Acórdão nº 269/21.7T8FNC.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 12-01-2023

Data de Julgamento12 Janeiro 2023
Ano2023
Número Acordão269/21.7T8FNC.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

I. RELATÓRIO
1. Em 18.01.2021 a Região Autónoma da Madeira – Direção Regional do Património e de Gestão dos Serviços Partilhados enviou ao Tribunal Judicial da Comarca da Madeira os autos de expropriação da “parcela …” levada a cabo para a realização da obra “Construção do novo Hospital do Funchal”, nos quais a requerente é entidade expropriante e são expropriados Maria (…) e outros, identificados nos autos.
2. A entidade expropriante requereu que lhe fosse adjudicada a posse e propriedade de um prédio misto e suas benfeitorias com a área de 1960m2, inscrito na matriz predial urbana sob os artigos matriciais n.ºs (…), (…), (…), (…), (…) (desconhecendo-se a identificação dos artigos de matriz das duas frações restantes) e na matriz predial rústica sob o artigo matricial n.º (…), seção U, descrito na Conservatória do Registo Predial do Funchal sob o n.º (…)/20061215, localizado ao Pico do Funcho e identificado como parcela (…).
3. A entidade expropriante juntou comprovativo da declaração da utilidade pública da expropriação por resolução de Conselho de Governo n.º 557/2020 de 30 de julho, publicada no JORAM, 1.ª Série, n.º 148 de 6 de agosto de 2020.
4. A arbitragem atribuiu, por acórdão de 16.12.2020, ao referido prédio o valor global de € 795.289,20 (setecentos e noventa e cinco mil duzentos e oitenta e nove euros com vinte cêntimos).
5. Encontra-se junta aos autos a guia de depósito referente à quantia arbitrada.
6. Em 24.02.2021 foi proferido despacho de adjudicação da posse e direito de propriedade sobre o aludido imóvel e parcela.
7. Em 22.3.2021 os interessados G e J recorreram da decisão arbitral, circunscrevendo o âmbito do recurso ao valor atribuído às duas benfeitorias urbanas de que são donos, a que fora atribuído o montante indemnizatório de € 150 450,00 e € 15 555,00, respetivamente.
8. Em 22.12.2021 a entidade expropriante e os recorrentes/interessados G e J formalizaram transação nos autos, que foi homologada por sentença, findando o recurso.
9. Os restantes interessados não recorreram da decisão arbitral, tendo apresentado requerimentos visando o levantamento das indemnizações que lhes cabiam nos termos da decisão arbitral.
10. Assim e para o que importa para o objeto deste recurso de apelação em 16.3.2021 os interessados Manuel (…) e Maria (…) apresentaram o seguinte requerimento:
MANUEL (…), NIF (…), divorciado, residente ao (…), no Funchal, neste ato representado pela mandatária (…), com escritório à Rua (…), no Funchal, e
MARIA (…), NIF (…), divorciada, residente à (…), no Funchal, neste ato representado por (…), Advogada com cédula profissional n.º (…) e domicílio profissional na Rua (…), no Funchal,
Notificados do montante depositado referente à fração (…), vêm pelo presente solicitar o pagamento de €223.207,00 em duas tranches de €111.603,50 porquanto os titulares do prédio se mostram atualmente divorciados, conforme documento 1 que se anexa, solicitando a transferência de tais valores para as contas bancárias das mandatárias, nos termos seguintes:
Conta Clientes (…):
Valor de €111.603,50 para a Conta (…);
Conta Clientes (…): Valor de €111.603,50 para a Conta (…);
Termos em que pede e espera de V. Excia. deferimento.
JUNTA: 1 documento e procurações forenses”.
11. Em 09.4.2021 os interessados Maria (…) e Manuel (…) apresentaram um segundo requerimento, reiterando o requerido em 10.
12. Em 06.9.2021 foi proferido, no que concerne aos requerimentos referidos em 10 e 11, o seguinte despacho:
Notifique os expropriados (descrição predial n.º (…)/20111130 – fls.436, identificada no quadro 7 do auto de arbitragem de fls.327) de que o levantamento da indemnização deve ser precedido da demonstração do integral cumprimento das obrigações fiscais previstas no atual Código do Imposto Municipal sobre Imóveis (procedeu à revogação do Código da contribuição Autárquica), conforme determinado pelo artigo 67.º, n.º 4, do Código das Expropriações, ou seja, devem os expropriados juntar aos autos certidão emitida pelo competente serviço de finanças na qual se demonstre a não existência de dividas de imposto (contribuição autárquica e/ou IMI).
Mais notifique a seção os processos executivos constantes da certidão predial de que existe nos presentes autos crédito a favor dos expropriados Manuel (…) e Maria (…)”.
13. Em 24.9.2021 a interessada Maria (…) veio aos autos (requerimento com a Referência n.º 4340125) juntar aquilo que considerou ser os “documentos necessários ao pagamento da indemnização respeitante à aqui expropriada”, ou seja:
a) Uma “declaração para levantamento de indemnização” assinada pela interessada, na qual reclama para si o pagamento da indemnização no valor de € 115 978,50, correspondente a € 111 603,50 acrescidos de € 4 375,00 “a título de partilha de património conjugal”, “conforme ata de processo de inventário”, afirmando que os créditos garantidos por penhora sobre o imóvel expropriado respeitam ao expropriado Manuel e não à expropriada Maria (…);
b) Uma ata de conferência de interessados em processo de inventário para partilha de bens, datada de 17.02.2016;
c) Uma certidão do Serviço de Finanças de Câmara de Lobos, datada de 24.9.2021 e válida por três meses, declarando que a referida interessada tinha a sua situação tributária regularizada.
14. Em 28.01.2022 o tribunal a quo deferiu alguns dos requerimentos de pagamento de indemnizações apresentados pelos diversos interessados e indeferiu outros, tendo, no que concerne aos requerimentos dos interessados Maria (…) e Manuel (…) proferido o seguinte despacho:
A expropriada MARIA (…) veio, por Requerimento (4340125) Formulário (57217771) apresentar, declaração unilateral, para recebimento da indemnização pela expropriação da benfeitoria descrita no quadro 7 do auto de arbitragem de fls. 324.
A declaração emitida pela mesma quanto à categorização da quantia exequenda peticionada em processo de execução não vincula o tribunal, estando, manifestamente fora das competências deste, motivo pelo qual não é a mesma tida em consideração.
Manuel (…) não outorgou a declaração apresentada, nem a sua I. Mandatária procedeu à adesão eletrónica do requerimento em causa, pelo que não se mostram reunidas, por ora, as condições legais para o pagamento da indemnização (cf. art. 37.º, n.ºs 3 e 4 a contrario sensu do Código das Expropriações).
Notifique.
Dê a seção conhecimento, para os efeitos tidos por convenientes, ao processo executivo, ao Sr. agente de execução e ao exequente (Urbano (…) - fls. 528), de que se mostra depositado à ordem deste tribunal o montante de € 223.207,00 relativo à indemnização por expropriação da fração com o artigo 3352”.
15. Em 02.02.2022 a Sr.ª agente de execução no processo de execução n.º (…)/12.2TBFUN pendente no Juízo de Execução do Funchal, Juiz 1, veio aos autos informar “que se encontra/fica penhorado, nos termos do artigo 773º do Código de Processo Civil, à ordem dos presentes autos a quantia de € 73.072,02 (setenta e três mil, e setenta e dois euros e dois cêntimos) que o executado Manuel (…), NIF (…), tem a receber no processo de expropriação com o n.º 269/21.7T8FNC”.
16. Em 05.02.2022 a interessada Maria (…), através da sua mandatária, veio aos autos apresentar o seguinte requerimento:
1. No que à necessidade de anuência do expropriado Manuel, sob a forma de outorga na declaração apresentada pela expropriada Maria (…) se refere, cumpre dizer:
- Foi notificada a Agente de execução do despacho supra, e a mesma veio comunicar que a quantia exequenda penhorada ao que o executado Manuel tem a receber, é de €73.072,02.
2. Quer isto dizer que, a penhora é em relação àquele, sobre a quota parte dele, sendo desnecessário, pois, a este tribunal categorizar, pois com esta decisão perentória da Agente de Execução, é evidente a exclusão deste montante à quota parte da Maria (…), assim como exime – a, de qualquer dependência do aval do executado, na assinatura de um acordo, para receber o que é seu por direito.
3. Por todo o atrás descrito, o montante de €111.603,50 acrescido dos €4.375,00 o que perfaz €115.978,50, que legalmente é titular, não pode ser beliscado pela ameaça de uma execução, que não recaiu sobre si.
4. Salvo o respeito devido, não está, um juiz vinculado nesta sede a um título executivo, fundado numa sentença?
5. Parte - se do pressuposto que é um facto assente a quota parte da Maria (…) e respectiva justificação, não obstante, não será demais realçar que se fixou o valor da indemnização decidida pelos árbitros, adicionado ao valor correspondente à expropriação à totalidade do prédio, decidido pelo tribunal e correspondentemente alvo de depósito pela entidade expropriante.
6. Esse valor indemnizatório foi fixado em termos globais, sem especificação do montante que cabe a cada interessado.
7. Daí que a concretização da quantia a que cada um dos expropriados terá direito dependerá, primacialmente, de acordo entre todos. Na falta de acordo, o montante da indemnização deverá ser entregue àquele que por todos for designado (n.º 4 do art.º 37.º, Código das Expropriações).
8. Na falta de tal designação, estabelece o n.º 4 do art.º 37.º que efetuar-se-á a partilha “nos termos do Código de Processo Civil”.
9. Porém, em acórdão da Relação de Lisboa, datado de 16.9.2008, proferido no processo n.º 22203/1991.L1, foi ponderado que do normativo contido no n.º 4 do art.º 37.º do CE resulta que “a atribuição das prestações aos interessados sobre o montante indemnizatório global far-se-á, na falta de acordo, segundo as regras de partilha previstas no CPC. E, não obstante, se tratar materialmente de divisão de coisa comum, parece ressaltar da letra da lei a aplicabilidade das regras do inventário partilha com as necessárias adaptações.
10. Ora, tendo já existido um inventário partilha que veio fixar os termos desta, conforme Ata de
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