Acórdão nº 2583/20.0T8OAZ.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-05-23

Ano2022
Número Acordão2583/20.0T8OAZ.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 2583/20.0T8OAZ.P1-Apelação
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro-Juízo Local Cível de Oliveira de Azeméis
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
Sumário:
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I-RELATÓRIO
F..., S.A, pessoa colectiva nº ..., com sede na ..., ..., Oliveira de Azeméis, intentou a presente acção declarativa sob a forma de processo comum contra M..., S.L., pessoa colectiva de direito espanhol, contribuinte ..., com sede em ..., .../G..., ..., ..., Alicante, peticionando a condenação desta última a pagar-lhe a quantia de € 3.899,56, acrescida de juros de mora vincendos desde a citação até efectivo e integral pagamento.
Alegou, para o efeito e em síntese, ter encomendado à ré um conjunto de aplicações e fivelas a aplicar em sapatos, sucedendo, porém, que devido a vicissitudes várias, a ré não cumpriu atempadamente com a sua prestação contratual, pois que ainda que não tenha sido estipulado prazo de entrega, o prazo normal era de 4 a 5 semanas. Incumprimento que lhe acarretou prejuízos cuja obrigação de reparar incide sobre a ré.
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Regularmente citada, a ré sublinhou que só a 08/01/2020 é que ficou formalizada a encomenda, sendo certo que a autora não solicitou qualquer prazo para a entrega. Frisou, de igual modo, que entregou o material descrito em duas facturas em 31/03/2020, não tendo a autora reclamado de qualquer defeito ou desconformidade nos 08 dias seguintes, razão pela qual, o seu direito de acção caducou decorridos esses 08 dias.
Mais aduziu pedido reconvencional, peticionando o pagamento pela autora das facturas ainda em dívida no valor de € 7.185,89.
Peticionou também a condenação da autora como litigante de má-fé.
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A autora respondeu a 25/11/2020, arguindo a improcedência da matéria de excepção e peticionando a condenação como litigante de má-fé da ré.
Terminou concluindo pela total improcedência do pedido reconvencional.
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Tendo o processo seguido os seus regulares termos, teve lugar a audiência final que decorreu com observância do formalismo legal.
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A final foi proferida decisão que julgou a acção improcedente por não provada e, em consequência, absolveu a ré do pedido e, na procedência do pedido reconvencional, condenou a autora reconvinda a pagar à ré a quantia de € 7.185,89, acrescida dos juros vencidos desde a data das facturas e vincendos até efectivo e integral pagamento.
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Não se conformando com o assim decidido veio a autora interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
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Devidamente notificada contra-alegou a ré concluindo pelo não provimento do recurso.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são duas as questões que importa apreciar:
a)- saber a sentença padece da nulidade que lhe vem assacada;
b)- saber se existe contradição sobre determinados pontos da matéria de factos e se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto;
c)- decidir em conformidade face à alteração, ou não, da matéria factual e, mesmo não se alterando esta, se a subsunção jurídica se encontra correctamente feita.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:
1. A autora é uma empresa que se dedica ao fabrico de calçado.
2. A ré dedica-se à venda de aplicações e fivelas para calçado por grosso.
3. No exercício da sua atividade a autora, em 5 de dezembro de 2019, remeteu à Ré, por correio eletrónico, uma encomenda das seguintes aplicações e fivelas: Aplicação Ref. MA978 Oro free–560 unidades; Aplicação Ref. Cristais–810 unidades; Fivela Ref. M205 P/12 Zamac Oro free–1522 unidades; Fivela Ref. M205 P/12 Zamac Plata–810 unidades.
4. A ré não respondeu a esta correspondência electrónica e não confirmou a encomenda.
5. Em 7 de janeiro, a autora enviou à ré um reforço de encomenda, por correio eletrónico de: Aplicação Ref. Cristais–50 unidades; Aplicação Ref. MA978 Oro free–16 unidades; Fivela Ref. M205 P/12 Zamac Plata–50 unidades; Fivela Ref. M205 P/12 Zamac Oro free–1374 unidades.
6. Apesar de não ter sido solicitado prazo de entrega, o prazo normal de entrega variava entre 4 a 5 semanas, informação que sempre havia sido dada à autora em todas as múltiplas encomendas anteriores e sempre havia sido entregue nesse intervalo de tempo, pelo que a autora contava receber as aplicações e fivelas em meados de Janeiro.
7. A 08 de Janeiro de 2020 a ré envia à autora correspondência electrónica com o seguinte teor: “Bom dia AA, Pedimos desculpa, pois aqui houve um erro. Vocês ao enviarem o email de 5 de dezembro, nós só vimos a vossa requisição de amostras, pelo que pedimos desculpa. Agora que enviou este email com o reforço do pedido é que nos vimos, comentário: -Fivelas M205 vamos pô-las agora em produção, não há problema. A cor Níquel free (810+50 unidades) podemos entregar em 3-4 dias aproximadamente (temos uma pequena quantidade em stock); a cor Oro free (1522+1374 unidades) podemos entregar em 10 dias aproximadamente. -Os adornos brilhantes (MA987 e MA979) vamos ter algum atraso, pois estes adornos se compõem de pérolas e brilhantes que nos provêm a nossa plataforma na Ásia, agora estão encerrados, pois começam as suas férias de ano novo, sendo que até abrirem não podemos fabricar essas peças. A data de entrega estimada para estes adornos é o dia 28 de fevereiro aproximadamente. Por favor, solicito a confirmação de esta informação para pôr tudo em produção com a máxima urgência possível. De novo, peço desculpa.”
8. Atendendo a que os demais materiais já estavam encomendados e em armazém, na sequência do email de 08 de Janeiro de 2020, os prazos de entrega foram aceites pela Autora, isto no pressuposto de que a encomenda chegaria até 28 de fevereiro, o que ainda daria tempo para a produção e entrega, conforme combinado com o cliente J..., SA..
9. Em 12 de Fevereiro de 2020 a ré deu conhecimento à autora que não seria possível entregar a encomenda em 28 de Fevereiro, tal como mencionado por email.
10. Em 26 de Março a autora alertou a ré para o facto de não saber se o cliente J..., SA. iria aceitar a encomenda, devidos aos consecutivos adiamentos da entrega dos acessórios.
11. Ao que a ré respondeu que já não aceitava o cancelamento da encomenda.
12. A ré entregou as aplicações à autora em 27.03.2020 e em 30.04.2020.
13. A autora emitiu e enviou à ré a factura ..., no montante global de €11.057,20, factura que a ré não aceitou.
14. A Ré emitiu as facturas nº. ..., datada de 27/03/2020, no montante de €1.953,00 e a factura nº ..., datada de 30/04/2020, no montante de €4.667,20, cujo pagamento a Autora se recusou a efectuar.
15. Assim como se recusa a pagar as seguintes facturas que se encontram em aberto, designadamente, as facturas ..., datada de 28/02/20020, no montante de €507,36, factura ..., datada de 23/06/2020, no montante de €8,40 e factura nº ..., no montante de €21,68.
16. A 26.03.2020 a ré recebe da autora correspondência electrónica a informar que a sua empresa estava encerrada por tempo indeterminado e pedia para a ré não enviar a encomenda.
17. A ré responde por correspondência electrónica nesse mesmo dia, informando a autora que a encomenda vai seguir nesse dia e que não pode aceitar nessa data um cancelamento da encomenda.
18. Informa também que todas as datas de entrega transmitidas foram aproximadas e que quando foi dada a informação do prazo de 27 a 30 de Março a autora não cancelou a encomenda pelo que aceitou o novo prazo dado.
19. A 15.04.2020 a autora envia email à ré a solicitar o envio da restante mercadoria, tendo a ré informado por email de 16.04.2020 o número de tracking do envio da encomenda.
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Factos não provados
Não se provou que:
a) Os materiais acima referidos destinavam-se a ser incorporados numa encomenda onde constam 718 pares de sandálias referentes aos modelos 48946 e 48947, que a autora iria fabricar para a sua cliente J..., SA., cuja entrega deveria ocorrer até meados de Janeiro de 2000, circunstância de que a ré tinha conhecimento.
b) A ré tinha conhecimento que para a autora era condição essencial para celebração do contrato que a ré cumprisse o prazo acordado.
c) A ré ao colocar em produção a encomenda com um mês de atraso, acabou por não conseguir entregar os acessórios, nem na data expectável de entrega (4 a 5 semanas), nem num prazo referido no e-mail de 8 de janeiro, ou seja, em 28 de fevereiro, atendendo a que, as aplicações só foram enviadas para a Autora, parte em 27/03/2020 (4 semanas após a segunda data de entrega) e a restante em 30/04/2020 (9 semanas após a data de entrega).
d) E devido ao atraso na entrega dos acessórios, a autora não conseguiu cumprir os prazos de entrega da sua encomenda da sua cliente J..., SA., relativamente aos modelos 48546 e 48547.
e) Tendo como consequência uma penalização de 40% no valor da encomenda, sob pena de cancelamento da totalidade da encomenda dos modelos, o que causou à autora um prejuízo de €11.057,20.
f) Se a ré tivesse colocado a encomenda em produção na data de 05 de Dezembro de 2019, a mesma teria sido entregue à autora antes de as fábricas na China suspenderem a produção devido à pandemia por COVID-19 e a autora não teria falhado o prazo de entrega da mercadoria à sua cliente.
g) E não se veria obrigada a aceitar o desconto na factura de 40%.1.1-Factos provados
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III. O DIREITO
Como supra se referiu a primeira questão que importa apreciar e decidir consiste em:
a)- saber se a sentença padece da nulidade que lhe
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