ali colocarem esteios a definir as extremas.
Juntaram certidão de registo predial de que resulta a inscrição do referido imóvel a favor da Autora, descreveram os atos de uso e aproveitamento do mesmo que ambos os Autores sobre ele praticam bem como relataram o teor de processo judicial em que foi proferida sentença que, segundo alegam, reconheceu a favor de Autora e Réus a propriedade de cada um desses imóveis e julgou válida uma permuta que os antecessores dos Réus celebraram com os Autores, que incidiu sobre duas parcelas de terreno primitivamente pertencentes a cada um dos dois imóveis, pelo que, também em consequência dessa sentença, pretendem o reconhecimento de que uma delas, que identificam, pertence agora ao seu imóvel, do que resulta a delimitação do mesmo que descreveram e querem ver declarada.
2. Os Réus contestaram impugnando em parte os factos alegados pelos Autores em sustentação dos seus pedidos, admitindo apenas a propriedade da Autora mulher sobre o prédio descrito na petição inicial, excecionaram o caso julgado decorrente da sentença proferida no processo invocado pelos Autores (de que fazem leitura distinta da por estes defendida) e a prescrição do direito dos Autores. Deduziram reconvenção pela qual pediram o reconhecimento de que os Autores haviam destruído, por terraplanagem, em 1992, a linha demarcação do seu imóvel pelo lado norte, demarcação também pediram que fosse feita judicialmente, pela linha por eles descrita. Pediram, ainda, a condenação dos Autores no pagamento de 10 000 € de indemnização pelos danos patrimoniais e morais que dizem ter sofrido com a sua conduta, que qualificam de persecutória, bem como pretendem a sua condenação como litigantes de má-fé, no pagamento de multa, indemnização e honorários da sua advogada.
3. Replicaram os Autores impugnando grande parte dos factos que sustentaram a reconvenção e pedindo, por sua vez, a condenação dos Réus como litigantes de má-fé.
4. Fixado o valor da ação em 90.000,02€, foi declarada a incompetência do juízo local cível onde os autos pendiam em função desse valor e ordenada a sua remessa ao juízo central cível em 26-04-2023.
5. Após trânsito da referida decisão e remessa ao tribunal julgado competente, foi preferida sentença, a 10-07-2023, pela qual se rejeitaram os pedidos reconvencionais e absolveram os Rés do pedido. Ali se declarou, previamente à decisão de mérito, que “Considerando que a mesma se destinaria apenas a decidir de imediato do mérito da causa, sendo certo que discutidos já nos autos os termos daquela possibilidade, ainda que mediante distinto enquadramento (jurídico) da situação, decide-se dispensar a audiência prévia e passa a proferir-se sentença, adiantando-se que a instância se afigura totalmente válida e regular.”. Foi afirmada a insuficiência da alegação de facto pelos Autores e, qualificados como essenciais os factos em falta, afirmou-se que não podia tal omissão ser suprida por via de convite ao aperfeiçoamento. Absolveram-se os Réus de todos os pedidos

II - O recurso:
É desta sentença que recorrem os Autores, pretendendo a declaração de nulidade da mesma por “excesso de pronúncia”, bem como a declaração da nulidade do processado e a remessa dos autos ao Tribunal recorrido para designação de audiência prévia. Defendem, ainda, ocorrer contradição entre os fundamentos (falta de alegação de factos essenciais) e a decisão proferida (absolvição do pedido) e ocorrer falta de fundamentação para esta decisão que, sublinham, os impede de noutra ação virem a discutir a sua pretensão de demarcação dos dois imóveis. Finalmente entendem os Recorrentes que, a considerarem-se insuficientes os factos alegados deviam ter sido convidados a aperfeiçoar a petição inicial.
Para tanto, alegam o que sumariam da seguinte forma em sede de conclusões de recurso:
“1 – A marcação de Audiência Prévia é obrigatória nos casos em que o Tribunal pretende decidir de imediato do mérito da questão.
2 – Ao dispensar a Audiência Prévia e decidir de imediato do mérito a coberto dessa mesma decisão, o Tribunal a quo comete uma nulidade processual que obriga à revogação da decisão.
3 – A decisão sobre o mérito do pedido, tendo em conta a dispensa da Audiência Prévia, é excessiva, porquanto o Tribunal apenas poderia decidir, no âmbito do saneamento do processo, a propósito das formalidades da instância.
4 – Termos em que deverá sempre, pelo menos, ser designada Audiência Prévia e permitida às partes as alegações de facto e de direito para o Tribunal poder conhecer do mérito da matéria em litígio.
SEM PRESCINDIR,
5 – Os Autores invocaram a Causa de Aquisição (por aquisição derivada) da Parcela que reivindicam: A Permuta entre eles e os proprietários do prédio vizinho.
6 - Permuta que a Sentença no P.º 183/18.3T8PRD, com Autoridade de Caso Julgado, declarou que produziu efeitos, pois seria abuso de direito fazer restituir a realidade jurídica à situação anterior à permuta ocorrer, devolvendo aos Autores a parcela que tinha sido saído da sua posse e propriedade com a permuta, sendo que este é um negócio bilateral sinalagmático.
7 – E se a permuta é um negócio bilateral e correspetivo, com sinalagma entre uma e outra prestação, sendo uma contrapartida da outra (e vice-versa), não podendo uma subsistir e a outra falhar, tal significa que se os Réus ficam com a parcela que lhes foi escambada, tem de forçosamente se reconhecer que nesse negócio também emergiu do seu lado a obrigação de entrega da parcela correspetiva, causa aquisitiva derivada da parcela pelos Autores.
8 – Os Réus ficaram com a propriedade da Parcela que adquiriram na permuta (Porque seria abuso de direito anular a Permuta apenas por ter sido acordada pela via oral), e, por isso, também os Autores ficaram com a parcela que naquela permuta lhes foi transmitida, tal como entendeu e assim raciocinou a Sentença no P. º 183/18.3T8PRD com autoridade de caso julgado.
9 – Apesar de apurados na totalidade os termos da permuta, a Sentença do P.º183/18.3T8PRD não condenou os Réus a entregar a parcela por si permutada aos Autores, uma vez que tal decisão ultrapassaria os limites do Princípio Processual do Pedido, mas incentivando os Autores a pedirem-no judicialmente em novo processo caso os Réus não o fizessem voluntariamente.
10 – O que os Autores fizeram no presente processo para aqui ser apreciado e decidido, ainda que sem caso julgado para a decisão final, mas com caso julgado para o pressuposto material de terem adquirido a propriedade pela permuta.
11 – É que a Sentença do P.º 183/18.3T8PRD reconhece, com Autoridade de Caso Julgado, a validade da permuta (o que a sentença recorrida nos fundamentos invocados reconhece!), até porque é este negócio que é base necessária ao silogismo jurídico que permite concluir pelo direito de propriedade dos Réus sobre a parcela que adquiriram por permuta com a parcela transmitida aos Autores nessa mesma permuta, e que no presente processo se reivindica!
12 - Qualquer decisão que não reconheça a eficácia da permuta entre Autores e Proprietários do Prédio dos Réus é necessariamente incoerente e nula por contradizer o decidido na Ação n.º 183/18.3T8PRD, que tem Autoridade de Caso Julgado.
13 – Ora, a eficácia da permuta, judicialmente reconhecida por Sentença transitada em julgado, é fundamento causal da forma derivada do direito de propriedade dos Autores sobre a parcela agora reivindicada (que, como se referiu, é diferente da reivindicada na Ação n.º 183/18.3T8PRD).
14 – Só uma decisão com base nesta premissa é coerente com os fundamentos invocados na Sentença recorrida que, de outro modo, padece de uma contradição insanável entre os fundamentos que invoca e a Decisão que profere de absolvição do pedido.
15 – A Sentença do P.º 183/18.3T8PRD, mesmo que sem autoridade de caso julgado, refere que, uma vez validada a permuta (pois considera ser abuso do direito os Autores invalidarem a permuta por vício de forma), então a permuta teria de valer em ambos os sentidos e aconselhava os Réus, judicialmente reconhecidos como proprietários da sua parcela com fundamento na permuta, a reconhecerem voluntariamente o sinalagma do negócio que fundamenta a sua propriedade em relação à parcela adquirida na permuta, dizendo aos Autores que, caso tal não acontecesse, teriam de propor nova ação judicial para tutelar o seu direito de propriedade.
16 – Em relação à decisão do P.º 183/18.3T8PRD quanto à eficácia aí dada à permuta há autoridade do caso julgado, sendo decisão que necessariamente tem de valer dentro e fora do processo 183/18.3T8PRD, nomeadamente no presente processo.
17 – Não reconhecer a Autoridade desta decisão quanto à validade da permuta corresponderia a permitir que, por exemplo, num qualquer processo futuro, em clara contradição, pudesse ser considerada nula a permuta a que é reconhecida eficácia no P.º183/18.3T8PRD.
18 – De igual modo, é ignorar o carácter necessário da validade/eficácia da permuta como pressuposto sine qua non para a constituição do direito de propriedade dos Réus sobre a parcela que lhes foi entregue, tal como
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