Acórdão nº 3/19.1GCSEI-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2024-02-07

Ano2024
Número Acordão3/19.1GCSEI-A.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (GUARDA (JUÍZO DE COMPETÊNCIA GENÉRICA DE SEIA – J2))
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Acordam, em conferência, na 4ª secção Penal do Tribunal da Relação de Coimbra:

I. RELATÓRIO

No âmbito do processo comum singular n.º 3/19...., que corre os seus termos no Juízo de competência genérica de Seia, por determinação da respetiva titular, foi notificado o Banco 1... para informar o titular da conta bancária com determinado IBAN, para onde o IGFEJ remeteu o montante de 335,07 euros devido à G..., S.A., a título de custas de parte .

Contudo, o Banco 1... invocou o segredo profissional, ao abrigo do artigo 78º do DL. 298/92 de 31/12.

Na sequência, o Ministério Público junto da 1.ª instância requereu que fosse suscitado o presente incidente de quebra do sigilo bancário.

Aberta conclusão, foi considerada fundamental a obtenção do elemento em causa, a fim de ser devolvida a quantia indevidamente ali depositada, pelo que remeteu os autos a este Tribunal, nos termos do artigo 135º do C.P.P..

O Ministério Público junto deste Tribunal da Relação acompanhou a posição da 1ª instância.

Colhidos os vistos legais e realizada a conferência, cumpre apreciar e decidir.

II. OBJECTO DO RECURSO

No presente incidente importa apenas apreciar e decidir se se mostra justificada a quebra do dever de sigilo invocado pela instituição bancária.

III. APRECIAÇÃO DO INCIDENTE

3.1. Dever de sigilo bancário

O segredo profissional traduz-se na proibição de revelar factos de que se teve conhecimento ou foram confiados em razão e no exercício de uma actividade profissional.

De acordo com o Parecer nº 110/566, do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, citado no Acórdão do S.T.J. de 15/2/2000, in CJ, Acs do STJ, tomo I, p.85, «O exercício de certas profissões, como o funcionamento de determinados serviços, exige ou pressupõe, pela própria natureza das necessidades que tais profissões ou serviços visam satisfazer, que os indivíduos que a eles tenham de recorrer revelem factos que interessam à esfera íntima da sua personalidade, quer física, quer jurídica. Quando esses serviços ou profissões são de fundamental importância colectiva, porque virtualmente todos os cidadãos carecem de os utilizar, é intuitivo que a inviolabilidade dos segredos conhecidos através do seu funcionamento ou exercício constitui, como condição indispensável de confiança nessas imprescindíveis actividades, um alto interesse público».

Conforme salientado por Ana F. Neves, «Os segredos no Direito», in AAFDL, 2019, p. 20-21, o sigilo «é uma imposição legal específica de circunspecção relativamente a informação, documentos e factos de que se tenha conhecimento num certo contexto funcional ou institucional».

A violação do segredo profissional até merece tutela penal, constituindo o crime previsto e punido pelo artigo 195º do C.P..

O presente incidente versa a matéria da quebra do dever de sigilo invocado por uma instituição bancária.

Dispõe o artigo 78º do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, aprovado pelo Decreto-Lei 298/92 de 31/12, exactamente sob a epígrafe «Dever de segredo» que

«1 - Os membros dos órgãos de administração ou fiscalização das instituições de crédito, os seus colaboradores, mandatários, comissários e outras pessoas que lhes prestem serviços a título permanente ou ocasional não podem revelar ou utilizar informações sobre factos ou elementos respeitantes à vida da instituição ou às relações desta com os seus clientes cujo conhecimento lhes advenha exclusivamente do exercício das suas funções ou da prestação dos seus serviços.

2 - Estão, designadamente, sujeitos a segredo os nomes dos clientes, as contas de depósito e seus movimentos e outras operações bancárias.

3 - O dever de segredo não cessa com o termo das funções ou serviços.».

Em face da norma transcrita, é indubitável que os bancos estão onerados com o dever de sigilo, devendo invocá-lo quando, como ocorre na situação em apreço, é solicitada informação sobre factos cobertos pelo aludido segredo.

Nomeadamente, por não ter sido dele libertado pelos seus clientes :

Trata-se da primeira excepção ao dever de segredo, consagrada no nº 1 do artigo 79º do DL. 298/92.

As restantes excepções estão previstas no nº 2 desse artigo, como segue :

«2–Fora do caso previsto no número anterior, os factos...

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