Acórdão nº 29624/13.4T2SNT-U.L1-1 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-09-05

Ano2023
Número Acordão29624/13.4T2SNT-U.L1-1
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa,

1. A MASSA INSOLVENTE DA SOCIEDADE … – TRANSPORTES MARÍTIMOS …, LDA., representada pelo Sr. Administrador da Insolvência, veio intentar a presente acção com processo comum contra E…, LDA., sociedade por quotas com o número único de pessoa colectiva e de matrícula …, com sede na … Marinha Grande, pedindo a condenação da Ré ao cumprimento do contrato de fretamento celebrado com a Autora, bem como a pagar-lhe o valor de € 904.650,00 (novecentos e quatro mil e seiscentos e cinquenta euros), os juros moratórios vencidos que, à data da entrada da presente acção, computou em €142.322,95 (cento e quarenta e dois mil, trezentos e vinte e dois euros e noventa e cinco cêntimos) e ainda os juros vincendos até efectivo e integral pagamento.
Para tanto alegou, em síntese, que no dia 03.02.2014 a sociedade … Transportes Marítimos …, Lda celebrou com a Ré um contrato através do qual fretou a esta o navio com a designação «....» pelo prazo de 24 meses, com a possibilidade de prorrogação, por opção do afretador, por um período adicional de 6 meses, sendo que o navio foi colocado à disposição da Ré no dia 24.05.2014. O contrato vigorou por um período inicial de 24 meses, até ao dia 24.05.2016, tendo o período de fretamento sido prorrogado por seis meses, tendo assim vigorado até ao dia 24.11.2016. Nos termos do contrato, a Ré ficou obrigada a pagar à Autora um valor de €1.065,00 por cada dia de duração do fretamento, devendo efectuar o pagamento do frete devido em prestações mensais com o valor de €31.950,00, cada uma. A primeira prestação a pagar pela Ré venceu-se no dia 24.05.2014 e as demais no dia 24 de cada mês subsequente, tendo a última prestação vencimento no dia 24.11.2016, data até à qual a Ré ficou obrigada a entregar o navio à Autora. Caso não entregasse o navio no prazo indicado, a Ré estava obrigada a pagar à Autora, por cada dia adicional de utilização do navio, um valor de €1.065,00, acrescido de uma taxa 10%, ou o valor de mercado aplicável à data, caso este fosse superior. Após intimação do Administrador de Insolvência, a Ré apenas entregou o navio à Autora no dia 23.12.2016. Mais alegou que a Ré apenas pagou à Autora os valores correspondentes aos 1.º a 4.º meses de prorrogação do contrato.
Regularmente citada, a Ré apresentou contestação e suscitou a incompetência absoluta do Tribunal. Para além disso, defendeu, no essencial, que no âmbito da sua actividade internacional foram-lhe adjudicados alguns contratos de construção, nomeadamente na Venezuela, tendo sentido necessidade, para transporte das peças para as referidas construções, de fretar, a casco nu, o navio “....”. Alega assim que no dia 3 de Fevereiro de 2014, celebrou com a [Sociedade insolvente] o contrato de fretamento a casco nu por um período de 24 meses com início em 1 de Maio de 2014, tendo aquele período sido prorrogado por mais 6 meses. Mais alegou que sobre o navio “....” pendiam, à data da celebração do aludido contrato de fretamento diversas dívidas. Para que pudesse proceder à entrega do navio .... em perfeito estado de navegabilidade necessário se tornava que o mesmo fosse à docagem e que se procedesse a diversas reparações e substituições de material naquele mesmo navio, o que incumbia à [Sociedade insolvente]. Em Maio de 2014 a [Sociedade insolvente] procedeu à substituição do turbo da máquina do navio ..... Em 16 de Maio de 2014, a [Sociedade insolvente] solicitou à Ré que procedesse, por sua conta e ordem, ao pagamento de reparações feitas, que a Ré levou a efeito, tendo o navio, com esta reparação, realizado em 24 de Maio de 2014, o transporte da mercadoria para a Venezuela, na condição de que após aquela viagem, o navio iria para docagem para que se pudessem proceder às reparações e substituições e por o navio em perfeito estado de navegabilidade. Mais alega que, entre 8 e 19 de Agosto de 2014, o navio esteve em doca seca no porto de Vlissingen, na Bélgica, para reparações e substituição de peças, para cumprir a condição prevista na licença concedida pela identificada Sociedade Classificadora, no montante de €80.000,00 que a Ré pagou, com autorização do senhor Administrador Provisório. Mais alega que a [Sociedade insolvente] e a Ré acordaram que todas as despesas relacionadas com o navio, que a Ré enquanto fretadora pagasse adiantadamente, seriam reembolsadas durante o período de fretamento, sendo deduzidas no valor diário do frete a pagar. Alega assim que as partes acordaram que durante o primeiro período de vigência do contrato de fretamento, nada seria pago pela Ré à [Sociedade insolvente]. Mais alega que efectuou vários pagamentos por conta de dívidas contraídas para e pelo navio .... e por salários da sua tripulação. Defende que a Ré não excedeu o prazo para entrega do navio e nada tem a pagar a este título.
A Autora pronunciou-se sobre a suscitada excepção de incompetência, pugnando pela sua improcedência.
Foi proferido despacho saneador e despachos a indicar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova, os quais não foram objecto de reclamação.
Foi apreciada a suscitada excepção de incompetência absoluta.
Realizou-se a audiência de julgamento, com inteira observância das respectivas formalidades legais.
Por fim, realizada a audiência de julgamento, veio a ser proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente por parcialmente provada e, consequentemente condenou a Ré, no cumprimento do contrato de fretamento e a pagar à Autora:
i)a quantia de €830.700,00 (oitocentos e trinta mil e setecentos euros) a título de prestações vencidas durante a duração da vigência do contrato e respectiva prorrogação, acrescida dos juros legais vencidos desde a data de vencimento de cada prestação, à taxa legal em vigor, no montante de €138.967,85 (cento e trinta e oito mil, novecentos e sessenta e sete euros e oitenta e cinco cêntimos), acrescida dos juros vincendos, a incidir sobre o capital, à taxa legal em vigor até integral e efectivo pagamento.
ii)a quantia de €33.973,50 (trinta e três mil, novecentos e setenta e três euros e cinquenta cêntimos), a título de utilização do navio pelo período de 29 dias após o termo do prazo de prorrogação do contrato de fretamento, ao preço diário de €1.065,00 acrescido de 10%, ou seja, €1.171,50, acrescida dos juros legais vencidos desde a data de 23.12.2016 até à entrada em juízo da presente acção, à taxa legal em vigor, no montante de €1.421,29 (mil, quatrocentos e vinte e um euros e vinte e nove cêntimos), acrescida dos juros vincendos, a incidir sobre o capital, à taxa legal em vigor até integral e efectivo pagamento.
É desta sentença que vem interposto recurso, pela Ré, ora Recorrente, que o termina alinhando as seguintes conclusões:
A. Deu o douto Tribunal dar como não provado: “Em Novembro de 2014, quando o navio .... aportava o Porto de Roterdão, a Ré foi confrontada com um arresto sobre o navio para pagamento de dívida contraída pela [Sociedade insolvente] em período anterior ao Contrato de Afretamento, tendo pago à entidade credora, a Reimerswaal o montante de €106.934,27.”
B. O douto Tribunal entendeu que os factos não provados no qual se inclui o mencionado em A) resultaram da ausência de prova clara em sentido positivo.
C. E que, dos documentos juntos aos autos, não se extrai com clareza a quem foram efectuados esses pagamentos e o motivo que lhes subjaz.
D. Não tem o douto Tribunal qualquer razão.
E. Por um lado, o douto Tribunal considera que as testemunhas ouvidas apresentaram, na sua generalidade, um discurso claro, coerente e lógico, denotando na sua globalidade genuinidade e veracidade no seu depoimento e nessa medida foram valorados.
F. Por outro lado, parece não ter valorado devidamente no que a este facto respeita o depoimento das testemunhas, concretamente, o depoimento do senhor Dr. PC.
G. Nomeadamente ao minuto 16:47, 18:06, 18:17 e 18:32 supra transcritos.
H. Resulta evidente que do depoimento desta testemunha, associado aos documentos juntos aos autos, concretamente juntos com a Contestação sob os nºs 11 e 12, que a ora APELANTE pagou à Reimerswaal o montante de €106.934,27.
I. Desta forma, deve ser dado como provado o seguinte facto: “Em Novembro de 2014, quando o navio .... aportava o Porto de Roterdão, a Ré foi confrontada com um arresto sobre o navio para pagamento de dívida contraída pela [Sociedade insolvente] em período anterior ao Contrato de Afretamento, tendo pago à entidade credora, a Reimerswaal o montante de €106.934,27.”
J. O douto Tribunal deu como não provado: “A Ré pagou à sociedade de direito inglês com a firma “C… Ltd. O montante de €25.600,00, correspondente a um saldo em dívida pela [Sociedade insolvente] de uma conta de escala do navio .....”
K. Mais uma vez, o douto Tribunal “a quo” andou mal ao não ter dado este facto como provado.
L. Para além de resultar claramente dos documentos juntos com a contestação sob o número 15, que incluem transferências bancárias daquele valor, a testemunha senhor RC, foi peremptório ao afirmar que foi a Electrofer a proceder ao pagamento à C…Ltd.
M. Veja-se a este propósito o depoimento da testemunha Sr. RC aos minutos 20:33 e 20:43 acima transcritos.
N. Assim, o facto sob o ponto C. da douta sentença, teria de ser dado como provado como segue: “A Ré pagou à sociedade de direito inglês com a firma “C… Ltd. o montante de €25.600,00, correspondente a um saldo em dívida pela [Sociedade insolvente] de uma conta de escala do navio .....”
O. O douto Tribunal “a quo” condenou, ainda que parcialmente, a ora APELANTE.
P. Não tem o douto Tribunal “a quo” qualquer razão.
Q. Começar-se-á por dizer que, caso o douto Tribunal da Relação venha a dar razão à ora APELANTE no que respeita à reapreciação da prova, aquele valor de € 484.206,17 (quatrocentos e oitenta e quatro mil duzentos e dezasseis euros e 17 cêntimos) será de € 616.740,44 (seiscentos e
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