Acórdão nº 3007/22.3T8LRS-B.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-11-10

Ano2022
Número Acordão3007/22.3T8LRS-B.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
ACORDAM na 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I) RELATÓRIO
A… veio requerer fosse regulado o exercício das responsabilidades parentais relativas a sua filha de menor idade M.., nascido em 1 de Dezembro de 2014, contra o pai da criança, B...
Alegou que o Requerido e a Requerente viveram em união de facto desde 2013 até 2020, deixando o requerido de habitar com a Requerente e a filha de ambos, passando a viver em casa dos pais, em ...
A Requerente e o Requerido acordaram em que a filha fosse confiada à guarda da mãe e que passasse semanas alternadas com a mãe e com o pai, de sexta a sexta, com interrupção a meio da semana para pernoita em casa do progenitor com quem não estivesse essa semana.
Como a criança sempre tenha beneficiado do apoio da avó materna e frequenta a escola na localidade onde a avó reside, esta vai buscá-la à escola às 17 horas, quando as actividades escolares terminam, trá-la para sua casa, dá-lhe o lanche e aguarda a chegada do pai ou da mãe para a virem buscar, sendo que o pai conclui as suas actividades profissionais pelas 18:30 horas.
O pai pretende alterar o regime estipulado, fazendo cessar a quebra da semana para pernoita em casa do outro progenitor e, na semana em que a filha está consigo, pretende que a avó materna não a vá buscar à escola, aí aguardando a criança pela chegada do pai ou, em alternativa, deverá o avô paterno deslocar-se de …a, para ir buscar a menor à escola.
Designado dia para conferência os pais foram ouvidos e, não tendo chegado a acordo, foi estabelecido regime provisório de regulação das responsabilidades parentais como segue:
1. A criança fica a residir com a mãe e com o pai, em semana alternada, com mudança à sexta-feira ao final das atividades escolares, incumbindo ao progenitor com quem se encontre a residir em cada momento, o exercício das responsabilidades parentais relativa aos atos da vida corrente dos filhos;
2. Na semana em que a criança estiver a residir com determinado progenitor, caberá ao mesma ir busca-la e levá-la à escola, podendo incumbir tal tarefa a outra pessoa da sua confiança;
3. Na semana em que a menor estiver a residir com um dos progenitores pode contactar telefonicamente ou por outro meio de comunicação à distância com o outro progenitor, sempre que o entenda, sem prejuízo dos horários de descanso e das atividades escolares;
4. As responsabilidades parentais relativas às questões de particular importância para a vida da menor (designadamente, a mudança do país de residência, a escolha do estabelecimento de ensino, a realização de intervenções cirúrgicas, deslocações ao estrangeiro e escolha das atividades extra curriculares) são exercidas de comum acordo por ambos os progenitores, salvo caso de urgência manifesta, em que qualquer um dos progenitores poderá agir sozinho, devendo prestar informações ao outro logo que possível.
5. A criança passará com a mãe o dia da mãe e o dia de aniversário desta, e com o pai o dia do pai e o dia de aniversário deste, sendo que esta regra prevalece sobre a regime referente à repartição das férias e à repartição dos períodos de residência;
6. A criança, no dia do seu aniversário, tomará com o pai uma refeição e com a mãe outra, sem prejuízo das respetivas atividades escolares e horas de descanso, sendo que no próximo aniversário almoça com a mãe e janta com o pai, alternando a refeição com um e com outro de ano para ano. Esta regra prevalece sobre a regime referente à repartição das férias e à repartição dos períodos de residência;
7. Nas férias escolares do Natal, a criança passará com um dos progenitores, do primeiro dia de férias até dia 25 de dezembro, entre as 10:30 e as 11:00 horas, passando com o outro progenitor, desde essa data e hora até ao último dia de férias. Este ano, passará o primeiro período com a mãe, alternando nos anos seguintes.
8. Nas férias escolares da Páscoa, a criança passará a primeira semana com a mãe e a segunda com o pai, alternando os períodos com um e com outro dos progenitores, nos anos seguintes;
9. Nos meses de julho e agosto, a criança passará as primeiras quinzenas com o pai e as segundas com a mãe, sem alternância, mas sem prejuízo de acordo dos progenitores em contrário;
10. O regime repartição de férias prevalece sobre o regime de residência;
11. Cada um dos progenitores suporta os custos com alimentação, vestuário, calçado e consumos domésticos (água, gás e eletricidade) e outras despesas correntes da criança, realizadas quando se encontra com cada deles, não havendo lugar a pensão de alimentos.
12. Os progenitores suportarão, em parte iguais, as despesas de saúde (consultas, medicamentos e tratamentos), na parte não comparticipada por terceiras entidades, e extraordinárias escolares (fardamento, visitas de estudo, livros e material escolar) desde que devidamente documentadas (com fatura emitida em nome da menor, com o seu NIF e descriminação do serviço ou bem contratado ou adquirido), a liquidar no prazo de 30 dias a contar o envio dos comprovativos da realização de despesa, pelo progenitor que a realizar ao outro progenitor;
Desta decisão foi interposto o presente recurso pela Requerente que, alegando, concluiu:
a) A Requerente pediu a Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais, alegando a existência de um acordo de facto que estava a ser cumprido mas sobre o qual o requerido manifestava descontentamento, sendo que face às ansiedades da menor e atento o seu superior interesse, deveria tal regime ser homologado.
b) Ouvindo apenas os progenitores, sem ouvir a menor, sem proceder a inquérito social e sem ouvir o depoimento de outros familiares, decidiu o Tribunal a quo estabelecer regime provisório com a cominação de poder ser definitivo, que altera o regime de facto até então cumprido, estabelecendo regras incompatíveis com a ponderação do superior interesse da menor.
c) De uma só penada a Decisão proferida não concede a existência de uma interrupção semanal de pernoita com o outro progenitor com quem a menor não se encontra e sobretudo, semana sim semana não, não permite o contacto, senão à distancia e telefonicamente, da menor com a família materna.
d) A decisão proferida fundada no princípio de igualdade entre progenitores, olvidou de ter em conta o universo afectivo, emocional e geográfico onde a menor se encontra e, por consequência violou os princípios orientadores nesta matéria, nomeadamente o superior interesse da menor, decorrente do disposto, especialmente nos Artigos 4º, 38º, 40º do R.G.T.C.
e) Ao decidir como decidiu o Tribunal a quo negou à menor o direito ao Exercício da Justiça.
Nestes termos e nos melhores de Direito, confiando sempre no mui Douto Suprimento de Vexas, deverá ser concedido provimento ao recurso e, em consequência, revogar-se a douta decisão recorrida, ordenando-se a audição da menor, o depoimento das testemunhas, a realização de inquérito social, aferindo-se da justeza do regime de regulação das responsabilidades parentais, exercido de facto até agora.
ASSIM SE FARÁ JUSTIÇA
O Requerido contra-alegou defendendo o bem fundado da decisão, concluindo as suas alegações como segue:
Este regime provisório deve ser mantido e até mesmo ser convertido em definitivo depois de decorridas todas as fases processuais em vigor, porque:
a) Permitirá à M, e em especial à mãe, perceber que ambos os pais devem ter uma participação ativa na vida da mesma de igual forma;
b) Possibilitará que a menina possa confiar nos dois progenitores e não só na progenitora mãe;
c) Que o pai tem um papel tão preponderante na sua vida tal como a mãe;
d) Que a proteção da Me dos seus interesses é tão prioritário para ele como para a mãe;
e) Que na sua vida deve fazer parte o pai, a mãe, os avós paternos, os avós maternos, assim como outros familiares de ambos os lados e não só os do lado da mãe;
f) Que a menina não se isole, por uma ou duas horas, cada vez que vem de casa da mãe, podendo desde logo manter uma relação muito normal, adequada e até revigorante com o pai e os avós paternos.
Deve, assim, confirmar-se in totum o regime provisório fixado, com o que se fará sã, serena e objetiva Justiça
O Ministério Público contra-alegou defendendo que o recurso não era admissível por a decisão não o admitir, nos termos do artigo 28.º, n.º 5, do RGPTC.
O recurso não foi admitido nos termos da pronúncia do Ministério Público, decisão que, reclamada nos termos do artigo 643.º, do CPC, foi revogada nesta Relação, sendo o recurso admitido para subir imediatamente, em separado e com efeito devolutivo, requisitando-se a formação e remessa do apenso respectivo a esta Relação.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II) OBJECTO DO RECURSO.
Tendo em atenção as conclusões da Recorrente, cumpre apreciar e decidir das seguintes questões:
1. Da omissão de audição da criança e suas consequências.
2. Do mérito da decisão de regulação das responsabilidades parentais na parte em que altera o regime estabelecido por acordo dos pais quanto a pernoita a meio da semana e quanto a recolha da criança na escola.
III) FUNDAMENTAÇÃO
1. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
O despacho recorrido não discriminou os factos indiciariamente assentes que suportam a decisão, resultando do seu teor, nomeadamente da argumentação quanto à situação de vida da M.., que considerou indiciariamente assentes os seguintes factos, do que a Recorrente e o Recorrido não dissentiram:
1) A Requerente e o Requerido acordaram, quando se separaram, em que a filha passasse uma semana com cada um deles, com interrupção a meio da semana para pernoita na casa do progenitor com quem não residia nessa semana.
2) A M.. frequenta a escola em …, localidade onde reside a avó materna, que a vai buscar à escola, trá-la para sua casa, dá-lhe o lanche e aguarda a chegada do pai ou
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