Acórdão nº 3125/20.2T8VFR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-01-27

Ano2022
Número Acordão3125/20.2T8VFR.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 3125/20.2T8VFR.P1
Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto
I. RELATÓRIO
AA e BB instauraram acção contra CC.
Alegam, em síntese, que o A., desde 21/03/2016, beneficia do registo de propriedade a seu favor de uma viatura com a matrícula ...-...-HC. Sucede que, no dia 13/09/2019, a viatura em apreço foi apreendida à ordem do processo 2072/19...., no âmbito de uma providência cautelar de arresto instaurada pela R. contra o A. e outros, sem contraditório prévio destes. No seguimento da aludida decisão judicial, o HC foi alvo de um auto de apreensão promovido pela G.N.R., com a consequente apreensão do certificado de matrícula do mesmo. Mercê do referido, o A. viu-se impedido de continuar a circular com o HC, sobre o qual foi nomeado fiel depositário, ficando imobilizada/parqueada na Rua ..., freguesia ..., deste concelho e comarca. O A. deduziu oposição na referida providência cautelar. Realizada a respectiva audiência, o A. viu ser julgada a oposição procedente e, por conseguinte, foi levantado o arresto do HC. Consequentemente, os documentos do HC foram devolvidos ao A. em 20/07/2020.
Nesta sequência, a paragem forçada a que o HC esteve sujeito fez com que a bateria do descarregasse irremediavelmente, Bem assim endureceram os lubrificantes, fluídos e combustíveis, comprometendo algumas peças, o que impossibilitavam que o HC pudesse novamente circular. De tal forma que para inverter essa imobilidade mecânica, o A. viu-se na necessidade de trocar a bateria do HC, a qual teve um custo de €75,77, bem assim substituir o óleo, filtros do óleo, do ar e da gasolina, anticongelante e velas, o que demandou um custo de €170,23, mão-de-obra incluída. Acresce que o A. esteve privado da sua viatura 311 dias. Para alugar uma viatura com características semelhantes àquelas que a da A. possuía, o mercado de aluguer de viaturas o razões de equidade, o A. reclama da R. valor não inferior a €25,00/dia pela paralisação da sua viatura, que se cifra em €7.775,00 pelos 311 dias decorridos.
Por seu turno, a A. beneficia, desde 06/01/2005, de registo a seu favor relativamente à viatura matrícula ...-...-QG. E beneficia, desde 14/10/2004, de registo a seu favor relativamente à viatura matrícula ...-...-EF. Estes automóveis foram apreendidos naquele arresto e este foi levantado nos mesmos moldes. Por força daquela paragem, a autora viu-se na necessidade de trocar as baterias do ... e ..., as quais tiveram um custo de €113,16, e €69,86, respectivamente, bem assim substituir o óleo do ..., que teve um custo de €24,99.
Da mesma forma, por razões de equidade, a A. reclama da R. valor não inferior a €25,00/dia pela paralisação das suas duas viaturas, que se cifra em €7.775,00 x 2 = €15.550,00, pelos 311 dias decorridos.
Sem alegarem mais factos, terminam pedindo o seguinte:
“Termos em que deverá a presente acção ser julgada procedente e, consequentemente, ser a Ré condenada a pagar:
a) ao Autor a quantia global de €8.021,00; b) à Autora a quantia global de €16.070,45;
sendo que sobre ambas as quantias deverão acrescer de juros de mora, à taxa legal, a partir da citação e até efectivo e integral pagamento, além de nas custas e o mais legal.

Citada, em síntese e para o que aqui releva, a ré alega que se divorciou de DD, em 12 de Junho de 2007. Mais tarde, instaurou uma acção declarativa de condenação, que correu termos com o nº 991/10..... Do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, a Ré recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça que admitiu o Recurso de Revista e, por Acórdão deste Tribunal, proferido a 8 de Janeiro de 2015 e notificado aos mandatários em 13 de Janeiro de 2015, revogou o Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, condenando DD a pagar à aqui Ré a quantia de 146.154,80€, com juros desde a citação à taxa legal até efectivo e integral pagamento. DD não pagou à Ré, por isso instaurou execução, que corre termos, Proc. nº 601/.... DD, dias após a notificação e conhecimento da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, tinha, em 19 de Janeiro de 2015, transferido todo o seu património para familiares e amigos onde se incluem os aqui AA. AA e a sua companheira BB e, mãe de sua filha EE e com a conivência destes de modo a impedir a penhoras dos mesmos.
Ora, foi para impedir a transmissão dos bens que a aqui Ré instaurou também Providência Cautelar de Arresto de bens que estivessem na titularidade dos AA, para, após prolação de sentença favorável pudessem garantir o crédito da Ré, onde se incluem os veículos automóveis em discussão nestes autos, sem audição dos requeridos.
Impugna também os prejuízos alegados pêlos autores.Por fim, pede que os autores sejam condenados como litigantes de má fé.
Os autores vieram responder.
O tribunal proferiu o seguinte despacho:
“Atentos os documentos juntos, os processos em curso, e o teor dos articulados, o tribunal, à luz do disposto no art. 374.º, do CPC, considera estar na posse de todos os elementos para proferir decisão final por escrito.”
Perante isto, os autores não deduziram oposição.Todavia, a ré discorda, porquanto não estão preenchidos nenhum dos pressupostos do art. 374º do CPC, ou seja, nem a providência que correu termos Tribunal Judicial da Comarca ... Juízo Central Cível ... |Juiz ... sob o nº de Processo 98/... foi considerada injustificada nem veio a caducar por facto imputável à requerente. Pelo contrario,alega, foram impugnadas judicialmente as transmissões feitas por DD aos aqui AA. BB e AA, respetivamente companheira e filho de DD, Processo esse que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca ... Juízo Central Cível ... | Juiz ... sob o nº de Processo 98/.... e constituindo o processo principal do que a providencia cautelar é apenso e ainda não tem decisão final.
Os autores responderam dizendo que no processo n.º 98/... que corre termos pelo ..., Juiz ..., não foram incluídas as viaturas matrículas ...-...-HC, ...-...-QG e ...-...-EF que nunca pertenceram a DD, encontrando-se registadas a favor dos autores que sempre as utilizaram e fruíram das suas utilidades. Pelo que, é falso que a Ré tenha impugnado as (inexistentes) transmissões das viaturas por parte de DD a favor dos aqui autores. Deste modo, a decisão final a proferir no processo 98/... não terá qualquer interferência ou relevância para o objeto do litígio nos presentes autos.

Entretanto, foi proferido despacho saneador-sentença que conheceu do mérito da causa e colocou termo à acção e, assim, o tribunal julgou a ação improcedente e absolveu a ré do pedido, bem como, absolveu os autores do pedido de condenação como litigantes de má fé.
Inconformados, os autores apelaram e concluíram nos termos seguintes

1)Os Autores invocaram no articulado inicial que as viaturas automóveis que lhes pertenciam (com as matrículas ...-...-HC, ...-...-QG e ...-...-EF) foram apreendidas no âmbito da providência cautelar de arresto que correu os seus termos sob o n.º 2072/19.... do Juiz ... do Juízo Central Cível ....

2) Mais expenderam que apresentaram oposição (julgada procedente) ao procedimento cautelar, pugnando pela procedência da oposição e consequente levantamento do arresto.
3) Assim sendo, os Autores ao procederem à junção desta sentença, reproduziram, acolheram e chamaram à colação, além do desiderato decisório, a factualidade assente na decisão e os fundamentos aí vertidos.
4) Da factualidade assente resulta o seguinte:

O veículo ...-...-HC é um veículo do ano de 1996 (ponto 19),
Foi adquirido pelo requerido (aqui Autor) em Março de 2016 e registado a seu favor a 21-03-2016 (cfr doc 1 junto), (ponto 20),
A anterior proprietária daquela viatura era FF, avó do requerido, que adquiriu o veículo no ano de 1999 (cfr doc 1 e 4 juntos), (ponto 22),
O veículo ...-...-QG, marca ..., encontra-se registado a favor da requerida (aqui Autora) desde 06-01-2005 (cfr doc 1 junto),
O anterior proprietário, a quem a requerida adquiriu o referido veículo era a O..., S.A. e foi adquirido com reserva de propriedade à GG (cfr doc. 1 junto),
Por sua vez o veículo ...-...-ED, foi adquirido pela requerida no ano de 2004, encontrando-se registado a favor da mesma desde 14-10-2004 e o anterior proprietário era HH (cfr doc 2 junto).

5) Sendo que estes factos resultaram da prova documental junta com a oposição à providência cautelar, designadamente das certidões emitidas pela Conservatória do Registo Automóvel que atestam os anteriores proprietários das viaturas e a data de aquisição das mesmas por parte dos Autores.
6) Encontra-se também provado que o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que reconheceu o crédito da Ré foi proferido a 8 de Janeiro de 2015.
7) As viaturas pertencentes à Autora foram adquiridas cerca de dez anos antes da constituição do crédito da Ré.
8) Além disso, as viaturas dos Autores nunca pertenceram a DD que é o efetivo devedor da Ré.
9) Deste modo, mesmo a admitir-se (no que não se concede) que a Ré agiu com a normal prudência ao peticionar o arresto das viaturas em causa, quando foi notificada da oposição à providência cautelar e respetiva prova documental onde se incluem as certidões emitidas pela Conservatória do Registo Automóvel, cessou a presumível prudência e boa-fé da Ré.
10) Nessa altura, a Ré ficou a saber com toda a certeza, por um lado, que as viaturas da Autora haviam sido adquiridas há mais de 10 anos e, por outro, que as viaturas arrestadas nunca pertenceram a DD sobre quem a Ré detém o crédito invocado a quando da instauração do arresto.
11) Desde então, a Ré, ao não desistir do arresto decretado, persistindo na sua intenção de manter as viaturas apreendidas (como sucedeu) atuou de forma dolosa apenas com o intuito de perseguir e prejudicar a utilização por parte dos Autores das viaturas. Incorreu, por isso, num comportamento ilícito.
12) Tal como fundamentou a decisão que considerou procedente a oposição «não se mostram preenchidos os requisitos
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