Acórdão nº 2526/20.0T8CBR-A.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 18-01-2022

Data de Julgamento18 Janeiro 2022
Ano2022
Número Acordão2526/20.0T8CBR-A.C1
Órgão Tribunal da Relação de Coimbra







Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Coimbra[1]

*

1 – RELATÓRIO

Em autos de regulação das responsabilidades parentais instaurados pela Exma. Magistrada do Mº Pº contra A. [dado como residente em ..., (Portugal)] e B. [dada como residente em ..., no Reino Unido], progenitores dos menores C. , nascida a 08.06.2007, e de D. , nascido a 18.08.2004, na medida em que a progenitora requerida, foi qualificada como “ausente” nos autos, foi-lhe nomeado um Defensor Oficioso ao abrigo do art. 21º do n.C.P.Civil, e, operada a correspondente citação, veio a ser apresentado um requerimento de “Defesa”, em 23/05/2021, subscrito pela Exma. Defensora que lhe havia sido nomeada, formulando pedido de realização de diligências instrutórias/probatórias, mais concretamente o seguinte:

«A- Requer-se nos termos do art.º 436.º e 440.º do C.P.C., que sejam oficiadas, as entidades oficiais Inglesas competentes para virem aos autos dizerem o que tiverem por conveniente, nomeadamente sobre a alegada incapacidade da requerente e, em caso de resposta afirmativa, a identificação, caso haja, do seu representante legal/tutor;

B- Requer-se que seja solicitada à Segurança Social, I.P. a realização de relatórios sociais à requerida B. ;

C- Requer-se que a acta de conferência de pais realizada a 24 de Novembro de 2020 – referência Citius 84193372, o despacho proferido a 4 de Maio de 2021 – referência Citius 85320819 e a presente defesa sejam traduzidas para a língua inglesa e remetidas à requerida ou ao representante legal/tutor no caso de se confirmar a sua incapacidade.»

*

Tal requerimento foi indeferido por despacho judicial proferido em 04.06.2021, o qual se traduziu nos seguintes termos:

«Requerimento de 23 de maio de 2021:

Indefiro o requerido ofício às autoridades inglesas, por falta de fundamento legal, não competindo ao Tribunal a realização da investigação pretendida pela requerida.

Mais indefiro a solicitação à Segurança Social para a realização de relatório social à requerida, por manifesta impossibilidade, posto que a requerida reside em país estrangeiro.

Acresce que, atendendo às declarações prestadas por pai e filhos, não se afigura existir qualquer utilidade na solicitação de relatórios sociais às autoridades inglesas, posto que não é de todo provável que a requerida possa constituir-se como alternativa ao pai nos cuidados a prestar aos menores, atendendo à doença mental relatada.

Por último, proceda à notificação à requerida e a E. nos termos solicitados, através do email utilizado para contactar o Tribunal a 23 de novembro de 2020, utilizando previamente o tradutor do Google na tradução para língua inglesa e fazendo menção de tal utilização no texto traduzido.

(…)»

*

Inconformada com essa decisão, apresentou a progenitora requerida recurso de apelação contra a mesma, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
« I. O tribunal a quo procedeu à citação da requerida, residente em Inglaterra e de nacionalidade inglesa para o presente processo de Regulação do Exercício das Responsabilidades Parentais em clara violação do estatuído no art.º 9.º-A do C.P.C. (que estabelece que as citações e as notificações devem usar uma linguagem simples clara) e no Regulamento (CE) n.º 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Novembro de 2007, relativo à citação e à notificação dos actos judiciais e extrajudiciais em matérias civil e comercial, por falta de junção do Anexo II. Regulamento que ainda é aplicável actualmente, vide art. 68.º do Acordo sobre a saída do Reino Unido da Grã-Bretanha e da Irlanda do Norte da União Europeia e da Comunidade Europeia da Energia Atómica (2019/C 384 I/01);
II. O Regulamento (CE) n.º 1393/2007 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 13 de Novembro de 2207 (doravante Regulamento) tem como objectivo, melhorar a eficácia e a celeridade dos processos judiciais, ao estabelecer o princípio da transmissão directa dos actos judiciais e extrajudiciais, sendo aplicável em matéria civil ou comercial, quando um ato judicial ou extrajudicial deva ser transmitido de um Estado-Membro para outro Estado-Membro para aí ser objecto de citação ou notificação;
III. No capítulo II do Regulamento, encontramos as disposições que prevêem os diferentes meios de transmissão e de citação ou notificação dividindo- se este capítulo em duas secções: A secção 1 respeita à transmissão pelas entidades designadas pelos Estados-Membros, designadas “entidades de origem” e “entidades requeridas”, competentes, respectivamente, para transmitir os actos para efeitos da sua citação ou notificação noutro Estado-Membro e para receber tais actos provenientes de outro Estado-Membro. No art.º 8.° do Regulamento - Recusa de recepção de ato” – podemos constatar que, “1. A entidade requerida avisa o destinatário, mediante o formulário constante do Anexo II, de que pode recusar a receção do ato quer no momento da citação ou notificação, quer devolvendo o ato à entidade requerida no prazo de uma semana, se este não estiver redigido ou não for acompanhado de uma tradução numa das seguintes línguas: a) Uma língua que o destinatário compreenda; ou b) A língua oficial do Estado-Membro requerido ou, existindo várias línguas oficiais nesse Estado-Membro, a língua oficial ou uma das línguas oficiais do local onde deva ser efetuada a citação ou notificação. 2. Se a entidade requerida for informada de que o destinatário recusa a receção do ato ao abrigo do disposto no n.° 1, deve comunicar imediatamente o facto à entidade de origem, utilizando para o efeito a certidão a que se refere o artigo 10.°, e devolver-lhe o pedido e os documentos cuja tradução é solicitada. 3. Se o destinatário tiver recusado a receção do ato ao abrigo do disposto no n.° 1, a situação pode ser corrigida mediante citação ou notificação ao destinatário, nos termos do presente regulamento, do ato acompanhado de uma tradução numa das línguas referidas no n.° 1. Nesse caso, a data de citação ou notificação do ato é a data em que o ato, acompanhado da tradução, foi citado ou notificado de acordo com a lei do Estado-Membro requerido. Todavia, caso, de acordo com a lei de um Estado-Membro, um ato tenha de ser citado ou notificado dentro de um prazo determinado, a data a tomar em consideração relativamente ao requerente é a data da citação ou notificação do ato inicial, determinada nos termos do n.° 2 do artigo 9.° 4. Os n.ºs 1, 2 e 3 aplicam-se igualmente aos meios de transmissão e de citação ou notificação de atos judiciais previstos na secção 2. 5. Para efeitos do n.° 1, os agentes diplomáticos ou consulares, nos casos em que a citação ou notificação é efetuada nos termos do artigo 13.°, ou a autoridade ou pessoa, nos casos em que a citação ou notificação é efetuada nos termos do artigo 14.°, devem avisar o destinatário de que pode recusar a receção do ato e que o ato recusado deve ser enviado àqueles agentes ou àquela autoridade ou pessoa, conforme o caso.”
IV. Na secção 2 do Regulamento encontramos outros “meios de transmissão e de citação ou notificação de atos judiciais”: art.º 12.º Transmissão por via diplomática ou consular; art.º 13.º Citação ou notificação de actos judiciais por agentes diplomáticos ou consulares; art.º 14.º Citação ou notificação pelos serviços postais e no art.º 15.º Citação ou notificação directa.
V. No que nos respeita, citação ou notificação pelos serviços postais, o art.º 14.° do Regulamento dispõe que: “Os Estados-Membros podem proceder diretamente pelos serviços postais à citação ou notificação de atos judiciais a pessoas que residam noutro Estado-Membro, por carta registada com aviso de receção ou [envio] equivalente.”
VI. Mas tal não obsta a que se anexe o formulário do Anexo II para que se possa cumprir o estatuído no art.º 8.º do Regulamento: dar a conhecer ao destinatário da citação ou notificação o seu direito de recusar a sua recepção, pelo facto de o acto em causa não estar redigido ou não ser acompanhado de uma tradução numa língua que o destinatário é suposto compreender;
VII. Ora, o direito de recusar a recepção de um acto objecto de citação ou notificação decorre da necessidade de proteger os direitos de defesa do destinatário desse acto, de acordo com as exigências de um processo equitativo, consagrado no artigo 47.°, segundo parágrafo, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e no artigo 6.°, n.° 1, da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, assinada em Roma, em 4 de Novembro de 1950;
VIII. Com efeito, embora o Regulamento n.° 1393/2007 se destine, essencialmente, a melhorar a eficácia e a celeridade dos processos judiciais e a assegurar a boa administração da justiça, o Tribunal de Justiça Europeu declarou que os referidos objectivos não podem ser alcançados à custa de um enfraquecimento, seja de que maneira for, do respeito efetivo dos direitos de defesa dos destinatários dos atos em causa (v., neste sentido, acórdão de 16 de setembro de 2015, Alpha Bank Cyprus, C-519/13, EU:C:2015:603, n." 30 e 31, e despacho de 28 de abril de 2016, Alta Realitat, C-384/14, EU:C:2016:316, n." 48 e 49”.;
IX. Neste conspecto, importa garantir que o destinatário não só receba a citação ou notificação mas, e se não o mais importante, possa compreender o sentido e o alcance da acção proposta contra ele no estrangeiro para fazer valer os seus direitos de uma forma plena e eficaz no Estado-Membro de origem, o mesmo se refira no direito interno português que estabeleceu no seu art. 9.º-A do C.P.C. que o tribunal aquando de...

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