Acórdão nº 32/23.0BELRA de Tribunal Central Administrativo Sul, 23-03-2023

Data de Julgamento23 Março 2023
Ano2023
Número Acordão32/23.0BELRA
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO TRIBUNAL CENTRAL ADMINISTRATIVO SUL

I. RELATÓRIO
1. O Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, intentou naquele tribunal contra J. C. uma acção para emissão de mandado judicial, pedindo a emissão de mandado judicial que autorize a entrada das autoridades competentes no prédio onde o requerido possui uma exploração pecuária, sito em C. C., C. U., freguesia de V. C., no concelho do Bombarral, bem como nos barracões e demais dependências existentes na mesma, recorrendo se necessário for ao arrombamento de quaisquer portas, com vista à apanha, transporte e abate dos animais detidos pelo visado naquela exploração, em execução das decisões administrativas proferidas pela Directora de Serviços, Drª Susana Fonseca em 2-3-2022 e Subdirectora-Geral da DGAV, Drª Ana Paula de Almeida Cruz de Carvalho, em 20-7-2022.
2. O TAF de Leiria, por decisão datada de 27-2-2023, indeferiu liminarmente a petição inicial, com fundamento na manifesta improcedência da acção, por ser evidente a ilegitimidade substantiva do réu (sic).
3. Inconformado, o Digno Magistrado do Ministério Público junto do TAF de Leiria interpôs recurso de apelação para este TCA Sul, no qual formulou as seguintes conclusões:
a) O Ministério Público intentou a presente acção especial para emissão de Mandado Judicial para entrada no prédio e exploração pecuária de J. C., melhor identificado nos autos, o que fez agindo em defesa da legalidade, da saúde pública, da qualidade de vida e da preservação do ambiente, e ao abrigo do disposto nos artigos 4º, nº 1, alíneas a), i) e n) do ETAF, e artigo 2º, nº 2, alínea o); artigo 9º, nº 2, artigo 36º, nº 1, alínea e) e artigo 109º e segs. do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, e com fundamentos ali melhor expostos;
b) E que, em apertada síntese consistem no facto de aquele criar animais à margem da lei que são posteriormente introduzidos no mercado. Tais animais só ainda não foram dali retirados e abatidos, em execução das decisões administrativas legalmente proferidas pela Directora de Serviços, Drª Susana Fonseca em 02.03.2022 e Subdiretora Geral da DGAV, Drª Ana Paula de Almeida Cruz de Carvalho em 20.07.2022, por J. C. ter vedado o prédio onde cria os animais e não permitir a entrada da DGAV para execução de tais decisões;
c) A acção foi improcedente por a Mmª Juíza a quo ter considerado que acção pecava de ilegitimidade, porque era necessário demandar o proprietário do terreno, uma vez que sem este ser ouvido o mandado carecia de eficácia;
d) Referindo ainda que não resulta claro dos autos a norma legal que legitime o Tribunal a emitir o mandado peticionado; e
e) Que em momento algum foi recusada a entrada no prédio em crise pelos respectivos proprietários, o que colocaria sempre em causa a necessidade de tutela judicial, porquanto caso os proprietários permitam a entrada na sua propriedade, tanto bastaria para que as decisões administrativas emitidas fossem devidamente executadas.
f) Sucede, no entanto, que não há qualquer prova nos autos sobre quem é ou não o proprietário do prédio e entende o Ministério Público que isso é absolutamente irrelevante;
g) Mesmo que se venha a demonstrar que o prédio é de terceiro, a verdade é que quem detém e dispõe do prédio é o referido J. C., foi este que foi sujeito da acção da DGAV e é este que se opõe à acção das autoridades;
h) O proprietário do prédio, caso seja efectivamente um terceiro, é um sujeito totalmente estranho a toda esta relação que, além do mais – e declaradamente – não dispõe do prédio, não tem acesso ao mesmo e não tem sequer poderes para autorizar a entrada no prédio pela DGAV, nem para se superar a oposição do referido J. C., o que nada tem de estranho, face à elasticidade dos direitos reais;
i) A sentença proferida também não concretizou quais as normas que impõem que a acção seja intentada contra o proprietário do terreno, caso este não seja o J. C. nem tão pouco os factos e os fundamentos de direito em que se baseia para afirmar que se o proprietário consentir na entrada J. C. não se oporá à mesma;
j) Em face disso deve considerar-se que a sentença proferida fez errada aplicação da lei e que o visado J. C. é parte legítima na acção, sendo o único sujeito com legitimidade passiva para a mesma, uma vez que nos termos do artigo 10º do CPTA e 30º do CPC é o único sujeito da relação material controvertida e o único com interesse directo em contradizer;
k) O proprietário do prédio, caso não seja o referido J. C., não tem qualquer interesse na acção, sendo parte ilegítima na mesma;
l) O mandado judicial regularmente emitido que autorize a entrada em determinada local é oponível a terceiros e em nada viola os direitos do respectivo proprietário;
m) Por força do disposto nos artigos 2º e 3º do CPTA, nomeadamente do artigo 2º, nº 2, alíneas h), i), q), e no artigo 3º, nº 3, é o Mmº Juiz dos tribunais administrativos o competente para emitir tal mandado;
n) Mostra-se violado o artigo 10º do CPTA e os artigos 30º e 590º do CPC e o artigo 2º, nº 2, alíneas h), i), q), e no artigo 3º, nº 3 do CPTA”.
4. Não foram apresentadas contra-alegações.

II. OBJECTO DO RECURSO – QUESTÕES A DECIDIR
5. Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Digno Magistrado do Ministério Público recorrente, sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, nos termos dos artigos 635º, nº 4 e 639º, nºs 1, 2 e 3, todos do CPCivil, “ex vi” artigo 140º do CPTA, não sendo lícito a este TCA Sul conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo as de conhecimento oficioso.
6. E, atendendo às conclusões vertidas na alegação do recorrente, impõe-se apreciar no presente recurso se a decisão recorrida incorreu em erro de julgamento, ao indeferir liminarmente o pedido com fundamento na manifesta improcedência da acção, por ser evidente a ilegitimidade substantiva do réu, tendo violado os artigos 10º do CPTA, 30º e 590º do CPCivil, e ainda os artigos 2º, nº 2, alíneas h), i), q), e 3º, nº 3, estes do CPTA.


III. FUNDAMENTAÇÃO
A – DE FACTO
7. A decisão recorrida considerou assente a seguinte factualidade:
i. Em 28 de Dezembro de 2020 foi elaborado pela Guarda Nacional Republicana “Auto de Apreensão”, nomeadamente com o seguinte teor:
(…) Local da ocorrência: C. C.

Imagem: Original nos...

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