Acórdão nº 2457/06.7BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 13-01-2022

Data de Julgamento13 Janeiro 2022
Ano2022
Número Acordão2457/06.7BELSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I-RELATÓRIO

ANA ISABEL (...) veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que absolveu da instância a Fazenda Pública porquanto os fundamentos invocados na petição de oposição deduzida, no âmbito do processo de execução fiscal nº 730/86, que corre termos no Serviço de Finanças de Lisboa 3, para cobrança coerciva de dívida proveniente de responsabilidade na qualidade de fiadora no âmbito do empréstimo nº 0612(...), contraído pela sociedade “B(...) & G(...), Lda”, junto da C. G. D., no valor de €168.905,94, não se subsumirem no elenco taxativo do artigo 204.º do CPPT.

A Recorrente, apresenta as suas alegações de recurso nas quais formula as conclusões que infra se reproduzem:

“Seguem-se as conclusões, extraídas dos aspectos essenciais, quer da matéria de facto, quer do Direito que lhe é aplicável.

142º

Assim, constavam já do processo os dados que a seguir se elencam, todos eles demonstrados documentalmente, isto é, de forma perfeitamente inequívoca.

143º

A primeira conclusão é a de que a abertura de crédito, até ao montante de 30.000 contos / € 150.000,00, fora contratada a 24/04/1981, conquanto a responsabilidade das fiadoras se cingisse a 9.000 contos / € 45.000,00.

144º

A segunda conclusão é a de que o incumprimento da “B(...) G(...), Lda.” remontava não a esta data, mas a sim a 24/10/1982.

145º

A terceira conclusão é a de que a falência desta empresa foi proferida a 04/05/1988.

146º

Do efeito conjugado destes três primeiras conclusões, resulta, desde logo, que a latitude máxima da dívida aqui em análise corresponderia a um capital que nunca chegou a ser de 30.000 contos / € 150.000,00, a que acresceriam juros, calculados sobre esse capital, relativos a cinco anos e meio, cuja exacta dimensão, insolitamente, nunca foi trazida a este processo pela CGD C. G. D.

147º

A quarta conclusão é a de que a massa falida da “B(...) G(...), Lda.” ascendeu a 312.000 contos / € 1.560.000,00.

148º

A quinta conclusão é a de que a CGD-C. G. D., recebeu, com directa proveniência desta massa falida, 95.000 contos / € 475.000,00.

149º

Recebeu, portanto, mais do triplo do que a quantia de 30.000 contos / € 150.000,00, correspondente ao máximo permitido pela abertura de crédito.

150º

A sexta conclusão é a de que a CGD-C. G. D. recebeu directamente das fiadoras 16.900 contos / € 84.500,00.

151º

Recebeu, portanto, quase o dobro da quantia de 9.000 contos / € 45.000,00, de que as fiadoras eram responsáveis.

152º

Em síntese, esta entidade financeira recebeu já 111.900 contos / €559.500,00, quantia que, na perspectiva da ora recorrente, ultrapassa até tudo aquilo que se encontrava em divida pela “B(...) G(...), Lda.” à CGD-C. G. D.

153º

Era exactamente isto que interessava discutir no Tribunal de 1ª Instância, até pela circunstância de ao mesmo ter sido facultado um conjunto de documentos que demonstrava, de forma inilidível, tais dados.

154º

Em termos de Direito aplicável, eis que surge a sétima conclusão : a sentença recorrida enferma de um vício sumamente relevante, na medida em que não extraiu as consequências devidas da invocação da “ilegalidade da liquidação da divida exequenda”, ao considerar que não se trata de um fundamento de oposição à execução, mas sim de um fundamento de um processo de outra natureza, qual seja, o de impugnação.

155º

Tal posição, pura e simplesmente, aceitável, uma vez que existe um princípio processual, denominado de convolação, na base do qual todos os contributos veiculados para um processo devem ser aproveitados, independentemente de não terem sido feitos da forma mais adequada, e desde que os prazos legais ainda o permitam.

156º

Tal princípio encontra-se acolhido: d) no nº 3 do art.97º da LGT, onde, em sede de processo tributário, se dispõe que “ordenar-se-á a correcção do processo quando o meio usado não for o adequado segundo a lei”;

e) no art.52º do CPPT, onde, em sede de procedimento tributário, se dispõe que “se, em caso de erro na forma de procedimento, puderem ser aproveitadas as peças úteis ao apuramento dos factos, será o procedimento oficiosamente convolado na forma adequada”;

f) e no nº 4 do art.98º do CPPT, onde, em sede de processo tributário, se dispõe que “em caso de erro na forma do processo, este será convolado na forma do processo adequada, nos termos da lei”.

157º

A aplicação deste princípio nem sequer depende da respectiva invocação pelo contribuinte – neste caso da ora recorrente –, devendo ser utilizado oficiosamente pelo Tribunal.

158º

Continuamos, assim, perante uma alegada divida à CGD-C. G. D., a qual é completamente ilegal.

159º

Em face de todos estes argumentos, em que releva fundamentalmente a evidência da CGD-C. G. D. já ter recebido até uma quantia superior àquela que alguma vez lhe foi devida pela “B(...) G(...), Lda.”, deve o processo à margem referenciado ser declarado imediatamente extinto, por inutilidade absoluta e total desta lide.

NESTA BASE, REQUER-SE A V.EXAS. QUE SEJA CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO E, EM CONSEQUÊNCIA, QUE SEJA REVOGADA A SENTENÇA RECORRIDA, POR PADECER DE ERROS DE JULGAMENTO, SENDO SUBSTITUÍDA POR UMA DECISÃO QUE ACEITE PLENAMENTE A PRETENSÃO DA ORA RECORRENTE, COM AS NECESSÁRIAS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS.

Valor : € 168.905,94 (cento e sessenta e oito mil, novecentos e cinco euros e noventa e quatro cêntimos).”


***

A Recorrida optou por não apresentar contra-alegações.

***

A Digna Magistrada do Ministério Público (DMMP) neste Tribunal Central Administrativo Sul emitiu parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso.

***

Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

***

II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Para a decisão da presente lide, fixam-se os seguintes factos:

1. A 24 de abril de 1981, foi outorgado escrito denominado de “nota privativa da CGD Instrumento avulso nos termos dos Decretos-Leis nºs 35892 e 639/70, abertura de crédito até ao montante de 30 000 contos” entre a CGD e Ana Isabel (…) B(...) G(...)(…) e Maria Teresa (…) B(...) G(...)(…), que outorgam em seu nome próprio e em representação da sociedade com a denominação comercial “B(...) G(...), LIMITADA”, no âmbito da qual a CGD concede à aludida sociedade “[p]ara fins industriais , um empréstimo sob a forma de abertura de crédito, até ao montante de trinta mil contos”, extratando-se na parte que, ora, releva, designadamente o seguinte:

Imagens – originais nos autos

(…)

(cf. doc. n.º 1 da petição inicial, a fls. 16 a 23 dos presentes autos).

2. A 3 de junho de 1986, foi emitida pela CGD, nota de débito reportada ao mutuário “B(...) G(...), Lda”, respeitante à outorga melhor evidenciada na alínea anterior, no valor de Esc. 79.964 932$00, e com o seguinte teor:

Imagem – original nos autos

(cfr. fls. 78 dos autos);

3. A 22 de julho de 1986, na sequência do incumprimento do contrato identificado no ponto 1, e suportada pela nota de débito referida em 2), foi instaurado o processo de execução fiscal nº 730/86, no 2º juízo do Tribunal Tributário de Lisboa, para cobrança coerciva das quantias decorrentes da abertura de crédito supra identificadas (facto alegado na p.i. e corroborado pelo doc. fls. 2 constante do PEF apenso).

4. A 02 de dezembro de 2005, foi emitida pela CGD, nota de débito nº 68/2005.12.02, no valor de €168 905,94, com o seguinte teor:

Imagem – original nos autos

(cfr. doc. junto com a p.i. a fls. 72 dos autos);

5. A 15 de dezembro de 2005, foi emitido ofício pela CGD, com o seguinte teor:

Imagens – originais nos autos

(cfr. doc. junto com a p.i. a fls. 73 dos autos);

6. A 19 de dezembro de 2005, foi prolatado despacho pelo Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3, no âmbito do processo de execução fiscal nº 730/86, descrito em 1), com o seguinte teor:

“Ordena-se a penhora de 1/3 do vencimento da executada/fiadora Dª Ana Isabel (…), identificada nos autos.

Dê-se-lhe conhecimento.

Após o que se comunicará à entidade patronal para efectivar a retenção do valor agora penhorado, que deverá ser entregue na Tesouraria de Finanças nos termos habituais.” (cfr. fls. 77 dos autos);

7. Na sequência da notificação do despacho referido no ponto antecedente, a Recorrente deu entrada, em 30 de janeiro de 2006, no Serviço de Finanças de Lisboa 3, da presente oposição (cf. carimbo, a fls. 2 dos presentes autos);

8. A 19 de fevereiro de 2021, foi prolatado ofício com o nº 03-1424, pela Chefe do Serviço de Finanças de Lisboa 3, no qual atesta, designadamente, que “[A]pós a recepção do V/ ofício nº 006718436, de 16-09-2019, foi contactado telefonicamente esse Tribunal e, face às informações disponibilizadas, apurou-se que o processo em causa não se encontrava registado informaticamente neste Serviço (nem fisicamente disponível uma vez que foi enviado a esse Tribunal pelo N/ ofício nº 2421, de 26-02-2009) pelo que a informação inicialmente prestada-que o processo estaria extinto-não foi correcta, facto que se lamenta.

Deste modo, não procedeu este Serviço de Finanças à extinção dos autos de execução fiscal.” (cfr. ofício nº 03-1424, de 19.02.2021, junto aos autos);


***

A matéria de facto, ora estruturada, efetuou-se com base na posição assumida pelas partes e nos documentos constantes dos autos e do PEF apenso conforme referido a propósito de cada alínea do probatório.

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III-FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

In casu, a Recorrente não se conforma com a decisão proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, que absolveu da instância a Fazenda Pública porquanto os fundamentos invocados na petição de oposição deduzida, no âmbito do processo de execução fiscal nº 730/86, para a cobrança coerciva de dívida proveniente de responsabilidade na qualidade de fiadora no âmbito do empréstimo nº 0612(...), contraído pela sociedade “B(...) & G(...), Lda”, junto da CGD, no valor de €168.905,94, não integrarem as causas de pedir constantes no artigo 204.º do CPPT.

Cumpre, desde já,...

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