Acórdão nº 3252/22.1T8VFX.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-12-20

Ano2023
Número Acordão3252/22.1T8VFX.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa:
Relatório
AA, propôs contra BB, S.A. , acção declarativa de condenação com processo comum, pedindo que se declare com justa causa a rescisão do contrato pelo Autor e se condene a Ré a pagar-lhe a quantia de 32.676,22 €, acrescida dos juros moratórios à taxa legal a contar de 01.07.2022 e até integral pagamento.
Invocou para tanto, em síntese, que: foi admitido ao serviço da Ré em 23.07.2019 como motorista dos Transportes Internacionais Rodoviários de Mercadorias e para trabalhar exclusivamente no estrangeiro ficando ao serviço e disposição da Ré durante 6 semanas, quer em dias úteis, quer aos fins de semana e feriados, findas as quais vinha a Portugal gozar 2 semanas de descanso; é aplicável às partes o CCTV. celebrado entre a ANTRAM e a FECTRANS, publicado no BTE n.º 34 de 15/09/2018 e Portaria de Extensão publicada na Separata do BTE n.º 40 de 17/09/2018 e, a partir de Janeiro de 2020, o CCTV celebrado entre a ANTRAM, a ANTP e a FECTRANS, publicado no BTE nº 45 de 08/12/2019 e a Portaria de Extensão publicada no BTE nº 49/2020 de 26/02 e, ainda, o DL n.º 109-A/2020 de 31/12/2020; a situação do Autor era exactamente a de um motorista internacional que saísse de Portugal para uma viagem de 60 dias pelo estrangeiro e que no regresso a Portugal tivesse direito a gozar 2 semanas de descansos compensatórios, pelo que o Autor tem direito não só a receber as diárias por todos esses dias, como tem direito a que todos os dias de descanso (sábados, domingos e feriados) dessas 6 semanas que ele se obrigou a trabalhar para a Ré lhe sejam pagos a dobrar, quer a Ré lhe tenha dado trabalho para esses dias, quer não, quer sejam pausas horárias gozadas nas viagens ou nas áreas de serviço; o Autor, como qualquer motorista internacional nas viagens pelo estrangeiro, só descansava para cumprir as pausas horárias obrigatórias; todos os dias de descanso (sábados, domingos e feriados) passados pelo Autor no estrangeiro nos referidos períodos de 6 semanas em que estava obrigado a trabalhar para a Ré, deveriam ser pagos em dobro nos termos do disposto na Cl.ª 51.ª nºs 1 e 2 do CCT de 15/09/2018; a Ré pagava os dias de descanso no “ Código 48” dos recibos, na rubrica “TS” (Trabalho Suplementar); porém, até Janeiro de 2020 a Ré indicava nos recibos o valor unitário pago por esses dias sendo que, em vez de os pagar em dobro, pagava-os apenas em singelo; a partir do mês de Janeiro de 2020 a Ré deixou de indicar o valor unitário dos dias de descanso, mas continuou a pagá-los em singelo até final do contrato, conforme consta no “ Código 48” dos recibos em TS (Trabalho Suplementar), quando deviam ter sido pagos em dobro, pelo que, são devidas ao Autor as diferenças que reclama dos anos de 2019 a 2022; no ano de 2019, embora o valor mínimo a fixar para o Complemento Salarial fosse de 31,50 € a Ré fixou e pagou esse complemento pelo valor de 63,00 €, mas no ano de 2020 baixou esse valor para 35,00€, violando o disposto nos artigos 129.º n.º1 al. d) e 476.º do CT e na Cl.ª 89.ª do CCTV de 08.12.2019, sendo-lhe devidas as diferenças dos complementos salariais que peticiona; a Ré não ministrou formação profissional ao Autor; a Ré baixou o valor das ajudas de custo/diária nos meses de Janeiro a Abril de 2020 para 50,00 € e, a partir desse mês, para 40,00 €, contrariando o acordo de que esse valor seria de € 55,00; são-lhe ainda devidas as diferenças de subsídio de Natal e de subsídio de férias; a Ré nunca deu férias a gozar ao Autor; a Ré estava obrigada a adiantar as quantias suficientes para as pausas horárias de 45horas, o que nunca fez, pelo que o Autor nunca pôde gozar das dormidas em hotéis durante estas pausas, tendo de pernoitar na cabine do veículo; e por carta registada datada de 01.07.2022 o Autor comunicou à Ré a cessação do contrato, com efeitos imediatos, invocando justa causa com os fundamentos que enuncia.
Realizou-se a audiência de partes não se conseguindo a sua conciliação.
A Ré contestou invocando, em suma, que: o Autor trabalhava 6 semanas no estrangeiro, vindo 2 semanas a Portugal para gozar os descansos ou férias, saindo do aeroporto de Bruxelas e regressando, após 2 semanas, à Bélgica, ao mesmo aeroporto de Bruxelas; nos fins de semana passados pelo Autor na Bélgica, em que não tinha serviço atribuído, o mesmo podia ausentar-se do camião que lhe estava atribuído e podia ausentar-se da base quando desejasse e pelo tempo que bem entendesse; nos fins de semana de descanso do Autor no estrangeiro, estes ocorreram, por norma, na base logística de Leuze, tendo permanecido ainda, em alguns fins de semana, em áreas de serviço por outros países, nomeadamente em França, pelo que o Autor não trabalhou em todos os sábados e domingos correspondentes às seis semanas passadas no estrangeiro; sempre que o Autor trabalhou para a Ré em sábados e domingos, esta procedeu ao respectivo pagamento sob a rubrica “T.S. -CCT2018” nos montantes que constam dos documentos juntos; que todos os dias passados pelo Autor no estrangeiro, quer correspondessem a dias de trabalho ou a dias de descanso, a Ré pagava ao Autor a importância referente à rubrica “Ajudas de custo Estrang.-Motorista”, no valor de €55,00/dia, que a partir de Janeiro de 2020 passou a € 50,00/dia sob a rubrica “Ajudas Custo Cláusula 58 CCTV” e a partir de Maio desse ano passou a ser de € 40,00; o Autor fez todas as viagens no estrangeiro, a partir de uma base igualmente situada no estrangeiro e nos períodos em que não estava em viagem poderia deixar o carro nessa base que tinha vigilância e ir dispor do tempo como bem entendesse, por isso, o Autor não tem direito a retribuição por trabalho suplementar nos sábados, domingos e feriados que, estando incluídos nas 6 semanas no estrangeiro, não efectuou qualquer trabalho por conta da Ré; o Autor pretende aproveitar-se de um erro da Ré no cálculo do complemento salarial que já foi rectificado, não lhe sendo devidas quantias a esse título e não lhe é devido o valor que reclama de acordo com a cláusula 61.ª; também não são devidas as alegadas diferenças nos subsídios de férias e de Natal; é devido ao Autor, a título de pagamento de férias não gozadas, um dia respeitante ao ano de 2020 e relativamente às férias vencidas em 1 de Janeiro de 2022, o autor gozou 18, pelo que ficaram em falta 4 dias de férias; o Autor nunca apresentou à Ré qualquer recibo relativo a dormidas em hotel; reconhece que não ministrou formação profissional ao Autor; e não existe justa causa de resolução do contrato de trabalho.
A Ré ainda deduziu reconvenção que fundamentou na falta de aviso prévio.
Pediu, a final, que a acção seja julgada improcedente com a sua absolvição dos pedidos, com excepção do pedido relativo aos créditos por formação profissional não ministrada e que a reconvenção seja julgada procedente com a condenação do Autor no pagamento da quantia de €1.466,14.
O Autor contestou a reconvenção pugnando pela sua improcedência.
Foi dispensada a realização da audiência preliminar, admitida liminarmente a reconvenção, fixado o valor da causa em €34.142,36 e proferido despacho saneador dispensando-se a enunciação dos temas da prova na consideração de que a causa é simples.
Procedeu-se a julgamento e após foi proferida a sentença que finalizou com o seguinte dispositivo:
“Por tudo quanto se deixa exposto o Tribunal julga:
A. O pedido do Autor parcialmente procedente, por provado, e consequentemente decide:
i) condena a Ré a pagar ao Autor o montante de € 7.216,36 a título de créditos laborais.
ii) Juros de mora vencidos e vincendos, à taxa legal, contados desde 01.07.2022.
iii) Absolvo a Ré do mais peticionado.
B. O pedido reconvencional procedente por provado e consequentemente condenar o Autor a pagar à Ré o valor de € 1.466,14
Custas a cargo de Autor e Ré na proporção do decaimento (sendo o Autor responsável por 21,14% e a Ré por 78,86%).
Registe e notifique.”
Inconformada com a sentença, a Ré recorreu e sintetizou as suas alegações nas seguintes conclusões:
“1º A recorrente não se conforma com a decisão proferida no tocante à sua condenação no pagamento do montante de €7216,36, por considerar que o tribunal a quo fez uma errada interpretação e valoração da prova em que se fundamentou para esta condenação, por, como se pretende demonstrar, essa prova impor que se desse como não provado o facto 53, a partir do mês de fevereiro do ano de 2020.
2º Por conseguinte a recorrente centra o objeto do recurso na impugnação da matéria de facto provada sob o ponto 53 dos factos provados, que se transcreve:
53. O Autor trabalhou dias de fim-de-semana ou feriado em dias não concretamente apurados, mas nos seguintes meses:
No ano de 2019: Agosto 10 dias; Setembro 4 dias; Outubro 10 dias; Nov 4 dias; Dez 8 dias.
No ano de 2020: Janeiro 5 dias; Fevereiro 8 dias; Março 4 dias; Abril 11 dias; Maio 9 dias; Junho 11 dias; Julho 6 dias; Agosto 8 dias; Setembro 10 dias; Outubro 5 dias; Novembro 8 dias; Dezembro 7 dias.
No ano de 2021: Janeiro 8 dias; Fevereiro 6 dias; Março 8 dias; Abril 10 dias; Maio 9 dias; Junho 5 dias; Julho 8 dias; Agosto 9 dias; Setembro 6 dias; Outubro 9 dias; Novembro 6 dias; Dezembro 11 dias.
No ano de 2022: Janeiro 3 dias; Fevereiro 10 dias; Março 3 dias; Abril 10 dias; Maio 2 dias; Junho 9 dias
3º Considera a recorrente que foi incorrectamente julgado o facto provado sobre o número 53., no que se reporta ao número de dias de feriados e fins de semana, considerados trabalhados pelo Autor, a partir de fevereiro de 2020.
4º Quanto às concretas provas, que na óptica da recorrente impunham decisão diversa da recorrida, são os recibos de vencimento juntos pelo Autor, como documento nº3, exactamente a mesma prova em que se estribou o douto tribunal a quo para fundamentar o facto 53.
5º Com efeito em sede de motivação da decisão de facto, escreveu-se na sentença o
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