Acórdão nº 26/12.1 BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2023-03-23

Ano2023
Número Acordão26/12.1 BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul, no âmbito de Reclamação para a Conferência, de decisão singular:

I Relatório
A Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, no âmbito da Ação Administrativa Especial intentada por E....., tendente, em síntese, à declaração de nulidade da deliberação do Conselho Diretivo da Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, de 14.9.2011, que indeferiu o seu requerimento de inscrição, naquela Ordem, como técnica oficial de contas, inconformada com a Sentença Proferida no TAC de Lisboa em 19 de abril de 2018 que declarou a nulidade da identificada deliberação, mais tendo determinado que, em execução da sentença de 26.2.2009, confirmada por acórdão do STA de 2.6.2011, a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas, em 30 dias, pratique o ato administrativo devido que proceda à inscrição da autora como TOC, a partir de dezembro de 1998, veio interpor recurso jurisdicional para esta instância.
Apresentou a aqui Recorrente/Ordem nas suas alegações de recurso em 28 de maio de 2018, as seguintes conclusões:
“1. A Recorrida, nestes autos de processo de execução de sentença, pretende que a deliberação tomada pela Recorrente viola o caso julgado porque este impunha, no seu entender, que a Recorrida fosse inscrita como Contabilista Certificado na respetiva Ordem.
2. O julgado anulatório anulou a anterior deliberação tomada pela Recorrente, que indeferiu a candidatura da recorrida, porque ali se restringiu a apreciação da candidatura aos meios de prova admitidos pelo regulamento que a Recorrente aprovou para execução da lei n.º 27/98, de 3 de Junho.
3. Ficou entendido que a Recorrente estava obrigada a apreciar a candidatura da Recorrida apreciando todos os meios de prova por esta apresentados para comprovação dos requisitos exigidos na referida Lei n.º 27/98.
4. A Recorrente, ponderando todos esses meios, acabou por indeferir de novo a candidatura da Recorrente, porque não julgou demonstrados tais requisitos, designadamente que a Recorrida tenha sido a responsável direta por contabilidades organizadas nos termos do POC, durante pelo menos 3 anos seguidos ou interpolados, entre 01.01.1989 a 17.10.1995.
5. Para prova de tal experiência a Recorrida apresentou uma declaração, subscrita pela empresa S....., que pretende atestar que a Recorrida preenche aqueles requisitos, e durante todos aqueles anos, embora, também durante todos aqueles anos, as suas declarações fiscais tenham sido assinadas por um Técnico Oficial de Contas que, perante a própria declarante e a Administração Tributária, assumia a responsabilidade por aquela mesma contabilidade.
6. A Recorrente entendeu que pretender que a Recorrida fosse dada como a responsável pela contabilidade daquela empresa era incompatível com o facto de as declarações fiscais de a responsabilidade de tal contabilidade ser assumida, expressamente, por um Técnico Oficial de Contas, nas respetivas declarações fiscais.
7. O Tribunal a quo entendeu que a Recorrente acabou por incorrer no mesmo vício que levara à anulação da anterior deliberação, pelo que declarou a sua nulidade por violação do caso julgado.
8. Mais entendeu que aquela declaração faz prova plena dos factos nela constantes, o que só poderia ser contrariado através da arguição da falsidade daquela declaração.
9. Salvo o devido respeito, esta decisão, para além de desrespeitar o disposto no art.º 173.º, n.º 1, e 179.º, n.ºs 1 e 2, do CPTA, viola também o disposto no art.º 95.º, n.ºs 2, 3 e 4 do mesmo diploma legal.
10. A sentença recorrida ultrapassa o âmbito do caso julgado, pretendendo alarga-lo de forma a possibilitar a discussão da validade da deliberação tomada ainda no âmbito deste processo de execução.
11. Por outro lado, a decisão ultrapassa os poderes jurisdicionais atribuídos ao Tribunal, entrando na esfera de atuação da Administração, violando assim o princípio da separação de poderes.
12. Mais ainda quando nenhum erro grosseiro é apontado à deliberação impugnada, seja pela recorrida, seja mesmo pelo Tribunal.
13. Acresce que a sentença viola também o disposto no art.º 376.º, n.ºs 1 e 2, do CCiv., pois pretende dotar de força probatória plena aquela declaração relativamente aos factos constantes do seu conteúdo, quando apenas se pode dar como provado que as declarações pertencem a quem as profere.
14. Acresce que a Recorrente nem sequer põe em causa os próprios factos consignados naquela declaração.
15. O que difere é na interpretação a dar aos mesmos para comprovação, ou não, dos requisitos impostos pela Lei n.º 27/98.
16. Como se disse já, o que se põe em causa, não é que tal declaração tenha sido subscrita por quem foi, mas sim que da mesma não se podem retirar os factos que a mesma pretende atestar, ou, aliás, que a conclusão que se pode retirar dos factos que ali se atestam é a de que a Recorrida cumpre os requisitos da Lei n.º 27/98.
17. Conforme determina o art.º 376.º, n.º 2, do CCiv., “os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante”.
18. Ora, os factos compreendidos na mesma declaração diziam que a Recorrida desempenhou funções na área da contabilidade da sociedade, mas as respetivas declarações fiscais eram assinadas por outro como seu responsável desde logo perante a Administração Tributária.
19. No entendimento da Recorrida devia desconsiderar-se tais declarações fiscais para efeitos da lei n.º 27/98.
20. Na interpretação da Recorrente tais declarações fiscais deviam também pesar na ponderação decisória.
21. No caso, a contradição entre ambas as situações, e o facto de se ter como relevante, por Lei, a posição do Técnico Oficial de Contas para efeitos de assunção da responsabilidade da contabilidade, determinou que não se pudesse dar por assente que foi a recorrida a responsável pela contabilidade da S....., quando esta responsabilidade fora assumida oficial e formalmente por um TOC.
22. Tal não constitui violação do caso julgado, mas, quanto muito – e hipoteticamente – constituiria matéria a apreciar, ex novo, que poderia levar à anulação da deliberação por um qualquer outro vício.
23. Pelo que, verificando-se o cumprimento do caso julgado que se impunha executar, deva manter-se a deliberação tomada, revogando-se pois a sentença recorrida, com as demais consequências legais.
Nestes termos e nos mais de Direito que V. Excelências doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se a decisão recorrida e mantendo-se a deliberação impugnada.”

A aqui Recorrida/E..... veio a apresentar as suas Contra-alegações de Recurso em 26 de setembro de 2018, sem conclusões, terminando afirmando que “Pelo exposto e no entender da ora contra alegante, negando-se provimento ao recurso e mantendo-se a decisão contida na Sentença recorrida, será feita JUSTIÇA.”

O Recurso veio a ser admitido por Despacho de 27 de novembro de 2018, o qual, mais sustentou o teor da Sentença, nos seguintes termos:
“O tribunal, cumprindo a causa de pedir e o pedido – invalidade da deliberação de 14.9.2011 e condenação à inscrição da exequente como técnica oficial de contas – formulados pela exequente, conheceu e decidiu a causa, mantendo a fundamentação de facto e de direito vertida na sentença recorrida.”
O Ministério Público junto deste Tribunal, notificado em 18 de fevereiro de 2019, nada veio dizer, requerer ou Promover.

Prescindindo-se dos vistos legais, mas com envio prévio do projeto de Acórdão aos juízes Desembargadores Adjuntos, foi o processo submetido à conferência para julgamento.

II - Questões a apreciar
Importa apreciar e decidir essencialmente se se mostrará violado pretérito caso julgado, sendo que o objeto do Recurso se acha balizado pelas conclusões expressas nas respetivas alegações, nos termos dos Artº 5º, 608º, nº 2, 635º, nº 3 e 4, todos do CPC, ex vi Artº 140º CPTA.

III – Fundamentação de Facto
O Tribunal a quo considerou a seguinte factualidade provada:
A) Por sentença de 26.2.2009, proferida no processo nº 9199/99, da ex 3ª secção do TAC de Lisboa, foi julgado procedente o recurso contencioso de anulação interposto pela autora contra a entidade demandada e por via do qual foi anulada a decisão e 16.12.1998, que indeferiu o pedido de inscrição da autora na lista oficial de técnicos oficiais de contas – ver doc nº 3 junto com a pi, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
B) Lê-se na fundamentação jurídica da decisão o seguinte:
... «nos termos do AC do Pleno do STA nº 0530/07, de 5.6.2008 «os requisitos de inscrição como Técnicos Oficiais de Contas, nos termos do art 1º da Lei nº 27/98, de 3.6, podem ser provados por quaisquer meios de prova admissíveis em Direito, não sendo juridicamente relevante o «Regulamento» emitido pela ATOC a estabelecer um determinado e único meio de prova».
Em face do expendido e de acordo com jurisprudência já firmada pelo referenciado Ac do Pleno do STA entende-se que não pode ser exigido como meio único de prova da responsabilidade direta por escrita organizada a apresentação das declarações fiscais de rendimento (modelo 22 de IRC e/ ou anexo C do modelo 2 do IRS), que tivessem sido apresentadas ao fisco e contivessem a assinatura do interessado na referida qualidade de responsável pela escrita.
A questão centra-se em saber se, para efeitos de inscrição na Associação dos Técnicos Oficiais de Contas prevista na Lei nº 27/98, de 3.6, é possível provar por qualquer meio o requisito de responsabilidade direta por contabilidade organizada, nos termos do Plano Oficial de Contabilidade ou se podia ser limitada a possibilidade de prova a cópias de declarações modelo 22 de IRC ou anexo C ao modelo 2 de IRS, como a Comissão de Inscrição estabeleceu num «Regulamento» que aprovou para...

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