Acórdão nº 275/20.9T8TVD.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 22-02-2022

Judgment Date22 February 2022
Year2022
Acordao Number275/20.9T8TVD.L1-7
CourtTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:


IRELATÓRIO:


RN e VF instauraram a presente ação declarativa de condenação contra Seguradora, S.A., alegando, em síntese, que no dia 22 de Fevereiro de 2018, pelas 16,00 horas, ao quilómetro 32,200 da Estrada ..... - n.º ..., freguesia de V___, concelho do C____, ocorreu um acidente de viação entre o veículo ligeiro de passageiros com a matrícula ___.___.VG, propriedade do autor e por ele conduzido, no qual seguia também a autora, e o veículo ligeiro de passageiros com a matricula ____-TU-____, conduzido por JL.
À data do acidente encontrava-se transferida para a ré a responsabilidade civil decorrente da circulação do ___-TU-___, através de contrato de seguro titulado pela apólice n.º ____.
O condutor do ___-TU-___ foi o responsável pela produção do acidente.
Em consequência do acidente ambos os autores sofreram danos de natureza patrimonial e não patrimonial, pelos quais pretendem ser ressarcidos.
Os autores concluem assim a petição inicial:
«Nestes termos e nos mais de Direito (...):
Deve a presente acção ser julgada procedente, por provada, e, por via disso, ser a Ré condenada a:
- Pagar ao Autor o valor venal do ___.___.VG, na quantia de € 3.875,00;
- Pagar ao Autor os danos resultantes da privação de uso do ___.___.VG, contados na presente data na quantia de € 6.550,00;
- Pagar ao Autor a indemnização relativa ao défice funcional permanente da integridade físico-psíquica, na componente do quantum doloris, dano estético, dano biológico a determinar posteriormente em perícia médico-legal;
-Pagar ao Autor os juros vincendos sobre a quantia indemnizatória total de € 10.425,00 à taxa de 4% ao ano, a contar da citação da Ré até integral pagamento;
- Pagar ainda as custas;
- Pagar à Autora, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 3.500,00;
- Pagar à Autora a quantia de € 180,00, relativa aos óculos partidos;
-Pagar à Autora os juros vincendos sobre a quantia indemnizatória total de € 3.680,00 à taxa de 4% ao ano, a contar da citação da Ré até integral pagamento.»
***

A ré contestou, alegando, também em síntese, que recai sobre o autor a responsabilidade pela produção do acidente.
Conclui pugnando pela improcedência da ação, com a sua consequente absolvição do pedido.
***

Com a singela afirmação de que «a questão a decidir nos presentes autos é de facto e de direito, e não se revestindo a matéria de facto de particular complexidade», e limitando-se a invocar o art. 593.º, n.º 1, o senhor juiz a quo dispensou a audiência prévia e proferiu despacho a identificar o objeto do litígio e a enunciar os temas da prova.
***

Após a designação de data para a realização da audiência final o autor RN veio, ao abrigo do disposto no art. 265.º, n.º 1, ampliar o pedido, pedindo agora que a ré seja condenada a pagar-lhe, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais por si sofridos em consequência do acidente, a quantia global de € 35.425,00.
Na audiência final a ré opôs-se à requerida ampliação do pedido, a qual, no entanto, foi admitida.
***

Realizada a audiência final foi proferida sentença de cuja parte dispositiva consta o seguinte:
«Nos termos e fundamentos expostos:
a)- Condeno a R. Seguradora, S.A. a pagar ao A. RN, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 6.550,00 (seis mil quinhentos e cinquenta euros) acrescida dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor, desde a data da citação até integral pagamento.
b)- Condeno a R. Seguradora, S.A. a pagar ao A. RN, a título de danos patrimoniais, a quantia que se vier a apurar em incidente de liquidação relativa ao valor venal do veículo ____.____.VG à data do acidente, descontado o valor do salvado, até ao limite de € 3.875,00 (três mil oitocentos e setenta e cinco euros).
c)- Condeno a R. Seguradora, S.A. a pagar ao A. RN, a título de danos não patrimoniais, a quantia total de € 22.000,00 (vinte e dois mil euros), acrescida dos juros vincendos, à taxa legal em vigor, desde a data da prolação da presente sentença até integral pagamento.
d)- Condeno a R. Seguradora, S.A. a pagar à A. VF, a título de danos patrimoniais, a quantia de € 180,00 (cento e oitenta euros), acrescida dos juros vencidos e vincendos, à taxa legal em vigor, desde a data da citação até integral pagamento.
e)- Condeno a R. Seguradora, S.A. a pagar à A. VF, a título de danos não patrimoniais, a quantia de € 1.000,00 (mil euros), acrescida dos juros vincendos, à taxa legal em vigor, desde a data da prolação da presente sentença até integral pagamento.
f)- Absolve-se a R. do demais peticionado.»
***

Inconformada, a ré interpôs o presente recurso de apelação, concluindo assim, de forma desnecessariamente extensa, as respetivas alegações:
«a)-Vem o presente recurso interposto da douta sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª Instância a fls._ dos autos de ação de processo ordinário que correram termos no Juízo Local Cível de Torres Vedras – Juiz 2, da Comarca de Lisboa Norte, sob o número de processo ___/__._T8TVD, que julgou a ação parcialmente procedente e condenou a ora Ré no pagamento indemnizatório aos Autores.
b)- De facto, não se pretendendo discutir a responsabilidade do condutor do veículo seguro pela produção do acidente, entende a ora Recorrente que se deverá resolver a seguinte questão: Como se computa a indemnização devida pela Ré ao ora Autor?
c)- No entender da ora Recorrente incorreu o Tribunal a quo em errada interpretação e/ou aplicação do disposto nos artigos 483.º, 494.º, 496.º, 562.º, 563.º, 564.º e 566.º do Código Civil, extravasando a justa medida da reparação devida pela Recorrente, como se demonstrará infra.
d)- Porquanto, e num primeiro momento, não concorda a ora Recorrente com a razão de ser do enquadramento feio pelo douto Tribunal a quo quanto ao dano não patrimonial considerado, por duas ordens de razão: douto Tribunal a quo peca por excesso de pronúncia; a douta Sentença recorrida duplica a condenação por um mesmo dano.
f)- Veja-se que o Autor em articulado superveniente ampliou o seu pedido, peticionando a quantia de € 10.000,00 (dez mil Euros) a título de dano biológico na vertente de dano futuro e, bem assim, peticionou € 15.000,00 (quinze mil Euros) na vertente dano não patrimonial.
g)- Tais pedidos alicerçaram-se na realidade do dano biológico, o que a ora Recorrente não pretende discutir, admitindo, como o faz, que o Autor, efetivamente, sofreu uma violação da sua saúde em consequência do acidente discutido nos presentes autos.
h)- Note-se, no entanto, que, erradamente a nosso ver, o douto Tribunal a quo decidiu fixar uma indemnização pelo “dano pela ofensa à integridade física e psíquica - dano biológico”, condenando a ora Recorrente no pagamento de € 10.000,00 (dez mil Euros) a título de dano não patrimonial na vertente do dano biológico em si mesmo.
i)-Quando, no entender da ora Recorrente o ora Autor peticionou o dano biológico na vertente dano patrimonial e na vertente dano não patrimonial - por essa razão, no seu articulado superveniente fez a distinção entre Dano Biológico enquanto dano futuro e padecimentos morais!
j)-Parece-nos a nós, com o devido respeito por opinião contrária, que era esta a realidade que o ora Autor pretendia ver apreciada, mesmo sem ter sido feita qualquer prova quanto à perda de ganho do ora Autor!
k)- No caso em concreto deveria ter sido aplicada uma fórmula financeira que permitisse concluir pelo quantum indemnizatório por danos patrimoniais futuros.
l)-Tudo temperado com um juízo de cálculo que permitisse aplicar a equidade sem extravasar os limites do razoável.
m)-A ressarcibilidade dos danos futuros encontra-se expressamente prevista no art.º 564.º, n.º 2 do Código Civil nos seguintes termos: “na fixação da indemnização pode o tribunal atender aos danos futuros, desde que sejam previsíveis; se não forem determináveis, a fixação da indemnização correspondente será remetida para decisão ulterior”.
n)-Salvo o devido respeito, que é muito, andou mal o douto Tribunal a quo ao desconsiderar a natureza do dano peticionado o que consubstancia excesso de pronúncia por parte do Tribunal.
o)-Já que conheceu de questões que não foram colocadas pelas partes, condenando em objeto diverso do que se pediu.
p)-O que, nos termos do artigo 615.º do Código de Processo Civil, invalida o processado, sendo nula a sentença proferida nesta parte, o que se alega para os devidos efeitos legais, devendo ser substituída por outra que contemple prova quanto ao rendimento do ora Autor, só assim tornando possível aplicar critérios de equidade concretos e não arbitrários, que legitimem a atribuição de indemnização a título de dano futuro na vertente dano patrimonial.
q)- Para o caso de assim não se entender, a ora Recorrente crê estar a ser duplamente condenada no pagamento de um indemnização por danos não patrimoniais, sem que consiga destrinçar a realidade de um e de outro dano!
r)- O douto Tribunal atribuí uma indemnização pelo mesmo dano ao ora Autor, parcelando de forma desconexa o dano corporal que padeceu, quando, no entender da ora Recorrente a sentença recorrida viola o princípio do indemnizatório, o qual proíbe a cumulação de indemnizações para os mesmos danos.
s)- Pois, o dano biológico tanto poderá ser ressarcido a título de dano patrimonial como a título de não moral, nunca, no entender da ora Recorrente, duplamente a título de dano não patrimonial.
t)- Pois a fundamentação explanada na douta sentença permite concluir que a razão de dupla condenação em dano não patrimonial deriva, apenas, da afetação da potencialidade física, psíquica e intelectual do lesado, devendo a douta sentença ter condenado, de acordo com a sua fundamentação, num único valor global.
u)-O qual deveria, necessariamente, estar abrangido por critérios de equidade.
v)- Pelo que deverá a sentença recorrida ser revogada por outra que fixe um quantum único a
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