Acórdão nº 271/21.9BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 14-07-2022

Data de Julgamento14 Julho 2022
Ano2022
Número Acordão271/21.9BESNT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 1ª Subsecção da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública e a A...., Lda., respetivamente, Reclamada e Contrainteressada, com os demais sinais nos autos, vieram, em conformidade com o artigo 282.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário, interpor recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, de 10 de fevereiro de 2022, a qual julgou procedente a ação de reclamação de actos do órgão de execução fiscal deduzida por M...., na qual peticionou a declaração de nulidade da venda do imóvel inscrito na matriz predial urbana da União das Freguesias de Queluz e Belas sob o n.º ….5, efetuada no âmbito do processo de execução fiscal n.º …….763, instaurado pelo Serviço de Finanças de Sintra 4 – Queluz.


A Reclamada, aqui Recorrente, Fazenda Pública, termina as alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«I – Visa o presente recurso reagir contra a douta Sentença que julgou a reclamação de actos do órgão de execução fiscal como procedente, determinando em conformidade pela anulação da decisão que ordenou a venda do prédio urbano inscrito na matriz predial urbana da União das Freguesias de Queluz e Belas sob o n.º ….5 e sito na Travessa da ..., n.º…., do qual a executada e mãe da ora Reclamante é proprietária.

II – Como fundamento de nulidade da venda, aventou a douta Sentença a quo que decorre dos factos provados que a Reclamante tinha, no imóvel em causa, juntamente com a executada, sua mãe e o seu filho, o centro da sua vida familiar e pessoal, pelo que integravam o mesmo agregado familiar para efeitos do disposto no artigo 244.º, n.º 2 do CPPT.

III – Porém, esta asserção mostra-se em contradição com o fato dado como provado no ponto V) do probatório, segundo o qual, a executada e mãe da Reclamante, a partir de 22-02-2019, passou a residir em morada diversa da correspondente ao imóvel objeto de venda (concretamente na Rua das Flores no…., Agualva Cacém).

IV – Pelo que, como bem se notou no douto Parecer elaborado pelo Digno Magistrado do Ministério Publico, a Reclamante e a executada, sua mãe, não residindo, pelo menos desde 22/02/2019, em comunhão de mesa e habitação, não integram o mesmo agregado familiar para efeitos do disposto no n.º 2 do artigo 244.º do CPPT.

V – Ou seja, aquando da venda, resulta da matéria de fato dada como provada que a Reclamante e a executada não residiam em comunhão de mesa e de habitação, pelo que aquela não se poderia prevalecer do disposto no art.º 244º do CPPT para assim lograr a anulação da venda.

VI – Mas ainda que assim não se entenda e sem conceder, importa referir que a Reclamante também não se poderia prevalecer da qualidade de membro do agregado familiar da executada e sua mãe, em face do âmbito de sujeitos tutelados pelo disposto no n.º 2 do artigo 244.º do CPPT.

VII – Com efeito, socorrendo-nos da jurisprudência expressa no Acórdão TCAS de 06-12-2018, tirado no processo nº 471/18.9BEALM, para efeitos do disposto no nº 2 do art.º 244º CPPT: “(…) a noção de agregado familiar há-de ser coincidente com a prevista no artº.13, nºs.3 e 4, do C.I.R.S., em consequência do que, fora do âmbito do casamento e da união de facto, os filhos só integram o agregado familiar do progenitor que os tiver a seu cargo.”

VIII – Ora, como decorre do probatório (ponto a)), a Reclamante, na data da venda, tinha 43 anos de idade e, nessa medida, constituía, juntamento com o filho menor, um agregado familiar independente e autónomo, não se podendo, como tal, prevalecer do disposto no n.º 4 do art.º 13.º do CIRS, nos termos do qual, o agregado familiar do contribuinte é constituído pelos respetivos dependentes, sendo considerados como tal os filhos menores não emancipados (cfr. n.º 5, alínea a), e os maiores apenas são admitidos nas circunstâncias previstas na alínea c) deste último preceito, sendo que em nenhuma destas circunstâncias poderia a Reclamante ser enquadrada.

IX – Ora no caso “sub judice”, face á idade da Reclamante (cfr. ponto a) do probatório), a mesma não reúne os condicionalismos legais para integrar o agregado da executada sua mãe.

X – Na exegese da norma (neste caso o n.º 2 do artigo 244.º do CPPT), não pode ser considerado pelo intérprete um pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, constituindo o texto da norma um limite interpretativo, o qual condiciona todos os vetores de interpretação reconhecidos pela doutrina, como sejam os elementos histórico, sistemático ou teleológico (cfr.artº.9, nºs.2 e 3, do C.Civil).

XI – Neste pendor, se o legislador consagrou que a proteção da norma em causa abrange o executado e o seu agregado familiar quanto à limitação da venda, tal significa que excluiu outras situações e sujeitos que não se enquadram naqueles conceitos.

XII - Sendo que o legislador ao consagrar um conceito de agregado familiar, pretendeu decerto reportar-se àquele que resulta do disposto no art.º 13º do CIRS.

XIII - A situação da ora Reclamante não se mostra assim tutelada pelo disposto no n.º 2, do artigo 244.º, do CPPT, dado que a mesma não integra o agregado familiar da executada, conforme decorre do disposto no art.º 13º do CIRS.

XIV - Motivo pelo qual não se mostrando in casu verificados os pressupostos do nº 2 do art.º 244º, do CPPT, o despacho reclamado não merece censura.

XV - Ou seja, a douta sentença, decidindo como decidiu, violou, salvo o devido respeito, que é muito, entre outros, o artigo 244.º do CPPT.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por Acórdão que declare a Reclamação improcedente.

PORÉM V. EX.AS, DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA»


****

A Contrainteressada, aqui Recorrente, A...., LDA., termina as alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões:

«A. Vem este recurso interposto da Douta Sentença que julgou procedente a Reclamação deduzida contra Despacho do Exmo. Sr. Chefe de Finanças de Sintra 4 (Queluz), processo de execução fiscal n.º…..763, tendo declarado a nulidade da venda do imóvel inscrito na matriz predial urbana da União das Freguesias de Queluz e Belas sob o n.º ….5, sito na Travessa da ..., n.º…., ...;

B. O Tribunal assentou erradamente a sua convicção decorrente da análise dos documentos juntos aos autos, bem como da prova produzida em audiência de julgamento, nomeadamente nas declarações que parte que, não obstante ao laço familiar existente entre as testemunhas (executada/mãe e filho da reclamante), o depoimento daquelas mostraram-se espontâneos e credíveis;

C. Tendo considerado que: “(…)decorre dos factos provados que a Reclamante tinha, no imóvel em causa nos autos, juntamente com a executada, sua mãe, e o seu filho, o centro da sua vida familiar e pessoal. E tanto a Reclamante como a sua mãe contribuíam para os encargos da vida familiar [cfr. alínea I) do probatório e respetiva motivação]. Após a mudança de domicílio da sua mãe (em setembro de 2019), a Reclamante permaneceu na referida habitação, juntamente com o seu filho, ainda estudante, mantendo nela o local onde tem a sua existência organizada e que lhe serve de base de vida[cfr. alíneas G) a I) do probatório e respetiva motivação]. Conclui-se, pois, que mãe, filha e neto viviam em economia comum na referida habitação(…);

D. Por fim, julgou a reclamação procedente por concluir que foram verificados os pressupostos identificados no n.º 2 do artigo 244.º do CPPT, o que determina a nulidade da venda do imóvel em apreço, cumprindo em julgar procedente a presente reclamação.

E. Salvo o devido respeito, discorda a contrainteressada da interpretação feita pelo Tribunal “a quo” da factualidade que fixou como provada, divergindo-se também da aplicação do Direito que foi feita no caso, incorrendo em erro de julgamento;

F. Deveria a douta sentença ter levado em consideração que as declarações de parte, bem como o depoimento das testemunhas não são vistas como qualquer elemento de prova objetivo e fiável que permitisse dar tal realidade como certa;

G. Isto porque contámos com as declarações de parte da própria Reclamante, com o depoimento testemunhal da mãe da Reclamante e executada que teve seu imóvel vendido no processo executivo que originou a presente Reclamação, para além do seu filho que vive com esta.

H. Restando óbvio que não foi possível extrair a verdade absoluta dos depoimentos prestados;

I. Sobre o tema citamos: “Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil”, de Ramos de Faria e Ana Luísa Loureiro, de Almedina, p. 364, onde pode ler-se: “A experiência sugere que a fiabilidade das declarações em benefício próprio é reduzida. Por esta razão, compreende-se que se recuse ao depoimento não confessório força para, desacompanhado de qualquer outra prova, permitir a demonstração do facto favorável ao depoente”;

J. Desse modo, conclui-se que a Reclamante, sua mãe e filho depõem acerca de causa do seu manifesto interesse e claramente como se estivesse a falar de causa própria.

K. Não podendo utilizar os depoimentos como preponderantes para comprovar as alegações da Reclamante, visto que os mesmos não estão dotados de parcialidade;

L. Até porque os depoimentos não são suficientes para comprovar a alegação de que a Reclamante faz parte do mesmo agregado da sua mãe, executada no processo executivo em epígrafe;

M. Portanto, não tem o condão para provar o alegado nos factos vertidos em G), H), I), J) e K) relativamente a matéria dada como provada em sentença;

N. Por outro lado, não se desincumbiu a Reclamante de juntar aos autos o meio hábil a provar a alegação que faz parte do mesmo agregado familiar da sua mãe, ou seja, deveria a Reclamante ter junto aos autos o seu IRS pelo menos dos últimos três anos, ou até mesmo da sua mãe para provar a dependência, mais não o fez;

O....

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