Acórdão nº 3037/20.0T8CBR.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 16-09-2022
Data de Julgamento | 16 Setembro 2022 |
Ano | 2022 |
Número Acordão | 3037/20.0T8CBR.C1 |
Órgão | Tribunal da Relação de Coimbra |
Apelação 3037/20.0T8CBR.C1
(secção social)
Relator: Azevedo Mendes
Adjuntos:
Felizardo Paiva
Paula Maria Roberto
Autor: AA
Rés: S..., S.A.
C..., Lda
Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:
I. O autor instaurou contra as rés a presente acção declarativa de condenação pedindo, nomeadamente, que: (a) seja a 1.ª ré condenada a reconhecer que a ela se manteve vinculado por contrato de trabalho apesar do resultado do concurso público que descreve em 17.º da petição inicial; (b) seja declarada a ilicitude do seu despedimento pela 1.ª ré, condenando-a a reintegrá-lo nas suas funções, sem prejuízo da categoria e antiguidade, bem como condenando-a a pagar as retribuições que deixou e deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude, sem prejuízo da possibilidade de optar, entretanto, pela indemnização de substituição; (c) seja a 1.ª ré condenada a pagar-lhe a quantia de € 5.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais. Subsidiariamente, relativamente aos pedidos formulados em a), b) e c), que (d) seja a 2.ª ré condenada a reconhecer que ele passou a estar vinculado a ela ré por contrato de trabalho a partir do dia 1 de Maio de 2020, mantendo-se os direitos contratuais decorrentes do contrato que vigorava com a 1.ª ré e adquiridos, nomeadamente no que toca a retribuição, antiguidade, categoria profissional, conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos; (e) seja declarada a ilicitude do despedimento pela 2.ª ré, condenando-a a reintegrá-lo nas suas funções, sem prejuízo da categoria e antiguidade, bem como condenando-a a pagar as retribuições que deixou e deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude, sem prejuízo da possibilidade de optar entretanto pela indemnização de substituição; (f) seja a 2.ª ré condenada a pagar-lhe a quantia de € 5.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais; (g) e, em qualquer caso, a pagar-lhe juros de mora sobre os montantes referidos em a) a f) desde a citação até efectivo e integral pagamento.
A ré S..., S.A. deduziu contestação alegando, para além do mais e em síntese, que o autor deixou de pertencer aos seus quadros em 30.04.2020, sendo que todos os seus direitos passaram a ter que ser assumidos pela transmissária C..., Lda, entidade a quem o serviço de vigilância que prosseguia - e ao qual o autor estava afecto - foi adjudicado com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2020 pelo cliente Município ..., tendo transmitido validamente o vínculo laboral para aquela C..., Lda, que deverá assumir, nos termos da lei, a antiguidade, categoria e demais características do mesmo. Com a adjudicação à C..., Lda, alegou que o contrato de prestação de serviço de segurança privada no espaço, locais e instalações do Município ..., norte, iniciou-se em 1 de Maio de 2020, quando aquela começou a prestar a sua atividade no âmbito da aludida adjudicação, assumindo o serviço de vigilância adjudicado até então à S..., S.A e manteve, integralmente, as mesmas caraterísticas em relação àquele que anteriormente vinha a ser prestado. Manifestou o entendimento que o serviço prestado por si, e que foi adjudicado à sua congénere C..., Lda, se assume como uma verdadeira unidade económica na acepção do artigo 285.º do Código do Trabalho, pelo que a transmissão operada do autor é lícita e a existência ou não de justa causa para rescisão do vínculo do autor não lhe diz respeito, visto que desde a data referida já transmitira o estabelecimento para a 2ª ré, bem como os trabalhadores. Alegou ainda, por outro lado, que a C..., Lda não demonstra nem indicia qualquer problema de solvabilidade ou financeiro que justifique oposição à transmissão da posição de empregador manifestada pelo autor. Concluiu pela improcedência da ação.
Por sua vez, a ré C..., Lda contestou, deduzindo oposição à reintegração do autor e arguindo a sua ilegitimidade passiva. Por impugnação, alegou para além do mais e em síntese, que o autor não se apresentou para lhe prestar serviço, nem o poderia fazer uma vez que a partir do dia 1 de Maio de 2020 foi a ré contestante quem assumiu a segurança e vigilância das instalações do Município ... com os seus próprios trabalhadores, considerando não se estar perante qualquer conceito de unidade económica no serviço de segurança que passou a prestar para o Município ..., pelo que não ocorreu transmissão de posto e, nunca tendo o autor sido seu trabalhador, não se encontrava obrigada a atribuir-lhe trabalho. Defendeu, por conseguinte, que não procedeu a despedimento, muito menos ilicitamente. Mais alegou que o serviço desempenhado nos postos de ..., como não constituía, nem constitui, um “estabelecimento” ou uma unidade económica, não determinou transferência do contrato de trabalho do autor, o qual não sofreu descontinuidade, mantendo-se contratualmente ligado à 1ª ré, continuando a ser seu trabalhador, não obstante ela ter perdido o concurso público e, por conseguinte, a concessão dos serviços de vigilância e segurança nas instalações indicadas pela Câmara Municipal .... Defendeu que o autor poderá ter sido objeto de um despedimento ilícito por facto imputável ao empregador, por não ter sido precedido do respetivo procedimento, cometido pela 1ª ré, devendo ser esta a única e exclusiva responsável pelo petitório da acção, ficando assim prejudicado o conhecimento do pedido subsidiário contra si formulado. Concluiu pela improcedência da acção com a sua consequente absolvição.
Realizou-se audiência de julgamento, tendo o autor manifestado a sua opção pela indemnização em substituição da reintegração.
Prosseguindo o processo, veio a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e, em consequência, declarou que o contrato de trabalho do autor, a partir de 1 de Maio de 2020, se transmitiu para a ré C..., Lda, e declarou ilícito o despedimento do autor promovido pela mesma ré e condenou-a a pagar ao autor: a) as retribuições que deixou de auferir desde 01.05.20 até ao trânsito em julgado da sentença, deduzidas dos rendimentos ou subsídios de desemprego que tenha auferido e não auferiria se não fosse o despedimento, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, bem como das retribuições relativas ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, a determinar em liquidação de sentença, acrescidas dos juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação e até efectivo e integral pagamento, quanto às importâncias já vencidas até essa altura e desde o final de cada um dos meses subsequentes até integral pagamento, em relação às demais que se foram vencendo; b) uma indemnização, em substituição da reintegração, fixada em 30 dias de retribuição por cada ano ou fracção de antiguidade, desde a data de celebração do contrato, até ao trânsito em julgado da sentença e respetivos juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal de 4%, desde a data do trânsito em julgado da decisão até integral pagamento.
Absolveu a ré C..., Lda do demais peticionado pelo autor e absolveu também a ré S..., S.A de todos os pedidos formulados.
É desta sentença que, inconformada, a ré C..., Lda veio apelar.
Alegando, concluiu:
«I. Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls. proferida pela Meritíssima Juiz do Juiz ... do Juízo do Trabalho ... que decidiu pela transmissão do contrato do Autor para a Ré C..., Lda, e ao pagamento ao Autor das: a) retribuições que deixou de auferir desde 01/05/20, até ao trânsito em julgado da presente sentença, deduzidas dos rendimentos ou subsídios de desemprego que tenha auferido e não auferiria, se não fosse o despedimento, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social, bem como das retribuições relativa ao período decorrido, desde o despedimento, até 30 dias antes da propositura da ação, a determinar em liquidação de sentença, acrescidas dos juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento, quanto às importâncias já vencidas até essa altura, e desde o final de cada um dos meses subsequentes, até efetivo e integral pagamento, em relação às demais que se foram vencendo; b) Uma indemnização, em substituição da reintegração, que fixo em 30 (trinta) dias de retribuição por cada ano ou fração de antiguidade, desde a data de celebração do contrato, até ao trânsito em julgado desta sentença, que nesta data perfaz a quantia de € 15.439,00 – quinze mil, quatrocentos e trinta e nove euros - e respetivos juros de mora vencidos e vincendos à taxa legal de 4%, desde a data do trânsito em julgado da presente decisão, até efetivo e integral pagamento.
II. A Recorrente apresentou a sua contestação, em que em suma, alegou, para tanto: a) a sua ilegitimidade passiva pelo facto de considerar válida a oposição realizada pelo trabalhador; b) a inexistência de conceito de unidade económica, o que impedia a verificação da transmissão de posto; c) inexistência de despedimento ilícito pelo vínculo contratual do Autor não se ter transmitido da Ré S..., S.A para si; d) inexistência de qualquer indemnização ou compensação a liquidar ao Autor.
III. Considerou o Tribunal a quo, que o Autor não demonstrou a existência de prejuízo sério ou razões que o fizessem suspeitar da sustentabilidade da nova empresa, i.e., falta de confiança na política de organização do trabalho do adquirente, não se verificando como válida a oposição à transmissão por si feita operar.
IV. A referida posição do Tribunal a quo não encontra suporte legal, nem factual, porquanto, a legislação laboral não prevê a existência de um prejuízo sério, mas sim um juízo de prognose – a possibilidade de se vir a verificar um prejuízo sério que se deva à transmissão da posição do empregador.
V. Prejuízo sério esse que deve consubstanciar um dano relevante, que não...
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