Acórdão nº 3018/22.9T8STS.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-11-09

Ano2023
Número Acordão3018/22.9T8STS.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo: 3018/22.9T8STS.P1
Tribunal Judicial da Comarca do Porto/Juízo Local Cível de Santo Tirso - Juiz 1

Relatora: Isabel Peixoto Pereira
1º Adjunto: Isabel Silva
2º Adjunto: Ernesto Nascimento
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Acordam os juízes da 3.ª secção do Tribunal da Relação do Porto:

I.
AA e BB vieram propor contra a HERANÇA ILÍQUIDA E INDIVISA ABERTA POR ÓBITO DE CC, aqui representada pela cabeça-de-casal DD, DD e EE, ação especial para fixação judicial de prazo, concluindo a final pedindo seja fixado judicialmente o prazo de 60 dias para o pagamento / vencimento da dívida dos Requeridos para com as Requerentes AA e BB (ou outro prazo considerado mais adequado), quantia esta que se obrigaram a satisfazer em contrato-promessa de partilha, junto aos autos.
Os requerentes alegaram que a 2ª. Requerida juntamente com o seu marido CC, outorgaram e assinaram um contrato-promessa de partilha datado de 15/11/2006, nos termos do qual o quinhão hereditário da Requerente AA seria preenchido apenas com dinheiro (não recebeu qualquer prédio), pelo que ficou convencionado que ela receberia do irmão CC e da esposa, aqui 2ª Requerida, a título de tornas, a quantia de 75.000,00€. E que relativamente à Requerente BB, do dito contrato-promessa de partilha, resulta que o quinhão hereditário da mesma seria preenchido apenas com dinheiro (não recebeu qualquer prédio), pelo que ficou convencionado que ela receberia do irmão CC e da esposa, aqui 2ª Requerida, a título de tornas, a quantia de 10.000,00€. Que o marido da 2ª. Requerida, CC, veio a falecer em 4 de Junho de 2012, tendo deixado como herdeiros a sua esposa, aqui 2ª. Requerida, e um filho, aqui 3º Requerido, atualmente com 18 anos. E que no referido contrato-promessa de partilha não consta o prazo de pagamento ou vencimento da dívida, razão pela qual requerem a fixação desse prazo em 60 dias, que reputam de razoável e adequado.
Responderam os RR, sustentando que não pode o tribunal fixar um prazo para o cumprimento de uma obrigação inexistente, o que impõe seja a acção julgada improcedente e os requeridos absolvidos do pedido.
Frustrada tentativa de conciliação das partes, foi proferida sentença, na qual se decidiu da fixação do prazo requerido em 60 dias.
É dessa sentença que vem interposto recurso de apelação, concluindo a recorrente nos seguintes termos:
1ª – Ao julgar a presente ação procedente e fixar o prazo peticionado de 60 dias para os requeridos cumprirem a obrigação de pagamento de tornas à requerente AA na quantia de 75.000,00€ e à requerente BB na quantia de 10.000,00€, a douta sentença recorrida violou o disposto nos arts. 777º, nºs 1 e 2, do CC e também nos arts. 1026º e 1027º, nº 2 – parte final, do CPC.
2ª - Conforme alegaram os requeridos na resposta que deduziram nos autos, inexiste a obrigação de terem de pagar tornas às recorridas com base no contrato promessa de partilhas junto aos autos.
3ª - Não existindo a obrigação dos requeridos de pagar tornas às requerentes não se justifica que o tribunal seja chamado a fixar um prazo para cumprimento de uma obrigação inexistente, por inutilidade da lide.
4ª - Sendo a obrigação de pagamento de tornas uma obrigação pura, que, nos termos do nº 1 do art. 777º do CC, são as obrigações que, por falta de estipulação ou disposição em contrário, se vencem logo que constituídas, ou seja, logo que o credor, mediante interpelação, exija o seu cumprimento ou o devedor pretenda realizar a prestação devida, a obrigação em causa não carece de fixação de prazo para o seu vencimento.
5ª – As autoras alegam que a recorrente juntamente com o marido CC, entretanto falecido, outorgaram e assinaram um contrato-promessa de partilha, datado de 15/11/2006, nos termos do qual o seu quinhão hereditário seria preenchido apenas com dinheiro, pois não receberam qualquer prédio, ficando aí convencionado que receberiam do irmão CC e da esposa, a título de tornas, a A. AA a quantia de 75.000,00€ e a A. BB a quantia de 10.000,00€, mas que nesse contrato-promessa de partilha não consta o prazo de pagamento ou vencimento da dívida.
6ª – E nesse sentido requerem ao tribunal a fixação do prazo de 60 dias (ou outro prazo que se considere mais adequado) para o pagamento / vencimento da dívida dos Requeridos para com as Requerentes.
7ª - Como prova da obrigação de pagamento dos referidos montantes de tornas às requerentes, que alegam ter sido assumida pela recorrente e o seu falecido marido no contrato-promessa de partilha da herança dos pais, que dão por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais, citam apenas a parte final da cláusula 3ª desse contrato promessa, onde se refere: “… e da quantia de setenta e cinco mil euros que os mesmos primeiros outorgantes devem, desde dezassete de Julho de dois mil e três à AA, a aqui terceira outorgante mulher, que vence juros à taxa anual de sete vírgula trinta por cento”.
8ª - O que constitui clara deturpação do acordo descrito na cláusula terceira do contrato-promessa de partilha, que estabelece a seguinte forma de preenchimento dos quinhões das requerentes e do falecido marido da 2ª requerida da herança dos pais: - “Os primeiros outorgantes acordam que os prédios descritos em b) e c), após a morte daquela mãe e sogra FF, terão o destino que entretanto já lhes foi dado, e como destinatários e proprietários os mesmos outorgantes a quem foram doados, nada mais tendo os primeiros outorgantes a reclamar ou receber dos outros outorgantes à exceção da quantia de dez mil euros que os primeiros outorgantes devem à BB, a aqui segunda outorgante mulher, desde dezassete de Julho de dois mil e três, a qual vence juros à taxa anual de dez por cento; e da quantia de setenta e cinco mil euros que os mesmos primeiros outorgantes devem, desde dezassete de Julho de dois mil e três à AA, a aqui terceira outorgante mulher, que vence juros à taxa anual de sete vírgula trinta por cento”.
9ª – Esclarece-se que ao ser referido nesse contrato promessa que os primeiros outorgantes (o falecido irmão das recorridas e sua mulher, a recorrente) nada mais têm a receber dos outros outorgantes à exceção da quantia de 10.000,00€, não obstante, mencionar-se, de seguida, que devem essa importância à BB desde 17/07/2003, e da quantia de 75.000,00€, sendo mencionado também, de seguida, que devem à AA igualmente desde 17/07/2003, parece evidente que por este contrato promessa de partilhas (da herança dos pais) quem tinha a receber tornas nos referidos montantes eram os primeiros outorgantes, mais propriamente o falecido marido da recorrente.
10ª – E que a requerente BB, a quem já tinham sido doados os prédios descritos na al. b) da cláusula 2ª desse contrato promessa, por força do acordo constante da cláusula 3ª do mesmo contrato, tem a receber os dois prédios que lhe foram doados pelos pais e a requerente AA, a quem já tinha sido doado o prédio descrito na al. c) da cláusula 2ª, tem a receber o prédio que lhe fora doado pelos pais.
11ª - Como podem as requerentes pretender que o tribunal fixe prazo para os requeridos lhes pagarem uma dívida de tornas relativas ao seu quinhão da herança dos pais, por força do “contrato-promessa de partilhas”, que juntaram aos autos e dão por integralmente reproduzido, se a mãe delas ainda é viva, conforme alegado pelos requeridos?!
12ª – Ao que acresce o facto de estar estabelecido no mesmo contrato promessa de partilhas que este documento tem plena validade, e, como tal, produzirá os seus efeitos, após a morte da mãe e sogra dos outorgantes?!
13ª – Ocorrendo a abertura da herança da mãe na data do seu falecimento, não podem as recorridas vir ao abrigo do contrato promessa de partilhas que juntaram ao seu requerimento inicial reclamar o pagamento de tornas do seu quinhão dessa herança.
14ª - Sendo este contrato promessa a única prova, ainda que meramente indiciária, que apresentaram nos autos, da dita obrigação de pagamento que imputam aos requeridos, para cujo vencimento vieram pedir ao tribunal a fixação do prazo de 60 dias, carece de justificação a fixação desse prazo determinado pela Mma Juíza a quo.
15ª - A Mma Juíza a quo deu como provados os seguintes factos: “A. Os requerentes alegaram que a 2ª Requerida juntamente com o seu marido CC, outorgaram e assinaram um contrato-promessa de partilha datado de 15/11/2006, nos termos do qual o quinhão hereditário da Requerente AA seria preenchido apenas com dinheiro (não recebeu qualquer prédio), pelo que ficou convencionado que ela receberia do irmão CC e da esposa, aqui 2ª Requerida, a título de tornas, a quantia de 75.000,00€.” - B. E que relativamente à Requerente BB, do dito contrato-promessa de partilha, resulta que o quinhão hereditário da mesma seria preenchido apenas com dinheiro (não recebeu qualquer prédio), pelo que ficou convencionado que ela receberia do irmão CC e da esposa, aqui 2ª Requerida, a título de tornas, a quantia de 10.000,00€.” - C. Que o marido da 2ª Requerida, CC, veio a falecer em 4 de Junho de 2012, tendo deixado como herdeiros a sua esposa, aqui 2ª Requerida, e um filho, aqui 3º Requerido, atualmente com 18 anos.” - D. E que no referido contrato-promessa de partilha não consta o prazo de pagamento ou vencimento da dívida e requer a fixação desse prazo em 60 dias, que reputam de razoável e adequado. - E.Na sequência da citação, os requeridos vieram apresentar contestação, defendendo-se negando a existência da obrigação de pagamento invocada pelos requerentes.”
16ª - A recorrente impugna os factos julgados provados nas alíneas A, B e D da sentença recorrida, factualidade que, salvo o respeito devido e melhor opinião, considera indevidamente julgada provada em face da única prova colhida nos autos, que é o denominado “contrato-promessa de partilhas” junto ao requerimento inicial das requerentes.
17ª-Pelo acordo firmado na cláusula terceira do contrato promessa de partilhas, contrariamente ao que vieram alegar, as
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