Acórdão nº 252/23.8YRPRT de Tribunal da Relação do Porto, 2023-11-07

Data de Julgamento07 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão252/23.8YRPRT
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 252/23.8YRPRT.P1
Centro de Informação, Mediação, Provedoria e Arbitragem de Seguros

Relatora: Anabela Andrade Miranda
Adjunta: Lina Castro Baptista
Adjunta: Anabela Dias da Silva
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Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I—RELATÓRIO
AA deduziu contra "A..., Companhia de Seguros y Reásegurós”, devidamente identificadas nos autos, o presente litígio arbitral, pedindo que seja condenada no pagamento da quantia de €11.176,01, a título de indemnização dos danos patrimoniais.
Alegou, em síntese, que no dia 22-06-2021, na estrada nacional n.°..., em ..., no concelho de Vila Nova de Gaia, ocorreu um acidente de viação, que envolveu as viaturas de matrícula ..-IG-.., propriedade da Autora e conduzida por esta, e a de matrícula ..-..-UP, seguro na Ré, propriedade de BB e conduzida por esta.
Acrescentou que celebrou contrato de seguro automóvel com a Ré, titulado pela apólice n.° ..., estando identificado como condutor habitual CC. O veículo seguro pelo referido contrato é um ligeiro de passageiros, com a matrícula ..-IG-.., de marca Mercedes, modelo .... Participou, ao abrigo do seguro de danos próprios, o sinistro ocorrido em 22 de Junho de 2021, tendo a Ré procedido à peritagem do veículo. Da referida peritagem resultou que a reparação do veículo orçava em €6.499,81. Não obstante, apenas foi aprovada a reparação pelo valor de €4.642,36, assentando a diferença entre o valor orçamentado (€ 6.499,81) e o valor aprovado (€4.642,36) no facto da Ré pretender que a reparação do veículo fosse feita com recurso a peças da concorrência. Como melhor consta dos documentos juntos, em resultado do sinistro, o veículo segurado ficou imobilizado e sem poder circular, e assim se manteve até à sua efectiva reparação, que ocorreu em 09.11.2021, tendo a reparação sido suportada pela Autora no valor total de € 6.976,01. Pelo que, e durante esse lapso de tempo, quer a Autora quer o condutor habitual ficaram efectivamente privados de retirar as normais utilidades do veículo e de satisfazerem as suas necessidades quer pessoais quer profissionais, designadamente, transporte para tratamentos de hemodiálise, deslocações diárias para o exercício da actividade profissional e pessoal, com prejuízo e perturbação de toda a sua vida familiar, pessoal e profissional. (...).
A Ré contestou alegando, para o efeito, que na sequência da participação do sinistro, solicitou a realização de uma peritagem ao veículo IG, a fim de apurar a extensão e o valor da reparação dos danos sofridos em consequência do sinistro. Da referida peritagem efetuada ao veículo IG foi possível verificar que a substituição das peças danificadas podia ser efetuada com recurso a peças da concorrência, as quais obedeciam às especificações e padrões de qualidade exigidos pela marca. Ora, para realização dos trabalhos de reparação, de acordo com o Regulamento da Comissão Europeia n°1400/2002 de 31 de julho de 2002 (ponto sete), está prevista a viabilidade da aplicação de peças de concorrência, pelo que, atendendo à legislação mencionada, assiste aos responsáveis pela reparação, o direito de proceder à aplicação de peças de qualidade equivalente, não estando vinculados à aplicação de peças em estado novo e original. Assim, de acordo com o relatório de peritagem, resultou que seria necessário despender a quantia de €4.642,36 para reparação dos danos com recurso à substituição das peças danificadas, quantia que a Reclamada aceitou liquidar à Autora, ao abrigo da cobertura de Danos Próprios (...) De facto, nada impede que o veículo seja reparado com peças da concorrência, sendo certo que o processo de fabrico dessas é igual ao das peças originais e mesmo nesses casos, ao consumidor são sempre garantidas as revisões numa oficina da marca. Por outro lado, nada justifica a pretensão da Autora ao reclamar a utilização de peças originais em detrimento da utilização de peças de concorrência para reparação do veículo em causa, pelo que carece de justificação o que é peticionado. De facto, não tem qualquer fundamento o que é peticionado nos presentes autos, já que a desde logo garantiu a possibilidade de reparar o veículo da Autora. Efetivamente, não é razoável a pretensão do pagamento de 6.000,00€ por uma reparação que pode ser garantida do mesmo modo, com peças que satisfazem na mesma medida a reparação e que têm qualidade equivalente, pelo custo de apenas 4.642,36€. Com efeito, verifica-se que a única diferença de preço reside na inclusão do logótipo da marca, não trazendo, a reparação pretendida pela Autora, qualquer garantia acrescida. A Autora peticiona ainda uma indemnização a título de privação de uso, pelo período compreendido entre a data do sinistro (22.06.2021) e a data da reparação (09.11.2021), à razão diária de €30,00. Contudo, a Ré cedeu à Tomadora de Seguro um veículo de substituição no período compreendido entre 23.06.2021 conforme condições do contrato de apólice de seguro contratado com o Tomador de Seguro, pelo que carece de justificação o aqui alegado pela Reclamante. Ainda que se admita que tem direito a ser indemnizada pela privação de uso de veículo, pretensão que não tem enquadramento contratual e apenas se admite para efeitos de raciocínio, sempre se dirá que o período a considerar deverá corresponder aos dias compreendidos entre 03.07.2021 e a data de efetiva reparação do veículo, sendo certo que desconhece se o veículo foi efetivamente reparado e em que data.
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Proferiu-se sentença que julgou a presente ação arbitral parcialmente procedente, por provada, e, consequentemente:
a.Condenou a Ré no pagamento da quantia de €6.976.01. a título de indemnização dos danos causados no seu veículo:
b.Condenou a Ré no pagamento da quantia de €105.00 a título de indemnização do dano de privação do uso do seu veículo.
c.Condenou-a no pagamento de juros de mora, à taxa de juro civil, sobre todas as quantias acima mencionadas, desde a sua citação até efetivo e integral pagamento.
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Inconformada com a sentença, a Autora interpôs recurso finalizando com as seguintes
Conclusões
A.Por decisão proferida a fls... dos autos, de 26.04.2023, foi decidido julgar parcialmente procedente a acção arbitral e em consequência condenar a reclamada no pagamento à reclamante da quantia de € 6.976,01, a título de indemnização pelos danos causados no veículo, da quantia de € 105,00 a título de indemnização do dano de privação do uso do veiculo, de juros de mora, à taxa de juro cível sobre todas as quantias acima mencionadas desde da citação da reclamada até ao efectivo e integral pagamento.
B.Não pode, contudo, a reclamante, aqui recorrente, se conformar, na integra, com a decisão proferida, concretamente, com o segmento decisório que condenou a reclamada a pagar, a titulo de indemnização do dano da privação do uso, apenas o valor de € 105,00.
C.Por tal motivo, e por via do presente recurso, pretende vê-la posta em crise, e, consequentemente, revogada.
D.O Tribunal a quo efectuou uma incorrecta apreciação e interpretação da prova produzida, existindo erro notório na apreciação da prova.
E.Os concretos meios probatórios constantes da prova gravada, e os documentos juntos, impunham decisão diversa.
F.Impugna-se a decisão da matéria de facto, quanto aos pontos 1 e 2 dos factos dados como não provados pretendendo, após reapreciação da prova produzida, ver alterado, para PROVADO o ponto 1.
G.Quanto ao facto constante do ponto 2, deve ser dado como provado, pelo menos, que o valor diário de aluguer de um veículo de características semelhantes ao do veiculo em questão é superior a € 30.00.
H.Deve, ainda, ser aditado à matéria dada como provada, atento ao DUA junto, o ponto "22. Veículo mercedes .../, gasóleo, 2000 de cilindrada, 5 lugares"
I.Para alteração da matéria de facto devem ser atendidos, os documentos juntos aos autos e testemunhos de CC e DD, depoimentos gravados no sistema de gravação digital existente no CIMPAS, na audiência de julgamento realizada no dia 29.06.2022 com início às 00.08h e término às 17.25h e início às 47.25h e término às 57.52h respectivamente, conjugados com o ponto 12 da matéria dada como provada.
J. Discorda a recorrente, do decidido pelo Tribunal arbitral quer quanto ao período de cálculo considerado quer quanto à quantificação diária respeitante à indemnização fixada a título do dano de privação do uso do veículo.
K. Não merece reparo a conclusão retirada pelo Tribunal recorrido que a privação do uso da viatura no período em que esteve imobilizada causou à recorrente um prejuízo patrimonial, prejuízo esse que é indemnizável.
L. O tribunal a quo decidiu que o período em que a recorrente esteve privada do uso do veículo, e que é merecedor da tutela do direito, foram 7 dias, ou seja de 03.07-2021 - data em que cessou a utilização do veículo de substituição- a 09.07.2021 - data em que a reclamada comunicou à reclamante a sua decisão de só aceitar proceder à reparação dos danos do veículo com peças da concorrência.
M. O que, manifestamente não se compreende ou pode aceitar.
N. Face à possível reconstituição natural, não impõe a lei ao lesado, perante a recusa da seguradora em fazê-lo, qualquer obrigação de reparação, nem limite temporal para o fazer, pelo que, será apenas e só no plano de uma conduta abusiva (artigo 334.° do Código Civil) ou culposa (art.570a do CC) que se justificará, que a indemnização pela privação do uso não seja atribuída ou que o seja em termos limitados.
O. O sancionamento da aqui recorrente, através do invocado art. 570.º do CC, só poderia ocorrer com base num comportamento culposo da sua parte.
P. A seguradora aqui recorrida, foi condenada no pagamento da indemnização pelos danos sofridos no veículo da recorrente, em resultado da total improcedência dos argumentos por si aduzidos.
Q. A
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