Acórdão nº 27655/20.7T8LSB-A.L1-8 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-06-22

Ano2023
Número Acordão27655/20.7T8LSB-A.L1-8
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 8ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa:

Relatório
Por apenso à ação declarativa de condenação que corre termos no Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa – Juízo Central de Lisboa – Juiz 7, sob o nº …., e que M… move contra Md….., veio este último, nos termos e ao abrigo das subalíneas i), e ii), da alínea e), do n.º 1, do artigo 696.º, e dos art.ºs 697.º, e 698.º, todos do CPC, interpor recurso de revisão da sentença ali proferida em 19 de maio de 2021, pela qual foi condenado a pagar ao primeiro a quantia de €78.000,00, acrescida de juros de mora vencidos no valor de €4.917,92, e, ainda, de juros de mora vincendos, desde 22 de dezembro de 2020 até integral e efetivo pagamento.
Alegou, para tanto, e em síntese, a falta de citação para contestar a ação e a nulidade da citação efetuada pela agente de execução, tendo formulado as seguintes conclusões:
“1) Vem o presente recurso da douta sentença proferida nos presentes autos e que decidiu condenar o Réu, “no pagamento ao Autor da quantia de €78.000,00 (setenta e oito mil euros), acrescida de juros de mora vencidos no valor de €4.917,92 (quatro mil, novecentos e dezassete euros e noventa e dois cêntimos), e, ainda, de juros de mora vincendos, desde 22 de Dezembro de 2020 até integral e efectivo pagamento; do mais absolvendo o Réu.”.
2) Isto porque, o Recorrente não se pode considerar regularmente citado, porquanto nunca residiu na morada indicada na Petição Inicial, nem, tão-pouco se encontrava em Território Nacional aquando da citação. Pelo que, salvo o sempre devido respeito por douto entendimento, não pode a revelia do Réu implicar a confissão dos factos alegados pelo Autor.
3) O Recorrente, no passado dia 24 de Novembro de 2021 e, enquanto procurava informação sobre um processo de despejo que sabia que contra si tinha sido iniciado, descobriu a existência dos presentes autos (Conf. Doc. 1), dos quais não teve conhecimento em momento anterior, quer porque se encontrava fora do território nacional, quer porque nunca residiu na morada indicada como sua pelo Autor.
4) A Citação é o acto através do qual se dá conhecimento ao Réu de que contra si foi intentada contra si determinada acção judicial, dando-lhe conhecimento do que é peticionado, e “visa assegurar o direito de defesa de quem é demandado em juízo, garantindo a realização do princípio do contraditório” (Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 04 de Outubro de 2007 em que foi relator o Sr. Desembargador Almeida Simões.)
5) Assumindo, por isso, a citação, um acto de crucial importância no processo civil e que conta com extensa e detalhada previsão no Código do Processo Civil, pelo que o incumprimento dessas exigências legais constitui uma nulidade processual.
6) Por outro lado, cumpre dizer que é ao Autor, que lhe compete a indicação do Domicílio do Réu, tal como decorre do artigo 552.º n.º 1 alínea a) do CPC. Sendo o domicílio do Réu, fixado nos termos das regras gerais previstas nos artigos 82.º e ss do Código Civil.
7) Acontece, porém, que o Réu não foi citado na sua morada, nem sequer, alguma vez teve qualquer residência na morada indicada no intróito, pelo autor.
8) Não se compreendendo de onde resulta a morada indicada nos presentes autos, uma vez que a citação nem sequer é feita para a morada do Réu à data da assinatura do contrato de cessação de posição contratual, nem sequer para a sua morada à data da propositura dos presentes autos – tal como resulta dos documentos 1 junto com a Petição Inicial do Autor e ainda do Documento 2 junto com o presente recurso.
9) Ora, não sendo o domicílio do Réu indicado correctamente, nem tendo o Recorrente qualquer ligação com a morada indicado a verdade é que era impossível que o Réu tivesse sido citado para os presentes autos, ou que de alguma forma tivesse conhecimento de que contra si corriam os presentes autos.
10) Tanto assim é que, num primeiro momento, a citação pessoal por via postal efectuada, mostra-se frustrada, por não ter sido possível fazer a entrega da mesma ao Réu.
11) Consequentemente, é determinada o recurso à citação por agente de execução nos termos do artigo 231.º do CPC.
12) Acontece que, na primeira deslocação ao local indicado como morada do recorrente, a Sra. Agente de Execução não logrou em localizar o Réu, tanto assim é que é a própria agente de execução que refere que “tentou citação por contacto pessoal no dia 27/01/2021 pelas 17h30. Tendo confirmado junto da Sra. de Limpeza do prédio que era a morada do citando”.
13) Ora, não tendo a Agente de execução conseguido identificar a identidade de quem lhe prestou tal informação (nome completo e documento de identificação civil) nem tendo localizado o real proprietário do imóvel a que se deslocou, não se mostra válida o recurso à citação em dia e hora certa, como a mesma decidiu fazer.
14) Ignorando, ainda, que no local indicado como domicílio do Réu, há uma vasta comunidade de emigrantes oriundos de países orientais como o Paquistão, Bangladesh e India e onde é consabido que os nomes como o do Recorrente são tão comuns como a utilização do nome de José, Ana e Manuel.
15) Pelo que a que utilização, tão somente, do nome Md… para identificar o Recorrente, não é um meio bastante para apurar se efectivamente se tratar de local onde o Réu possa ser encontrado.
16) Até porque a Sra. Agente de Execução, tendo ficado na dúvida quanto à identificação do Réu, tem ao seu alcance outros mais eficazes e fidedignos para identificar a concreta morada de uma pessoa.
17) Como se isso não bastasse, quando a Sra. Agente de Execução se desloca ao local no dia e hora certos, tal como resulta do artigo 232.º do CPC, não tendo encontrado o Recorrente a mesma afirma que perguntou “no restaurante que fica perto do imóvel, n.º 12 A “Ruposh Bangja Indian Restaurante” sobre se conheciam o citando, foi referido pelo Sr. que lá se encontrava que sim” – não tendo, no entanto logrado em identificar correctamente quem prestou esta informação.
18) A Agente de Execução refere ainda que esse mesmo Senhor de identidade desconhecida, telefonou para o citando “e passou o telefone à AE. No visor do telemóvel era visível o nome de M… como sendo a pessoa para quem estava a ser efectuada a ligação. A AR chegou à fala com o citando que disse ser o mesmo, no entanto quando a AE explicou qual era o assunto, o mesmo referiu que se tratava de um engano”
19) A verdade é que, este procedimento adoptado pela Sra. Agente de Execução causa grande estranheza ao Recorrente, uma vez que nem sequer se procede à identificação do contacto telefónico que alegadamente pertencia ao Réu.
20) Para além disso, causa-nos ainda mais estranheza, que a Sra. Agente de Execução tenha achado como suficiente a aparição no ecrã do telemóvel utilizado de um nome (MO..) que nem sequer corresponde ao nome do Réu, que é M….
21) Ora, daqui resulta, com meridiana clareza, que não só a AE não logrou em localizar o citando, aqui recorrente, como nenhuma ligação tem o Réu àquela morada, não tendo, por isso, sido efectivamente citado para os presentes autos.
(…)
25) É, igualmente, de realçar que, para além da Sra. Agente de Execução não se ter certificado forma devida que o Réu estava naquela morada, também não cumpriu as formalidades a que estava adstrita nos termos do artigo 232.º do CPC.
26) Uma vez que, não cumpre o preceituado na alínea b) do número 2 do supra citada artigo, tendo, apenas e como a própria refere “Nesse dia (03/02/2021) a AE só estava com uma testemunha pelo que não concretizou a citação por afixação, tendo concretizado a mesma no dia 10/02/2021 pelas 14h15m na presença de duas testemunhas”
27) Daqui outra não pode ser a conclusão de que a citação por afixação, nos termos do n.º 4 do artigo 232.º do CPC apenas poderá ser feita, quando se mostra impossível a colaboração de terceiros nos termos da alínea b) do n.º 2 do mesmo artigo.
28) Ora, salvo o devido respeito, entendemos que a AE não deu nem demonstrou o cumprimento de todas as formalidades que estava adstrita. Pelo que, também por esta banda não se poderá considerar o Réu regularmente citado para os presentes autos.
29) Assim e nos termos do número 1 artigo 188.º do CPC, há falta de citação do Réu, quando “b) Quando tenha havido erro de identidade do citado; (...) e) Quando se demonstre que o destinatário da citação pessoal não chegou a ter conhecimento do acto, por facto que não lhe seja imputável.”
30) De tudo o exposto, resulta que existiu erro na identidade do Citado, quer na identificação da sua morada, quer na posterior identificação feita pela Sra. Agente de Execução.
31) Resulta, ainda que o Réu não teve qualquer conhecimento de que contra si correram os presentes autos, uma vez que para além de se encontrar, ainda que temporariamente fora do território nacional, nunca residiu na morada indicada pelo Autor.
32) Assim, a falta de citação do Réu, implica, nos termos do artigo 187.º a anulação de todo o processado posterior à petição inicia e a consequente repetição da citação do Réu para a sua efectiva morada.
33) Sendo que, a jurisprudência tem entendido que “Após trânsito em julgado da decisão que ponha termo à acção, a invocação da falta de citação ou de nulidade da mesma só poderá ocorrer em sede de recurso de revisão, nos termos do art.º 696º do CPC, não sendo admissível argui-la em sede de incidente suscitado nos autos.” – Cfr. Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães de 23/09/2021.
34) Devendo, por isso a decisão proferida ser revista, tendo em consideração tudo o quanto supra alegado.
Nestes Termos, E nos mais do Direito que V. Exa doutamente suprirá, deve o presente recurso de revisão ser julgado procedente por provado e, consequentemente, anulado todo o processado, repetindo-se a citação do Recorrido assim se fazendo a costumada J U S T I Ç A”.
*
Admitido o recurso de revisão, foi o Autor/recorrido notificado pessoalmente
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT