Acórdão nº 32/22.8T8ELV.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-03-02

Ano2023
Número Acordão32/22.8T8ELV.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO
AA e BB instauraram a presente ação declarativa, com processo comum, contra CC, formulando o seguinte pedido:
«- Reconhecer-se que as aberturas existentes nas traseiras do prédio dos AAs. são janelas e existem há mais de 20 anos.
- Condenar-se a R. a proceder imediatamente à retirada dos tapumes colocados nas janelas do prédio dos AAs. e a abster-se de colocar qualquer material, construção ou outro que impeçam as vistas que as janelas do prédio dos AAs. proporcionam.
- Condenar-se a R. a pagar aos AAs, a título de danos causados pela privação do uso do prédio, o valor de € 10 000,00,
- Mais deve a R. ser condenado ao pagamento aos AAs, a título de danos morais, de quantia nunca inferior a € 5 000,00 (cinco mil euros).
- Mais se requer a condenação da R., em caso de procedência da presente acção, a pagar aos AAs., a quantia diária de €50,00 (cinquenta euros), a título de sanção pecuniária compulsória, por cada dia de atraso na efectiva retirada dos tapumes da janela ou outro objecto aí colocado, que impeça o fim a que se destinam, a partir da data do trânsito em julgado desta acção.
- Mais deve a R. autorizar os AAs. a passarem pelo seu quintal, duas vezes ao ano, uma no mês de Maio e outra no mês de Outubro, para procederem à limpeza e pintura das traseiras do seu prédio.»
Alegam, em síntese, que adquiriram por compra o prédio sito em Santa Eulália, na Rua ..., com destino a habitação, o qual, desde a sua construção, ocorrida em 1979, tinha três janelas traseiras: uma na cozinha, outra na sala e outra no quarto. A ré, que reside no imóvel contíguo ao prédio adquirido pelos autores, decidiu, no mês de maio do ano passado, colocar tapumes presos às janelas do prédio dos autores, os quais impedem a iluminação natural e ventilação do imóvel, sendo que os mesmos foram colocados pela ré sem conhecimento e autorização dos autores.
Mais alegam que o autor marido requereu junto da Câmara Municipal de Elvas, em 28 de julho de 2021, que fosse feita uma vistoria ao interior do seu prédio, por forma a ser aferido se de facto, as aberturas existentes no seu prédio eram janelas ou frestas, tendo aquela edilidade informado que as aberturas em causa eram de facto janelas e verificou-se que as mesmas já existiam há mais de 20 anos e que se encontram aprovadas pelo município através do processo de obras nº ...8 e autorizadas pelo então dono do logradouro, mas a ré insiste em manter os tapumes colocados junto às referidas janelas.
Contestou a ré, contrapondo que as aberturas existentes no prédio dos autores não podem ser qualificadas como janelas, mas sim como frestas, considerando, por um lado, as suas reduzidas dimensões e, por outro lado, não disporem de um parapeito onde o utilizador comum possa apoiar-se ou debruçar-se.
Conclui pela sua absolvição do pedido e pede a condenação dos autores como litigantes de má-fé, em indemnização a seu favor, no montante de € 10.000,00, bem como no pagamento de uma indemnização no valor de € 5.000,00 a título de danos morais.
Os autores apresentaram réplica, concluindo pela improcedência do pedido da sua condenação como litigantes de má-fé.
Realizada a audiência prévia, as partes transigiram quanto ao último dos pedidos formulados pelos autores, ou seja, o pedido de autorização para passarem pelo prédio da ré, tendo o respetivo acordo sido homologada por sentença transitada em julgado [vd. a respetiva ata].
Foi fixado o valor da causa e proferido despacho saneador tabelar, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.
Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
«Pelo exposto, julga-se a presente acção totalmente improcedente, por não provada, e em consequência:
(i) Absolve-se a Ré CC dos pedidos;
(ii) Condenam-se os Autores AA e BB em custas[1];
(iii) Absolvem-se os Autores do pedido de litigância de má-fé.»
Inconformados, os autores interpuseram o presente recurso de apelação, finalizando a respetiva alegação com a formulação das conclusões que a seguir se transcrevem:
«A)
Era tema de prova, apurar a natureza e função das aberturas em causa.
B)
Pese embora a sentença recorrida tenha aflorado em sede de fundamentação, a natureza das aberturas, a verdade é que, em sede de factos provados e não provados, a mesma foi totalmente omissa. (veja-se facto provado nº 7 e facto não provado alínea a) e fundamentação da pág. 8).
C)
Assim, porque constituía tema de prova apurar a natureza das aberturas, impunha-se ao Tribunal a sua pronúncia, a qual poderia conduzir a decisão diferente.
D)
Não o tendo feito, é nula a sentença por violação do preceituado no artº 615º nº 1-b) do C.P.C.
A não se decidir desta forma, sempre se dirá:
E)
A sentença recorrida padece de contradição entre fundamentação, factos provados, não provados e decisão,
F)
Em sede de fundamentação, a douta sentença recorrida apresenta contradições, pois, o Tribunal considerou atender à prova que apresentasse razão de ciência, como foi o caso, do Sr. Arquitecto da Câmara Municipal de Elvas (DD), Srs. Técnicos da Câmara (EE, FF, Engº GG e HH), ( vidé pág. 7 da fundamentação),
G)
E na página 8 da fundamentação, essas mesmas testemunhas, (com razão de ciência pelas habilitações académicas e profissionais que possuem), foram incapazes de definir o que é janela ou fresta (Vidé pág 8 da fundamentação).
H)
É pois nítida a contradição existente entre a fundamentação constante do último parágrafo da página 7 com a sua página 8, também, com os argumentos expendidos sob os artºs 21º a 25º da motivação.
I)
E a corroborar tal contradição, veja-se o despacho de indeferimento da requerida inspecção ao local, constante da sessão de audiência de discussão e julgamento de 14 de Setembro de 2022, já após audição da prova supra identificada e que se transcreve: “ Atendendo a que o objecto do pedido está integralmente documentado em imagem, considerando ainda a prova produzida em audiência –que incluiu testemunho dos técnicos que se deslocaram ao local –não se vislumbra qualquer conveniência na realização da inspecção judicial, pelo que se indefere o requerido” (sublinhado nosso).
J)
Ora, como pode a sentença recorrida vir agora concluir que estes técnicos foram incapazes de definir as qualidades que um objecto deve apresentar para ser qualificado como janela em oposição a fresta, se aquando da pronúncia sobre a requerida inspecção ao local, para o seu indeferimento, o Tribunal apoiou-se no seu depoimento?
L)
A contradição da fundamentação no que à prova testemunhal diz respeito, conduziu a contradição entre factos provados e não provados, mormente, o facto não provado constante da alínea a), com o facto provado sob o nº 7.
M)
Com efeito, é a contradição existente na fundamentação que fez o Tribunal incorrer em erro no que à valoração da prova diz respeito e que culminou com o facto não provado sob a alínea a).
N)
Tal contradição, a não existir conduziria a decisão sobre a matéria de facto diferente, mormente na prova do facto constante na alínea a) dos factos não provados.
O)
É pois nula a sentença por violação do preceituado no artº 615º nº 1 –c) do C.P.C.
Ainda por dever de patrocínio se dirá:
P)
É igualmente nula a sentença recorrida por manifesta contradição entre factos provados e factos não provados, senão vejamos:
Q)
Como pode a sentença recorrida dar como não provado o facto constante da alínea g), ou seja, que o desgosto, tristeza e ansiedade que os recorrentes sofrem se deva a comportamento da ré, se resulta provado sob o facto vertido no nº 16, que o desgosto, tristeza e ansiedade dos aqui recorrentes se deve ao facto provado dado sob o nº 15 (verem tapumes), quando utiliza a expressão: “ por esse motivo” e se quem os colocou foi a R. (facto provado nº 12)?
R)
Assim, o facto constante da alínea g) dos factos não provados está em contradição com o facto provado nº 16, por referência aos factos dados como provados sob os nºs 12 e 15, devendo ser alterado para facto provado.
S)
Deve assim também a sentença recorrida ser nula por contradição entre factos provados e não provados, por violação com o artº 615º nº 1 – c) do C.P.C.
A não se julgar assim, ainda se dirá:
T)
Da prova produzida em sede de audiência de discussão e julgamento, entendem os recorrentes ter logrado provar que as aberturas em causa tinham a natureza e a função de janelas.
U)
Tal prova resultou, quer do documento nº 15 junto à p.i, quer da prova testemunhal apresentada pelos recorrentes, no caso, os técnicos da CMElvas.
V)
Com efeito, o documento nº 15, onde é referido em suma, que as aberturas existentes, são janelas, não lhe pode ser retirada valia probatória pelo Tribunal, ainda mais com os argumentos expendidos em sede de fundamentação contida na pág. 10 – 2º parágrafo, na medida em que,
X)
Trata-se de um documento emitido por autoridade pública com competência técnica conferida para se pronunciar sobre os assuntos que lhe são apresentados.
Y)
A prova testemunhal produzida, a qual não teve dúvidas em concluir que as aberturas existentes são janelas, cuja razão de ciência decorrente da formação académica e experiência profissional, o Tribunal muito bem reconheceu,
Z)
A qual se encontra transcrita e gravada conforme melhor resulta da respectiva identificação constante dos artºs 55º a 57º da motivação para a qual se remete, com os depoimentos prestados pelo Sr. arquitecto DD e o técnico, Sr. EE, onde é afirmado tratarem-se de janelas,
AA)
Do depoimento transcrito da gravação melhor identificada sob o artº 58 e 59 da motivação, para a qual se remete, cuja testemunha, o técnico FF,
AB)
E pela testemunha, II, de profissão, técnico projectista, cujo depoimento transcrito da gravação melhor identificada sob o artºs 60 e 61 da motivação, para a qual se remete, fazem ambas as testemunhas prova da natureza das aberturas, considerando-as janelas, e
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