Acórdão nº 3370/22.6T8CBR.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2024-03-05

Ano2024
Número Acordão3370/22.6T8CBR.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO LOCAL CÍVEL DE COIMBRA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE COIMBRA)

Relator: Arlindo Oliveira
1.ª Adjunta: Helena Melo
2.ª Adjunta: Catarina Gonçalves

Processo n.º 3370/22.6T8CBR.C1 – Apelação

Comarca de Coimbra, Coimbra, Juízo Local Cível

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra

AA e mulher, BB, residentes R. Quinta ..., ..., intentaram a presente acção declarativa sob a forma de processo comum, contra Aegon Santander Portugal Não Vida – Companhia de Seguros, S.A., sociedade comercial, Pessoa Colectiva nº 513 251 936, com sede na R. da Mesquita, nº 6, na cidade e concelho de Lisboa, pedindo na sua procedência: 1) a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de € 11.830,00 (onze mil e oitocentos e trinta euros), a titulo de ressarcimento indemnizatório pelo furto dos objectos/bens furtados na sua residência; 2) a condenação da ré a pagar-lhes a quantia de € 1.000,00 (mil euros) a titulo de danos não patrimoniais; 3) a condenação da ré a pagar-lhes juros pela mora, contabilizados à taxa legal de 4%, sobre os valores contantes nos números anteriores, desde a data da citação da presente acção, até efectivo e integral pagamento.

Alegam para tanto, em síntese, que celebram com a ré um contrato de seguro denominado “Protecção Lar”, pelo qual e para além do mais, a ré assumiu a responsabilidade pelo ressarcimento aos autores, no caso da verificação de furtos ou roubos ocorridos na residência destes, nomeadamente, pelas perdas e danos resultantes desses furtos ou roubos, mediante a utilização de chaves falsas.

Em 18/11/2021, os autores foram alvo de um furto na sua residência, tendo sido utilizado para o efeito chaves falsas ou outro objecto que funcionasse como tal e que permitiu a abertura da respectiva porta de entrada, tendo os assaltantes levado consigo os bens móveis no valor global de € 11.830,00, que melhor identificam na p.i..

Nesse seguimento, apresentaram a respectiva participação criminal contra desconhecidos em 19/11/ 2021 junto da P.S.P. ..., dando azo ao processo de inquérito nº 1714 / ..., o qual correu termos na ... Secção do DIAP ... que foi alvo de arquivamento por não ter sido possível identificar-se os autores dos factos denunciados.

Tal como evidencia o respectivo relatório de inspecção judiciária, efectuado no âmbito do referido processo de inquérito, verificou-se na porta de entrada da residência dos autores, uma marca no aro vertical esquerdo, próximo da fechadura, indiciando a utilização de um objecto para efectuar a abertura da porta ou auxiliar a abrtura da mesma.

Os autores participaram à ré o referido furto, que declinou a sua responsabilidade contratual.

Toda a descrita situação, para além dos citados prejuízos resultante da perda, por furto, dos bens descritos, implicou igualmente um forte desgosto, tristeza e revolta nos autores, não só pela circunstância de verem-se desapossados dos ditos bens, mas também pelo acto de “invasão/intromissão” na sua residência, sendo que tal indignação e revolta agravaram-se sobremaneira tendo em consideração o facto da ré ter decidido declinar a sua responsabilidade contratual, de uma forma totalmente injustificável.

*

Citada, ofereceu a ré contestação, impugnando a factualidade subjacente ao alegado furto e correspondentes prejuízos, mais alegando que o sinistro não está coberto pelo contrato de seguro celebrado entre as partes, pois que inexistindo vestígios inequívocos de arrombamento, escalamento, ou tivesse sido constatada por inquérito policial, a utilização de chaves falsas, a cobertura contratada não cobria qualquer desaparecimento de bens seguros, concluindo no sentido de dever a ação ser julgada improcedente.

***

Foi realizada audiência prévia, na qual foi proferido despacho saneador tabelar e se se identificaram o objecto do litígio e os temas de prova.

Os autores requereram a ampliação do pedido para a quantia de 12.802,00 €, a qual foi admitida, cf. despacho de fl.s 94/5.

Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, e finda a mesma foi proferida a sentença de fl.s 105-A a 105-L, na qual se fixou a matéria de facto considerada como provada e não provada e respectiva fundamentação e, a final, se decidiu julgar a presente acção improcedente por não provada, absolvendo-se a ré do pedido, ficando as custas a cargo dos autores.

Inconformados com a mesma, interpuseram recurso os autores, AA e mulher BB, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo – (cf. despacho de fl.s 120), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões:

1- Na presente acção, não poderia a Meritíssima Juiz de 1ª Instância ter decidido como decidiu, ou seja, não poderia ter julgado a acção interposta pelos ora recorrentes, totalmente improcedente, absolvendo a ora recorrida dos respectivos pedidos, porquanto,

2- atento à factualidade dada como provada nos Pontos III 1., 2., 3., 6. E 9. da sentença recorrida, afigura-se claro que o contrato de seguro em causa, é susceptivel de cobrir os respectivos prejuízos sofridos pelos recorrentes, dado que,

3- encontra-se provado o facto de no dia 19 / 11 / 2021, ter-se verificado um furto na residência daqueles, tendo os mesmos participado criminalmente junto da autoridade policial, encontrando-se igualmente provado que,

4- o ou os autor(es) do citado ilícito introduziram-se na residência dos recorrentes, pela porta de entrada, pelo que e, na ausência de sinais de estroncamento ou danos visíveis no canhão da respectiva fechadura,

5- não haveria outra forma de introdução na residência dos recorrentes que não fosse mediante a utilização de chaves falsas ou objecto que funcionasse como tal, sendo de realçar que,

6- encontra-se também dado como provado, no Ponto III 9. da sentença recorrida que, no aro vertical esquerdo, próximo da localização da fechadura, foi produzida uma marca, indiciando a utilização de um objecto para efectuar a abertura da porta ou auxiliar na abertura da mesma.

7- Por outro lado, é a própria testemunha CC, perito da área dos seguros que, no seu depoimento acima transcrito, confirma que a utilização de chaves falsas, por regra, não deixa vestígios na fechadura, sendo igualmente algo do conhecimento geral e público.

8- Deverá também evidenciar-se que, como é referido no Ponto IV da sentença recorrida: “É certo que o objecto da garantia do seguro são, além do mais, bens móveis integrantes do recheio da casa de residência dos autores e o risco é a eventualidade do prejuízo decorrente da sua subtracção fraudulenta.”.

9- Diga-se ainda que, constatando as condições da apólice de seguro em causa, patentes no doc.7 junto com a P.I., sempre se poderá verificar que, na parte sob a epigrafe “O que não está coberto”, referente aos casos de furto ou roubo, não encontra aí qualquer previsão que se enquadre nos factos dados como provados, ou seja,

10- nenhuma dessas previsões que afastam a cobertura do seguro, se encontram reflectidos no citados factos dados como provados da sentença recorrida.

11- Assim, deverá a descrita factualidade dada como provada na sentença recorrida ser considerada integrada na previsão das condições contratuais do respectivo contrato de seguro e, em consequência, ser a recorrida condenada na indemnização peticionada pelos ora recorrentes.

PELO EXPOSTO, deve dar-se total provimento ao presente recurso e, em consequência do mesmo:

a) Deverá revogar-se a decisão proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, procedendo os pedidos efectuados pelos recorrentes na P.I., condenando-se assim a recorrida nos mesmos.

E assim se fará INTEIRA JUSTIÇA

Contra-alegando, a ré, Aegon, SA, pugna pela manutenção da decisão recorrida, aderindo aos fundamentos na mesma exarados, designadamente que o sinistro em causa, não se enquadra no risco previsto, por não se ter provado o uso de chaves falsas nem a existência de vestígios que denotem o arrobamento ou escalamento, como forma de entrada na residência dos autores.

Dispensados os vistos legais, há que decidir.

Tendo em linha de conta que nos termos do preceituado nos artigos 635, n.º 4 e 639.º, n.º 1, ambos do CPC, as conclusões da alegação de recurso delimitam os poderes de cognição deste Tribunal e considerando a natureza jurídica da matéria versada, a questão a decidir é a de averiguar se o sinistro em causa se mostra ou não, enquadrado nas coberturas da apólice do seguro contratado entre as ora partes, designadamente, as previstas na cláusula “Furto ou Roubo”.

É a seguinte a matéria de facto dada por provada na decisão recorrida:

1. Entre o autor e a ré foi celebrado um contrato de seguro, intitulado “Protecção Lar”, do ramo multirriscos habitação, com início em 26.12.2017, renovável anualmente, titulado pela apólice n.º ...50, o qual tem como objeto seguro o «Recheio» da habitação sita na Rua ..., ..., ..., ..., com o capital seguro até ao limite de € 35.000,00, conforme cláusulas particulares e gerais constantes de tal contrato junto com a p.i. sob os docs. nºs 6 e 7, cujo teor aqui dou por integralmente...

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