Acórdão nº 264/22.9YRCBR de Tribunal da Relação de Coimbra, 2023-12-13

Ano2023
Número Acordão264/22.9YRCBR
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE COIMBRA)
Acordam na Secção Cível (3.ª Secção), do Tribunal da Relação de Coimbra

Proc.º n.º 264/22.9YRCBR

1.- Relatório

1.1. - AA, solteira, maior, portadora do cartão de cidadão n.º ..., válido até 07/08/2029, contribuinte fiscal n.º ...17, residente na Rua ..., ..., ..., ... ..., intentou a presente ação de revisão de sentença estrangeira, contra BB, solteiro, maior, portador do cartão de cidadão n.º ..., válido até 19/02/2030, com o N.I.F. ...57, residente em ... 38, ... ..., Suíça, nos termos e com os seguintes:

- Autora e Réu são os progenitores de CC, menor, nascido em .../.../2017, em ... (...), Suíça (Doc. 1);

-Por douta sentença, transitada em julgado, com efeitos desde 30/10/2018, proferida pelo competente Tribunal de Comarca de Hinwil, atendendo a que Autora, Réu e o sobredito menor ali residiam àquela data, foi estabelecida a regulação do exercício das responsabilidades parentais referentes a este último, conforme melhor consta da certidão ao diante junta, objecto de Apostila em 03/10/2022 (Doc. 2);

-Pelo que se impõe, assim, rever e confirmar aquela decisão judicial, nomeadamente para efeito de averbamento ao respectivo Assento de Nascimento do aludido menor, nos termos do preceituado na alínea f) do artigo 1.º do Código do Registo Civil, de modo a que produza plenos efeitos jurídicos em Portugal;

- Sendo que, s.m.o., a decisão em causa consta de documento cuja autenticidade e inteligência não merecem quaisquer dúvidas, havendo a mesma, conforme supra referenciado, já transitado em julgado e sido objecto da necessária Apostila (Doc. 2);

- Provém de Tribunal estrangeiro cuja competência não foi provocada em fraude à lei, nem versa sobre matéria da exclusiva competência dos Tribunais Portugueses (Doc. 2);

- Acresce que não se poderá invocar excepção de litispendência ou de caso julgado com fundamento em causa afecta a Tribunal português, na justa medida em que não foi proferida, até ao presente, qualquer decisão judicial pela jurisdição portuguesa, com trânsito em julgado, sobre a mesma matéria, havendo a douta sentença sub judice sido proferida em momento anterior à instauração de qualquer acção de regulação do exercício das responsabilidades parentais junto de qualquer outro Tribunal;

-Por sua vez, foram plenamente respeitados os princípios do contraditório e da igualdade das partes no processo que correu termos junto do Tribunal de Comarca de Hinwil, referindo-se, até, que a sentença proferida homologou um acordo alcançado entre Autora e Réu em sede do mesmo, subscrevendo ambos, pelo seu próprio punho, o documento que o corporizou (Doc. 2);

- Ademais, analisado o teor da sentença em apreço, extrai-se que a mesma não contém decisão contrária aos princípios de ordem pública internacional do Estado Português;

***

1.2. – Citado o requerido deduziu oposição, alegando:

- Como adiante se concluirá, a sentença estrangeira em causa nestes autos não pode aqui ser revista nem confirmada.

- a sentença estrangeira não procede a qualquer regulação das responsabilidades parentais, por um lado, como pelo outro, tal matéria já foi objeto de decisão, transitada em julgado, por parte de tribunais portugueses, o que, a nosso ver, obsta, então, à revisão e confirmação requeridas.

- A decisão que aqui se pretende rever e confirmar foi proferida por um tribunal suíço no dia 9 de outubro de 2018.

-A decisão em causa debruça-se única e exclusivamente sobre a obrigação alimentícia ao menor CC e em nada se confunde com algo muito mais abrangente como é o exercício da regulação das responsabilidades parentais contemplada pela legislação portuguesa, nomeadamente no RGPTC.

- No dia 31 de dezembro de 2019 o menor e a requerente regressaram definitivamente a Portugal onde passaram a residir com carater habitual e permanente desde então até à data presente.

- Desde o referido dia 31 de dezembro de 2019 que requerente e menor, ambos de exclusiva nacionalidade portuguesa, deixaram de ter qualquer ponto de contato com o ordenamento jurídico suíço.

- O requerido (também ele de exclusiva nacionalidade portuguesa), também já abandonou, há sensivelmente um ano, definitivamente a Suíça, já não mais ali residindo ou trabalhando, deixando, assim, de ter qualquer ponto de contato com aquele ordenamento jurídico.

- Mercê dos inúmeros desentendimentos entre requerente e requerido e pelo facto de as responsabilidades parentais quanto ao menor CC não se mostrarem reguladas (quer seja na Suíça, quer seja em Portugal), o aqui requerido instaurou no dia 02-09-2022 no Juízo de Competência Genérica ... do Tribunal Judicial da Comarca ... um processo de Regulação das Responsabilidades Parentais quanto ao referido menor, processo esse que viria a ser autuado sob o n.º 145/22.....

- A conferência de pais a que alude o disposto no art.º 35.º do RGPTC viria a ser realizada naqueles autos no dia 02-09-2022.

- No dia em que o presente processo de revisão e confirmação de sentença estrangeira deu entrada em juízo [25-10-2022] já aqueloutro (o ÚNICO a debruçar-se efetivamente sobre o exercício e regulação das responsabilidades parentais) se mostrava pendente nos tribunais portugueses.

- No dia 11-05-2023, em sede de conferência de pais quanto à regulação das responsabilidades parentais realizada no âmbito daquele Proc.º n.º 145/22.... do Juízo de Competência Genérica ... do Tribunal Judicial da Comarca ..., requerente e requerido lograram alcançar acordo quanto a todos os aspetos relacionados com a regulação das responsabilidades parentais do menor CC, à exceção do que diz respeito à prestação de alimentos, porque a aqui requerente a isso se opôs.

- Requerente e requerido já acordaram naqueles autos quanto à regulação das responsabilidades parentais do menor.

- O referido acordo viria ali a ser homologado por sentença – cfr. documento que aqui se junta sob o n.º 1 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos -, transitada em julgado, mostrando-se o mesmo atualmente em vigor.

- Atenta a oposição manifestada pela requerente em fixar por acordo o valor de uma prestação alimentícia ao menor CC, foi, por douto despacho proferido naqueles mesmos autos no dia 02-06-2023, fixado um regime provisório quanto a alimentos devidos ao menor - cfr. documento que aqui se junta sob o n.º 2 e cujo conteúdo se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos e legais efeitos.

- O referido despacho mostra-se também ele transitado em julgado e o regime nele previsto está em vigor e a ser cumprido.

- Ao contrário do que a requerente preconiza no artigo 2.º da p.i., a sentença que aqui pretende ver revista e confirmada NÃO ESTABELECE QUALQUER REGULAÇÃO DO EXERCICIO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS quanto ao menor CC.

- Aquilo que o tribunal suíço se limitou a fazer for homologar por sentença o acordo a que requerente e requerido chegaram quanto aos alimentos devidos ao menor, e nada mais do que isso.

- Basta atender a que o tribunal suíço nunca se pronunciou, por exemplo, em momento algum, sobre a quem o menor deveria ficar confiado, ou qual o regime de férias e visitas, ou seja, no fundo, os tribunais suíços nunca se pronunciaram sobre nenhuma das matérias referidas no art.º 40.º do nosso RGPTC, sendo que tal matéria é da competência dos tribunais portugueses ao abrigo das disposições conjugadas dos art.ºs 25.º do Código Civil e 9.º n.º 1 do RGPTC.

- A decisão que aqui se pretende rever e confirmar em nada se confunde, assim, nem de perto, nem de longe, com aquilo que é uma verdadeira regulação do exercício das responsabilidades parentais e resolução de questões conexas, como aquela que já se mostra parcialmente decidida pelo Juízo de Competência Genérica ... do Tribunal Judicial da Comarca ... no âmbito do processo de Regulação das Responsabilidades Parentais sob o n.º 145/22.... onde apenas falta fixar o regime definitivo quanto a alimentos porque a aqui requerente ali expressamente se recusou a fazê-lo.

- A decisão proferida pelo tribunal suíço tem por pressuposto a residência do menor e da requerente naquele país – cfr. ponto 4.º da referida decisão – pressuposto esse que já deixou de estar verificado há mais de 3 anos e meio quando a requerente e o menor abandonaram definitivamente aquele país e há um ano atrás quando também o requerido o fez.

- A requerente pretende que seja revista e confirmada uma sentença proferida por um tribunal suíço num momento em que nem requerente, nem requerido, nem menor têm qualquer elemento de contato com aquele país, e ASSUMIDAMENTE nem nenhum deles pretende vir a ter (pelo menos num futuro próximo), bem como num momento em que um tribunal português já decidiu precisamente a concreta matéria objeto daquela sentença estrangeira.

- Alega, ainda, a requerente, no artigo 3.º da p.i., que se impõe rever e confirmar a decisão do tribunal suíço para efeito de averbamento no assento de nascimento do menor, nos termos do preceituado na alínea f) do art.º 1.º do Código do Registo Civil, para que a mesma produza plenos efeitos jurídicos em Portugal.

- A alínea f) do n.º 1 do art.º 1.º do Código do Registo Civil tem por objeto a regulação do exercício do poder paternal, sua alteração e cessação – o que manifestamente não é o caso dos autos, onde apenas se pretende e rever e confirmar uma sentença que se debruça única e exclusivamente sobre um acordo quanto à obrigação alimentícia e não sobre a regulação do exercício do poder paternal, sua alteração e cessação em sentido amplo, pelo que o referido desiderato também não poderia alcançar pela presente via.

- Também não assiste razão à requerente quanto ao alegado em 6.º da p.i. na justa medida em que, como já se deixou alegado supra, os aqui requerente e requerido já acordaram na regulação das responsabilidades parentais do menor (á exceção da obrigação alimentícia porque a aqui requerente a isso se opôs), tendo tal acordo sido homologado...

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