Acórdão nº 2628/23.1T8OER.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2024-02-08

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão2628/23.1T8OER.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 6ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa

I. O relatório
A
apresentou impugnação judicial da decisão de recusa de acto de registo (do cancelamento de hipoteca apresentado sob o n.º 112320230105, relativo ao imóvel descrito sob o nº … - Linda a Velha/Oeiras) do Conservador da 1.ª Conservatória do Registo Predial de B.
A Recorrente requereu a 22/03/2022, o cancelamento da hipoteca a favor da C, para garantia de empréstimo concedido. Hipoteca que foi cedida a D e E, tendo estes executado o crédito contra a A. e seu ex-marido, no processo nº 23707/19.5T8OER. Requerido o cancelamento, este foi recusado.
A 19/01/2023, foi proferido despacho de qualificação que recusou a conversão.
Apresentado recurso hierárquico da qualificação do registo, foi proferido despacho de sustentação.
O Ministério Público emitiu parecer, no sentido de se manter o despacho recorrido, julgando-se improcedente a impugnação judicial apresentada.
Com data de 14/9/2023, foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
Nestes termos e face ao exposto, julgo a presente impugnação judicial improcedente mantendo, na íntegra, o despacho proferido a 19.01.2023, que recusou o pedido de cancelamento da hipoteca voluntária efetuado pela ap. 9 de 06.02.1986, que incide sobre a fração autónoma E do prédio nº, da freguesia…, concelho do …, requerido na ap. 1123 de 05.01.2023.
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Inconformada, a impugnante interpôs recurso de apelação para esta Relação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões:
I. Não podem restar dúvidas de que a execução extinta, por pagamento, se reporta à mesma dívida sobre a qual recaía a hipoteca cedida pela C aos Exequentes D e E.
II. Se alguma dúvida pudesse subsistir quanto a que a dívida exequenda, julgada extinta, é a mesma que titulou a hipoteca cedida pela C aos Exequentes, a sentença, ainda manuscrita, junta à certidão junta como doc. 3, que esteve na base da Execução, ora extinta, é inequívoca.
III. Pelo que a dívida extinta é inequivocamente a mesma garantida pela hipoteca a favor da C, constituída em 6.06.1986, e averbada em 29/11/1995 a favor dos exequentes D e E.
IV. A qual se encontra extinta por pagamento.
V. Acresce que a única hipoteca ativa é a registada com a cota C-3, "Ap. 09/060286 - Hipoteca voluntária provisória por natureza - alínea i)999999 do n.º 1) e alínea b) do n.º 2 - a favor da C - Lisboa - Garantia de empréstimo - (Dec-Lei n.º 459/3).
VI. De salientar, para que não restem dúvidas, que a Ap. 09/060286 coincide com a data em que a fração em causa foi adquirida por F, ex-cônjuge da ora Requerente, conforme provado na sentença recorrida.
VII. Nos termos do art.º 730.º al. a) do C. Civil, a hipoteca extingue-se pela extinção da obrigação que serve de garantia.
VIII. E, nos termos do art.º 13.º do CRP: "Os registos são cancelados com base na extinção dos direitos, ónus ou encargos neles definidos, em execução de decisão administrativa nos casos previstos na lei, ou de decisão judicial transitada em julgado".
IX. Em face do exposto, não pode subsistir qualquer dúvida de que a hipoteca sobre a fração autónoma dos autos, para garantia da quantia pecuniária emprestada pela C foi transmitida para D e E, os quais são os credores exequentes no processo de execução sumária nº 3707/19.5T8OER a que respeita a certidão emitida pelo Tribunal Judicial da Comarca de ….
X. Sendo que a execução foi extinta por pagamento da quantia exequenda, conforme sentença transitada em julgado e certificada.
XI. Conforme resulta dos art.ºs 686.º e 687.º/Cód. Civil, não podem subsistir hipotecas sem terem dívidas subjacentes.
XII. O despacho e a sentença recorrida violaram os art.ºs 686.º, 687.º e 730.º do C. Civil, assim como o art.º 13.º/CRP.
XIII. Pelo que deve ser averbado o cancelamento da hipoteca registada a favor de D e E a que se reporta o Averbamento - Ap. 36/951129.
Termos em que, com o douto suprimento de V. Exas Senhores Desembargadores, deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida e substituindo- se por outra que determine que seja averbado o registo do cancelamento da hipoteca registada a favor de D e E, a que se reporta o AVERB. - Ap. 36 de 1995/11/29.
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O recurso foi admitido como sendo de apelação, com subida de imediato, nos autos e efeito suspensivo.
Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. O objecto e a delimitação do recurso
Consabidamente, a delimitação objectiva do recurso emerge do teor das conclusões do recorrente, enquanto constituam corolário lógico-jurídico correspectivo da fundamentação expressa na alegação, sem embargo das questões de que o tribunal ad quem possa ou deva conhecer ex officio.
De outra via, como meio impugnatório de decisões judiciais, o recurso visa tão só suscitar a reapreciação do decidido, não comportando a criação de decisão sobre matéria nova não submetida à apreciação do tribunal a quo.
Por outro lado, ainda, o recurso não é uma reapreciação ‘ex novo’ do litígio (uma “segunda opinião” sobre o litígio), mas uma ponderação sobre a correcção da decisão que dirimiu esse litígio (se padece de vícios procedimentais, se procedeu a incorrecta fixação dos factos, se fez incorrecta determinação ou aplicação do direito aplicável). Daí que não baste ao recorrente afirmar o seu descontentamento com a decisão recorrida e pedir a reapreciação do litígio (limitando-se a repetir o que já alegara na 1ª instância), mas se lhe imponha o ónus de alegar, de indicar as razões porque entende que a decisão recorrida deve ser revertida ou modificada, de especificar as falhas ou incorrecções de que em seu entender ela padece, sob pena de indeferimento do recurso.
Ademais, também o tribunal de recurso não está adstrito à apreciação de todos os argumentos produzidos em alegação, mas apenas – e com liberdade no respeitante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito – de todas as “questões” suscitadas, e que, por respeitarem aos elementos da causa, definidos em função das pretensões e causa de pedir aduzidas, se configurem como relevantes para conhecimento do respectivo objecto, exceptuadas as que resultem prejudicadas pela solução dada a outras.
Assim, em face do que se acaba de expor e das conclusões apresentadas, são as seguintes as questões a resolver por este Tribunal:
Adequação da certidão judicial ao cancelamento de hipoteca.
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III. Os factos
Receberam-se da 1ª instância os seguintes factos provados:
- A é actualmente proprietária da fração autónoma designada pela letra "E", do prédio sito em …, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº ... e inscrito na matriz predial sob o artigo … da União das Freguesias de ….
- A 6.02.1986 a fracção foi adquirida pela recorrente e por F.
- A 06.02.1986 foi constituída hipoteca voluntária a favor da C.
- A 13.07.1999 foi registada uma penhora.
- A 29.11.1995 foi a hipoteca averbada a favor de D e E por cessão de créditos.
- A 06.07.2021 foi averbada a aquisição por partilha judicial com seu ex-marido F.
- Na mesma data foi cancelada a penhora registada a 13.07.1999.
- A 3.02.2021 foi proferido despacho judicial que a extinção da execução e determinou o levantamento da penhora.
- Foi requerida certidão (cujos termos não foram alegados) a qual suportou o pedido de cancelamento da hipoteca junto da CRPredial.
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IV. O Direito
Pretende a recorrente o cancelamento do registo de hipoteca voluntária efectuado pela ap. 9 de 06/02/1986, que incide sobre a fração autónoma E do prédio nº …, da freguesia …, concelho do …, que se destinava a garantir o empréstimo concedido pela C a F, casado com A na comunhão de adquiridos.
Por averbamento lavrado a coberto da ap. 36 de 29/11/1995 o identificado banco cedeu o seu crédito hipotecário a D e E, casados na comunhão geral.
O pedido de cancelamento foi instruído com certidão judicial eletrónica, emitida em 15.07.2022 pelo Tribunal Judicial da Comarca de …, Juízo de Execução de Oeiras, Juiz 1, relativa aos autos de execução sumária nº 3707/19.5T80ER, em que foram exequentes D e E e executados F e A, na qual se certifica que os presentes autos se encontram extintos por pagamento integral conforme sentença proferida nos presentes autos em 01.02.2002 e que pela Mmª Juiz de Direito foi ordenado por despacho proferido nos autos a 29.06.2022 o levantamento de todos os registos pendentes, despacho que transitou em 14.07.2022. Mais se certifica que os presentes autos de execução corriam sob o nº de processo 281-A/19967.
Para apreciação do presente recurso, será da maior relevância a ponderação das conclusões da informação junta ao recurso hierárquico e que fundou o indeferimento do mesmo:
I - Não é titulo para o cancelamento do registo de hipoteca, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 13º, in fine, do CRP -
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