Acórdão nº 253/15.0BEFUN de Tribunal Central Administrativo Sul, 09-02-2023

Data de Julgamento09 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão253/15.0BEFUN
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul

Relatório
N…instaurou contra o Município do Funchal e contra a F… – Companhia de Seguros, S.A. ação administrativa comum para efetivação da responsabilidade civil extracontratual, peticionando a condenação dos réus a pagarem-lhe a quantia de €: 47.359,18 correspondente aos seguintes montantes:
(i) € 1.006,10 a título de indemnização por danos patrimoniais,
(ii) € 5.565,00 referente à privação do uso de motociclo,
(iii) € 788,08 relativos aos danos patrimoniais resultantes da inutilização das calças, relógio, capacete, sapatos,
(iv) € 30.000 a título de indemnização pelo dano patrimonial na vertente do dano biológico correspondente à perda de ganho ou à não perceção de retribuição suplementar pelo esforço acrescido na execução das mesmas,
(v) € 15.000 a título de indemnização devida pelos danos não patrimoniais, na vertente de dano moral, e
(vi) € 5.000 a título de indemnização devida pelos danos não patrimoniais, devida pela afetação definitiva da afirmação pessoal.
O TAF do Funchal julgou a ação parcialmente procedente e, em consequência: (1) condenou o Município do Funchal no pagamento ao autor da quantia de €: 2.901,21, absolvendo-o do demais peticionado; (2) absolveu do pedido a F… – Companhia de Seguros, SA.
O autor, inconformado com a decisão, interpôs o presente recurso jurisdicional, com as seguintes conclusões:
1. Tendo em consideração os factos provados sob os pontos, 6.°, 10.° a 14.° da Sentença recorrida, fácil é verificar que a decisão em apreço violou os direitos patrimoniais e de personalidade do Autor, atendendo às lesões/sequelas que o mesmo sofreu e aos danos causados no seu velocípede;
2. Neste entendimento, os montantes fixados na sentença em apreço - quer a titulo de danos patrimoniais, quer de danos não patrimoniais - são muito exíguos, se considerados à luz dos juízos de equidade, a que alude o art. 496°, n°4 do Código Civil;
3. Sendo o dano, no caso dos presentes autos, violador da integridade física e psicológica do Autor, que viu o acidente causar-lhe danos corporais com significativa gravidade, que deixaram sequelas permanentes, a nível físico e psicológico para o resto da sua vida;
4. Já que as lesões/sequelas, que resultaram para o Autor, constituem uma limitação relativamente à situação anterior ao acidente (10.° e 14.° dos factos);
5. Pelo facto do Recorrente exercer, à data do sinistro, a profissão de armador de ferro, o que implica habilidade, competência, força e minúcia na execução de movimentos de
extrema precisão ao nível das mãos e dedos;
6. Na execução de tais serviços, os movimentos feitos pelo Recorrente exigem e obrigam utilização constante dos membros superiores a tempo inteiro, bem como, carregar, deslocar e movimentar peças de pequeno ou grande porte com pesos muito variáveis provocando as lesões em causa, grandes dificuldades na realização de tais tarefas;
7. Já que, as lesões/ sequelas do recorrente ainda que compatíveis com o exercício da sua profissão, causam-lhe esforços suplementares acompanhados de queixas dolorosas passando a ter maior dificuldade em efetuar tais trabalhos e consequentemente a dar desenvolvimento e prossecução à sua atividade profissional (Cfr. Relatório Gabinete Médico Legal constante de Fls... dos autos);
8. Antes do evento danoso, o Recorrente trabalhava com mais destreza e sem queixas dolorosas sendo incontornável que, ao longo do resto sua vida, seja qual for a atividade que exerça, o Recorrente terá sempre que desenvolver um quadro de esforço acrescido para alcançar o mesmo rendimento, que outra pessoa que não sofra de qualquer incapacidade, desde logo em todos os pequenos movimentos que diariamente terá que executar, quer no plano profissional, quer pessoal, indissociável daquele;
9. Atendendo à idade do Autor, à data do acidente sofrido, de 32 anos, e não fosse o sinistro sofrido ainda lhe restavam mais de 40 anos para desfrutar da vida sem aquelas lesões e sequelas;
10. O montante da indemnização de € 750,00 atribuído pelo Tribunal ad quo, ao Recorrente, a titulo de Danos Patrimoniais Futuros/ Dano Biológico, não teve um papel corretor e de adequação às circunstâncias do caso concreto;
11. A indemnização por danos patrimoniais, fundamentada apenas na redução e na perda de rendimento que resulta das lesões e, bem assim, na necessidade de um acréscimo de esforço para a evitar, não valorou a circunstância de que tais danos consubstanciam, antes de mais, uma lesão do direito fundamental à integridade física e psíquica que deve ser reconhecido ao Autor;
12. Pelo que, em face às sequelas que afetam de forma profunda e irremediável o padrão e a qualidade de vida do Recorrente, deve tal indemnização a titulo de Dano Biológico/ Dano Patrimonial Futuro ser alterada para o quantitativo peticionado de €:30.000,00 (Trinta Mil Euros);
13. Além do mais, a reparação/indemnização dos danos não patrimoniais visa dar uma satisfação ou compensação pelo dano sofrido que, para responder, atualizadamente, ao comando do artigo 496.° do CC e constituir uma efetiva possibilidade compensatória, tem de ser significativa, não meramente simbólica ou miserabilista. (cfr. Ac. STJ de 28.06.2007, n.° convencional JST J000; www.DGJSTJOOOSI.PT);
14. Razão pela qual o ora Recorrente não pode igualmente concordar com o valor indemnizatório de €:600,00 arbitrado pelo Tribunal a quo a titulo de Danos não Patrimoniais, tendo sido dado como factos provados os vertidos nos pontos 11.° e 12.° da douta Sentença;
15. Já que o Autor, ora Recorrente, apresenta sequela que implicam esforços suplementares acompanhados de queixas dolorosas, na execução da sua atividade profissional;
16. Todas estas circunstâncias revelam elevados desgostos e sofrimentos, sendo fácil de concluir que, sob o ponto de vista psicológico, o Autor sofreu lesões com elevada gravidade, sendo patente o seu mal-estar físico e anímico;
17. Por tais razões a indemnização arbitrada a título de Danos não Patrimoniais, pelo Tribunal ad quo, afronta manifestamente as regras da boa prudência, do bom senso prático, da justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das regras da vida;
18. Atendendo à matéria de facto dada como provada, pela Douta Sentença e com interesse para a determinação do montante indemnizatório a atribuir ao Autor/Recorrente a título de danos pessoais do mesmo, deverá o mesmo montante indemnizatório ser fixado equitativamente em quantia nunca inferior a €:20.000,00 (Vinte Mil Euros) pelos danos não patrimoniais, nomeadamente pelo Quantum Doloris e pelo Dano Estético atribuídos ao autor;
19. Foram violados, artigos 483°, 496.°, nº 1 e 3; 562º, 563º; 564º, nº 1 e nº 2, 566.°, nº 1, 2 e 3 todos do Código Civil. 
20. Razão pela qual deve a decisão Sub Judice ser alterada por outra, que corrija os montantes indemnizatórios em causa para os valores peticionados pelo Recorrente.
21. Nestes termos, deve ser revogada a decisão sob censura e substituindo-a por outra que arbitre ao ora Recorrente uma indemnização de €: 30.000,00 (Trinta Mil Euros) a título de indemnização pelos danos patrimoniais sofridos e uma compensação de € 20.000,00 (Vinte Mil Euros) a título de indemnização pelos danos não patrimoniais;
Deverá o presente Recurso ser julgado totalmente procedente por provado, devendo a douta Sentença recorrida ser revogada e substituída por douto Acórdão que condene os Réus/Recorridos na medida do acima assinalado, com as demais consequências legais.

Os recorridos contra-alegaram o recurso.
A F… – Companhia de Seguros, SA concluiu as contra-alegações do modo seguinte:
1. A douta sentença recorrida condenou o Município do Funchal no pagamento ao Autor da quantia de 2901,21€, indo, por seu turno, a Demandada Seguradora absolvida do pedido, por considerar que os danos não se encontram cobertos pela apólice.

2. Ainda que, a final, após a conclusão 21, o Autor Recorrente tenha requerido a condenação de ambos os Réus, não imputou nem nas alegações, nem nas conclusões de recurso, quaisquer vícios ou razões de discordância em relação à sentença recorrida, na parte em que absolveu a Demandada Seguradora do pedido, por considerar que o evento e danos não se encontram cobertos pela apólice, nem invocou as razões de facto e de direito da sua putativa discordância, nem as normas jurídicas violadas, não tendo sido cumprido o disposto nos arts. 144°, n°2 do CPTA e 639°, nº 1 e 2 do C.P.C.

3. Para além de o presente processo não se tratar de um processo impugnatório, pelo que não poderá ser feito uso do convite previsto no art. 146°, n°4 do CPTA, mesmo que o Autor Recorrente fosse convidado a apresentar, completar ou esclarecer as conclusões formuladas, no prazo de 10 dias, sob pena de não se conhecer do recurso na parte afetada, bem como respondesse ao dito convite, o certo é que o art. 146°, n°4 do CPTA (bem como o disposto no art. 639°, n°3 do C.P.C., caso fosse aplicável, o que não se concede, pelo facto de o n°4 do art. 146°, n°4 do CPTA comportar uma norma especial) limita o dito convite às conclusões, não sendo extensível às alegações.

4. Sendo certo que nos termos do disposto no art. 635°, n°4 do C.P.C., nas conclusões de recurso o recorrente pode restringir, expressa ou tacitamente, o objeto inicial do recurso, mas não ampliá-lo.

5. O recurso interposto pelo Autor encontra-se circunscrito ao montante indemnizatório fixado a título de ressarcimento dos danos não patrimoniais e dano biológico, da responsabilidade exclusiva do Município do Funchal.

6. Não sendo vinculativo para os tribunais superiores o douto despacho de admissão do recurso (cfr. art. 641°, n°5 do C.P.C.), deverá considerar-se que, no recurso interposto, o Autor Recorrente não impugnou validamente a sentença recorrida na parte em que absolveu a Demandada Seguradora do pedido por considerar que os danos não se encontram cobertos pela apólice.

7. Pelo que, nesta parte, o...

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