Acórdão nº 280/22.0T8VFR.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-11-07

Ano2023
Número Acordão280/22.0T8VFR.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
PROCESSO N.º 280/22.0T8VFR.P1
[Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro - Juízo Local Cível de Santa Maria da Feira - Juiz 2]

Relator: Fernando Vilares Ferreira
1.ª Adjunta: Lina Castro Baptista
2.ª Adjunta: Anabela Dias da Silva

SUMÁRIO:
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EM NOME DO POVO PORTUGUÊS, acordam os Juízes da 2.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:
I.
RELATÓRIO
1.
AA intentou a presente ação declarativa de condenação em processo comum contra BB e CC.
Alegou, em síntese, que, por os Réus não conseguirem obter crédito bancário para si, acabou por adquirir um veículo automóvel para aqueles com recurso a crédito bancário; os Réus ficaram com a posse do veículo automóvel e obrigavam-se a entregar mensalmente ao Autor o valor correspondente às prestações bancárias; todavia, nada foi pago pelos réus, vindo o Autor a ser executado e, mais tarde, pago ao exequente a quantia de €17.500,00; a esta quantia acrescem as quantias relativas a impostos que os réus se obrigaram a pagar e não pagaram, mas que o autor foi obrigado a liquidar junto das Finanças; invocou ainda ter sofrido danos não patrimoniais decorrentes da conduta dos Réus.
Pediu a condenação dos Réus a indemnizarem-no na quantia de 18.276,31€, por danos patrimoniais, e na quantia de 2.500,00€, por danos não patrimoniais, acrescidas dos respetivos juros à taxa legal desde a citação até efetivo pagamento, a título de responsabilidade contratual por incumprimento do acordado; e, subsidiariamente, a condenação dos Réus a indemnizarem-no por se terem locupletado sem causa, na quantia de 77.040,00€, acrescida dos juros de mora à taxa legal, desde a citação e até efetivo e integral pagamento.
2.
A Ré CC contestou, invocando, em síntese, que não interveio no negócio a que se refere o Autor; que o Réu era seu marido, mas já não tinham qualquer relação conjugal, e que a alegada dívida foi em proveito exclusivo do Réu, pelo que é exclusivamente da responsabilidade dele; entregou 4 mil euros ao Autor, mas apenas por força de pressão deste; os serviços que o Réu prestava ao Autor eram descontados no valor do carro; o documento assinado por si, junto com a petição inicial, foi assinado em branco.
O Réu BB também contestou, alegando que acordou com o Autor por este lhe ter criado a expectativa de que iriam criar uma sociedade; por força do acordo, entregou 1050 euros ao Autor, assim como lhe prestou serviços que eram descontados no valor do carro; deixou de usar o automóvel em 4.8.2013, data em que o mesmo foi penhorado; invocou ainda abuso do direito por parte do Autor, por ter criado fundada expectativa de que a reclamação do pagamento dos valores das prestações em falta não iria ser exercitada; impugnou o enriquecimento sem causa e invocou a respetiva prescrição.
3.
Teve lugar audiência prévia, no âmbito da qual foi proferido despacho saneador que julgou válida e regular a instância; procedeu-se à enunciação do objeto do litígio e à fixação dos temas da prova (Apurar se a Ré também se vinculou ao acordo supra referido e, em caso negativo, se se trata de uma dívida exclusiva do réu; Apurar se os Réus pagaram alguma quantia ao autor e se os serviços prestados pelo Réu ao Autor eram descontados no valor do carro; Apurar se o Autor pagou ao exequente da execução supra identificada a quantia de €17.500,00; Apurar se o Autor pagou impostos relativos ao carro e que os Réus tinham que pagar; Apurar se o Autor sofreu danos não patrimoniais por força da conduta dos Réus; Apurar o período temporal em que o veículo foi usado pelos Réus e qual o custo diário de um veículo semelhante; Apurar se o Autor criou no Réu uma fundada expectativa de que não iria reclamar do Réu o pagamento dos valores relativos àquele acordo).
4.
Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi prolatada sentença, com o seguinte DISPOSITIVO:
[Pelo exposto, tendo em atenção as considerações produzidas e as normas legais citadas, decido:
a) Condenar os réus a pagar ao autor a quantia de €17.612,13, acrescida de juros civis vencidos e vincendos desde a data da citação até integral e efectivo pagamento;
b) Absolver os réus do demais peticionado;
c) Condenar o autor e os réus nas custas do processo, sendo aquele na proporção de 16% e estes na proporção de 84%.]
5.
Inconformado com a sentença, o Réu BB interpôs o presente recurso de apelação, com subida nos próprios autos e efeito devolutivo, versando matéria de facto e de direito, assente nas seguintes CONCLUSÕES:
1.ª A douta sentença enferma de fundamentação que está em oposição com a decisão proferida, bem de ambiguidade e da obscuridade, o que torna a decisão ininteligível e, consequentemente, leva à respectiva nulidade, nos termos e para efeitos do art. 615º nº 1 al. c) do CPC. Isto porque:
2.ª Como pode a Douta sentença recorrida decidir, como o fez, nos termos supra exposto no ponto II -1., quando não dá como provada qualquer data referente aos factos dados como provados, nomeadamente em 1. a 8.?
Ou seja, sem tais datas, como concluiu pela condenação do recorrente no pagamento da quantia de €17.500,00, por violar o contrato a que estava vinculado?
3.ª Mas mais, dados como provados os factos 11 e 12, como pode o Tribunal a quo condenar o recorrente no pagamento da quantia de €17.500,00, sem ser efectuada a respectiva subtração do valor pago pelo Réu?
4.ª Mais ainda, analisada a motivação exposta a fls. da Sentença recorrida sobre a factualidade dada como provada em 15. 16. 17. e 18., não se compreende, nem se aceita, como pode ser dada como não provada a factualidade descrita em f), g), i), j), k, l, m), e n), tornando ininteligível como se pode “condenar os Réus a pagarem ao autor a quantia de €17.500,00, por violarem o contrato a que estavam vinculados”!
5.ª Acresce que se atendermos ao facto dado como provado em 12., nada considerou provado o Tribunal que as prestações tenham sido entregues pelo recorrido ao Banco 1...,S.A. - sendo certo que em 15º da sua PI aquele alega que os réus nunca lhe fizeram qualquer entrega de dinheiro para pagamento de qualquer prestação - pelo que, perante esta realidade, não pode, porque contraditório, afirmar o Tribunal a quo, simultaneamente, que “ Ora, seria essa a quantia a pagar ao autor, pois foi o que as partes estipularam no âmbito das suas relações internas. Todavia, uma vez que os réus não pagavam ao autor, este entrou em incumprimento perante o Banco, vindo a ser executado”
6.ª Ainda mais, dá o Tribunal a Quo provada a factualidade em 13. Mas desde quando, pergunta-se? É que não se dá como provada qualquer data quer de pagamento, quer ao período a que respeitam tais impostos, e é com base neste facto dado como provado que os Réus são condenados no pagamento €112,13, a título de Imposto Único de Circulação. A propósito de tal factualidade pronuncia-se o Tribunal recorrido na respectiva fundamentação, de fls, donde se afere que os €112,13 a título de Imposto Único de Circulação a que os Réus foram condenados a pagar referir-se-ão, alegadamente, ao período de 2016 e de 2018, período em que para além do veículo já estar penhorado e de si desapossado desde Agosto de 2013, conforme facto 14 dado como provado, também não lhe eram exigíveis porque “era o autor quem pagava o seguro e os impostos relativos ao veículo”, conforme assentada lavrada em acta datada de 10.02.2023.
7.ª É, pois, manifesta a oposição de fundamentos com a decisão proferida, bem como a sentença ambígua e obscura, o que leva à respectiva nulidade, nos termos e para efeitos do art. 615º nº 1 al. c) do CPC.
8.ª Acresce que a decisão proferida sobre a matéria de facto e direito enferma de incorrecta interpretação e apreciação da prova produzida em audiência de julgamento, razão pela qual vai impugnada, visando-se a respectiva alteração nos termos e para efeitos dos artigos 638º, nº 7, 639º e 640º, todos do CPC.
9.ª Desde logo quanto à omissão de factos que deveriam ser dados como provados na sequência da motivação sobre a factualidade dada como provada em 15. 16. 17. e 18., exposta a fls. da Sentença recorrida, uma vez que dela resulta manifesto que “Autor e esposa não tinham conhecimento na área ou experiência na área, pelo que o objectivo era que o Réu fizesse parte do projecto, já que era o detentor do know-how necessário.” (art. 662º nº1 e art. 640º CPC)
10.ª Pelo que deverá, em conformidade, acrescentar-se um novo facto dado como provado: “19. Autor e esposa não tinham conhecimento na área ou experiência na área, pelo que o objectivo era que o Réu fizesse parte do projecto, já que era o detentor do know-how necessário.”
11.ª Das declarações de parte do Recorrido resulta que “era o Autor quem pagava o seguro e os impostos relativos ao veículo”, conforme assentada lavrada em acta datada de 10.02.2023.
12.ª Pelo que, e com manifesto interesse para a boa decisão da causa, deverá tal facto ser acrescentado como facto dado como provado: “20. Era o Autor quem pagava o seguro e os impostos relativos ao veículo”.
13.ª De igual modo se impõe a alteração da resposta dada aos pontos f), g), i), j), k, l, m), n) e o) dados como não provados pelo Tribunal a Quo.
14.ª E impõe-no não só o facto de terem sido dados como provados os factos 15. 16. 17. e 18., como também a respectiva motivação a fls. da Sentença recorrida.
15.ª Que outra interpretação pode dar- se a “o objectivo era que o Réu fizesse parte do projecto, já que era o detentor do know-how necessário” que não aquela que sempre foi feita pelo recorrente, ou seja, a de vir a ser sócio do recorrido e que só convicto da futura concretização da aludida parceria é que cessou o contrato de trabalho com a sua entidade patronal DD, é que aceitou tal negócio sobre o veículo e a consequente responsabilização pelo pagamento das prestações, sempre na legítima expectativa que lhe foi criada pelo recorrido, acalentada em Janeiro de 2007 quando a esposa EE fez cessar o
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